Anais: Geomorfologia fluvial

Desenvolvimento da Cecropia sp. (Cecropiaceae) nos diferentes paleoambientes da Ilha Mutum

AUTORES
Pinheiro, C.M. (UEM) ; Ariza Ramírez, A.I. (UEM) ; Leli, I.T. (UNESP) ; Stevaux, J.C. (UEM/UNESP)

RESUMO
Devido à ocorrência constante da Cecropia pachystachya na ilha Mutum, localizada no alto do rio Paraná, após sofrer intensos processos de desflorestamento causados pelas interferências humanas (Campos & Souza, 2002), foi desenvolvido o projeto a fim de identificar a composição do gênero Cecropia nos diferentes paleoambientes (canal, ressaco, lago e pântano), formados no decorrer do desenvolvimento do arquipélago, os quais, são compostos por 194 sementes do gênero Cecropia no testemunho.

PALAVRAS CHAVES
Cecropeacea; Paleoambientes; Planície de Inundação

ABSTRACT
The constant incidences of Cecropia pachystachya in the island of Mutum, located at the upper part of the Paraná River, after the island suffered intense deforestation as a result of human interference (Campos and Souza, 2002) is the focus of the present project, which seeks to identify the composition of the genus Cecropia in different paleoenvironments (channel, ressaco, lake and swamp), all of which were formed during the development of the arquipelago, a region that according to our findings contains 194 types of seeds of the genus Cecropia.

KEYWORDS
Cecropeacea; paleoenvironments; floodplain

INTRODUÇÃO
O trecho do alto rio Paraná caracteriza-se pelo padrão multicanal, composto por grandes arquipélagos, que funcionam como planícies de inundação (Corradini et al., 2008). O processo de formação das ilhas está fortemente controlado pelo regime hidrológico e hidrossedimentalógico do rio, que se dão a partir do acúmulo de deposição arenosa no fundo do canal, e, fundamentalmente, estas ilhas são formadas pela anexação de barras que posteriormente recebem o acréscimo vertical (Stevaux et al., 2006). O resultado deste processo mostra diferentes sub-ambientes, como, depósitos de canal, “ressaco”, um ambiente de fluxos ocasionais, na maior parte do tempo com águas calmas e ligação direta ao canal, lagoa e pântano. O processo de formação de ilhas permite estudar a dinâmica de colonização da vegetação arbórea local, o qual tem início após a anexação das barras (Campos & Souza, 2002). Devido a importante diversidade biológica desses ambientes, em 1997, foi implantada a Área de Proteção Ambiental Federal das Ilhas e Várzeas do rio Paraná, com a finalidade de interromper o desgaste ambiental produzido por ações antrópicas (Campos & Souza, 2002). Sobre a ilha Mutum, situada no alto rio Paraná em um trecho de 15 km em frente à cidade de Porto Rico, é notável em sua regeneração natural uma abundância da família Cecropiaceae, principalmente, Cecropia pachystachya (Batista et al., 2008). Esta espécie é conhecida, popularmente, como embaúba, e tem crescimento rápido de comportamento pioneiro (Lorenzi, 1992). Este trabalho visa estabelecer a relação entre o banco de semente de Cecropiaceaes nos diversos paleoambientes formadores da ilha Mutum, ao longo do tempo geológico. Com isso pretende-se fornecer subsídios para estudos de recomposição florística e recuperação de áreas fluviais impactadas. A escolha das Cecropiaceas para este estudo deve-se ao fato destas plantas estarem entre as dez mais abundantes e de maior importância para a restauração local (Campos & Thomaz, 2008).

MATERIAL E MÉTODOS
Foi feito uma análise de imagem aérea para identificar as feições de paleocanais da ilha Mutum. Após, foi realizado o trabalho de campo e coletado um testemunho de 2,15m, em tubo de alumínio, com a ajuda de um vibro-testemunhador na localização 22°45’36”S 53°17’447”W. No laboratório, o tubo amostrador de alumínio foi cortado longitudinalmente e o sedimento preparado para descrição faciológica do testemunho, considerando a cor, textura do material, estrutura, presença ou ausência de fragmentos organismos e fotografação. Em uma das metades do testemunho, foram retiradas amostras destinadas a análise granulométrica e a datação com o isótopo 14C (Centro de Energia Nuclear na agricultura – CENA da Universidade de São Paulo – USP). Na outra metade do testemunho foram coletadas amostras em intervalos de 5cm destinadas a identificação e quantificação das sementes. Após, foi realizado a triagem destas amostras e posteriormente analisado com microscópio estereoscópio.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O intervalo entre 0 - 96cm apresenta lama argilosa, cinza média maciça, e bastante bioturbada por restos vegetais, predominando galhos e troncos. Esta faciologia foi interpretada como sendo de pântano. Foram também comuns a presença de marcas irregulares de precipitação de dióxido de ferro. A contagem de sementes deste paleoambiente totalizou de 194 sementes do gênero Cecropia. Na profundidade de 96-163cm foi encontrada intercalação de material lamoso e orgânico, predominando argila cinza escura preta rica em matéria orgânica. A matéria orgânica é composta de troncos e fragmentos de folhas, algumas bem preservadas. O perfil todo se mostra bastante laminado com lâminas de 2 a 5mm e foi definido como ambiente de lago. A amostragem do lago apresentou uma composição total de 245 sementes de C. pachystachya. Na sequência do testemunho, 163-200cm, o horizonte apresenta Lamito cinza médio a cinza acastanhado, intercalado de areia muito fina, restos de folhas e caules, característico de ressaco. Esta área apresentou o total de 8 sementes, sendo a menor taxa de dispersão, quando comparado aos outros sub-ambientes. A base do testemunho, 200-215cm de profundidade, é caracterizada pela presença de uma sequencia em “fining upward” de areia muito grossa/grossa/média, com raros grânulos argilosos, pouco argilosa na base, de cor amarelo acastanhado e com estratificação incipiente a maciça. Este ambiente foi interpretado como canal fluvial. Nesse intervalo foram contadas 12 sementes do gênero Cecropia. As datações processadas nos depósitos mostram que as ilhas são morfologias bastante perenes nesse tipo de rio (“anabranching”), tendo em vista que a idade do primeiro pacote de finos sob as areias de canal datam de 14C 920 anos A.P. (200cm de profundidade) Com apoio de outra datação executada à profundidade de 90cm pode-se inferir uma taxa de sedimentação de 0,7mm.ano-1. A alta frequência das sementes de Cecropiaceae, encontrada no ambiente de pântano e de lago, deve-se aos aspectos ecofisiológicos e morfoanatômicos característicos. A espécie de maior densidade e de melhor adaptação ao meio (C. pachystachya) atua em solos úmidos, em proximidades de cursos d´agua, beira de matas e em clareiras devido à necessidade de alta taxa de iluminação para ocorrer seu crescimento (Pilati et al.,1999). Possuem capacidade de adaptação em ambientes de inundação, com o aumento de lenticelas e o surgimento de raízes adventícias quando submetidas a este estresse (Batista et al., 2008). Nos pontos amostrados, 90-95, 110-115 e 130-135cm apresentam valores altos na dispersão de sementes. Com relação ao período de acontecimento, tem-se que o último pico em dispersão (130-135 cm) foi há 14C 760 anos A.P. Os fatores para estes acontecimentos de alta dispersão ainda não foram esclarecidos. Porém, uma das explicações neste caso, pode estar relacionada às diferentes origens da deposição das sementes no solo, que podem, ocorrer, tanto, em períodos de inundações, como, por “chuvas de sementes” (Campos & Souza, 2003), (Figura 1).

Diagrama dos paleoambientes do testemunho da Ilha Mutum



CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na descrição e análise de fácies do testemunho foram identificados quatro diferentes sub-ambientes que se sucederam: canal, ressaco, lago e pântano. O topo dos depósitos de canais foi datado em 920 anos indicando a idade de início da formação da ilha por meio do ambiente de ressaco (200cm). Após a fase do ressaco quando o ambiente foi fechado por ocasião das cheias, ocorre maior deposição de sedimentos e restos vegetais, esse ambiente muda para a fase de lagoa, contendo um grande número de sementes, soterradas há 720 anos. Posterior a lagoa, o sub-ambiente adere características pertencentes a pântano, e em seus primeiros estágios, também possui um alto índice de sementes. O conhecimento da dispersão de sementes Cecropiaceae nos paleoambientes ajuda a entender a evolução florística nos arquipélagos do rio Paraná. Esse conhecimento é importante para a melhor compreensão das características sedimentológicas e evolução das ilhas ao longo dos anos.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq, ao Núcleo de Pesquisas em Limnologia, Ictiologia e Aquicultura (NUPELIA), ao Programa de Pós-Graduação em Ecossistemas Aquáticos Continentais (PEA) e ao Grupo de Estudos Multidisciplinares do Ambiente (GEMA), pelas facilidades oferecidas no desenvolvimento deste trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
Batista, C.U.N, Medri, M.E, Bianchini, E, Medri, C & Pimenta, J.A. 2008.Tolerância à inundação de Cecropia pachystachya Trec. (Cecropiaceae): aspectos ecofisiológicos e morfoanatômicos
Campos, J.B & Souza, M.C. 2002. Impactos antrópicos e potencialidade de recuperação natural na apa federal das ilhas e várzeas do rio Paraná.
Campos, J.B & Souza, M.C. 2002. Arboreous Vegetation of na Alluvial Riparian Forest and Their Soil Relations: Porto Rico Island, Paraná River, Brazil.
Campos, J.B & Souza, M.C. 2003. Potencial for Natural Forest Regeneration from Seed Bank in an Upper Paraná River Floodplain, Brazil.
Campos, J.B & Thomaz, S.M. 2008. Caderno da Biodiversidade. V.5, N.2.
Corradini, F.A, Fachini, M.P & Stevaux, J.C. 2006. Controle geomorfológico da distribuição da vegetação ripária do rio paraná: parte i- unidades geomórficas da planície de inundação. Revista UnG- Geociências. V.5, N.1
Corradini, F.A, Stevaux, J.C & Fachini, M.P. 2008. Geomorphology and distribution of riparian vegetation on the Mutum island, Paraná river – PR/MS.
Pilati, R & Adrian, I.F, Carneiro, J.W.P. 1999. Effects of Different Temperatures on the Performance of Seeds Germination of Cecropia pachystachya Trec. (Cecropiaceae).
Lorenzi, H. 1992. Árvores Brasileiras: manual de identificação e cultivo de plantas arbóreas nativas do Brasil. Instituto Plantarium de Estudos da Flora LTDA.