Anais: Geocronologia e evolução da paisagem
Estudo de fitólitos e isótopos de carbono e suas inferências nas análises geomorfológicas na Serra do Espinhaço Meridional, MG
AUTORES
Chueng, K. (UERJ) ; Coe, H. (UERJ) ; Augustin, C. (UFMG) ; Gomes, J. (UERJ)
RESUMO
Análises de fitólitos e isótopos de carbono em dois perfis de neossolos
quartzoarênicos de mesma base litológica em rampas deposicionais, na Serra do
Engenho, Espinhaço Meridional, MG, possibilitaram a identificação de variações nos
ambientes nos quais ocorreram os processos geomorfológicos. A alternância de
condições mais secas e mais úmidas que as atuais influenciaram os processos de
acumulação e o elevado grau de alteração dos fitólitos evidencia a intensidade dos
processos erosivos na área.
PALAVRAS CHAVES
Processos Geomorfológicos; Fitólitos; Isótopos de Carbono
ABSTRACT
Phytoliths and carbon isotopes analysis in two soil profiles, with the same
lithologic basement formed by quartzite rocks, from the Serra do Engenho,
Espinhaço Meridional, MG, allowed of identifying variations in environments where
geomorphic processes occurred. Alternation of drier and more humid conditions than
that of the nowadays influenced, the processes of accumulation and the high degree
of alteration of phytoliths seems to indicate a high intensity of the erosion in
this area.
KEYWORDS
phytoliths; carbon isotopes; geomorphic processes
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa faz parte de um projeto de estudo da geodinâmica quaternária na
região do Espinhaço Meridional, em Minas Gerais, cuja evolução ainda não é
totalmente compreendida (AUGUSTIN, 2011). Alguns trabalhos de reconstrução
paleogeomorfológica da área e a evolução do seu relevo no final do Pleistoceno
Superior/Holoceno já foram realizados (AUGUSTIN, 1995a, 1995b), mas ainda há
lacunas na compreensão mais ampla sobre a cobertura vegetal e aspectos
climáticos prevalecentes durante a deposição dos sedimentos mais recentes. Por
isso é importante a realização de análises complementares, e como indicadores
paleoclimáticos foram escolhidos os fitólitos.
Fitólitos são partículas microscópicas de sílica que se formam como resultado da
absorção de ácido silícico da solução do solo pelas raízes das plantas e que se
precipitam nas células vegetais. Preservam-se bem sob condições oxidantes dos
solos, além de serem excelentes para o estudo de gramíneas (COE, 2009). Permitem
reconstituição paleoambiental, indicando as alterações climáticas e seus efeitos
sobre a cobertura vegetal, oferecendo indícios sobre as condições de
disponibilidade da água e fatores que possam ter influenciado os processos
geomorfológicos. As condições paleoambientais prevalecentes encontram-se
intimamente associadas aos tipos e intensidade dos processos de elaboração do
relevo. A análise fitolítica pode ser combinada à análise polínica, isotópicas e
outras. Seu estudo é útil para se compreender a evolução de uma vegetação em
relação com as condições bioclimáticas, informações importantes para elucidar a
dinâmica evolutiva da área e seus efeitos sobre o modelado.
Este trabalho tem como objetivo contribuir para a compreensão da dinâmica
geomorfológica da Serra do Espinhaço Meridional, a partir do entendimento da
evolução do relevo durante o Quaternário, tendo como base a análise de variações
na cobertura vegetal, o que permite inferências sobre paleoclimas, através do
estudo de assembléias fitolíticas.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram coletadas na Serra do Engenho, parte da Serra do Espinhaço Meridional,MG,
amostras de solo e plantas para a realização de análises fitolíticas, isotópicas
e datação por 14C AMS. Foram amostrados 2 perfis de arenossolos quartzoarênicos
na extensa rampa deposicional localizada na borda leste da Serra do Engenho,
coordenadas 18025’44”S e 43048’34”W (AUGUSTIN, 1995b). Ambos os perfis
apresentam paleopavimento detrítico em profundidades semelhantes, sendo que um
deles, o localizado na baixa vertente, apresenta um horizonte orgânico. Também
foram coletados materiais sob serrapilheiras dos principais tipos de cobertura
vegetal atualmente presentes na área, para servir como assembléias fitolíticas
modernas de referência.
As análises elementares e isotópicas da matéria orgânica dos solos (MOS) foram
realizadas pelo Laboratório de Ecologia Isotópica do CENA/USP, com um limite de
detecção de 0,03%.
Os fitólitos foram extraídos a partir de 20g de solo seco, após a dissolução dos
carbonatos, oxidação da matéria orgânica, remoção dos óxidos de ferro, separação
granulométrica e densimétrica (2,35). Em seguida foi feita a identificação e
contagem das assembléias de fitólitos em microscópio óptico com aumento de 400x.
Foram contados pelo menos 200 fitólitos de diâmetro superior a 5µm e com
significado taxonômico (classified) e aqueles sem significância taxonômica
(unclassified) devido a sua dissolução ou fragmentação. Os resultados são
apresentados como porcentagens do total de fitólitos classificados, seguindo a
classificação de Twiss (1992), aumentada por Mulholand (1989), Fredlund & Tiezen
(1994), Kondo et al. (1994), Alexandre et al. (1997), Barboni et al. (1999) e
Runge (1999), e de acordo com o ICPN (International Code for Phytolith
Nomenclature 1.0), 2005. Após a contagem, foram calculados os índices
fitolíticos D/P, Bi, Iph e Ic.
As datações por 14C AMS da MOS das amostras estão sendo realizadas nos
laboratórios do Instituto de Física da Universidade Federal Fluminense
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Serra do Engenho apresenta uma larga e extensa rampa deposicional localizada
na sua borda leste, limitada, também a leste, por um profundo vale cortado em
rochas intrusivas metabásicas. A rampa apresenta uma leve forma côncava na
porção amostrada e ruptura abrupta de declive no contato com o afloramento, além
de declividade pouco acentuada. Os 2 perfis analisados encontram-se nessa rampa,
basicamente formada pela deposição de material proveniente dos afloramentos dos
quartzitos da Formação Galho do Miguel, do Super Grupo Espinhaço. O perfil 1
situa-se na parte mais elevada, a cerca de 30m desses afloramentos, e apresenta
uma espessura maior de material, no qual é possível identificar sequências
deposicionais, algumas das quais se estendem até o ponto do P2. Embora essas
sequências possam ter ocorrido concomitantemente, os processos de acumulação ou
a intensidade dos mesmos ocorreram de formas diferentes, como indicado pelas
análises dos fitólitos e demais, cujos resultados são sintetizados nas figuras 1
e 2.
Em ambos os perfis, e em quase todas as assembléias modernas coletadas nas suas
proximidades, os fitólitos se apresentam profundamente alterados com maior
porcentagem de unclassified que de classified. Isto dificulta a identificação
dos tipos e o cálculo dos índices fitolíticos, mas evidencia a intensidade dos
processos erosivos na área. Os resultados também mostram o predomínio de
fitólitos grandes, pois estes são mais resistentes à erosão, mesmo assim muito
alterados, e baixas proporções de fitólitos pequenos, mais frágeis.
Quanto ao carbono orgânico, os estoques são maiores em P2 que em P1, sendo a
maior concentração no horizonte orgânico, já que no P2 os processos de
acumulação são mais intensos. No P1, devido à proximidade do afloramento e
cobertura vegetal menos densa, o escoamento superficial da água de chuva foi, e
continua sendo, mais efetivo, dificultando a acumulação da MOS e respondendo
pelo diâmetro maior dos seixos (cascalho), que evidenciam a atuação mais efetiva
do intemperismo mecânico.
O estoque dos fitólitos do P1 segue uma tendência normal de diminuição com a
profundidade. Já o P2 apresenta um aumento muito grande no horizonte orgânico.
Este aumento no estoque não significa maior densidade de cobertura vegetal, já
que as gramíneas podem produzir até 5 vezes mais fitólitos que as dicotiledôneas
lenhosas, como pode ser observado pelo índice D/P, que diminui no horizonte
orgânico.
Algumas tendências puderam ser observadas nos 2 perfis: nos horizontes
superficiais, os índices D/P são característicos de vegetação aberta, sendo que
no P1 a densidade arbórea atual é um pouco maior que em P2, provavelmente
porque, estando mais próximo ao afloramento, situa-se em um local que hoje
concentra mais umidade, ou porque parte dos fitólitos provem da vegetação mais
arbórea da encosta. O índice Bi é elevado e similar em ambos.
O índice D/P diminui com a profundidade, com exceção de um aumento significativo
no paleopavimento detrítico, sugerindo um ambiente mais úmido. Nos horizontes
mais profundos (rocha alterada) os valores são mais baixos que os atuais, mas a
alteração dos fitólitos nessa profundidade é tão grande que o sinal fitolítico é
muito fraco, restando apenas os fitólitos mais resistentes à dissolução. Neste
caso, a reconstituição da vegetação através dos fitólitos não é viável, sendo
possível apenas inferir que neste período os processos erosivos eram muito
acentuados, em um ambiente de alta energia.
Os resultados isotópicos, que quase não apresentaram variações ao longo dos
perfis, nesses horizontes mais profundos apresentam valores característicos de
uma vegetação mais fechada, sugerindo um ambiente mais úmido. Como, para as
amostras de referência moderna, os resultados isotópicos correspondem à
vegetação observada, essas análises parecem ser menos afetadas pelos processos
de erosão e podem fornecer informações complementares aos resultados
fitolíticos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho tem como objetivo aprofundar os conhecimentos sobre a dinâmica
evolutiva do Quaternário na Serra do Espinhaço Meridional, analisando as
interações entre os elementos bióticos e abióticos, como parte dessa dinâmica.
Nosso propósito é contribuir para a compreensão dos processos geomorfológicos que
levaram à formação da sequência coluvial na região, inferindo variações climáticas
através de estudos fitolíticos e isotópicos, a fim de entender a relação entre
clima, cobertura vegetal e processos evolutivos predominantes no Pleistoceno
Superior/Holoceno na área.
A pesquisa, ainda em andamento, trouxe resultados que, apesar de preliminares, são
promissores, pois indicam que os fitólitos são bons indicadores de mudanças
ambientais e auxiliam na compreensão de processos geomorfológicos, principalmente
se os resultados forem associados a outros indicadores (análise multiproxy).
AGRADECIMENTOS
Os autores gostariam de expressar os seus agradecimentos à UERJ, pela concessão da
bolsa PIBIC e à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG), processo
nº CRA-APQ 01652-09, pelo apoio financeiro para realização desta pesquisa.
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