Anais: Geotecnologias e mapeamento geomorfológico

Caracterização geomorfológica da bacia do rio Sesmarias (SP/RJ) – Médio Vale do rio Paraíba do Sul

AUTORES
Dantas, M.E. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Fernandes, L.F.R. (CPRM - SERVIÇO GEOLÓGICO DO BRASIL) ; Avelar, A.S. (GEOHECO - DEPTO. GEOGRAFIA/ UFRJ) ; Coelho Netto, A.L. (GEOHECO - DEPTO. GEOGRAFIA/ UFRJ)

RESUMO
A bacia do rio Sesmarias situa-se no médio vale do rio Paraíba do Sul e, juntamente com as bacias dos rios Bananal e Barreiro de Baixo, insere-se em terrenos francamente afetados por intensos processos erosivo-deposicionais vigentes desde o Pleistoceno Superior e intensificados com a ocupação humana (Coelho Netto, 1999, 2003). Este estudo visa caracterizar o relevo e os processos geomorfológicos desta bacia de drenagem e traçar um paralelo com as demais bacias de drenagem já estudadas.

PALAVRAS CHAVES
Mapeamento Geomorfológico; Processos erosivo-deposic; Médio rio Paraíba do Sul

ABSTRACT
The Sesmarias river basin is located at Middle Paraíba do Sul valley and, in addition to the Bananal and Barreiro de Baixo river basins, comprises terrains strongly affected by erosion processes since Late Pleistocene and intensified by human intervention (Coelho Netto, 1999, 2003). This study pretends characterize the relief and the geomorphological processes and, then, compare with results registered on other studied basins.

KEYWORDS
Geomorphological Mapping; Erosion processes; Middle Paraíba do Sul Val

INTRODUÇÃO
Estudos geomorfológicos conduzidos nas bacias dos rios Bananal e Barreiro de Baixo demonstraram uma notável atuação da erosão mecânica nos processos de denudação do relevo. Tais processos geomorfológicos foram avaliados por meio da análise de voçorocamentos (Coelho Netto et al., 1988; Cambra et al., 1995; Coelho Netto, 1997; Rocha Leão et al., 2003; Coelho Netto, 2003); de processos de inversão de relevo e captura de drenagem (Coelho Netto et al., 1990; Dantas & Coelho Netto, 1996; Coelho Netto, 1999; Mello et al., 1999a); de estocagem de sedimentos em fundos de vales (Moura et al., 1991; Dantas & Coelho Netto, 1991, 1995; Peixoto & Moura, 1993; Dantas et al., 1995; Coelho Netto, 1999) e na geração de concavidades estruturais (Avelar & Coelho Netto, 1992; Pinto et al., 1998; Coelho Netto, 2003). A severa atuação dos processos geomorfológicos nesta região foi explicada como uma resultante da mudança climática da transição Pleistoceno-Holoceno (Coelho Netto et al., 1995; Dantas, 1995; Coelho Netto, 1999) ou por reativações neotectônicas que geraram a denominada Aloformação Manso (Mello et al., 1999a, b). Todavia, estudos posteriores demonstram que tal efetividade erosiva não se estende para todo o Médio Vale do rio Paraíba do Sul (Coelho Netto et al., 1997; Dantas, 2001; Uagoda et al., 2006; Xavier & Coelho Netto, 2008; CPRM, 2009, p.59), mas restringe-se a uma faixa que se estende do sopé do Planalto da Bocaina à calha do rio Paraíba em sua margem direita, entre as localidades de Volta Redonda e Itatiaia. A bacia do rio Sesmarias, situada imediatamente a oeste das bacias supramencionadas, apresenta um formato alongado no eixo N-S, abrangendo uma área total de 149 km2 (Sato et al., 2007), estando nela inserida o povoado de Formoso. Esta bacia de drenagem drena a vertente norte do planalto da Bocaina e percorre um extenso relevo colinoso até desembocar no rio Paraíba do Sul em meio aos tabuleiros e extensas planícies aluviais da Bacia Sedimentar de Resende.

MATERIAL E MÉTODOS
Para a elaboração do mapa geomorfológico da bacia do rio Sesmarias procedeu-se a análise conjugada de cartas topográficas (1:50.000) e fotografias aéreas (1:30.000), com aferição de campo, com o objetivo de identificar e cartografar as diversas unidades geomorfológicas existentes e que caracterizam, de maneira geral, uma macro compartimentação geomorfológica da bacia. Utilizando o mesmo instrumental, foram mapeadas as principais feições erosivas que atestam processos geomorfológicos vigentes na bacia (concavidades; voçorocamentos e selas topográficas). As concavidades identificadas foram classificadas em três tipos: abertas, estruturais articuladas e estruturais suspensas (Avelar & Coelho Netto, 1992). As voçorocas identificadas foram categorizadas em voçorocas ativas ou inativas. As selas topográficas, por sua vez, representam zonas de destruição de divisores e coalescência de rampas, conforme já descrito por Meis & Monteiro (1979) e Meis & Moura (1984), tanto para o vale do rio Doce, quanto para o vale do rio Paraíba do Sul. Do mesmo modo, foram mapeadas as feições deposicionais em fundos de vales: planícies de inundação, terraços fluviais e rampas de alúvio-colúvio e rampas de colúvio-tálus. Foram ainda assinaladas ocorrências de níveis de base locais (knickpoints), vales abandonados (evidência de captura de drenagem), cristas e picos principais. Especificamente, essa construção foi elaborada por meio da utilização de ferramentas de geoprocessamento no programa ArcGis 9.3. Estas se traduziram, principalmente, em uma etapa inicial de georreferenciamento e no trabalho de vetorização e delimitação da bacia de interesse nas cartas topográficas e na identificação das feições geomorfológicas, feitas nas imagens aéreas através de fotointerpretação; e numa segunda etapa, que buscou garantir a confiabilidade do produto digital, onde foram feitas as correções topológicas e, por último, montagem de layout e SIG.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram mapeadas quatro unidades geomorfológicas, condicionadas pela tectônica Cenozoica e por controles litoestruturais do substrato rochoso: escarpa da serra da Bocaina; domínio colinoso do médio vale do rio Paraíba do Sul; maciço do Morro do Taquaral; e Tabuleiros da Bacia de Resende. A Escarpa da Serra da Bocaina, em seu flanco continental consiste numa muralha montanhosa que delineia a linha de cumeada da Serra do Mar com picos que atingem 1.900 a 2.095 metros de altitude. A partir dessa cumeeira, projetam-se cristas assimétricas bem demarcadas (controladas pela direção e mergulho da foliação dos paragnaisses do Complexo Embu - Eirado, 2006) que encerram o alto vale do rio Sesmarias (localmente denominado de rio Formoso), cujas cotas, gradativamente, perdem altitude até atingir o nível topográfico do relevo colinoso subjacente. As feições erosivas são restritas a poucas concavidades (em sua maioria, estruturais suspensas). Todavia, observa-se nitidamente o processo denudacional de recuo regressivo da escarpa evidenciado pela geração (ainda incipiente) de colos na linha cumeada (wind-gaps) e na sedimentação de possantes rampas de colúvio-tálus em zona de piemonte. O domínio colinoso do médio vale do rio Paraíba do Sul consiste de um relevo colinoso de topos subnivelados e geometria convexo-côncava, posicionada em cotas decrescentes (650 a 450 metros de altitude) a medida que se aproxima da calha do rio Paraíba do Sul. Os fundos de vales são caracterizados por uma alternância de estrangulamentos e alvéolos, estes com expressiva sedimentação aluvionar. Nos estrangulamentos observa-se a ocorrência de cotovelos e knickpoints (cachoeiras ou extensas corredeiras), gerando uma segmentação em distintas sub-bacias suspensas. A intensidade dos processos erosivo-deposicionais é marcante. A densidade de concavidades estruturais, articuladas ou suspensas, é muito alta e imprime um cenário de forte dissecação do relevo. As bacias de drenagem tributárias com alta densidade de concavidades estão, via de regra, entulhadas por rampas de alúvio-colúvio que se encontram suspensas por níveis de base locais ou se interdigitam com os terraços fluviais que preenchem o fundo de vale do rio Sesmarias. Muitas delas foram parcialmente esvaziadas, tendo em vista o registro de dezessete voçorocas inativas. Curiosamente, existem poucas voçorocas ativas (quatro) nesta bacia, ao contrário do que ocorre nas bacias dos rios Bananal e Piracema (Coelho Netto et al., 1988; Cambra et al., 1995). Outro aspecto marcante é salientado no divisor ocidental da bacia, onde foi registrado 11 selas topográficas com destruição do divisor e coalescência de rampas, o que denota uma grande magnitude do trabalho erosivo, numa situação similar a verificada no divisor Piracema – Barreiro de Baixo (Dantas, 1995; Cambra et al. 1995; Coelho Netto, 1999; Mello et al. 1999a). O maciço do Morro do Taquaral ressalta-se topograficamente em relação ao relevo colinoso circunjacente sob forma de uma elevação monolítica que atinge cotas de mais 800 metros. Este maciço está sustentado por ortognaisses e metagranitos do Complexo Taquaral (Eirado, 2006) que consistem em rochas mais resistentes ao intemperismo e erosão. As feições deposicionais são pouco expressivas. Destacam-se a ocorrência de concavidades estruturais suspensas e articuladas e de knickpoints ao longo dos rios que drenam este maciço no contato com o relevo colinoso. Os tabuleiros da Bacia de Resende consistem de superfícies tabulares de baixa amplitude de relevo modeladas em rochas sedimentares pouco litificadas de idade Paleógena (Ramos et al., 2006), na qual se encaixa o baixo vale do rio Sesmarias com deposição de extensas planícies e terraços fluviais. Estes tabuleiros estão embutidos em cotas entre 390 e 420 metros, sendo ocupados pela malha urbana de Resende e apresentam somente esparsas concavidades abertas e um entalhamento fluvial recente em ajuste ao nível de base regional representado pela calha do rio Paraíba do Sul

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A bacia do rio Sesmarias apresenta um cenário de preponderância da erosão mecânica, expressa pela intensa atuação de processos erosivo-deposicionais verificados, especialmente, em seu domínio colinoso. Em certos locais, a erosão mecânica é tão severa que o relevo convexo das colinas é desfigurado numa sucessão de concavidades justapostas e fundos de vales afogados por espessos depósitos alúvio-coluviais. Este cenário assemelha-se ao descrito pela literatura para as bacias dos rios Bananal e Barreiro de Baixo e opõe-se ao descrito para outras áreas do médio vale do rio Paraíba do Sul, como os vales dos rios Turvo e das Flores (Xavier & Coelho Netto, 2008) e bacia do rio Santana, em Rio Preto/MG (Uagoda et al., 2006), onde estes autores advogam um modelo de denudação geoquímica para a evolução geomorfológica da paisagem da margem esquerda do vale do rio Paraíba do Sul.

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