Anais: Geotecnologias e mapeamento geomorfológico

Utilização do Processo Analítico Hierárquico como metodologia alternativa para a elaboração de Mapa de Distribuição do Escoamento Superficial Hortoniano na Bacia Hidrográfica do Rio Una - Pernambuco

AUTORES
Duarte, C.C. (UFPE) ; Corrêa, A.C.B. (UFPE) ; Girão, O. (UFRPE)

RESUMO
O presente artigo teve como objetivo elaborar um mapa de distribuição do escoamento superficial hortoniano da bacia hidrográfica do rio Una utilizando-se a estrutura lógica de análise e integração denominada AHP no ambiente SIG, levando-se em conta como critérios de análise e integração a declividade, os tipos de solos e a vegetação, pois a configuração e distribuição de tais critérios na bacia influenciam significativamente no comportamento do escoamento superficial.

PALAVRAS CHAVES
Escoamento Superficial; AHP; SIG

ABSTRACT
This article aims to elaborate a distribution of runoff map for Una river basin using the logical structure of analysis and integration called AHP - Analystic Hierarchy Process in GIS environment, taking account criteria analysis and integration such as slope, soil types and vegetation, because the configuration and distribution of such criteria in the basin, influence significantly the behavior of runoff.

KEYWORDS
Runoff; AHP; GIS

INTRODUÇÃO
O escoamento superficial hortoniano, considera o mecanismo no qual o escoamento superficial é gerado quando a intensidade da precipitação excede a capacidade de infiltração no solo, ou seja, a diferença entre o total precipitado e a infiltração. De acordo com este conceito, o escoamento superficial ocorre em toda a bacia de drenagem, entretanto, este será mais intenso e frequente em áreas onde a capacidade de infiltração é baixa (Dunne, 1983). O conceito de "área variável de contribuição", trazido a tona na década de 60 por autores como Cappus (1960), Hewlett e Hibbert (1967) e Dunne e Black (1970), é, devido ao seu caráter variável espacial e temporal, função da umidade da bacia de drenagem e da dinâmica de cada evento de precipitação. A distribuição da água das chuvas em uma bacia e a resposta rápida ou lenta na alimentação do canal principal irá depender, principalmente, das condições iniciais de umidade, da textura, estrutura e profundidade do solo, da cobertura vegetal, da intensidade da chuva, do relevo e do substrato rochoso. As alterações na superfície das bacias têm impactos significativos sobre o escoamento. Esse impacto normalmente é caracterizado quanto ao efeito que provoca no comportamento das enchentes, nas vazões mínimas e nas vazões médias (Tucci e Clarke, 1997). Deste modo, o presente trabalho tem como objetivo a elaboração de um mapa de escoamento superficial hortoniano da bacia hidrográfica do rio Una, com a utilização da estrutura lógica de análise e integração denominada AHP - Analystic Hierarchy Process ou Processo Analítico Hierárquico no ambiente de Sistema de Informações Geográficas (SIG). Optou-se pela bacia do rio Una devido às grandes enchentes que ocorreram em 2010, que geraram diversas perdas nos municípios de Palmares e Barreiros e por apresentar uma variedade de paisagens relacionada com as mudanças do clima úmido na porção leste da bacia para o clima semi-árido na porção oeste.

MATERIAL E MÉTODOS
O mapa de distribuição do escoamento superficial foi elaborado com vistas a identificar as áreas onde predominam o escoamento superficial (hortoniano) em detrimento da infiltração e do escoamento de base, a partir da sobreposição de mapas temáticos de solos, declividade e vegetação. Todos os mapas temáticos foram classificados na escala de 1 a 3, em que 1 estaria associado às características ligadas a um menor e 3 a um maior escoamento superficial. Os solos foram classificados de acordo com o seu grau de impermeabilidade, em que os valores de 1 estão relacionados àqueles que apresentam maior permeabilidade e menor escoamento superficial e 3 àqueles solos impermeáveis que apresentam alto escoamento superficial. Já em relação à declividade assume-se que quanto mais elevados forem seus valores menor será a contribuição pelo escoamento de base, prevalecendo o escoamento superficial e vice-versa. Finalmente, o mapa de vegetação foi elaborado a partir do NDVI (Normalized Difference Vegetation Index), o qual apresenta valores de -1 a 1, relacionados respectivamente a áreas destituídas de vegetação a uma vegetação densa. Este nível categórico, por sua vez, também recebeu valores de 3 a 1, pois a presença da vegetação retarda o escoamento superficial. Assim, para modelar em bases qualitativas a propagação do escoamento superficial na bacia utilizou-se a estrutura lógica de análise e integração denominada AHP - Analystic Hierarchy Process ou Processo Analítico Hierárquico. O método AHP, desenvolvido por Saaty (1970)consiste na criação de uma hierarquia de decisão. Para estabelecer a importância relativa de cada fator da hierarquia são elaboradas matrizes de comparação para cada nível, onde os resultados das matrizes são ponderados entre si. Tal modelo é um processo de escolha baseada na lógica de comparação par a par (SILVA e NUNES, 2009).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Bacia hidrográfica do rio Una localiza-se no estado de Pernambuco entre as mesorregiões da Zona da Mata Sul e Agreste. Possui uma área de 6.296,77 km² e abrange 42 municípios inseridos total ou parcialmente na área da bacia. A bacia como um todo apresenta formas de relevo bem distintas, principalmente, na porção oriental, onde são encontrados planícies (correspondente à faixa costeira) e conjunto de morros e colinas (indicando um relevo bastante dissecado), que se estende até as proximidades do Planalto da Borborema (com altitudes que chegam até 300 metros). Na parte ocidental da bacia, sobre o Planalto da Borborema, localizam-se superfícies aplainadas com altitudes variando entre 800 e 1000 metros. As variações climáticas na bacia são representadas por regimes pluviométricos diferenciados, em que há uma variação nos totais anuais, porém o período chuvoso mantém-se concentrado nos meses de março a julho na maior parte da bacia, sendo os meses de junho e julho os mais chuvosos.O mapa de distribuição do escoamento superficial (Figura 1) demonstra maior influência do grau de cobertura vegetal sobre a intensidade do escoamento, que ainda associada aos setores de maior declividade com solos impermeáveis, originam áreas de escoamento rápido a muito rápido, representadas em tons de rosa a vermelho. Em relação aos solos a bacia do Una é composta por 36% de Latossolos Amarelo, os quais ocupam a porção litorânea até a escarpa do planalto da Borborema a oeste da bacia, seguidos do Planossolo Háplico (24,63%) na porção oeste sobre áreas de baixa declividade e Neossolos Regolíticos (14%) também na porção oeste sobre áreas de declividades mais acentuadas. Percebe-se que nas áreas de cabeceira de drenagem, onde se encontram Neossolos Regolíticos, há uma infiltração insipiente por conta da delgada espessura do manto de intemperismo, além das cabeceiras apresentarem declividades superiores a 50%. Enquanto que nas áreas cobertas por Planossolos, a intensidade do escoamento apresenta-se moderada, pois além de estarem sobre declividade baixa caracterizam-se por drenagem deficiente, possuindo horizonte Bt, argiloso, de densidade aparente elevada e semipermeável. Essas características favorecem ao acumulo de água durante parte do ano, caracterizando um ambiente redutor. Quando da ocorrência de eventos climáticos de alta magnitude estas áreas saturam-se rapidamente, característica relevante diante dos altos valores pluviais registrados entre os dias 16 e 19 de junho na bacia. A partir das Escarpas do Planalto da Borborema as condições fisiográficas contribuem ainda mais para a potencialização das enchentes a jusante, uma vez que a cobertura vegetal predominante passa a ser a caatinga hiperxerófila e o uso da terra restringe-se quase que inteiramente às pastagens, sendo que diversos setores sequer apresentam cobertura de vegetação. Predomina na bacia, portanto, a classe de vegetação rala 53,08%, seguida de solo exposto (23,09%). As cidades de Palmares e Barreiros, que se localizam no médio e baixo curso do rio Una, respectivamente, foram fortemente atingidas pelo evento climático de alta magnitude que ocorreu nos dias 16 a 19 de junho 2010, atingindo a população que ocupava tanto o leito maior quanto o leito menor do rio Una, chegando a atingir também o leito excepcional. Esse evento foi agravado ainda mais pelo fato que as fortes chuvas desse período atingiram as cabeceiras de drenagem, ou seja, a porção oeste da bacia, de pouca vegetação, alta declividade e solos delgados ou que se saturam rapidamente. Tal fato levou esses setores a contribuírem de forma catastrófica para o escoamento e a respectiva enchente a jusante.

Figura 1

Demonstração do resultado dos mapas temáticos elaborados, a sobreposição destes e o resultado final após a AHP - Mapa de escoamento superficial

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Processo Analítico Hierárquico consorciado ao ambiente GIS, promoveu uma boa sobreposição e correlação das informações, gerando graus de hierarquia entre os critérios analisados (declividade, vegetação e solos). O critério vegetação foi determinante para a configuração do mapa de escoamento, visto que a vegetação se comporta como agente importante para favorecer a infiltração e diminuir o escoamento superficial, ou seja, é um agente fundamental para o equilíbrio do sistema. Este método permite que outros critérios sejam acrescentados e hierarquizados na análise, no entanto, o resultado poderá variar em função do critério dominante, além disso alguns cuidados devem ser tomados na etapa inicial do estudo como: conhecimento do tema estudado, dos processos atuantes que definirão os critérios a serem escolhidos e o comportamento destes no ambiente, para poder representar de forma mais fiel possível o fenômeno a ser analisado.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq pela bolsa de doutorado concedida, ao Grupo de Estudos do Quaternário – GEQUA-UFPE e ao Instituto de Tecnologia de Pernambuco –ITEP.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
CAPPUS, C. (1960). Basin experimental dÁlrance. Etudedeslois de l’écoulement. Application aucalcul et à laprevision dês débis. La HouilleBranche, 15 (A), 493-520.
DUNNE, T. (1983). Relation of field studies and modeling in the prediction of storm runoff. Jorn. of Hidrol., 65, p. 25-48.
DUNNE, T & BLACK, R.D. (1970). Partial area contribuitions to storm runoff in a small New England watershed. Water Res. Res, 6, 1296-1311.
HEWLETT, J. D. & HIBBERT, A. R. (1967). Factors affecting the response of small watersheds to precipitation in humid areas. In Sopper, W. E. & Lull, H. W. eds. Badland geomorphology and piping. Norwich, Geobooks, p. 13-46.
SILVA, C. A.; NUNES, F. P. Mapeamento de vulnerabilidade ambiental utilizando o método AHP: uma análise integrada para suporte à decisão no município de Pacoti/CE. In: SIMPÓSIO BRASILEIRO DE SENSORIAMENTO REMOTO, 14., 2009, Natal. Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Anais..., Natal, Brasil, 25-30 abril 2009, INPE, p. 5435-5442
TUCCI, C. E. M. e CLARKE, R. T. (1997). Impactos das mudanças na cobertura vegetal no escoamento: revisão. Rev. Bras. Recursos Hídricos, v 2, n.1, p. 135-152.