Anais: Geomorfologia fluvial

Reflexos da extração de areia na morfologia do ribeirão dos Macacos-MG, entre 1989 e 2010

AUTORES
Carvalho, A. (PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA, IGC/UFMG) ; Raposo, A.A. (PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA, IGC/UFMG) ; Bezerra, D.P. (PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA, IGC/UFMG)

RESUMO
Este trabalho investiga os reflexos da extração de areia entre 1989 e 2010 na morfologia do canal e nas margens do ribeirão dos Macacos. A partir da interpretação de fotografias aéreas, imagens de satélite e trabalhos de campo constatou-se que houve o aumento das áreas de extração de areia e que as principais alterações no ribeirão correspondem à modificação das margens do canal e alteração de seus limites, degradação da planície e terraço, bem como intensificação da retilinização do ribeirão.

PALAVRAS CHAVES
extração de areia; morfologia do canal; ribeirão dos Macacos

ABSTRACT
The aim of this paper is to inquire the outcomes of the sand extraction on channel and banks of Macacos Creek between 1989 and 2010. Through interpretation of aerial photographs, orbital images and fieldwork it was encounter that the total area of sand extraction has raised and that the major variances in the morphology of Macacos Creek was changes in position and limits of the stream, degradation of his plain and terrace and also a very intense decrease in the sinuosity of the Creek.

KEYWORDS
sand extraction; channel morphology; Macacos Creek

INTRODUÇÃO
As bacias hidrográficas são sistemas dinâmicos, compostos pela geologia, relevo, biogeografia, clima e seres humanos. A alteração nesses fatores interfere, direta ou indiretamente, nos canais fluviais, o que impacta na velocidade e volume do escoamento de água e, consequentemente, promove alteração nacapacidade e competência do rio (CHRISTOFOLETTI, 1981). Cunha (2001) afirma que em uma bacia hidrográfica, as características de leito, canais, padrões de drenagens, entre outras, analisadas em conjunto, podem ser consideradas responsáveis por uma dinâmica fluvial peculiar que, associada a uma geometria e hidráulica, promovem processos fluviais específicos de erosão, transporte e deposição. É assim também que o fluxo e o material sedimentar se destacam enquanto elementos fundamentais na estruturação do sistema de geometria hidráulica, nos cursos fluviais (CHRISTOFOLETTI, 1981). A extração de areia nos rios se insere no conjunto de atividades antrópicas potencialmente modificadoras dos cursos fluviais. Oliveira e Mello (2007) afirmam que a extração de materiais aluviais nas margens de rios provocam desequilíbrios na dinâmica fluvial. Ao retirar ou adicionar materiais nas margens e leito dos canais fluviais, esta atividade causa a redefinição dos limites do canal, bem como interfere no padrão de fluxo e de transporte sedimentar. Também podem ocorrer outras alterações no curso fluvial, propagando- se a montante e a jusante das áreas diretamente atingidas pela atividade. O ribeirão dos Macacos, afluente do rio Paraopeba, localizado na região central de Minas Gerais, constitui-se como uma das principais áreas das quais se extrai areia para atender o mercado da construção civil da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Isso tem comprometido a qualidade ambiental deste ribeirão, alterando seu padrão de drenagem e dinâmica fluvial. Assim, esse trabalho investiga os reflexos da atividade de extração de material aluvionarna morfologia do ribeirão dos Macacos entre 1989 e 2010.

MATERIAL E MÉTODOS
A bacia hidrográfica do ribeirão dos Macacos localiza-se na região central do estado de Minas Gerais, a noroeste da Região Metropolitana de Belo Horizonte. A bacia está inserida nos municípios de Sete Lagoas, Esmeraldas, Inhaúma, Fortuna de Minas e Cachoeira da Prata. Nesses três últimos municípios, concentra-se a maior parte das áreas de extração de material aluvionar nas margens do ribeirão em questão. Para cumprir o objetivo proposto neste trabalho, foram realizadas as seguintes etapas metodológicas: (i) mapeamento do canal principal do ribeirão dos Macacos em 1989 e em 2010; (ii) mapeamento das áreas de extração de material aluvionar no leito e margens do ribeirão em 1989 e 2010; e (iii) caracterização das condições atuais do canal do ribeirão dos Macacos e de suas margens. O mapeamento do canal fluvial e das áreas de extração de material aluvionar foi realizado em gabinete, através da interpretação de fotografias aéreas cedidas pela CEMIG (1989) e de imagens Rapideye cedidas pelo IGAM (2010). Assim, foi realizado o mapeamento do canal principal do ribeirão dos Macacos em 1989 e em 2010, identificando os trechos com modificações mais significativas em sua forma. Em seguida, foi realizado o mapeamento das áreas de extração de material aluvionar em 1989 e em 2010, identificando as áreas com intervenções mais significativas nas margens e canal no período investigado. Posteriormente, essas duas informações foram interpretadas em conjunto e possibilitaram a associação das alterações na morfologia do canal à extração de material aluvionar em determinados trechos. Para caracterizar as condições atuais do ribeirão, foram realizados trabalhos de campo, percorrendo a maior parte do canal principal do ribeirão dos Macacos. Desse modo, foram levantadas informações sobre o canal fluvial, planície de inundação, terraço mais recente e áreas nas quais ocorre extração de material aluvionar ou que ainda possuem características relacionadas a esse tipo de atividade.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
O ribeirão dos Macacos é caracterizado pela intensa extração de material aluvionar em seu canal e em suas margens. Na Figura 1, estão destacados os principais trechos nos quais ocorreram significativas alterações na morfologia do ribeirão, entre 1989 e 2010.Em 1989, as áreas de extração se concentravam no baixo curso do ribeirão. De modo geral, a extração ocorria dentro do leito do canal e nas margens deste, devido à existência de espessos depósitos arenosos de origem fluvial (terraço mais recente). As áreas de extração nas margens eram mais estreitas e não se apresentavam associadas às mudanças significativas na forma (largura) do canal. Figura 1: Principais trechos do ribeirão dos Macacos alterados em 2010. Em 2010, houve aumento considerável das áreas de extração de material aluvionar, ocupando principalmente o baixo curso do ribeirão, mas com o registro do surgimento de áreas expressivas desta extração também no médio curso. As áreas de extração identificadas em 2010 se diferenciam daquelas identificadas em 1989, pois ocupam uma área maior ao longo do canal e são mais largas. A maior parte das áreas de extração identificadas em 2010, diferentemente daquelas identificadas em 1989, estão associadas a trechos do canal com morfologia bastante alterada. Ressalta-se que durante os trabalhos de campo foram identificadas áreas de extração expressivas também no alto curso do ribeirão. Na Figura 2 estão destacados quatro trechos do ribeirão dos Macacos nos quais foram identificadas alterações significativas na morfologia do canal. Os trechos com alterações mais expressivas se concentram no baixo curso e estão associadas a áreas de extração de material aluvionar. Nos trechos destacados na figura, observa-se que, embora sejam áreas nas quais havia extração em 1989, as áreas de extração de 2010 são mais expressivas. Assim, pode-se considerar que a interferência na planície de inundação e no terraço mais recente contribuiu de forma significativa para que o rio perdesse a sinuosidade existente em 1989. Ao interferir na planície e terraço, a extração de areia condiciona às margens fluviais maior susceptibilidade aos processos erosivos. Deve-se ainda atentar para o fato de que a própria atividade de extração contribuiu tanto para a retilinização do ribeirão, como para seu alargamento e formação de barras arenosas observadas atualmente ao longo de praticamente todo o baixo curso do ribeirão. Figura 2: Trechos com as alterações na morfologia do canal mais expressivas. A bacia do ribeirão dos Macacos apresenta características do quadro físico e humanos bastante peculiares e que têm se associado e contribuído para a degradação das condições do curso fluvial. De acordo com Oliveira (1999), a bacia em questão está situada em uma área de rochas granitoides. Isso deve favorecer o aporte de sedimentos arenosos que podem ser observados nos depósitos do terraço mais recente, o qual é bastante amplo e extenso tanto no alto, como no baixo curso. A grande quantidade de sedimentos arenosos foi fundamental para que esse ribeirão se destacasse como uma das principais fontes de areia para o mercado de construção civil da Região Metropolitana de Belo Horizonte. Entretanto, a extração de areia tanto no canal, como em suas margens, culmina em desequilíbrios na dinâmica fluvial. Nesse sentido, ao retirar areia do fundo do canal, o nível de base do curso d’água foi alterado, provocando o encaixamento a montante. Com maior capacidade de erosão a montante e com grandes áreas ao longo do canal com margens instabilizadas devido à ação da própria atividade de extração,infere-se que o ribeirão tenha erodido com mais intensidade suas margens, alargando seu canal e intensificando o aporte de sedimentos para o próprio canal fluvial.

Principais trechos do ribeirão dos Macacos alterados em 2010.



Trechos com as alterações na morfologia do canal mais expressivas.



CONSIDERAÇÕES FINAIS
A extração de areia no leito e nas margens do ribeirão dos Macacos contribuiu de forma significativa para a alteração da morfologia do canal, da planície e do terraço mais recente. Os trechos mais alterados se concentram no baixo curso e são caracterizados pela diminuição da sinuosidade do canal. Embora em 1989 houvesse grande quantidade de áreas de extração, o mapeamento revelou que o canal se apresentava pouco alterado devido a essa atividade, diferentemente do que se observa em 2010. Ressalta-se que a bacia hidrográfica desse ribeirão se localiza em uma área de rochas granitoides, que contribuem para o aporte de sedimentos arenosos e para a formação de espessos depósitos sedimentares nas margens. Assim, a extração de areia nas margens do canal instabiliza estas que, por serem constituídas principalmente por areia, tornam-se ainda mais susceptíveis aos processos erosivos, o que leva o ribeirão a estar ainda mais sujeito às alterações na morfologia do canal, na planície e no terraço.

AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem à FAPEMIG e CNPq pelo auxílio financeiro.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
CHRISTOFOLETTI, Antônio. Geomorfologia fluvial. Edgard Blücher, 1981.
COMPANHIA ENERGÉTICA DE MINAS GERAIS – CEMIG. Fotografias aéreas dos municípios de Cachoeira da Prata, Inhaúma, Fortuna de Minas e Sete Lagoas. Aerocarta, 1989.
CUNHA, Sandra B. Geomorfologia Fluvial. In: GUERRA, A.J.T.; CUNHA, S.B. (orgs.) Geomorfologia uma Base de Atualização e Conceitos. 4. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. p. 211-252.
INSTITUTO MINEIRO DE GESTÃO DE ÁGUAS – IGAM. Imagens Rapideye. 2010.
OLIVEIRA, Edeleuza Adriana. Geologia, petrografia e geoquímica do maciço granitoide de Cachoeira da Prata. Belo Horizonte: IGC/UFMG (Dissertação de Mestrado), 82 p., 1999.
OLIVEIRA , Flávia Lopes; MELLO , Edson Farias. A mineração de areia e os impactos ambientais na bacia do rio São João, RJ. Revista Brasileira de Geociências, 37(2):374-389, junho de 2007.