Anais: Geomorfologia cárstica

A morfologia exocárstica no médio Ribeirão dos Patos, Minas Gerais

AUTORES
Martins, T.I.S. (UFU) ; Rodrigues, S.C. (UFU)

RESUMO
A região do médio Ribeirão dos Patos faz parte da Província Cárstica de Arcos-Pains-Doresópolis, área carbonática situada em Minas Gerais. É uma região que apresenta uma paisagem cárstica de relevante interesse geográfico, tanto científico quanto econômico. Assim, o presente trabalho busca a caracterização e mapeamento da morfologia cárstica na região citada, onde ocorrem maciços calcários com lapiás e processos de dissolução, dolinas, uvalas, sumidouros, ressurgências, vales cegos e cavernas.

PALAVRAS CHAVES
Geomorfologia Cárstica; Mapeamento; Relevo Cárstico

ABSTRACT
The Middle Ribeirão dos Patos Region is part of the Karst Province of the Arcos-Pains-Doresópolis, a carbonate area in Minas Gerais. It is a region with a karst landscape of relevant geographical interest, both scientific as economic. Thus, this work aims at the characterization and mapping of karst morphology in the cited area, where there are limestone massifs with lapiás and dissolution processes, sinkholes, uvalas, sinks, resurgences, blind valleys and caves.

KEYWORDS
Karst geomorphology; Mapping; Karst relief

INTRODUÇÃO
O estado de Minas Gerais possui uma grande diversidade geológica, e no que se refere às rochas carbonáticas é um estado em destaque no Brasil, devido à rica presença desse tipo litológico. Isto se dá, em função do Cráton do São Francisco que sustenta depósitos calcários em grande parte de sua extensão, sendo uma porção relevante no estado mineiro. Pode-se citar as regiões de Lagoa Santa, Cordisburgo e a Província Cárstica de Arcos-Pains-Doresópolis, onde está situada a área de estudo. A geomorfológia cárstica abrange o estudo da gênese, tipos das formas e dinâmica dos relevos derivados de rochas solúveis, quer sejam carbonáticas ou não (KOHLER, 1989; KOHLER, 2007; PILÓ, 2000). O conjunto das formas originadas a partir da dissolução de tais rochas podem ser: exocársticas (meio superfícial), endocársticas (meio subterrâneo) ou ainda, epicársticas (meio subsuperficial). Neste contexto, o presente trabalho objetiva o mapeamento e caracterização das formas exocársticas da região do médio Ribeirão dos Patos, utilizando Sistema de Informações Geográficas. O intuito é compreender a distribuição espacial do exocarste por meio da caracterização do relevo, bem como, registrar um produto cartográfico que poderá ser utilizado no futuro para eventuais pesquisadores da região. A área de estudo localiza-se no sudoeste do Município de Doresópolis, compreende a área de drenagem do Ribeirão dos Patos, um importante afluente da margem direita do Rio São Francisco. Apresenta uma paisagem cárstica de grande beleza, drenando as rochas calcárias do Grupo Bambuí. É uma região de relevante interesse geográfico, do ponto de vista científico e também econômico. Devido a isso, é uma área sujeita à exploração mineral, muitas vezes exacerbada e que por vezes desencadeia prejuízos ambientais ao ecossistema da região.

MATERIAL E MÉTODOS
A metodologia baseou-se em cinco passos principais, a saber: levantamento bibliográfico do tema e da área de estudo; levantamento cartográfico e montagem de um banco de dados; trabalhos de campo pré e pós-mapeamento; mapeamento da área com utilização de Sistema de Informações Geográficas – SIG e, por fim, síntese dos resultados e caracterização da área de estudo. Os trabalhos de campo foram realizados antes, durante e depois do mapeamento, totalizando 3 saídas à campo. No primeiro, foi realizada a pré-observação da área de estudo, verificação de acessos e contexto geomorfológico geral; a segunda saída ocorreu durante a fase de mapeamento, quando foi possível observar com maior propriedade as características físicas e antrópicas da área, foi feito registro fotográfico dos aspectos geomorfológicos e marcação de pontos de coordenadas via GPS; a terceira saída serviu como fase de verificação do mapeamento, contou com a aquisição de fotografias e pontos de coordenadas. A fase de mapeamento foi realizada em gabinete, com auxílio do ArcGIS 9.3 e Envi 4.3. A escala adotada foi 1:50.000, tendo como base as cartas topográficas do IBGE, a menor feição mapeada foi de até 25 m. Baseou-se nos seguintes passos: • Definiu-se as regiões homogêneas de ocorrência das feições típicas do relevo cárstico; • Criou-se o Modelo Digital de Elevação (MDE), gerou-se produtos que auxiliaram na análise morfométrica da área, tais como: mapa hipsométrico, mapa clinográfico, perfis topográficos e modelo 3D; • Realizou-se a classificação supervisionada da Imagem de satélite LANDSAT 5 Sensor TM, para a extração das áreas de afloramento de calcário e regiões de explotação do mesmo; • A síntese da morfologia da área foi definida após os passos anteriores, com o auxílio da imagem de satélite, das cartas topográficas, do MDE e das observações anotadas em campo. Nesta fase foram identificadas as feições típicas do relevo cárstico, como dolinas, uvalas, sumidouros, vales cegos, entre outros.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A região cárstica do médio Ribeirão dos Patos, na Província de Arcos-Pains-Doresópolis, é representada pelos sedimentos da Formação Sete Lagoas do Grupo Bambuí, correspondente à fácies carbonática do referido grupo, na qual se encontram rochas como o calcário, calcário com dolomita e calcários dolomíticos. Não há nos mapeamentos geológicos disponíveis uma diferenciação entre tais tipos litológicos, os quais encontram-se agrupados apenas como rochas calcárias, o que impede a representação do percentual das feições cársticas encontradas na área de estudo em cada feição litológica. Em geral, as características dos carbonatos no Grupo Bambuí estão associadas com rochas pelíticas (argilito, siltito), como é possível observar na região de estudo. Estas condições irão determinar um relevo cárstico coberto por espessa camada de solos, oriundos da decomposição dos pelitos (RIBEIRO et al, 2008; PILÓ, 2000). No médio Ribeirão dos Patos, a intercalação dos relevos cobertos pela decomposição dos pelitos e dos relevos formados a partir dos afloramentos calcários, foi identificada a partir da imagem LANDSAT 5 TM com a classificação da mesma, o que possibilitou determinar que cerca de 7% da área é tomada pelos afloramentos calcários, enquanto 93% engloba a região onde se observa a formação de solos. A rede de drenagem de uma região cárstica é caracterizada pela predominância dos fluxos subterrâneos. Entretanto, na área de estudo, a rede de drenagem superficial, em geral, é bem desenvolvida, representando fluxos contínuos de água. Em alguns trechos pode se observar que os vales são interrompidos pela ocorrência de sumidouros e ressurgências indicando a existência de fluxos subterrâneos. A presença da drenagem superficial desenvolvida pode estar associada à camada argilosa criada pela intercalação dos pelitos, que diminui a tendência de infiltração da água. Outro aspecto importante, que deve ser abordado ao se estudar a morfologia em áreas da Província Cárstica de Arcos-Pains-Doresópolis, é sobre o possível controle estrutural e geológico desenvolvido na região em função da reativação tectônica ocorrida durante a Era Cenozoica. Valadão e Domingues (1999 apud VALADÃO, 2009) consideram que, no Mioceno, as bordas do Cráton sofreram o soerguimento intracontinental de maior magnitude no contexto regional do território brasileiro. Saadi (1993) reitera essa hipótese. Assim, os aspectos podem estar condicionados por lineamentos estruturais, criando zonas preferenciais de ocorrência de dolinas, paredões, maciços calcários, sumidouros, surgências/ressurgências, entre outros. Essa abordagem tectonoestrutural não foi representada no mapa morfológico para a área de estudo nesta ocasião, sendo de interesse dos autores a sua publicação posteriormente. A área de estudo encontra-se abaixo da cota de 700 metros, com predomínio de declives abaixo de 10 graus. Na parte central, ocorrem áreas com declividades superiores a 15 graus. No que se refere à morfologia, constitui-se por uma larga área plana, que em alguns pontos está suscetível à inundação e em outros, já se apresenta úmida. Em praticamente toda a extensão do médio Ribeirão dos Patos há afloramentos calcários. A jusante da área, na parte norte do mapa, formam-se maciços abruptos com lapiás, destacando-se os processos de dissolução. Destacam-se também as dolinas, uvalas, sumidouros, ressurgências e vales cegos, de grande beleza cênica, além da ocorrência de diversas cavidades subterrâneas, que chegam a mais de 300 na área de estudo. A rede de drenagem em alguns trechos é contínua e desenvolvida, enquanto que em outros, desaparece em sumidouros e chega a formar belas lagoas com afloramento calcário. Outra característica peculiar na região do médio Ribeirão dos Patos corresponde às lagoas, que são representativas (em dimensões e quantidade) ao se comparar com outras áreas da Província Cárstica de Arcos-Pains-Doresópolis. O mapa na Figura 1, sintetiza os aspectos morfológicos aqui apresentados.

Figura 1

Mapa Morfológico da área de estudo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho buscou a representação cartográfica da área do médio Ribeirão dos Patos, importante tributário do São Francisco, cuja paisagem cárstica se destaca no conjunto da Província Cárstica de Arcos-Pains-Doresópolis. Esta é alvo de pesquisas científicas desde o século XIX, dada a sua importância no cenário cárstico/espeleológico mineiro e também nacional. Vários trabalhos norteiam os estudos sobre a área, sobretudo, aqueles de cunho geológico, espeleológico e biológico. Com relação à sua geomorfologia, têm-se trabalhos que descrevem a morfologia cárstica, mas que deixam a desejar no que se refere à espacialização de tais feições para que estejam representadas em mapas. Neste sentido,a representação cartográfica da área, bem como a caracterização da morfologia em escala de semidetalhe, busca o aproveitamento deste material para pesquisas futuras, inclusive como sendo parte de pesquisa maior dos autores do artigo.

AGRADECIMENTOS
Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq pelo financiamento da bolsa de mestrado e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais - FAPEMIG pelo apoio à participação no IX SINAGEO.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
KOHLER, H. C. Geomorfologia Cárstica na região de Lagoa Santa – MG. 1989, 113f. Tese (Doutorado em Geografia) – Departamento de Geografia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1989.

KOHLER, H. C. Geomorfologia Cárstica. In: GUERRA, A. J. T.; CUNHA, S. B. (Org.), Geomorfologia: uma atualização de bases e conceitos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007. Cap. 7, p. 309-334.

PILÓ, L. B. Geomorfologia Cárstica. Revista Brasileira de Geomorfologia. v.1, n.1, p.88-102, 2000.

RIBEIRO, A.; PACIULLO, F. V. P.; SENRA, A. S.; VALERIANO, C. M.; TROUW, R. A. J. Geologia da Folha Piumhi SF.23-V-B-II. Minas Gerais: UFRJ/CPRM, 2008.

SAADI, A. Neotectônica da Plataforma Brasileira: esboço e interpretação preliminares. Geonomos, 1 (1), p. 1-15, 1993.

TRAVASSOS, L. E. P. Considerações sobre o carste da região de Cordisburgo, Minas Gerais, Brasil. Belo Horizonte: Tradição Planalto, 2010.

VALADÃO, R. C. Geodinâmica de Superfícies de Aplanamento, Desnudação Continental e Tectônica Ativa como Condicionantes da Megageomorfologia do Brasil Oriental. Revista Brasileira de Geomorfologia, v.10, n.2, p.77-90, 2009.