Anais: Geomorfologia costeira
COMPARAÇÃO PRELIMINAR ENTRE FEIÇÕES MORFOLÓGICAS DE FUNDO EM UNIDADES DE CONSERVAÇÃO MARINHO COSTEIRAS NO BRASIL: FERNANDO DE NORONHA (PE), ABROLHOS (BA) E ARVOREDO (SC).
AUTORES
Pereira, M.L.M. (ICMBIO - MMA / LOC - UFSC) ; Bonetti, J. (LAB. OCEANOGRAFIA COSTEIRA - UFSC)
RESUMO
Métodos de seleção de áreas para implementação de Unidades de Conservação vêm
evoluído através do tempo, estando atualmente associados à ecologia da paisagem e
modelos biogeográficos. O substrato de fundo tem papel fundamental no
condicionamento da vida em ambientes submersos, sendo a caracterização morfológica
bom indicador de áreas de interesse ecológico. Este trabalho apresenta a
compartimentação padronizada e comparação do relevo de fundo de três Unidades de
Conservação marinho-costeiras.
PALAVRAS CHAVES
geomorfologia submarina; camada de fundo; modelo bêntico de terreno
ABSTRACT
Methods for site selection to implementation of protected areas have evolved over
time, being currently associated, in most of the examples, to landscape ecology
and biogeographical models. The bottom substrate plays a fundamental role in the
conditioning of life in underwater environments, and its morphological
characterization is a good indicator of areas of ecological interest. This paper
presents a comparison of relief classification of the sea floor in three marine-
coastal protected areas.
KEYWORDS
submarine geomorphology; bottom layer; benthic terrain model
INTRODUÇÃO
Métodos para a seleção de áreas visando a implantação de Unidades de Conservação
(UCs) têm evoluído através da valorização de paisagens cênicas, estéticas e
atributos naturais específicos, do apelo à preservação de espécies e seus
hábitats e devido à utilização de conceitos de ecologia da paisagem e modelos
biogeográficos, onde diferentes escalas de processos ecológicos são consideradas
nas tomadas de decisão (Vallejo, 2002; Rylands e Brandon, 2005). Nesse sentido,
a organização ecológica associa-se à estruturas e funcionalidades dos ambientes
que podem ser identificados utilizando-se diferentes níveis de análise da
paisagem, e que vêm auxiliando na conservação ambiental (Grober-Dunsmore, Hale
et al., 2011).Com o objetivo de permitir uma identificação mais objetiva das
feições do fundo marinho foi criado o Benthic Terrain Modeler - BTM (Noaa, 2010)
com base na adaptação de um modelo desenvolvido para o ambiente terrestre
(Jenness, 2006). Essa rotina classifica o relevo de fundo de forma unificada,
por meio de algoritmos matemáticos, a partir da comparação relativa do
posicionamento vertical dos pontos e sua vizinhança. Com isso, propõe a
classificação de feições geomorfológicas de fundo em até quatro classes em
escala grosseira (zonas) e até treze classes em escala refinada (estruturas)
(Erdey-Heydorn, 2008; Campos, 2011). Nesta pesquisa serão apresentadas as
classificações de estruturas morfológicas do fundo obtidas para três unidades de
conservação (UCs) marinhas brasileiras: Parque Nacional Marinho de Fernando de
Noronha, Parque Nacional Marinho de Abrolhos e Reserva Biológica Marinha do
Arvoredo. A partir da comparação entre os resultados obtidos será discutida a
eficiência da abordagem metodológica proposta como apoio a ações de gestão.
MATERIAL E MÉTODOS
A escolha das três UCs se deu por apresentarem similaridades (proteção integral,
apelo regional e significância biológica, localizadas em águas rasas,
apresentando áreas emersas e planícies de baixa declividade em diferentes
profundidades) e diferenças (posição latitudinal, extensão da plataforma
continental adjacente, geologia, regime de ondas e marés) que favorecem
comparações internas e entre as unidades.
Os dados utilizados foram compilados das Cartas Náuticas disponibilizadas pela
Marinha do Brasil (números 52, 1310, 1902, e 1903), correspondentes aos
territórios das Unidades de Conservação, com complementações de dados das
respectivas folhas de bordo. Para a área de Fernando de Noronha foi realizada
uma complementação dos pontos batimétricos através de dados oriundos da missão
TOPEX/POSEIDON (TOPEX-Poseidon Merged Geophysical Data Record, 2012).
Posteriormente, foi realizada interpolação dos dados pontuais de batimetria pelo
método do Vizinho Natural, gerando células de 2500m² (50mX50m), com posterior
remoção das áreas emersas. As grades interpoladas finais (uma para cada UC)
alimentaram as análises realizadas pelo aplicativo BTM (extensão do ArcGIS 9.3),
tendo-se adotado a seguinte configuração: a: Índice de Posição Batimétrica em
escala grosseira (Broad BPI): raio interno=1; raio externo=125 (fator de escala
de 7500); b:Índice de Posição Batimétrica em escala refinada (Fine BPI): raio
interno=1; raio externo=35 (fator de escala de 1750).
O Índice de Posição Batimétrico é um derivativo de segunda ordem da superfície,
onde um algoritmo matemático analisa a posição relativa de um ponto em relação a
media dos seus vizinhos, classificando cada pixel como neutro, positivo ou
negativo (Mesh, 2008). Em etapa posterior do BTM, criou-se uma biblioteca de
classificação adaptada da proposta por LUNDBLAD (2004) para a região da Samoa
Americana, onde a cota delimitadora entre Planície Rasa e Planície foi alterada
de -22m, para -10m (MMA, 2002).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No Parque Nacional Marinho de Abrolhos (mapas 1 e 2) foram encontradas
onze das treze feições possíveis, com destaque em área para a planície, seguida
da classe planície rasa, além da presença de canais no entorno do ambiente
recifal da gleba norte do arquipélago (Parcel das Paredes), corroborando em
parte o proposto por (ANDRADE et al., 2003), sobre a ação da drenagem
continental na planície exposta subaereamente em condição do nível do mar mais
baixo que o atual. Não foram encontradas as feições quebra lateral de vertente e
vertente íngreme. Observou-se a predominância de cristas estreitas na gleba
norte, enquanto que na gleba sul (Ilhas Redonda, Siriba e Sueste) predominou a
feição planície rasa.
No Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (mapa 3) foram observadas
onze das treze estruturas possíveis, sendo predominante a planície, seguida da
crista estreita. O Mar de Fora apresentou planície mais expressiva que Mar de
Dentro, além das maiores áreas de planícies rasas e da presença de cristas
isoladas. As feições depressão em crista e crista local em depressão não foram
observadas para esta UC.
Na Reserva Biológica Marinha do Arvoredo (mapa 4), nove das treze possíveis
estruturas foram encontradas. A feição predominante foi a planície, com destaque
para depressão local e ao canal entre as Ilhas do Arvoredo e Deserta,
evidenciados anteriormente por Chludinsky (2002). As feições depressão de meia
encosta, planície rasa, crista local em depressão e vertente íngreme não foram
observadas nessa UC, que apresentou o menor número de classes dentre todas.
Nota-se, para o conjunto de UCs, que existe a predominância da feição planície.
Apenas para Abrolhos observou-se a participação de outra estrutura com mais de
25% da área marinha (planície rasa) o que evidencia a presença expressiva de
formas de relevo relativamente suaves. Entretanto, praticamente todas as áreas
próximas às ilhas nas três UCs foram caracterizadas como cristas estreitas, com
grande variabilidade de feições estruturais, provavelmente resultado do processo
genético e evolutivo de cada um dos ambientes. Assim, em primeira análise, essas
áreas talvez devessem ser prioritárias no esforço de gestão, pois podem estar
dando suporte a uma maior biodiversidade.
Figura 1.
Mapas de estruturas de feições morfológicas de fundo
nas Unidades de Conservação: 1. Abrolhos (gleba
norte); 2. Abrolhos (gleba sul).
Figura 2.
Mapas de estruturas de feições morfológicas de fundo
nas Unidades de Conservação: 3. Fernando de Noronha
e 4. Arvoredo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O método proposto, ainda pouco utilizado em UCs locais, permitiu compartimentar de
forma comparável diferentes feições morfológicas de fundo, promovendo um maior
conhecimento sobre as mesmas. Embora apresentando bons resultados, há limitações a
serem consideradas na análise dos produtos, sobretudo quanto à escala usada na
obtenção da batimetria, que limita a análise comparativa das feições com hábitats
e processos atuantes (Walker, Jordan et al., 2009). Possivelmente há processos
importantes e feições de detalhe ocorrendo em escalas maiores dentro dessas áreas
protegidas e que devem ser investigadas através de uma batimetria de detalhe. Essa
pesquisa deve prosseguir através do refinamento da batimetria e da análise e
espacialização das classes texturais de sedimento de fundo dessas UCs. Novas
alternativas de compartimentarão do fundo e da paisagem marinha serão propostas,
incluindo-se parâmetros abióticos adicionais de relevância para a comunidade de
fundo (Olenin e Ducrotoy, 2006).
AGRADECIMENTOS
Ao Dr. Antonio Klein, à colega Clarisse De Luca e ao projeto SMC Brasil pelo
repasse de parte dos dados de batimetria digitalizados; aos colegas Geógrafos MSc.
Alexandre Vilci e Celso Voos pelo auxilio e discussões sobre os parâmetros e
produtos das interpolações e do BTM; ao ICMBio por permitir minha capacitação e o
devido afastamento para melhor dedicação ao doutoramento.
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