INTERCEPTAÇÃO DE FLUXO SUBSUPERFICIAL CAUSADO POR ESTRADAS RURAIS NA BACIA DO RIO GUABIROBA, GUARAPUAVA-PR

Autores

Cristina da Cunha, M. (UFPR-UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ) ; Antonio de Oliveira, F. (UFPR-UNIVERSIDADE ESTADUAL DO PARANÁ) ; Lopes Thomaz, E. (UNICENTRO-UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CENTRO OESTE)

Resumo

A construção e a permanência de estradas causam vários distúrbios na paisagem. O trabalho teve por objetivo identificar os pontos de interceptação do fluxo subsuperficial causado pelas estradas rurais da bacia do Rio Guabiroba, Guarapuava-PR. A metodologia utilizada foi baseada na observação direta em campo. Identificamos 20 pontos de interceptação de fluxo subsuperficial em um trecho de 23 km de estradas. A interceptação do fluxo pode aumentar a produção e entrada de sedimento nos rios.

Palavras chaves

Água; Instabilidade de talude; Terreno dissecado

Introdução

Estradas são entendidas como elementos geográficos (de forma linear) presentes nas paisagens rurais (CUNHA, 2011). Asif et al. (2012) destacam que com base nas tendências mundiais em desenvolvimento de estradas durante a primeira década deste século, não é improvável que, em média, entre 1 a 2 milhões de quilômetros de estradas rurais sejam acrescentadas a cada década aumentando a malha viária até 2050. De utilidade indiscutível para indivíduos, as estradas rurais são fundamentais para o deslocamento de pessoas e veículos. De todo modo, apesar da importância que as estradas representam para a locomoção da população local, poucas são as pesquisas em relação aos seus efeitos sobre os processos de interceptação do fluxo subsuperficial. Grande parte das pesquisas se concentram nas estradas recém-construídas em paisagens florestais (Sidle e Onda, 2004; Sidle e Ziegler, 2012; Waldykowski e Krzemień, 2013; Wemple, 2013). Em menor quantidade são os estudos do efeito de estradas velhas sobre os recursos hídricos, especialmente, em áreas rurais (Copstead, 1997; Building rural roads, 2008; Cunha, 2011; Thomaz et al. 2013). Em paralelo às questões econômicas e sociais, as questões ambientais são de fundamental importância dentro dos estudos de implantação e conservação de estradas rurais. Kahklen et al. (1999) colocam que são necessárias informações relativas aos efeitos da circulação das águas de subsuperfície sobre as estradas para minimizar os impactos no ambiente circundante sob o ponto de vista ecológico e de gestão. Sidle e Ziegler (2012) apontam que foi registrado no sudoeste da Ásia um índice de 78% da perda de solos a partir de estradas devido à sua proximidade com os canais fluviais e à interceptação do fluxo de subsuperfície. Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo identificar alguns pontos de interceptação do fluxo subsuperficial causado por estradas rurais na bacia do Rio Guabiroba, Guarapuava-PR.

Material e métodos

Caracterização das estradas rurais: Forma identificados em campo os impactos provocados pela localização e manutenção das estradas rurais. Em várias seções foi realizada a verificação do estado de conservação, largura, declividade, altura do talude, presença de ravinas e disponibilidade de material para ser transportado. As estradas são primárias (1), secundárias (2), e terciárias (3). As primárias são as estradas principais que tem o maior fluxo de veículos e apresentam em média 6 m de largura. As estadas secundárias, com largura média de 4,5 m, e as terciárias, com largura média de 2 m, são denominados como caminhos internos. A hierarquia desta classificação teve como principal embasamento a largura, comprimento e intensidade de uso (trafegabilidade). Os locais de inspeção incluem todas as unidades da bacia hidrográfica, sendo estes locais de alta, média e baixa vertente. Utilizou-se equipamentos como: trena laser(DLE 50 Professional), trena métrica, suporte de madeira, clinômetro (CST), GPS de navegação, máquina fotográfica digital, prancheta e caderneta. Identificação dos pontos de interceptação do fluxo subsuperficial: A identificação dos pontos de interceptação do fluxo subsuperficial por estradas rurais tiveram início em dezembro de 2013. Em um período de 6 meses (dezembro de 2013 a maio de 2014)em um trecho de 23 km foram identificados os pontos de interceptação. Realizaram-se observações direta em campo durante e após os eventos pluviométricos, independente da intensidade, duração e frequência. As observações dos pontos de interceptação consistiram na verificação da umidade e afloramento de água no talude e na estrada, presença de vegetação como samambaias ou juncos (plantas que crescem em lugares úmidos) e localização de estradas próximas ás áreas úmidas. O monitoramento consistiu na verificação do tempo de permanência do fluxo interceptado, ou seja, o número de dias do escoamento no leito das estradas rurais após os eventos de chuva.

Resultado e discussão

A bacia do Rio Guabiroba possui área de 24 km2 (2,401 ha), hierarquia fluvial de 4a ordem em escala de 1:10.000, Figura 1. Na bacia em estudo a densidade de drenagem é de 3,4 km/km². De acordo com Villela e Mattos (1975), a densidade de drenagem varia de 0,5 km/km² com bacias de drenagem baixa a 3,5 km/km² ou mais, em bacias bem drenadas, ou seja, a bacia do Rio Guabiroba caracteriza-se como bem drenada. No presente trabalho foram considerados apenas os rios perenes para o calculo da densidade de drenagem. A densidade de estradas é de 4,02 km/km², ou seja, maior do que a rede de drenagem natural. Somando-se a rede drenagem natural e a rede viária a extensão atinge 181,51 km, aumentando a densidade para 7,5 km/km2. Portanto, com acréscimo da densidade total com a inclusão das estradas foi 54% superior de quando se considerou apenas a drenagem natural. Por sua vez estima-se que a área ocupada pelas estradas e caminhos é de aproximadamente 43 ha, considerando uma largura média de 4,5 m. Sidle e Ziegler (2012) argumentam que estradas mal planejadas e construídas sem sistemas de drenagem, associadas a declividades elevadas, aceleram processos de erosão do solo. Sendo assim as estradas inseridas no meio rural devem ser integradas a paisagem, e sempre que possível agregadas às práticas de manejo e uso do solo das regiões lindeiras. Interceptação de fluxo subsuperficial causado por estradas rurais na bacia do Rio Guabiroba: Em um trecho observado de 23 km de estradas, foram identificados na bacia do Rio Guabiroba 20 pontos de interceptação do fluxo subsuperficial causado por estradas rurais, Figura 2. Constatamos em campo que os pontos de interceptação do fluxo subsuperficial causados pelas estradas acarretam instabilidade no talude e processos erosivos na faixa de rolamento da estrada. Além do mais em alguns casos o fluxo interceptado foi redirecionado formando um novo canal de fluxo aumentando os processos erosivos. Por sua vez o tempo de permanência do fluxo interceptado variou em média de 8 a 10 dias após o cessar da precipitação. Hartsog et al. (1997) mencionam que a interceptação, concentração, redirecionamento ou interrupção do fluxo de águas subsuperficiais por um corte da estrada pode levar ao aumento da quantidade de água de superfície, a taxas de erosão acelerada, a um maior fluxo de pico de vazão e à redução da umidade do solo. Por sua vez, Luce e Wemple (2001) salientam que a concentração de escoamento de superfícies de estrada quase impermeáveis e a interceptação do fluxo subsuperficial em valas aumenta a densidade de drenagem, deslocando a distribuição de água na vertente, com potencial de aumento dos fluxos de vazão. Classificação preliminar dos fluxos subsuperficiais interceptado: Foram identificados basicamente três tipos de fluxo subsuperficial na bacia do Rio Guabiroba, como segue: 1.Interceptação de fluxo subsuperficial pontual relacionado à captura de drenagem subterrânea particularmente “piping”. Na bacia em questão este tipo de interceptação do fluxo subsuperficial representa a menor quantidade. Do total de 20 tipos observados, estes representam 25% sendo observados 5 pontos. 2.Interceptação de fluxo subsuperficial difuso devido à interceptação de drenagem paralela a vertente. Este tipo de fluxo tende a seguir lateralmente os barrancos em média de 7 metros no sentido longitudinal. Do total observado, este tipo de fluxo representou a maio quantidade, sendo 40% no total de 8 pontos notados. 3.Interceptação de fluxo subsuperficial de áreas saturadas. Como resultado de uma ação combinada da infiltração e do fluxo subsuperficial, foi observado à formação de uma camada saturada a pouca profundidade e próxima aos cursos naturais. Do total observado esse tipo de fluxo representa 35% sendo 7 pontos observados. Sendo assim, os pontos de interceptação do fluxo subsuperficial causados pelas estradas rurais, prejudicam a qualidade da faixa de rolamento e podem mudar a resposta hidrológica da bacia ou da vertente.

Figura 1- Localização da bacia do Rio Guabiroba

Fonte: Base Cartográfica Prefeitura Municipal de Guarapuava-PR. Escala 1:10.000 Elaborado pelos autores (2014)

Figura 2- Pontos de interceptação do fluxo subsuperficial

Em A, fluxo subsuperficial. Em B, fluxo redirecionado. Em C, , fluxo difuso. Em D, deslizamento do talude.Elaborado pelos autores (2014)

Conclusões

As estradas rurais constituem-se no elemento essencial para o desenvolvimento econômico e social da comunidade do Rio Guabiroba. O impacto do uso do solo sobre o comportamento hidrológico de bacias rurais é fundamental na preservação e uso dos recursos hídricos. Associada a rede drenagem natural a rede viária, aumenta a densidade para 7,5 km/km². Por conseguinte, com acréscimo da densidade total com a inclusão das estradas foi 54% superior de quando se considerou apenas a drenagem natural. Com a concentração marginal da água coletada ao longo do comprimento da estrada aumenta o risco de deslizamentos dos taludes e desestabilização de canais fluviais existentes. Estes deslizamentos de terra podem incidir na descarga de detritos e ter consequências estendendo-se além da bacia. Quando existentes, os sistemas de drenagem da estrada, associados ao fluxo subsuperficial interceptado, podem exceder sua capacidade de suporte, facilitando a deterioração da estrada.

Agradecimentos

À CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) pela concessão de bolsa.

Referências

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