Anais: Geomorfologia costeira
DINÂMICA SAZONAL DA PRAIA NA APA DE MARICÁ-RJ
AUTORES
Gralato, J.C.A. (UERJ FFP) ; Silva, A.L.C. (UERJ FFP) ; Silvestre, C.P. (UFF) ; Eccard, L.R. (UERJ FFP)
RESUMO
O principal objetivo do presente estudo é a compreensão do comportamento
morfológico e sedimentar da praia da APA de Maricá (RJ). A metodologia consistiu
de perfis topográficos de praia utilizando-se o método de Emery (1961), associada
com análise granulométrica de amostras coletadas na superfície da praia. Os
resultados indicam que o arco de praia é dinâmico como consequência da intensa
energia local das ondas de tempestades de S e SW. Os sedimentos predominantes são
de areias grossas.
PALAVRAS CHAVES
Dinâmica de praia; morfologia; APA de Maricá
ABSTRACT
The main objective of the present study is to understand the morphological and
sedimentary behaviour of the APA Maricá beach (RJ). The methodology consisted of
beach profiles employing Emery’s method (1961), associated with grain size
analysis of samples collected from the beach surface. The results indicate that
the beach arc is dynamic as consequence of local intense energy of S and SW storm
waves. The most abundant sediment is coarse sand.
KEYWORDS
Beach dynamic; morphology; APA Maricá
INTRODUÇÃO
A praia da APA de Maricá, também conhecida como praia da Barra de Maricá e de
Zacarias, situa-se na parte central do arco de praia em Maricá. Trata-se de num
trecho do litoral relativamente preservado por se tratar de uma Área de Proteção
Ambiental. No entanto, uma série de problemas são observados, tais como: despejo
de lixo; queimadas; prática de off road e exercícios militares, utilizando
veículos que trafegam por sobre as dunas e áreas de vegetação, destruindo a
flora e a fauna; e a extração ilegal de areia.
O litoral de Maricá é conhecido pela alta energia das ondas incidentes, que
ocasionam fortes ondas na arrebentação provenientes principalmente de SE
associada às condições de tempo bom e, de S e SW, quando da ocorrência de
ressacas (Muehe, 1975; Silva 2006; Silva et al. 2008). A amplitude da maré neste
litoral não ultrapassa 1,50 m. Trata-se, portanto, de um litoral influenciado
por um regime de micro-maré, o qual a dinâmica é determinada principalmente pela
ação das ondas.
No litoral do estado do Rio de Janeiro, diversas pesquisas voltadas para o
entendimento da dinâmica de praias vêm sendo realizadas já há algumas décadas
(Muehe, 1975; Muehe, 1989; Muehe, 1994; Bastos, 1994; Silva, et al. 1999; Santos
et al., 2004; Lins-de-Barros, 2005; Silva, 2006; Silva et al. 2008; Silva &
Silva, 2010; entre outros). Desde então, os conhecimentos adquiridos sobre o
comportamento das praias localizadas nos litorais de Niterói e de Maricá, vêm
gradualmente contribuindo para um maior entendimento da dinâmica das mesmas.
O entendimento da dinâmica deste litoral visa subsidiar políticas voltadas para
o gerenciamento dessas áreas. Principalmente por se tratar de um litoral com
elevada dinâmica e com tantos recursos vivos e que são constantemente ameaçados.
Portanto, o presente estudo tem por objetivo o entendimento da dinâmica sazonal
da praia da APA de Maricá através do registro das variações morfológicas e
sedimentar ao longo das estações do ano.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram realizados 24 perfis topográficos de praia distribuídos ao longo de 4
pontos de monitoramento no arco praial da APA de Maricá. Amostras de sedimentos
superficiais de praia foram coletadas para análise granulométrica, totalizando
24 amostras.
Para os perfis topográficos de praia utilizou-se o método das balizas
(Emery, 1961). O início dos perfis corresponde ao limite interno da praia na
escarpa de tempestade, indo até o alcance médio das ondas. O registro da
topografia da praia foi obtido alinhando-se 3 balizas perpendicularmente a linha
d’água e obtendo-se a diferença vertical entre dois pontos, tendo como
referência a linha do horizonte. A coleta de dados foi realizada nas mesmas
condições de maré baixa de quadratura.
Os locais de coleta das 24 amostras de sedimentos de praia correspondem
aos mesmos trechos onde foram realizados os perfis topográficos de praia. Em
cada uma dessas áreas a amostragem foi feita na área do pós-praia (parte emersa
da praia) e frente de praia (parte da praia sujeita ao alcance diário das
ondas). A coleta da amostra foi realizada nos primeiros centímetros de
sedimentos superficiais, abrangendo uma área representativa do perfil estudado.
Na análise granulométrica das amostras, realizada no Laboratório de
Sedimentologia da UFF, utilizou-se um conjunto de peneiras com abertura em
milímetros de 4.00, 2.83, 2.00, 1.00, 0.500, 0.250, 0.125 e 0.062. Os resultados
das análises granulométricas possibilitaram a confecção dos histogramas e a
classificação dos sedimentos, o que foi feito baseando-se na classificação
proposta por Wentworth (1922) citado por Peittijohn (1975).
Por ocasião dos levantamentos foram observadas algumas das
características das condições de mar, tais como: altura da onda na arrebentação,
tipo de arrebentação, direção de chegada das ondas e período médio das ondas
(sempre estimada por 2 ou 3 pessoas).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A praia estudada está sujeita à ação de ondas provenientes de SE, S e SW. O mar
na região pode ser caracterizado pela incidência predominante de ondas de SE e
de S, associadas a condições de tempo bom ao longo do ano. Ondas provenientes de
S e SW são predominantes sob condições de mar agitado (Silva et al., 2008).
Durante as observações de campo, as ondas apresentaram altura média na
arrebentação variando entre o mínimo de 0,66 metros na primavera de 2011 em
condições de mar calmo; e a máxima de 2,05 metros no inverno de 2011, sob
condições de mar agitado. O período médio observado variou entre 10,1 segundos
na primavera de 2011 e 12,7 segundos no verão de 2012. A forma de arrebentação
das ondas varia significativamente, predominando o tipo mergulhante (“plunging”)
em todos os levantamentos, seguido por progressiva (“spilling”) e ascendente
(surging) em menor proporção. A arrebentação das ondas ocorre praticamente junto
à linha d’água, com a presença de uma estreita “zona de surf” nesta praia. As
condições de mar observadas durante os levantamentos de campo no arco de praia
na APA de Maricá são semelhantes às observadas em Itaipuaçú, a oeste da área de
estudo, por Silva (2008).
A praia da APA de Maricá apresenta pós-praia com presença de bermas e,
ocasionalmente, extensos canais paralelos à linha d’água; frente de praia
bastante íngreme e estreita, localmente atravessada por canais desenvolvidos
perpendicularmente à linha d’água e interligados aos canais existentes no pós-
praia. A praia apresentou uma dinâmica diferenciada ao longo dos seus 8
quilômetros de extensão entre o outono de 2008 e o verão de 2012. As maiores
variações na largura da praia foram observadas na área do perfil 2 (setor
centro-oeste do arco praial), que variou entre 45 metros no inverno de 2008 e
cerca de 87 metros na primavera de 2009. Apesar da variabilidade dos perfis
topográficos observada ao longo de toda a sua extensão, a praia apresentou-se
praticamente com a mesma largura. No meio do arco de praia, por exemplo, o
perfil 3 apresentou uma variação na largura de apenas 16 metros ao longo de 4
anos de monitoramento (mínima de 72 m no inverno de 2011 e máxima de 88 metros
na primavera de 2009 e verão de 2012).
O comportamento caracterizado pelo estreitamento da praia no inverno, em
resposta a ação de ondas de tempestades provenientes de S e SW, assim como, o
seu alargamento no verão subseqüente quando predominam as ondas de tempo bom de
SE, ocorre em todos os perfis da praia. No entanto, é importante ressaltar que a
variação observada na largura da praia foi em geral inferior a 20 metros. O
mesmo padrão clássico foi verificado na extremidade oeste da praia de Itaipuaçu
(Silva et al., 2008).
A análise granulométrica das 24 amostras de sedimentos superficiais de praia
permitiu confirmar a predominância da fração arenosa de 0,5 mm, correspondendo a
areia grossa, ao longo dos cerca de 8 quilômetros. Esses resultados corroboram
dados anteriores (Muehe 1975; Silva & Silva, 2010). Os dados indicam um aumento
percentual da fração 0,25 mm em direção a extremidade oeste no inverno de 2011,
provavelmente em resposta a maior incidência de ondas de tempestades neste
período no meio do arco de praia (área dos perfis 2 e 3) e no extremo leste
(perfil 4), o que provavelmente não ocorreu no setor oeste da praia (perfil 1).
Este setor está localizado próximo as ilhas Maricás e, consequentemente, sujeito
a interceptação parcial de ondas de tempestades por estas ilhas. O grau de
selecionamento apresenta-se bastante homogêneo ao longo do arco praial.
Verificou-se também, um selecionamento ligeiramente superior junto à frente de
praia em relação ao pós-praia, o que é um comportamento compatível com a
dinâmica da frente de praia.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realização deste estudo possibilitou o entendimento da dinâmica do arco de praia
na APA de Maricá. A praia apresentou consideráveis variações morfológicas nos
cerca de 8 quilômetros de extensão, características da dinâmica do próprio
ambiente. Os perfis topográficos mostram variações na largura entre 45 e 87
metros. A praia apresentou um comportamento dinâmico, com alterações na morfologia
e na largura dos perfis em resposta às mudanças na energia das ondas incidentes.
Os sedimentos superficiais da praia apresentam grande uniformidade quanto ao
tamanho e grau de selecionamento. As areias são predominantemente grossas e bem
selecionadas. O deslocamento transversal das areias da face de praia para a frente
de praia, e vice-versa, parece ser o principal mecanismo responsável pelo
deslocamento de sedimentos neste ambiente, sem desprezar o papel da corrente de
deriva litorânea no transporte longitudinal de sedimentos.
AGRADECIMENTOS
O presente estudo integra resultados obtidos ao longo de vários projetos
desenvolvidos junto ao Departamento de Geologia da UFF e Departamento de Geografia
da UERJ-FFP voltados para o entendimento da dinâmica e evolução do litoral de
Maricá. Agradecimentos a CAPES pela concessão da bolsa de mestrado. Agradecemos
também aos responsáveis pela APA de Maricá por permitir o acesso à área de estudo.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
Bastos, A. C. 1994. Estudo da Variação Morfológica a partir de Perfis de Praia em Piratininga, Niterói-RJ, Brasil. Departamento de Geologia da Universidade Federal Fluminense do Rio de Janeiro. pp. 121.
Emery, K. O. 1961. A Simple Method of Measuring Beach Profiles. Limnology and Oceanographic V 6. pp. 90-93.
Lins-de-Barros, F. M., 2005. Risco, Vulnerabilidade Física à Erosão Costeira e Impactos Sócio-econômicos na Orla Urbanizada do Município de Maricá, Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Geomorfologia – Ano 6, nº 2, pp. 83-90.
Muehe, D. C. E. H. 1975. Análise Ambiental no Sistema Costeiro Sul-oriental do Estado do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado. Pós Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. pp. 141.
Muehe, D. C. E. H. 1989. The Coastline Between Rio de Janeiro and Cabo Frio. The VI Simposium on Coastal and Ocean Management. pp. 22-35.
Muehe, D. C. E. H. 1994. Geomorfologia Costeira. In: Guerra, A. J. T. e Cunha, S. B. Geomorfologia Uma Atualização de Bases e Conceitos. Bertrand Brasil, Rio de Janeiro. pp. 253-308.
Pettijohn, F. J. 1975. Sedimentary Rocks. Third Edition. Harper and Row Publishers. pp. 68-81.
Santos, C. L. dos, Silva, M. A. M. da e Salvador, M. V. S. 2004. Dinâmica Sazonal e os Efeitos das Ressacas nas Praias de Niterói/RJ. Revista Brasileira de Geociências. pp. 355-360.
Silva, A. L. C. 2006. Comportamento Morfológico e Sedimentológico do Litoral de Itaipuaçú (Maricá) e Piratininga (Niterói), RJ, nas últimas três décadas. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós Graduação em Geologia e Geofísica Marinha da Universidade Federal Fluminense. pp.153.
Silva, A. L. C., Silva, M. A. M., Santos, C. L. 2008. Comportamento Morfológico e Sedimentar da Praia de Itaipuaçú (Maricá, RJ) nas Últimas Três Décadas. Revista Brasileira de Geociências. Sociedade Brasileira de Geologia, 38 (1), pp. 89-99.
Silva, A. L. C. & Silva, M. A. M. 2010. Caracterização geomorfológica e sedimentar da planície costeira central de Maricá (Rio de Janeiro). VII Simpósio Nacional de Geomorfologia. Recife, pp. 1-15.
Silva, M. A. M., Resende, M. C. C. M. & Santos, C. L. 1999. Um Estudo sobre a Dinâmica das Praias de Niterói (Baía de Guanabara, RJ). Anais da Academia Brasileira de Ciências. Nº 71 (4) pp. 962 – 967.