Anais: Geomorfologia costeira
MAPEAMENTO E DISSECAÇÃO DO RELEVO DO SÍTIO DE TRINDADE (PARATI, RJ)
AUTORES
Marques Neto, R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE JUIZ DE FORA)
RESUMO
O presente artigo tem por objetivo investigar elementos da geomorfologia do sítio de Trindade (Parati, RJ) por meio da edição de uma carta geomorfológica e da mensuração da dissecação horizontal, vertical e geral do relevo, congregando aspectos de formas e processos discernidos a partir da análise qualitativa e quantitativa do relevo para a apreciação do quadro morfogenético operante.
PALAVRAS CHAVES
Dissecação horizontal; Dissecação vertical; Serra do Mar
ABSTRACT
The article here aims to investigate geomorphological elements in Trindade farm (Parati, RJ) by the edition of a geomorphological chart and measuring relief horizontal, vertical and general dissecation, congregating aspects of discerned processes and shapes starting from quantitative and qualitative analysis of relief for apreciation operating morphogenetical chart.
KEYWORDS
Horizontal dissecation; Vertical dissecation; Serra do Mar
INTRODUÇÃO
O litoral brasileiro revela notável diversidade paisagística decorrente da sua apreciável heterogeneidade tectono-estrutural e dos fatores bioclimáticos, erosivos e sedimentares que controlam os processos operantes na geomorfogênese litorânea.
A parte setentrional do litoral paulista e meridional do Rio de Janeiro estão compreendidas no macrocompartimento das Escarpas Cristalinas Norte (MUEHE, 2001), caracterizada pela proximidade da Serra do Mar com o ambiente marinho adjacente, com redução gradual dos depósitos sedimentares costeiros a partir do município de Caraguatatuba (SP).
O presente exposto toma por intuito apresentar um mapeamento morfológico do sítio de Trindade e mensurar a dissecação vertical, horizontal e geral do relevo, o que se presta como subsídio ao entendimento dos processos operantes em tempos atuais e suas implicações para o uso da terra.
MATERIAL E MÉTODOS
Os mapeamentos foram elaborados sobre as bases cartográficas escala 1/50000 (folhas Picinguaba - SF. 23-Z-C-I-3, e Juatinga - SF.23-Z-C-I-4), além de imagem de radar SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) e do satélite TM-Landsat-5 para interpretação dos elementos texturais. Destes materiais foram extraídos os conjuntos de formas semelhantes (ROSS, 1992), apresentando também formas isoladas conforme as possibilidades permitidas pelo nível de detalhamento destas feições nas imagens.
A mensuração da dissecação horizontal, que se refere à distância horizontal entre os talvegues e sua respectiva linha de cumeada, se baseou na proposta de Spiridonov (1981), adotando o uso do ábaco graduado (MAURO et al,1991). Para tanto, foram delimitadas as sub-bacias contidas na unidade espacial em questão para posterior deslizamento do ábaco entre o canal fluvial e a linha divisória.
A dissecação vertical foi mensurada em adaptação a proposta de Hubp (1988), considerando tal parâmetro como a distância vertical entre o talvegue e a linha de cumeada, correspondente a profundidade que o canal fluvial entalhou. A amplitude altimétrica também foi referenciada segundo as sub-bacias, e o valor calculado anotado em um ponto central para posterior interpolação linear dos valores.
As duas cartas foram cruzadas para a obtenção da dissecação geral do relevo. Foram atribuídos valores para as diferentes classes, tanto maior quanto maior o potencial morfodinâmico do intervalo de classe. Para a dissecação vertical foram arbitrados valores de 0,1 a 0,7, distribuídos em ordem crescente para cada um dos sete intervalos. O mesmo foi aplicado para a dissecação horizontal, com ressalva ao agrupamento feito para as duas classes superiores a 800 metros e de 400-800 metros, que possuem morfodinâmica similar no que tange a este parâmetro. Os valores foram associados por somatória, resultando nas seguintes classes de dissecação: fraca (0,1 – 0,3); média (0,4 – 0,6); forte (0,7 – 0,9); muito forte (1,0 – 1,2).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para a dissecação horizontal foram trabalhadas as seguintes classes, de acordo com a distância medida na carta: < 50m (< 1 mm); 50 – 100 m (1 – 2 mm); 100 – 200 m (2 – 4 mm); 200 – 400 m (4 – 8 mm); 400 – 800 m (8 – 16 mm); > 800 m (> 16 mm). É mais pronunciada no setor SW, onde as linhas erosivas estão bem próximas e as cabeceiras encontram-se posicionadas perto do divisor das bacias adjacentes, ensejando processos de decapitação. Pelo lado NE a dissecação horizontal é menos severa, com extensões superiores a 400 metros sem a incidência de um canal fluvial permanente.
Para a dissecação vertical foram considerados os seguintes intervalos: < 100 m; 100 – 140 m; 140 – 180 m; 180 – 220 m; 220 – 260 m; 260 – 300 m; > 300 m. Nos setores mais elevados os canais superam 300 metros de aprofundamento em eficiente controle estrutural. As classes intermediárias se agrupam em torno de 100 metros nos degrau escalonados onde as declividades diminuem. Os trechos de menor aprofundamento são encontrados nos terraços, condição onde os córregos percolam em baixa energia. O afogamento da costa e o consequente contato direto das escarpas com o mar influenciam no entalhamento vertical da drenagem, que, em sua maioria, aflui no meio marinho bruscamente sem percorrer terrenos de estocagem sedimentar.
O cruzamento dos valores de dissecação horizontal e vertical (para obtenção da dissecação geral) revela que as sobreposições são mais restritas para o extremo inferior de dissecação geral (fraca) e superior (muito forte), realçando as classes intermediárias, para as quais as perspectivas de cruzamento são mais diversas e a expressão espacial maior.
As zonas de dissecação fraca se concentram nos terraços e planícies litorâneas, atingindo setores dos degraus inferiores da Serra do Mar. A densidade de dissecação média é a classe que aparece mais extensivamente, ocorrendo a partir de 80 metros de altitude e atingindo as áreas de topo em alguns setores. Predomina na parte nordeste de Trindade e se estende por todo o esporão que limita a área no extremo sudoeste. Setores de dissecação forte também são numerosos, perseguindo a margem esquerda do córrego da Trindade onde a dissecação horizontal e vertical são pronunciadas. No extremo nordeste foram marcados trechos de dissecação geral muito forte por conta de valores de dissecação vertical superiores a 300 metros.
O padrão de dissecação vigente exerce influência contundente na evolução morfológica do sítio de Trindade, que pode ser arranjado em cinco compartimentos:
I. Modelados de acumulação (A): 1. Planícies costeiras (Apc); 2. Terraços flúvio-marinhos (Atfm). II. Modelados de dissecação (D): 3. Morros costeiros (Dm); 4. Frente escarpada de rebordo de planalto (De) 5. Patamares de cimeira (Dc)
As planícies costeiras e os terraços são restritos, e representam, respectivamente, 1,4 e 3,3 % da área. As planícies constituem pequenas enseadas em forma de ferradura e os exíguos terraços apresentam setores alagadiços durante as chuvas que, de acordo com Suguio & Martin (1976), podem corresponder à laguna colmatada por sedimentação alúvio-coluvionar. Os sedimentos não pertencem à Formação Cananeia, cuja distribuição foi discutida por Suguio & Martin (1976a) e Suguio & Tessler (1992), sendo fundamentalmente holocênicos e depositados durante a Transgressão Santos.
As frentes escarpadas de rebordo de planalto apresentam a maior expressão espacial (85,7%), representando avanço do Planalto da Bocaina em direção ao mar, cujas cumeadas preservam patamares de cimeira correspondentes ao patamar inferior mencionado por Cruz (1974), último degrau da escarpa costeira cujos topos correspondem a remanescentes arrasados de superfície mais antiga. Juntamente com os morros costeiros enfeixam litologias gnáissicas, migmatíticas e granulíticas agrupadas na Faixa Costeira (RADAMBRASIL, 1983) ou Complexo Costeiro (CAMPANHA et al. 1994).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O sítio de Trindade é bastante representativo do compartimento litorâneo no qual está inserido, que tem como marcas fundamentais o avanço pronunciado da Serra do Mar e o contato das escarpas costeiras com o mar em consideráveis extensões.
O mapeamento morfológico que foi empreendido denuncia de maneira contundente a forte energia do relevo dada pela natureza escarpada que caracteriza esta parte da costa brasileira, a revelar o controle tectônico no avanço abusivo do escudo cristalino e o pífio desenvolvimento de planícies costeiras e terraços de construção flúvio-marinha.
O relevo local apresentou valores consideráveis de dissecação horizontal e vertical, o que acusa uma forte potencialidade morfogenética e fragilidade natural, quadro este que pode ser propagado para todo o conjunto das paisagens das frentes escarpadas da Serra do Mar, que indubitavelmente está entre os mais frágeis de toda a fachada atlântica brasileira.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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HUBP, J. I. L. Elementos de geomorfologia aplicada. Mexico: Universidad Nacional Autonoma de México, D. F. 1988. 128p.
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