REATIVAÇÃO DE VOÇOROCAS EM RESPOSTA A MUDANÇA DE USO PASTORIL PARA PLANTIO DE EUCALIPTO EM VALES DE CABECEIRAS ADJACENTES: MÉDIO VALE DO RIO PARAÍBA DO SUL.

Autores

Facadio, A.C.C. (IGEO/ UFRJ) ; Corrêa Junior, L.D.S. (IGEO/ UFRJ) ; Sato, A.M. (IGEO/ UFRJ) ; Coelho Netto, A.L. (IGEO/ UFRJ)

Resumo

Este estudo busca o entendimento dos processos hidrológicos e erosivos associados ao desenvolvimento de canais incisos do tipo voçoroca, conectadas a expansão da rede de canais no domínio dos vales de cabeceiras de drenagem, em resposta a mudanças de uso do solo decorrente da introdução de plantios de eucalipto em antigas áreas de pastagens.

Palavras chaves

Voçoroca; Eucalipto; Pastagem

Introdução

A expansão da rede de canais é um processo natural preconizada pela Lei de Ajuste de Declives de Gilbert (1877) e aliada a magnitude dos impulsos climáticos em interação com os condicionantes e mecanismos hidrológicos e erosivos locais. Dentre estes últimos sobressaem as características geobiofísicas da cobertura vegetal como reguladora da infiltração e estocagem de água nas encostas. Estudos conduzidos em ambiente de pastagem por Coelho Netto e colaboradores, na bacia do rio Bananal, afluente do rio Paraíba do Sul no seu médio curso, apontam que a expansão da rede de canais nos vales de cabeceiras de drenagem é dominada por mecanismos de erosão por ação da água subterrânea, seguidos por outros mecanismos secundários tais como lavagem superficial e movimentos de massa, configurando feições de canais incisos do tipo voçoroca (gully). Seguindo um processo histórico de alterações de uso e cobertura do solo, atualmente ocorre uma expansão acelerada de manchas de plantios de eucalipto em uma matriz de pastagem na região do MVRPS, com um padrão espacial descontínuo no mosaico da paisagem, em justaposição aos antigos fragmentos florestais remanescentes (VIANNA et al 2007 e SATO, 2008). Pesquisas geo-hidroecológicas vem sendo conduzidas por Sato (2008; 2012) na bacia do rio Sesmarias (médio curso do rio Paraíba do Sul), para entender a resultante hidrológica dos plantio de eucalipto (grandis e urophylla). O autor destacou que o processo de intercepção favorece a infiltração e recarga do aquífero em vales de cabeceiras, ao que associou a reativação e expansão de voçorocas já estabilizados antes destes plantios. Diante deste resultado optou-se por expandir os estudos buscando uma melhor compreensão dos efeitos hidrológicos e erosivos dos plantios de eucalipto, localmente, e nos vales de cabeceiras adjacentes ainda sob uso pastoril. Este trabalho discute os resultados iniciais desta segunda fase de pesquisas na bacia do rio Sesmarias.

Material e métodos

Para a análise temporal da evolução das duas voçorocas, foram coletadas previamente fotografias aéreas e imagens orbitais a fim de criar um histórico com diferentes fases de desenvolvimento, tendo assim um panorama dos momentos de atividade e estabilidade destes processos. Para a estimativa quantitativa das taxas de recuo das cabeças dos dígitos das voçorocas e avaliar o atual estágio de desenvolvimento, foram considerados os levantamentos em campo, utilizando DGPS e Estação Total, do perímetro das voçorocas em diferentes períodos: Abril e Maio de 2012; Janeiro e Agosto de 2013; e Janeiro e Julho de 2014. A partir da sobreposição destes contornos no software ArcGis 10, foi calculada a diferença das áreas dos dígitos e a taxa linear de recuo dos dígitos. Foi realizado um mapeamento topográfico detalhado da cabeceira de drenagem como um todo e das áreas de contribuição de cada dígito, com a utilização de Estação Total. Pretende-se a partir desta topografia em detalhe, extrair parâmetros como: densidade de drenagem (Dd), densidade de hollows (Dh) e gradiente (G); visando relacionar o escoamento superficial produzido nestas cabeceiras, que podem contribuir, juntamente com o fluxo subterrâneo, para a expansão das voçorocas. Buscando entender a dinâmica do lençol freático na área em questão, foram instalados poços e piezômetros na parte interna do canal de voçorocamento. Pretende-se também ampliar o monitoramento a partir da rede de poços e piezômetros em outros pontos ao longo da bacia do rio Sesmaria, para entender o comportamento hidrológico da área e avaliar a propagação da influência dos plantios de eucalipto na dinâmica de oscilação do lençol freático. Tendo por base a comparação das fotografias aéreas com as imagens orbitais e também do levantamento e das observações feitas em campo, foi possível obter um histórico do comportamento destas voçorocas, pré e pós os plantios de eucalipto, no que diz respeito aos períodos de atividade/estabilidade e de desenvolvimento

Resultado e discussão

A comparação de imagens em diferentes tempos, aliada ao monitoramento topográfico do crescimento regressivo das voçorocas, mostraram que após a introdução dos plantios de eucalipto (em fevereiro de 2004) ocorreu uma reativação erosiva nas duas voçorocas como indicado na Figura 1, sendo o contorno em vermelho relativo ao levantamento de campo em 2012. Como a erosão na voçoroca 1 evolui por mecanismos de exfiltração de água subterrânea (aquífero permanente) esta aceleração reflete um produto do aumento de recarga do aquífero como apontado anteriormente por Sato (2012). Embora a voçoroca 2 já mostrasse atividade erosiva em 2003, observa-se uma aceleração da erosão nas encostas mais íngremes adjacentes aos plantios, refletindo a transferência de escoamento subsuperficial entre as encostas adjacentes com plantio e sob gramínea. Este fato é também corroborado pela presença de inúmeros túneis erosivos na encosta adjacente ao plantio de eucalipto. A Tabela 1 mostra as taxas de evolução das voçorocas em uma série temporal de 2012 a 2014. Sobressaem os dados de recuo dos dígitos erosivos da voçoroca 1, especialmente do digito 2 que alcançou uma taxa de recuo médio superior a 1 m/mês. Bull & Kirkby (1997) sintetizando os resultados de diferentes estudos indicam uma variação de taxas de recuo de cabeças de voçorocas da ordem de 0, 125 a 6 metros por ano. Vale ainda destacar que outros mecanismos secundários, como a concentração de escoamento superficial nas cabeças dos canais, também contribuem para a evolução destas feições erosivas, e que este conjunto de mecanismos contribuem com elevada exportação de sedimentos durante os eventos de chuva.

Figura 01

A) Panorama completo da área em 2004, com o início dos plantios de eucalipto na vertente oposta às voçorocas. B e C) Voçorocas em atividade em 2010.

Tabela 01

Taxas de recuo das cabeças dos dígitos da voçoroca 01.

Conclusões

Os resultados acima apontam a necessidade de expansão do monitoramento hidrológico atual para confirmas as relações ora apontadas. Ou seja, além da possível influência do aumento de recarga local nos vales de cabeceiras sob plantio e vales imediatamente adjacentes, pergunta-se , por ora, o quanto e até onde se propagaria os efeitos desta mudança local. Esta pergunta será respondida a partir da expansão do monitoramento atual do aquífero, assim como do monitoramento das variações de umidade na zona não-saturada. Pretende-se assim, compreender a dinâmica da água subterrânea para verificar se a água proveniente dos plantios através da alta infiltração é direcionada para a vertente oposta em que estão localizadas as voçorocas e outros vales do entorno.

Agradecimentos

Os autores agradecem o auxílio financeiro da FAPERJ (processo E-26/111.364/2012), do CNPq (processo 480293/2011-2); à CAPES pela concessão da bolsa de mestrado e a Faperj pelo apoio com bolsa de iniciação científica. Estas pesquisas integram ainda o projeto INCT-REAGEO sobre Reabilitação do Sistema Encosta-Planície, sediado na COPPE-Geotecnia sob a coordenação geral do Prof. Emérito Willy A. Lacerda.

Referências

BULL, L.J. & KIRKBY, M.J. (1997) Gully processes and modelling. Progress in Physical Geography, 21(3): 354-374.
COELHO NETTO, A.L. (1999): “Catastrophic Landscape Evolution in a Humid Region (SE Brazil): inheritances from tectonic, climatic and land use induced changes.” Supplementi di Geografia 162 (III), Tomo 3: 21-48.
GILBERT, K.G. (1877) Report on the geology of the Henry Mountains (Utah). U.S.Geogr. Geol. Survey Rocky Mtn. Region (Powell): 18-98.
SATO, A. M.(2012) Influência do plantios de eucalipto na hidrologia e erosão: Bacia do rio Sesmaria, Médio Vale do Rio Paraíba do Sul. Tese (Doutorado) PPGG/IGEO/UFRJ. 177p.
SATO, A.M. (2008): “Respostas geo-hidroecológicas à substituição de pastagens por plantações de eucalipto no médio vale do rio Paraíba do Sul: a interface biota-solo-água”. Dissertação (Mestrado), PPGG/UFRJ. 160p.
VIANNA, L.G.G., SATO, A.M., FERNANDES, M.C., COELHO NETTO, A.L. 2007. Fronteira de expansão dos plantios de eucalipto no geoecossistema do médio vale do rio Paraíba do Sul (SP/RJ). Taubaté, Brasil, IPABHi, 367-369.


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