Anais: Geomorfologia fluvial
Espacialização das áreas de inundação nos municípios de Igrejinha e Três Coroas, bacia hidrográfica do rio Paranhana/RS
AUTORES
Oliveira, G.G. (UFRGS) ; Valente, P.T. (UFRGS) ; Guasselli, L.A. (UFRGS)
RESUMO
Este estudo espacializa áreas de inundação, em Igrejinha e Três Coroas, rio
Paranhana. Para tanto, simula diferentes eventos de chuva, e utiliza modelos
hidrológicos para avaliar a vazão nesses eventos. A partir de geoprocessamento e
de sensoriamento remoto estima as cotas e espacializa as áreas urbanas atingidas.
A análise de 92 pontos com registro de inundações, mostrou que apenas 3 não
coincidiram com as áreas mapeadas, revelando resultados satisfatórios na sua
espacialização.
PALAVRAS CHAVES
desastres naturais; geoprocessamento; hidrologia
ABSTRACT
This study spatializes the flood areas in Igrejinha and Três Coroas, Paranhana
River. For this, it simulates different rainfall events, and it uses hydrological
models to evaluate the runoff in these events. It estimates the rivers level and
spatializes urban areas affected from GIS and remote sensing. The analysis of 92
points with record floods, showed that only 3 did not coincide with the mapped
areas, revealing satisfactory results in their spatialization.
KEYWORDS
natural disasters; geoprocessing; hydrology
INTRODUÇÃO
As inundações são originadas por eventos climáticos extremos e constituem-se em
fenômenos de ocorrência natural em todos os ambientes fluviais (Castro, 1998;
Oliveira, 2010). Apesar desses fenômenos ocorrerem naturalmente, diversos
estudos (Alcántara-Ayala, 2002; Kobiyama et al., 2004; CRED, 2012) salientam o
aumento da freqüência na qual esses fenômenos causam destruições e perdas
humanas (Brubacher et al., 2012).
O aumento dos impactos das inundações pode ser explicado também pela expansão da
ocupação humana em áreas suscetíveis a esses eventos (Kobiyama et al., 2006;
Oliveira, 2010; Brubacher et al., 2012). A ocupação dessas áreas ocorre, de modo
geral, em virtude de esses eventos possuírem uma irregular distribuição
temporal, muitas vezes sem nenhuma ocorrência durante décadas (Tucci e Bertoni,
2003). Com o transcorrer dos anos, os investimentos em planejamento e prevenção
se tornam insuficientes e uma nova inundação causa uma destruição ainda maior do
que a registrada anteriormente.
Na bacia do rio Paranhana, as inundações frequentemente atingem milhares de
moradores nos municípios de Parobé, Taquara, Igrejinha e Três Coroas, cujas
áreas urbanas estão predominantemente localizadas nas planícies e terraços
fluviais. Em janeiro de 2010, por exemplo, de acordo com a Defesa Civil do Rio
Grande do Sul, as inundações atingiram mais de 57.000 pessoas nesses quatro
municípios, ocasionando perdas humanas, a destruição de residências, escolas,
indústrias e estradas, e a pausa no fornecimento de energia.
Inserido nesse contexto, o presente estudo tem como objetivo espacializar as
áreas de inundação no vale do rio Paranhana, com ênfase nos municípios de
Igrejinha e Três Coroas, a partir da utilização de dados de sensoriamento
remoto, de ferramentas de geoprocessamento e de modelos hidrológicos.
MATERIAL E MÉTODOS
A bacia do Paranhana possui 574 km², sendo uma das principais bacias de
contribuição do rio dos Sinos, Região Hidrográfica do Lago Guaíba. As áreas
urbanizadas de Igrejinha e Três Coroas estão localizadas, predominantemente, em
áreas suscetíveis às inundações, que ocorrem de forma rápida, normalmente poucas
horas após o pico das chuvas, dadas as características hidrológicas (tempo de
concentração: <6h) e morfométricas (desnível altimétrico: 924m; declividade
média: 22,9%).
O estudo foi estruturado nas seguintes etapas:
a) estimativa dos parâmetros físicos da bacia e principais rios, a partir de
dados Shuttle Radar Topography Mission (SRTM), do projeto TOPODATA, e da
hidrografia (1:50.000);
b) geração da chuva de projeto com tempos de retorno (TRs) de 2 a 50 anos, a
partir da construção de uma equação do tipo IDF (intensidade-duração-frequência)
com base nos dados pluviométricos disponíveis;
c) modelagem chuva-vazão e propagação da onda de cheia, com base em dois modelos
hidrológicos: o modelo SCS (Soil Conservation Service) para a transformação da
chuva em vazão e o modelo Muskingum Cunge para a propagação da vazão nos
segmentos de rios. No método SCS, foi necessário estimar um parâmetro que
relaciona o uso e ocupação do solo e o tipo de solo, obtidos por classificação
de imagem Landsat 5 (TM) de 2009. O modelo SCS gera hidrograma de saída a cada
intervalo de tempo nas sub-bacias. Já o modelo Muskingum Cunge utiliza
parâmetros físicos dos rios para propagar a vazão resultante da chuva pela
drenagem;
d) estimativa das cotas altimétricas atingidas por evento, em diversos pontos do
rio, a partir da construção de curvas-chave, com base nas seções transversais
dos rios (via SRTM);
e) espacialização das áreas atingidas por TR em Igrejinha e Três Coroas;
f) análise espacial das áreas urbanas atingidas pelas inundações em cada evento,
com auxílio do Google Earth;
g) registro de inundações a partir de jornais e lista das prefeituras municipais
das residências afetadas.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No primeiro evento de chuva simulado, com TR de 2 anos e duração de 1h, o
acumulado no evento foi de 48,4mm, com o pico ocorrendo entre 25 e 30min após o
início da chuva (12,4mm em 5min). A vazão de pico no rio Paranhana, em Três
Coroas (PC1, ver Fig.1), foi de 82,2m³/s, cerca de 100min após o pico da chuva.
A jusante, em Igrejinha (PC2, ver Fig.2), a vazão de pico foi de 93,4m³/s,
ocorrendo 40min após o pico da vazão em Três Coroas. O fim do escoamento
superficial no PC1 ocorreu cerca de 5h após o término das chuvas, e no PC2,
cerca de 7h. Considerando as cotas altimétricas, com base nos dados SRTM, neste
evento, o nível do rio subiu 3,4 e 3,5m, respectivamente, nos PCs 1 e 2.
Para uma chuva com TR de 50 anos e duração de 1h, o acumulado no evento foi de
73,2mm, com o pico ocorrendo entre 25 e 30min após o início da chuva (18,8mm em
5 min). A vazão de pico no PC1 foi de 442,3m³/s, cerca de 2h após o pico da
chuva. No PC2, a vazão de pico foi de 481,8m³/s, ocorrendo 20min após o pico da
vazão em Três Coroas. O fim do escoamento superficial no PC1 ocorreu cerca de 5h
após o término das chuvas, e no PC2, cerca de 7h30min. Neste evento, o nível do
rio Paranhana subiu 6,3m no PC1 e 6,2m no PC2.
No terceiro evento, com TR de 2 anos e duração de 24h, a chuva acumulada foi de
122,4mm, com intensidade média de 5,1mm/h. O pico da chuva ocorreu entre 11 e
12h após o início do evento. A vazão de pico no PC1 foi de 488,5m³/s, cerca de
2h após o pico da chuva. No PC2, a vazão de pico foi de 523,7m³/s, ocorrendo
30min após o pico da vazão em Três Coroas. O fim do escoamento superficial no
PC1 ocorreu cerca de 6h após o término das chuvas, e no PC2, cerca de 8h30min.
Em Três Coroas, PC1, o nível do rio subiu 6,4m. Já em Igrejinha, PC2, a elevação
do nível do rio foi de 6,5m.
Para uma chuva com TR de 50 anos e duração de 24h, o acumulado foi de 185mm, com
intensidade média de 7,7mm/h. A vazão de pico no PC1 foi de 1.121m³/s, cerca de
90min após o pico da chuva. No PC2, a vazão de pico foi de 1.189m³/s, ocorrendo
30min após o pico da vazão no PC1. O fim do escoamento superficial no PC1
ocorreu cerca de 6h após o término das chuvas, e no PC2, cerca de 9h. Neste
evento, o nível do rio Paranhana subiu 7,6m no PC1 e 9,5m no PC2. Dos quatro
eventos hipotéticos simulados, este é o que representaria maiores prejuízos às
populações locais.
As Figuras 1 e 2 apresentam as áreas de inundação do rio Paranhana, nos
municípios de Três Coroas e Igrejinha, respectivamente, para um evento de chuva
com TR de 50 anos e duração de 24h. O município mais atingido é o de Igrejinha,
com 598,3 hectares do território municipal sob às águas do rio Paranhana e seus
principais afluentes. O município de Três Coroas apresentou 553,6 hectares de
áreas afetadas pela inundação. Considerando somente as zonas urbanas, foram
observados 215,2 hectares de áreas atingidas em Igrejinha e 176 hectares em Três
Coroas.
Os pontos com registro de inundações foram coletados em eventos que ocorreram na
bacia nos anos de 2009, 2010 e 2011. Ao todo, dos 92 pontos com registro, apenas
3 não coincidiram com as áreas mapeadas de inundação. Isso indica que a
espacialização apresentou resultados satisfatórios, mesmo com as limitações dos
dados hidrológicos e altimétricos disponíveis.
A precisão da espacialização tende a melhorar à medida que dados altimétricos de
maior resolução espacial sejam adquiridos, aumentando a confiabilidade dos
perfis topográficos das seções transversais. Além de refinar o mapeamento de
áreas de inundação, também é importante destacar a necessidade de iniciar o
monitoramento sistemático de níveis e de vazão, para subsidiar novas ações de
planejamento de ocupação do solo nos municípios e para a criação de um sistema
de alerta à eventos extremos relacionados com as enchentes do rio Paranhana.
FIGURA 1. Áreas de inundação do rio Paranhana em Três Coroas, RS
FIGURA 2. Áreas de inundação do rio Paranhana em Igrejinha, RS
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O evento com TR de 50 anos e duração de 24h apresentou o maior volume de chuva
acumulado (185mm). A vazão de pico em Três Coroas e Igrejinha foi de 1.121 e
1.189m³/s, ocorrendo entre 90 e 120min após o pico da chuva. No evento, o nível do
rio Paranhana subiu 7,6m em Três Coroas e 9,5m em Igrejinha. O município mais
atingido é Igrejinha, com 598ha (215ha em áreas urbanas), enquanto que Três Coroas
apresentou 554ha (176ha - áreas urbanas).
Ao todo, dos 92 pontos com registros de inundação, apenas 3 não coincidiram com as
áreas mapeadas, revelando resultados satisfatórios na sua espacialização, mesmo
com as limitações dos dados hidrológicos e altimétricos disponíveis. Entretanto, a
precisão do mapeamento tende a melhorar à medida que dados altimétricos de maior
resolução espacial sejam adquiridos. Também é importante destacar a necessidade de
monitorar os níveis e a vazão, para subsidiar ações de planejamento de ocupação do
solo e criar um sistema de alerta às enchentes do rio Paranhana.
AGRADECIMENTOS
À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS) e ao
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio
financeiro ao projeto de pesquisa.
Ao Centro Estadual de Pesquisas em Sensoriamento Remoto e Meteorologia (CEPSRM) da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) pela infra-estrutura
indispensável à realização do projeto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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Brubacher, J. P.; Oliveira, G. G.; Guasselli, L. A. 2012. Identificação e análise de eventos extremos de precipitação na bacia hidrográfica do rio dos Sinos/RS. In: Congresso Brasileiro sobre Desastres Naturais, 1., Rio Claro. Anais... p.1-10 (CDROM).
Castro, A. L. C. 1998. Glossário de defesa civil, estudos de riscos e medicina de desastres. 2 ed. Brasília: Ministério do Planejamento e Orçamento, 283p.
CRED - CENTRE FOR RESEARCH ON THE EPIDEMIOLOGY OF DISASTERS. 2012. The international disaster database (EM-DAT). Disponível em: <http://www.emdat.br/database>. Acesso em: 24 fev. 2012.
Kobiyama, M.; Checchia, T.; Silva, R. V.; Schröder, P. H.; Grando, A.; Reginatto, G. M. P. 2004. Papel da comunidade e da universidade no gerenciamento de desastres naturais. In: Simpósio Brasileiro de Desastres Naturais, 1., Florianópolis. Anais... Florianópolis: GEDN/UFSC, p.834-846 (CDROM).
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Oliveira, G. G. 2010. Modelos para previsão, espacialização e análise das áreas inundáveis na bacia hidrográfica do rio Caí, RS. Dissertação (Mestrado em Sensoriamento Remoto) – Centro Estadual de Pesquisas em Sensoriamento Remoto e Meteorologia, UFRGS, 148p.
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