Anais: Interações pedo-geomorfológicas
ANÁLISE DA RELAÇÃO RELEVO-ROCHA-SOLO NO CONTATO PLANALTO ATLÂNTICO - DEPRESSÃO PERIFÉRICA PAULISTA
AUTORES
Villela, F.N.J. (UFSCAR) ; Ross, J.L.S. (USP)
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo realizar abordagem integrada de fatores da paisagem
segundo as formas de relevo, o substrato rochoso e os solos. Uma compartimentação
geomorfopedológica é feita em escala de detalhe de uma área situada entre o
Planalto Atlântico e a Depressão Periférica Paulista, e trabalha-se no
entendimento funcional da relação destes fatores visando o diagnóstico do meio
físico em questão. Há a possibilidade de rebaixamento do relevo por erosão
geoquímica.
PALAVRAS CHAVES
Relação Relevo-Rocha-Solo; Diagnóst. do Meio Físico; Erosão Geoquímica
ABSTRACT
This work aims to establish the integrated approach to landscape factors according
to landforms, bedrock and soils. A geomorphopedological compartmenting is made in
a detailed scale of an area between the Atlantic Plateau and the Peripheral
Depression of Sao Paulo, and the work is done aiming at a better understanding of
some functional characteristics of the physical environment in question. There is
the possibility of relief being degraded by geochemical erosion.
KEYWORDS
Relief-Rock-Soil Relation; Physical Environment Diag; Geochemical Erosion
INTRODUÇÃO
O município de Sorocaba situa-se na transição de duas grandes unidades
geomorfológicas: a região do Planalto Atlântico, de gênese cristalina e pré-
cambriana, e a região sedimentar da Depressão Periférica Paulista, ligada à
progradação fanerozóica da Bacia do Paraná. Nesta área de transição do
embasamento cristalino para a cobertura sedimentar existe a rugosidade da
superfície decorrente das interações com o substrato geológico e a gênese dos
solos.
Por meio de análises de campo, gabinete e laboratório, houve entendimento
analítico da relação relevo-rocha-solo e seus reflexos no contexto da paisagem
natural, apontando a possibilidade da atuação da erosão geoquímica no
rebaixamento da superfície de acordo com as formações dos solos ou materiais de
alteração expostos na superfície. Por meio da confecção das cartas
geomorfológica e geomorfopedológica em escala de detalhe (1:20.000), houve
caracterização da paisagem, que envolveu as formas de relevo e sua relação com o
substrato rochoso, a cobertura pedológica e os processos de superfície.
A área de pesquisa localiza-se na porção sudeste do Estado de São Paulo, no
sudeste do Brasil, entre as latitudes 23º 34’ 1’‘ a 23º 36’ 4’‘ S e longitudes
47º 32’ 3’‘ a 47º 29’ 2’‘ W. Corresponde a um quadrante de 25,07 km2, situando-
se 87 km a oeste da capital paulista. Compreende três municípios: Sorocaba ao
norte e noroeste, Salto de Pirapora no centro-sul, oeste e sudeste e uma pequena
parte de Votorantim a leste e nordeste (vide Figura 1). Do ponto de vista
geomorfológico, o quadrante insere-se na Unidade Morfoescultural da Depressão
Periférica (ROSS & MOROZ, 1997). A referida região concentra o período chuvoso
de outubro a março, e o regime é controlado por massas equatoriais e tropicais,
com precipitações médias anuais de 1.500 a 1.600 mm e temperatura média anual em
torno de 22ºC (MONTEIRO, 1973). Tais características conferem, grosso modo,
clima com chuva de verão e verão quente(Cwa)pela classificação de Köppen.
MATERIAL E MÉTODOS
Entre as metodologias voltadas para o diagnóstico pretendido destacam-se as
aproximações de Tricart & Kilian (1982), pela percepção da coexistência de
conjuntos geomorfológicos e solos correspondentes, definindo a construção de
unidades morfopedológicas, as proposições de Ross (1991, 1992 e 1994), voltadas
à cartografia taxonômica dos fatos geomórficos, e as orientações de Castro &
Salomão (2000), para as compartimentações morfopedológicas propriamente ditas.
Para a elaboração da carta geomorfopedológica foram utilizadas cartas
topográficas do Instituto Geográfico e Cartográfico do Estado de São Paulo em
escala 1:10.000 (IGC, 1979), que resultaram na carta base. A estas foram
ajustadas todas as outras delimitações, sendo elas hipsométricas, clinográficas,
morfológicas, geológicas, geomorfológicas, pedológicas e, finalmente,
geomorfopedológicas. As confecções das cartas hipsométrica e de declividade
seguiram metodologia indicada por Libault (1975) e De Biasi (1992),
respectivamente; as cartas geológica e morfológica resultaram de levantamentos
de campo e aerofotointerpretação de fotografias aéreas pancromáticas em escala
1:25.000 (BASE AEROFOTOGRAMETRIA, 1962). Os tipos de solo expressos na carta de
solos foram inferidos principalmente por levantamentos de campo através de
tradagens, análises morfológicas de trincheiras e análises físico-químicas e
mineralógicas de laboratório de amostras de solo coletadas em profundidades de
até 2 m.A carta geomorfológica seguiu ordenamento taxonômico para a
classificação e compartimentação do relevo, enquanto que para a carta
geomorfopedológica (Figura 1) foram combinados todos os demais mapas. A
compilação de suas informações resultou no mapa síntese dividido em
compartimentos e possibilitou a leitura da paisagem sob o entendimento da
relação relevo-rocha-solo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O levantamento e combinação de informações de campo, gabinete e laboratório
permitiu relacionar a existência de quatro compartimentos geomorfopedológicos
principais (Fig. 1), caracterizados pela relação das formas de relevo com o
substrato geológico e a cobertura pedológica. São eles:
•Unidade I: corresponde a superfície de divisores aplainados (Tp), com
declividades dominantes de 0 a 6%, situada acima da cota de 640 m, com alguns
topos convexos (Tc), ambos sustentados por cobertura sedimentar paleozóica,
composta de arenitos finos (CPia) e siltitos argilosos (CPib), sendo que os
solos associados tratam tipicamente de Latossolos Vermelhos (LV), podendo mudar
para Cambissolos evoluindo para organização de horizonte B latossólico (CX Bw)
quando sustentados por litologias cristalinas variadas (vide perfil esquemático
da Unidade I);
•Unidade II: caracterizada pela ocorrência de topos convexos (Tc), divisores
aplainados (Tp), setores de vertente amplos (Cad) e vales fluviais (Vf), com
transição dos setores de vertente demonstrados no perfil esquemático. A Unidade
situa-se entre 630 e 716 m, com declividades acima de 20% somente em setores
restritos das vertentes. As litologias compreendem arenitos finos (CPia) e
siltitos argilosos (CPib), transitando para metassedimentos neoproterozóicos
como metarritmitos (PSsX), quartzitos (PSsQ) e filitos (PSsF), ou granitos
cambrianos (CSo). Os solos tratam de Cambissolos evoluindo para a organização de
horizonte B latossólico (CX BW) ou Cambissolos (CX), podendo aparecer Gleissolos
(G) no sopé das vertentes;
•Unidade III: altitudes entre 595 a 694 m, compreendendo formas de relevo em
topos convexos (Tc), divisores aplainados (Tp), setores de vertente dissecados
(Cad) e vales fluviais (Vf), com declividades de até 20%, e, em setores mais
restritos, acima de 20%. A litologia corresponde a metassedimentos (PSsX, PSsQ e
PSsF) e granitos (CSo), enquanto que a cobertura pedológica é dominada por
Cambissolos (CX), como mostra o perfil esquemático da Unidade III;
•Unidade IV: envolve setores dos vales fluviais (Vf) e planícies fluviais (Pf),
entre 595 e 680 m, com declividades dominantes abaixo de 20% mas com
declividades acima deste valor no início dos vales fluviais quando nas altitudes
mais elevadas. Tais formas de relevo cortam sedimentos paleozóicos (CPia e
CPib), metassedimentos (PSsX, PSsQ e PSsF) e granitos (CSo). Depósitos
aluvionares (Qa) estão restritos às planícies fluviais. Cambissolos evoluindo
para organização de horizonte B latossólico (CX Bw) estão associados aos
sedimentos paleozóicos, enquanto que os Cambissolos (CX) estão associados aos
metassedimentos ou granitos. No contato dos vales com as planícies fluviais,
ocorrem Gleissolos (G) (vide perfil esquemático da Unidade IV).
Os solos variam conforme o substrato, e possuem pedogênese mais ou menos
avançada de acordo com o relevo; nas áreas de divisores aplainados e setores de
vertente amplos há processos de hidrólise avançados, evidenciados pelo domínio
gibbsítico da relação Ki e picos cauliníticos na mineralogia, ocorrendo
Latossolos Vermelhos e Cambissolos evoluindo para organização de horizonte Bw;
quando há superfícies mais inclinadas que respondem pela mudança do substrato
sedimentar para o cristalino, ocorrem mudanças de solos, hidrólise parcial,
domínio caulinítico pela relação Ki e presença de minerais interestratificados
na mineralogia. Notam-se solos mais desenvolvidos nas alterações da litologia
sedimentar e ígnea.
Nos relevos planos, recobertos por solos argilosos, há condições intempéricas
expressivas; nos Cambissolos evoluindo para organização de horizonte Bw
sustentados por granitos também. A exposição dos granitos, em setores de
vertente amplos, em mesmo nível altimétrico que os divisores aplainados,
corresponde a uma superfície basal exumada, truncada à superfície aplainada
sustentada pela litologia sedimentar. Tal associação aponta a possibilidade de
haver processo de rebaixamento do relevo por erosão geoquímica.
Mapa_Geomorfopedologico
Figura 1. Carta Geomorfopedológica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho procurou diagnosticar de maneira integrada relações entre
fatores da paisagem que compõem o meio físico, no caso relevo, litologia e solos.
A compartimentação geomorfopedológica proposta permitiu estabelecer algumas
relações e apontar hipóteses. Nas relações obtidas por meio das compartimentações,
foi possível verificar que as formas de relevo mais aplainadas, sustentadas pelo
substrato sedimentar ou ígneo, respondem pela formação de solos desenvolvidos e
profundos, geoquimicamente evoluídos; já formas de relevo mais inclinadas,
sustentadas por litologias cristalinas, respondem por solos mais incipientes e
rasos, mas que podem estar evoluindo para organização latossólica. O expressivo
processo intempérico no topo e na base da estratigrafia local, associado ao
modelado de relevo e resultados de laboratório, aponta a hipótese do rebaixamento
da superfície por erosão geoquímica, em que a formação e desenvolvimento dos solos
existentes seriam síntese deste processo.
AGRADECIMENTOS
Às Profas Dras do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo Sidneide
Manfredini, pela atuação indispensável nas investigações pedológicas; Marisa de
Souto Matos Fierz, pelos levantamentos geomorfológicos; e finalmente à Lylian
Zulma Doris Coltrinari, no auxílio às questões de erosão geoquímica e cartografia
geomorfológica.
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