O CULTIVO DA CANA-DE-AÇÚCAR (Saccharum officinarum L.) ASSOCIADO A PROCESSOS GEOMORFOLÓGICOS: O CASO DO PROJETO ALCOOBRÁS, CAPIXABA - ACRE

Autores

Souza, N.L. (UFAC) ; Santos, W.L. (UFAC) ; Arcos, F.O. (UFAC) ; Nascimento, F.I.C. (UFAC)

Resumo

Este trabalho objetiva identificar, monitorar e analisar perdas erosivas em área experimental sob cultivo de cana-de-açúcar e pastagem no Projeto de Assentamento Alcoobrás, localizado na rodovia BR-317, Km 59, utilizando-se parcelas experimentais e monitoramento com pinos de erosão. Os resultados demonstraram maiores perdas na parcela sob pastagem, embora esta tenha apresentado maiores níveis de compactação do solo. Os tufos da cana-de-açúcar podem ter impedido maiores perdas naquela parcela.

Palavras chaves

Impactos ambientais; Uso da terra; Geomorfologia aplicada

Introdução

O setor agrícola do Brasil é marcado pelo ciclo do plantio de cana-de-açúcar para obtenção de combustível. No estado do Acre, o interesse pelo cultivo dessa planta não foi diferente e teve início com o projeto de construção da indústria Alcoobrás, localizada na BR-317, km 59, município de Capixaba/AC. O centro da área de expansão do cultivo de cana-de-açúcar abrange um raio de 30 km da usina, distância que conferiu a essa atividade como sendo economicamente viável, tanto para o cultivo quanto para o transporte até a usina. A indústria entrou em decadência no final dos anos de 1980, porém, atualmente foi retomada a sua operacionalização com o principal objetivo de intensificar o desenvolvimento local pela prática da agricultura nas áreas já desmatadas ocupadas com pastagens e capoeiras, viabilizando a geração de emprego e renda, o abastecimento do mercado regional, além de contribuir para reduzir as pressões de desmatamento no Estado do Acre. Em 2010, o plantio abrangeu uma área de 2.769 ha, com a produção de 107 mil toneladas de cana-de-açúcar (IBGE, 2011). Paralelo ao sucesso econômico do cultivo da cana-de-açúcar naquela região existe a necessidade de estudos aprofundados sobre os efeitos ocasionados por essa cultura ao ambiente natural, especialmente, aos fundos de vale e aos solos, com enfoque para a ocorrência de processos erosivos decorrentes do uso diferenciado da terra, comparativamente às áreas de pastagem. O monitoramento constitui etapa de fundamental importância, considerando-se que estudos desses elementos da paisagem são inexistentes no âmbito do projeto de assentamento e podem servir para o melhoramento do atual uso da terra naquela região. Para isto instalou-se duas parcelas experimentais para o monitoramento de perda de solos, uma na área de pastagem e outra em área de plantio direto de cana-de- açúcar, monitorando-se por todo o período chuvoso do ano de 2014 (outubro a março).

Material e métodos

Inicialmente, selecionou-se uma encosta com 120m comprimento. Procedeu-se as seguintes medidas: a) Declividade - utilizou-se três balizas topográficas e um clinômetro Suunto, constatando-se declividades entre 2 e 6 graus. A seção da meia vertente foi escolhida para a instalação dos experimentos, possuindo a declividade de 3°. b)Infiltração da água - utilizou-se um infiltrômetro idealizado por Hills (1970) construído com um cano de PVC com as seguintes dimensões: 15 cm de altura e 10cm de diâmetro interno. Enterrou-se um parte no solo e, adicionando água, media-se com uma trena a quantidade de água infiltrada (em cm), preenchendo-o com água paralelo à cronometragem com relógio. A profundidade da água foi anotada a cada 2 minutos, até chegar em 30 min de experimento. Este procedimento foi realizado nas duas parcelas (cana-de-açúcar e pastagem. c)Precipitação pluviométrica - foi monitorada através da instalação de um pluviômetro modelo Ville de Paris em ambas as parcelas, anotando-se a altura da água a cada coleta de dados (semanalmente). d)Compactação do solo - foi aferida com um Penetrômetro de impacto, repetindo-se 20 (vinte) batidas em cada parcela experimental, segundo Stolf (1983). As parcelas foram delimitadas no tamanho de 2x10m (20 m2) (uma com plantio de cana-de-açúcar e outra com cobertura vegetal de pastagem) no sentido do caimento da vertente e cercadas com arame. Plantou-se 44 mudas de cana em covas de 30cm de profundidade, com distância perpendicular de 50cm e longitudinal de 90 cm uma da outra. Os pinos de vergalhão de 2,5mm de diâmetro e tamanho de 35cm, foram fixados 15cm no solo, totalizando-se 70 em cada parcela. As medidas dos pinos (coleta de dados) foram realizadas semanalmente, com trena e ficha de anotação específica em cada um dos pinos, na parte da frente e na parte detrás. O monitoramento foi realizado de outubro/2013 a março/2014.

Resultado e discussão

Durante o período monitorado, o total de precipitação pluviométrica foi de 1333 mm e 1372 mm, na pastagem e cana-de-açúcar, respectivamente, valores estes considerados dentro do previsto para o período de “inverno amazônico”. Constatou-se o rebaixamento na área de pastagem (frente) de 99,0 cm (4,95 cm/m2) e 99,9 cm (4,99 cm/m2) na parte detrás. Na área com cana-de-açúcar, rebaixou 49,2 cm (2,46 cm/m2) na parte detrás e 54,6 cm (2,73 cm/m2) na parte frontal do pino. Isto demonstra maior perda de sedimentos na parcela de pastagem do que na parcela de cana-de-açúcar. Tal comportamento pode estar atrelado ao escoamento superficial concentrado na área de pastagem e maior retenção nos tufos das mudas de cana-de-açúcar. Somente nesta última houve valores relativos à deposição de sedimentos (0,1 cm e 1,9 cm). A correlação dos totais de precipitação com os dados dos pinos demonstrou a frequência maior a partir da 7ª semana de monitoramento (r=0,50 a r=0,95), acreditando-se que com o aumento do período chuvoso, houve maior escoamento superficial e maior erosão. A aplicação do teste T-Student, demonstrou que houveram comportamentos diferentes com relação ao rebaixamento entre as duas parcelas, com p-valor < 0,05, exceto para a 10ª e 19ª semana que pode estar atrelada à intensidade das chuvas. Na parte detrás dos pinos, as diferenças também foram significativas, excetuando-se a 17ª e 18ª semana de monitoramento, correspondendo a 10% do período observado. A compactação revelou-se maior na pastagem, alcançando 7,39 Mpa nos primeiros 12 cm da camada superficial. Na parcela com cana-de-açúcar, aos 12 cm alcançou-se 5,68 Mpa, atribuindo isto ao maior escoamento na primeira, corroborando os valores de infiltração na área de pastagem. Nos primeiros 2 minutos infiltrou o valor de 1099 mL, decaiu após 6 minutos para 157 mL a cada 2 minutos. Na área com cana-de-açúcar, a infiltração foi de 1413 mL nos primeiros 2 minutos, permanecendo alta em relação a pastagem até os 16 minutos, estabilizando-se a 628 mL até o final de 30 minutos (fig. 1)

Figura 1 - Demonstrativo de compactação (Mpa) e Infiltração (mL) - Can

A figura demonstra as diferenças nos valores de compactação do solo e infiltração de água nas parcelas experimentais.

Conclusões

Pesquisas complexas sobre o uso da terra em ambiente amazônico são, ainda, escassas e necessitam ser realizadas visando a melhor utilização das terras e diminuindo as agressões ao meio ambiente. Nesta pesquisa realizada, foi possível identificar que a plantação da cana-de- açúcar apresentou menores efeitos erosivos superficiais do que a pastagem, ratificadas pela alta compactação desta última, que favoreceu o escoamento superficial concentrado e, com isto, promoveu maior rebaixamento da superfície do solo. Em contrapartida, os tufos das mudas de cana-de-açúcar promoveram maior retenção dos sedimentos na parcela e, portanto, maior infiltração do que escoamento, o que sugere menor retirada e maior deposição. Sugere-se o aprofundamento das pesquisas, com o aumento da amostragem para uma escala temporal e espacial que possa abranger outras áreas e, com isso, tornar possível prever o impacto da monocultura para a erosão dos solos no sudoeste amazônico, especificamente, no Estado do Acre.

Agradecimentos

À Universidade Federal do Acre pela concessão de bolsa de Iniciação Científica (PIBIC/UFAC).

Referências

CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. T. (Orgs.). Geomorfologia: exercícios, técnicas e aplicações. Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 1996.

De PLOEY, J. & GABRIELS, D. Measuring soil loss and experimental studies. In: KIRKBY, M.J. & MORGAN, R.P.C. (Org). Soil erosion. London: John Wiley & Sons, p. 63-108, 1980.

STOLF, R.; FERNANDES, J.; FURLANI NETO, V. L. Penetrômetro de impacto, IAA/Planalsucar-Stolf.;Recomendações para o seu uso. R. STAB, Piracicaba, v. 1 n. 3, p. 18 – 26. 1983.

SANTOS, W. L. Dinâmica hidroecogeomorfológica em bacia de drenagem: efeitos do uso e ocupação da terra no sudoeste amazônico – Acre – Brasil. (Tese de Doutorado). Programa de Pós-Graduação em Geografia. IGC/UFMG: Instituto de Geociências da Universidade Federal de Minas Gerais, 2013.


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