Anais: Geomorfologia fluvial

ANTROPOGEOMORFOLOGIA DA BACIA HIDROGRÁFICA DA ESTRADA NOVA, BELÉM – PARÁ

AUTORES
Araújo Jr., A.C.R. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ)

RESUMO
A Geomorfologia Fluvial busca a compreensão dos processos e formas relacionados aos cursos d’água, para tanto a cidade de Belém – Pará será alvo de análise por compreender a intrínseca relação de gênese, intensificação e transformação de formas e processos fluviais atuantes no surgir de áreas de risco a inundações e alagamentos, objetivando analisar ações empreendidas pelo poder público municipal no âmbito do Programa de Reabilitação Urbano-Ambiental na bacia hidrográfica da Estrada Nova.

PALAVRAS CHAVES
Sociedade-natureza; Risco; Inundação

ABSTRACT
The Fluvial Geomorphology seeks to understand the processes and forms related to water courses, for both the city of Belém - Pará will being analyzed to understand the intrinsic relation of the genesis, intensification and transformation of forms and fluvial processes operating in emerging areas risk to floods and flooding, aiming to analyze the actions taken by the municipal government under the Rehabilitation Program in Urban and Environmental watershed of Estrada Nova.

KEYWORDS
Society and nature; risk; flood

INTRODUÇÃO
Rios e canais têm mudado de fisionomia e os estudos dessas mudanças têm sido domínio da Geomorfologia Fluvial. Tradicionalmente a visão geográfica envolve o método baseado na observação de campo, no reconhecimento das relações entre os processos atuantes nos rios e canais e as formas resultantes e nas relações entre os tipos de mudanças e as variáveis ambientais locais (CUNHA, 2009), as ações humanas dentre estas variáveis devem ser consideradas. Leva-se em consideração que a ação antropogênica gera feições e formas de relevo locais, relacionadas à ação humana na história (até alguns poucos milhares de anos) e por intermédio do trabalho, entenda-se: interesses, atividades socioeconômicas e tecnologias disponíveis (ARAÚJO Jr. e BARBOSA, 2010), as quais acabam por gerar áreas de risco. Risco (risk) é utilizado pelos geógrafos como uma situação, que está no futuro e que traz a incerteza e a insegurança. Assim, há regiões de risco (regions of risk) ou regiões em risco (regions at risk) (MARANDOLA Jr e HOGAN, 2004). No entanto, isto não significa que estudar os riscos é uma tentativa de prever o futuro, mas aprender a planejar de forma compatível com as regiões de/em risco, de acordo com potencialidades de acontecimentos. No âmbito das discussões sobre intervenções antropogênicas no relevo e os riscos a elas associados, o presente trabalho busca ser uma contribuição para estudos que envolvam a relação sociedade-natureza visando a realizar uma análise da dinâmica morfogenética na área da bacia hidrográfica da Estrada Nova, porção sul da cidade de Belém – PA. Para tanto, tem-se por objetivo analisar as ações empreendidas pelo poder público municipal referente às inundações e alagamentos na área de abrangência do Programa de Reabilitação Urbano-Ambiental da bacia hidrográfica da Estrada Nova.

MATERIAL E MÉTODOS
A ação da sociedade assume importância na medida em que a insere como relevante agente geomórfico, cujo poder de apropriação e produção do relevo não deve ser desconsiderado nos dias atuais (ROSS, 1990; CASSETI, 1991; ROSSATO, SUERTEGARAY, 2002), assim como seu poder decisório de forma articulada com a práxis humana diante do meio biofísico, o qual é ao mesmo tempo recurso e risco (VEYRET, 2007), implicando na necessidade de estudos que subsidiem o entendimento das dinâmicas processadas ou em processo na porção sul da cidade de Belém. A análise de sistemas foi considerada como o domínio de aplicabilidade e da operacionalização em busca da compreensão do sistema ambiental da bacia hidrográfica da Estrada Nova, enquanto a Teoria Geral dos Sistemas foi concebida no plano genérico e teórico-conceitual. A linha teórico-metodológica fundamenta-se na abordagem sistêmica e visão holística, pois proporciona trabalhos ambientais integrados a luz da teoria geossistêmica, sendo que o estudo dos geossistemas pressupõe um método que trate as esferas geográficas (física/ambiental e a socioeconômica) de modo isonômico, privilegiando as suas inter-relações (SANT’ANNA, 1998) de modo integrado. Tendo por base o processo histórico de ocupação urbana da cidade de Belém – PA será empreendida revisão das obras executadas na cidade com base nos anais do Arquivo Público do Estado do Pará, além de revisão documental do Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) do Programa de Reabilitação Urbano-Ambiental da Bacia Hidrográfica da Estrada Nova (PROMABEN) complementadas por observações sistemáticas em campo e revisão bibliográfica sobre temas relacionados a planejamento urbano-ambiental constituíram os procedimentos adotados e assentados no enfoque sistêmico. A discussão das propostas apresentadas no ano de 2007 na audiência pública sobre a Urbanização da bacia da Estrada Nova e Orla do rio Guamá serão consideradas para verificação dos possíveis rumos a serem tomados no PROMABEN.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Trindade Jr (1997), define as baixadas existentes em Belém como sendo áreas inundadas ou sujeitas às inundações - decorrentes, em especial, dos efeitos das marés - e ficaram conhecidas, principalmente a partir da década de 1960, por serem espaços de moradia das camadas sociais de baixo poder aquisitivo. Além disso, a pluviometria colabora à potencialização dos efeitos da inundação podendo prolongá-las em determinados períodos do ano. Será trabalhado o conceito de várzea, considerando o igapó como um de seus estágios ou ciclos morfodinâmicos, tendo em conta a presença geomorfológica destas feições no modelado do relevo na área de influência da bacia hidrográfica da Estrada Nova e associados às características pluviométricas regionais potencializam a gênese de áreas de risco a inundação, principalmente entre os meses de dezembro a abril. O beneficiamento das áreas alagadiças (igapós e várzeas) desencadeou um intenso processo de uso e ocupação do solo urbano em Belém, por conta da imensa parcela de solo criado formadora dos bairros do Guamá, Jurunas e Condor (principal e diretamente influenciados pela construção de um dique na década de 1940), a qual fez com que a população da cidade de Belém sofresse um aumento de 47,04%, passando de 169.351 habitantes em 1940 para 359.998 habitantes em 1960 (fig. 1). No entanto, a concepção setorizada das obras de recuperação das baixadas resolve situações particulares agravando as condições das vizinhanças, isto porque a elevação das cotas das vias e terrenos isoladamente passa a drenar água as porções inferiores, inclusive retendo ou dificultando seu escoamento como percebido da bacia hidrográfica da Estrada Nova, potencializando áreas de inundação e alagamento, em razão também da penetração das águas do rio Guamá. Obras ocorridas na década de 1940 por conta do Programa Amazônico e aprovação do Projeto Dique e Drenagem, o qual atuou diretamente na dinâmica natural da bacia hidrográfica da Estrada Nova, por transformar e intensificar processos fluviais, bem como atua na gênese de formas no relevo (geomorfologia urbana e fluvial) inauguraram o Dique da Estrada Nova (DEN), obra relevante para a cidade de Belém. As obras empreendidas dinamizaram a vida urbana da cidade de Belém por permitir que um amplo uso do solo e ocupação urbana ocorresse mais intensamente, posto essas áreas já encontrarem moradores, os quais viviam sem as mínimas condições de sanitarização. Com o programa implantado e o dique construído impediu-se o alagamento de 38.549 m² da área da cidade e o total da área beneficiada pela drenagem é de 96.270.000 m², destacando conforme Albuquerque (1993) que serviços adicionais são necessários e muitos só serão possíveis pela observação do que suceder no decorrer dos primeiros tempos. A audiência pública ocorrida em 2007 já apontava possíveis intervenções na área da bacia hidrográfica da Estrada Nova, sendo possível observar (fig. 2) que próximo as áreas dos canais revestimentos com bloquetes são priorizados em detrimento do revestimento asfáltico, com o intuito de facilitar a infiltração, atenuando os efeitos de run-off. Observa-se que a partir da morfometria ou hipsometria associada a fatores climáticos e sociais apoiadas por observações sistemáticas em campo que variáveis como alteração do relevo em função do aterramento das planícies de inundação, retirada da cobertura vegetal das proximidades dos canais favorece o escoamento superficial assim como outras dinâmicas (carreamento de substâncias e assoreamento, por exemplo) e por fim o uso do solo e a ocupação urbana as quais acontecem de forma indiscriminada gerando e potencializando áreas de risco a inundação, tornam as populações residentes na bacia hidrográfica da Estrada Nova vulneráveis a inundações.

FIG_1

MAPA DOS BAIRROS COMPONENTES DA BACIA HIDROGRÁFICA DA ESTRADA NOVA

FIG_2

CARTA-IMAGEM DA BACIA HIDROGRÁFICA DA ESTRADA NOVA COM DEMARCAÇÃO DE SUAS QUATRO SUB-BACIAS COMPONENTES

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As políticas públicas desenvolvidas e em desenvolvimento na cidade de Belém visaram e visam planejar o espaço urbano de forma a coadunar elementos políticos, econômicos, sociais e ambientais em âmbito integrado, no entanto as intervenções alteram a morfologia original da cidade em questão gerando e intensificando processos, paradoxalmente expondo as populações de espaços urbanos criados a riscos à inundação e alagamentos, tornando-as vulneráveis. Para tanto se faz importante a verificação de planejamentos mais adequados a realidade belenense, uma vez que inúmeros são os exemplos de políticas públicas já implementadas, as quais (ao que parece) tiveram caráter mitigador em curto prazo, gerando, induzindo e intensificando formas e processos antropogeomorfológicos, sendo o futuro dessas políticas incerta por conta da dinâmica natural estar a “mercê” da sociedade, a qual desvia determinados processos para seu (super) aproveitamento.

AGRADECIMENTOS
Agradecimentos a CAPES por financiar a pesquisa que ora se apresenta preliminarmente e que integrará a dissertação de mestrado a ser apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Pará, aos quais estimula de forma ímpar a pesquisa a divulgação de trabalhos acadêmicos em eventos e periódicos de relevância internacional. Agradecimentos também ao Prof. Dr. Carlos Alexandre Leão Bordalo (orientador), a Profª Drª Carmena Ferreira de França e a Profª Drª Sandra Baptista da Cunha por contribuírem a construção da dissertação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
ALBUQUERQUE, A. P. O dique de Belém. A Província do Pará, Belém, 20/dez. Segundo Caderno, 1993. ARAÚJO JR, A. C. R.; BARBOSA, E. J. S. a estrada e a paisagem: como a antropização atua sobre o relevo (um ensaio de Geomorfologia Ambiental). In: XVI ENCONTRO NACIONAL DE GEÓGRAFOS, 2010, Porto Alegre. Anais... Porto Alegre: AGB, 2010. CASSETI, V. Ambiente e apropriação do relevo. São Paulo: Contexto, 1991. CODEM. Projeto de recuperação das baixadas de Belém. Resumo mimeografado. Belém, 1986. CUNHA, S. B. Canais fluviais e a questão ambiental. In: CUNHA, S. B.; GUERRA, A. J. T. (orgs.). A questão ambiental: diferentes abordagens. 5ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2009. LIMA, R. R., TOURINHO, M. M. e COSTA, J, P. C. Várzeas fluvio-marinhas da Amazônia brasileira: características e possibilidades agropecuárias. Belém: FCAP. Serviço de Documentação e Informação, 2000. MARANDOLA Jr, E. e HOGAN, D. J. Natural hazards: o estudo geográfico dos riscos e perigos. Ambiente & Sociedade – Vol. VII nº. 2 jul./dez. 2004, p, 95-110. MOREIRA, E. Os Igapós e seu aproveitamento, Belém: UFPA, cadernos do NAEA nº 2, 1976. PREFEITURA MUNICPAL DE BELÉM, Programa de Reabilitação Urbana e Ambiental da Bacia Estrada Nova. Relatório de Impacto Ambiental. Tomo 01/02: Engesolo Engenharia LTDA, 2007a. _______. Disponível em: http://www.belem.pa.gov.br. Acesso em: 2007b. ROSS. J. L. Geomorfologia: ambiente e planejamento. São Paulo: Contexto, 1990. SUERTEGARAY, D. M. & NUNES, J. O. R. A natureza da geografia física na geografia. Terra Livre, vol. 17, 2002, p. 11-24. TRINDADE JR. SC. C. Produção do espaço e uso do solo urbano em Belém. Belém: NAEA, 1997.