Anais: Geocronologia e evolução da paisagem
ANÁLISE DAS ALTERAÇÕES DE SISTEMAS HIDROGRÁFICOS BASEADOS EM TÉCNICAS CARTOGRÁFICAS: O CASO DA BACIA DO RIBEIRÃO SANTO INÁCIO
AUTORES
Sordi, M.V. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ) ; Fortes, E. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ)
RESUMO
O presente artigo trata da reconstituição do paleorelevo na bacia hidrográfica do ribeirão Santo Inácio, extremo norte do estado do Paraná, através da técnica de Seppômen. Os mapas confeccionados (em duas escalas), uma de um período de tempo mais remoto e uma mais recente, mostram que o modelado do relevo na bacia hidrográfica do ribeirão Santo Inácio foi progressivamente dissecado devido a ação de um clima úmido, através da erosão remontante controlada por altos e baixos estruturais.
PALAVRAS CHAVES
Geomorfologia Estrutural; Evolução do Relevo; Reconstiuição do Relevo
ABSTRACT
The present article deals with the reconstruction of the peleorelief in the hydrographic basin of the Santo Inácio creek, extreme north of the Paraná state by the summit level map technique. The maps made (in two scales), one of a distant period of time and one more recent, showed that the modeling in the hydrographic basin of the Santo Inácio creek was progressively dissected due action of a humid climate, through headwater erosion controlled by structural highs and lows.
KEYWORDS
Structural Geomorphology; Relief Evolution; Relief Reconstrucion
INTRODUÇÃO
Durante muito tempo considerou-se que os planaltos do interior do Brasil – especialmente das regiões sudeste e sul – formavam, no Terciário e Quaternário extensas Superfícies de Aplainamento. Com a evolução de metodologias e técnicas, a teoria das Superfícies de Aplainamento ficou cada vez mais difícil de ser aplicada.
As variações paleoclimáticas recebem nova interpretação e os fatores estruturais passam a ser considerados quando do estudo da evolução da paisagem durante o Terciário e Quaternário.
A paisagem atual é resultado direto da dinâmica paleoclimática e morfoestrutural. O maior conhecimento das características tectóno-estruturais no interior do Brasil mostra que, apesar da importância climática para modelagem da paisagem, outros fatores são essenciais para compreender a evolução das bacias hidrográficas em áreas intraplacas.
A bacia do ribeirão Santo Inácio está localizada no extremo norte do Estado do Paraná, entre as coordenadas 22º37’24.56’’ e 22º57’33.76’’ de Latitude Sul, e 51º56’35.18’’ e 52º01’38.19’’ de Longitude Oeste.
O ribeirão Santo Inácio está localizado no Terceiro Planalto Paranaense, na área do reverso, o que, no estado de São Paulo corresponde a Depressão Periférica Paulista. O relevo regional é formado por extensos espigões levemente ondulados, com vertentes convexas, longas e de baixa declividade. Apresenta baixa dissecação, exceto em determinados locais, onde a rede de drenagem está mais entalhada, ou nas cabeceiras dos principais rios, onde desenvolve relevos em forma de meia laranja, vertentes convexas e desníveis que podem ultrapassar a 50m.
A bacia hidrográfica do ribeirão Santo Inácio é embasada por rochas cretáceas do Grupo São Bento, representadas por basaltos da Formação Serra Geral, bem como por arenitos e siltitos do Grupo Bauru, dos quais fazem parte às formações: Caiuá, Santo Anastácio e Adamantina, além de depósitos colúvio-aluviais quaternários.
MATERIAL E MÉTODOS
O avanço das técnicas de geoprocessamento e sensoriamento remoto permitiu aos mapeamentos geomorfológicos – geográficos e geológicos de um modo geral – maior precisão. Além disso, uma nova gama de técnicas e métodos vem surgindo, explorando o novo leque de possibilidades abertas por essas novas tecnologias.
Lançando-se mãos das novas tecnologias, no presente trabalho será utilizada a técnica de Seppômen. O método de Seppômen constitui-se de uma técnica cartográfica de preenchimento de vales, buscando a reconstituição do paleorelevo, utilizando-se como base a carta topográfica.
A técnica, originalmente, foi empregada para pesquisas de origem de relevos das regiões sob influência de movimentos verticais de falhas ativas (Huzita & Kasama, 1997 apud Motoki et al. 2008). No Brasil a técnica foi divulgada por Motokiop. cit. 2008.
Foram utilizadas como base para confecção dos mapas de Seppômen, as cartas topográficas de Santo Inácio na escala 1: 50.000 folha SF-22-Y-B-V-1, de Colorado na escala 1:50.000 folha SF-22-Y-B-V-3 e de Centenário do sul na escala 1:50.000 folha SF-22-Y-B-V-4, fonte ministério do planejamento e coordenação geral,
A técnica consiste em: a) divisão do mapa topográfico em áreas quadradas por uma malha definida; b) marcação do ponto mais alto de cada área; c) confecção de um novo mapa topográfico utilizando-se somente os pontos culminantes de cada área dividida.
No presente trabalho o processo de confecção dos mapas foi totalmente digital, buscando diminuir os erros e aumentar a precisão. Os mapas foram construídos nos programas Spring 5.1.8 e Surfer 8.0® .
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A bacia hidrográfica do ribeirão Santo Inácio apresenta uma área de 391 km2 e um perímetro de 110 km. O curso d’água principal, homônimo, é de 5a ordem segundo ordenamento de Strahler (1957), e possui 48 km de extensão total.
O relevo é plano (figura 1), com poucas áreas onde as declividades ultrapassam os 8%. As áreas de maior declividade (entre 8 e 20%) estão associadas às nascentes e aos fundos de vale.
A amplitude altimétrica da bacia é de cerca de 280 metros, sendo as maiores altitudes, em torno de 540 metros, localizadas a sudeste (Figura 1). Próximo a foz do ribeirão Santo Inácio, em sua confluência com o rio Paranapanema, a altitude é de cerca de 260 metros.
Buscando reconstruir a paleopaisagem foram elaborados, com base na técnica de Seppômen, dois mapas: um na escala de 1km x 1km, que permite a reconstrução do modelado em um passado mais remoto e outro na escala 0,5 x 0,5km que revela as características do relevo em um passado relativamente mais recente.
A maior limitação da técnica reside no desvinculamento temporal. A técnica permite apenas uma organização cronológica esquemática das paleosuperficies, não possibilitando uma localização desses eventos na escala do tempo.
Na figura a seguir (Figura 2) são comparados os mapas do modelado atual do relevo, do passado recente (Seppômen escala 0,25 km2) e do passado mais remoto (escala 1 km2). Todos os mapas possuem a mesma escala e as mesmas classes hipsométricas visando facilitar a visualização das nuances e da modificação gradual do relevo.
O mapa A, na escala 1km2 mostra uma superfície mais aplainada. O entalhamento do talvegue é baixo, com uma drenagem não totalmente articulada com a bacia atual.
É possível visualizar, ao longo do que, atualmente é o baixo curso do ribeirão Santo Inácio, zonas desconectadas, que segundo Fortes & Sordi (no prelo), tratam-se de altos e baixos estruturais que controlavam a evolução da paisagem.
As classes hipsométricas tem transição bem gradual, o que atesta o aplainamento dessa superfície, onde a declividade dificilmente deveria ultrapassar os 8%. A classe que agrupa altitudes abaixo dos 300 metros ocorre de forma restrita junto ao rio Paranapanema.
Na escala 0,25 km2 (Figura 2B) a organização da paisagem se aproxima da atual, e os altos e baixos estruturais estão menos evidentes, porém ainda presentes. No baixo curso a drenagem parece estar interrompida por um alto estrutural, ou o resquício do que seria um antigo alto estrutural.
A drenagem já apresenta um princípio de organização, com um entalhe um pouco maior, de modo mais pronunciado no canal principal. As cabeceiras de drenagem ainda não tem um papel erosivo destacado, sendo que aquelas (poucas) existentes se encontravam pouco encaixadas.
Os sistemas de drenagem principais são identificáveis, no entanto, com poucos afluentes e pouca ramificação, se comparados com o sistema atual.
Na paisagem atual, os altos e baixos estruturais não são identificáveis, estando recobertos por espessas camadas de solo. O sistema de drenagem já escavou o substrato e erodiu os ressaltos preexistentes.
A ramificação do sistema atual é bem evidente, aliado a uma dissecação progressiva. O relevo atual (Figura 1 e 2C) apresenta drenagens bem encaixadas e declividades mais altas. A maturidade do relevo do relevo é atestada pela grande quantidade de drenagens de primeira ordem.
Ao comparar os mapas, claramente as nascentes atuais estão muito mais próximas ao divisor, indicando a participação da erosão remontante nesse processo. A erosão remontante ocorre quando as cabeceiras de drenagem recuam de jusante para montante, em direção aos divisores, podendo inclusive, permitir capturas de drenagem.
Figura 1 - Mapa Hipsométrico e Clinográfico do ribeirão Santo Inácio.
Figura 2 - Modelos Digitais de Terreno, construídos a partir das Cart
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A evolução paleoclimática associada às superfícies de aplainamento parece ser pouco provável na bacia hidrográfica do ribeirão Santo Inácio. Os mapas de Seppômen demonstram um vigoroso processo de dissecação da paisagem, associado a um clima úmido.
A erosão remontante tem importante função para evolução da bacia, ocorrendo, por vezes, associada a altos e baixos estruturais. Gasparetto (1999), estudando a evolução de bacias hidrográficas no norte paranaense já havia demonstrado a influência deste processo na configuração atual do modelado.
Os processos morfoclimáticos obedecem às influências estruturais, assim não podem ser considerados como processos antagônicos. Sua ação sob o relevo é concomitante, com câmbios de predomínio, ora estrutural, ora morfoclimático.
Conclui-se então que, apesar de, por muito tempo se considerar as estruturas pouco importantes para evolução das paisagens intraplanálticas brasileiras, estas estiveram ativas em um passado não tão remoto.
AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela concessão de bolsa de Mestrado a Michael Vinicius de Sordi.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
FORTES, E. ; SORDI, M. V. Mapa de Nivelamento de Topos na Análise da Evolução Geomorfológica da Bacia Hidrográfica do Ribeirão Santo Inácio - PR. Pesquisas em Geociências, UFRGS. Impresso, 2012 (no prelo).
GASPARETTO, N. V. L. As formações superficiais do noroeste do Paraná e sua relação com o Arenito Caiuá. Tese de Doutorado em Geociências, Instituto de Geociências -
Universidade de São Paulo, 1999, 185p.
MOTOKI, A. PETRAKIS, G. H. SICHEL, S.E. CARDOSO, C. E. MELO, R.C. SOARES, R. MOTOKI. K.F. Origem dos relevos do maciço sienítico do Mendanha, RJ, com base nas análises geomorfológicas e sua relação com a hipótese do vulcão de nova Iguaçu. Geociências, UNESP. v.27 n.1, 2008, p.97-113.
STRAHLER, A. N. Quantitative analysis of watershed geomorphology.American Geophysical Union Transactions. v. 38, 1957, p. 913-920.