Anais: Geomorfologia fluvial
ANÁLISE MORFOMÉTRICA COMO INSTRUMENTO NA IDENTIFICAÇÃO DE TENDÊNCIA A ENCHENTES
AUTORES
Moura, C.A. (UNESP-PÓS GRADUAÇÃO EM GEOCIÊNCIAS E MEIO AMBIENTE)
RESUMO
Este trabalho buscou caracterizar as bacias hidrográficas pertencentes ao
município de Caraguatatuba (SP). Foram limitadas 15 sub-bacias para as quais
foram definidos cinco parâmetros morfométricos: densidade de drenagem, densidade
hidrográfica, índice de forma, índice de circularidade e índice de sinuosidade. Os
parâmetros morfométricos foram analisados de forma conjunta permitindo a
identificação entre as 15 bacias quatro como de maior suscetibilidade a enchentes.
PALAVRAS CHAVES
geomorfologia fluvial; inundação; bacias hidrográficas
ABSTRACT
This study sought to characterize the hidrographic basin of the city of
Caraguatatuba (SP and determine which of these are more prone to flooding through
a morphometric analysis of basins. This work was limited to 15 sub-basins for
which the five morphometric parameters below were defined: drainage density,
hydrographic density, form Index, circularity index and sinuosity index. The
morphometric parameters were analyzed jointly enabling the identification of
basins with greater susceptibility to flooding and 15 basins analyzed showed four
major tendency to flooding.
KEYWORDS
fluvial geomorphology; flooding; hidrographic basin
INTRODUÇÃO
A ocupação desordenada do espaço urbano e o manejo inadequado das atividades
antrópicas acarretam problemas ambientais sérios às cidades e, portanto
estratégias de gestão e diminuição do impacto social, ambiental e econômico
provocados por enchentes e alagamentos são essenciais à sociedade.
Neste trabalho pretendeu-se caracterizar as bacias hidrográficas pertencentes ao
município de Caraguatatuba e determinar entre as 15 bacias delimitadas quais
possuem maior tendência a enchentes a partir de uma análise morfométrica de
bacias. Conforme Souza (2005) é comum o uso de correlações de parâmetros
morfométricos para a determinação de suscetibilidade a inundações e enchentes em
bacias hidrográficas, mas essas relações são feitas de forma isolada devido à
dificuldade em se estabelecer intervalos genéricos de referência em graus de
suscetibilidade. A proposta deste trabalho consistiu numa análise conjunta de
cinco parâmetros morfométricos: Densidade de Drenagem (Dd), Densidade
Hidrográfica (Dh), Índice de forma (k), Índice de circularidade (Ic) e Índice de
sinuosidade (Is), a partir dos quais foi possível estabelecer graus de tendência
a enchentes e inundações destas bacias.
A escolha do município de Caraguatatuba para o estudo foi devido ao fato
deste ser considerado pelo Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento de
Desastres Naturais) como um dos cinquenta e seis municípios prioritários para
monitoramento de desastres - tais como enchentes ou escorregamentos - das
regiões Sul e Sudeste do Brasil.
O município de Caraguatatuba no ano de 1967 foi devastado por um dos
piores eventos climáticos ocorridos no Brasil. Este evento aconteceu em 18 de
março de 1967 e foi chamado de “A Catástrofe”, uma vez que causou enchentes e
uma sequência de deslizamentos da Serra do Mar decorrentes de uma anomalia
positiva de precipitação nessa que provocou segundo registros jornalísticos da
época, a morte de mais de 400 pessoas, além de grandes prejuízos à
infraestrutura e à economia local.
MATERIAL E MÉTODOS
O programa empregado neste trabalho foi o ArcMap 9.3 da ESRI utilizado no
georreferenciamento dos dados, implementação do banco de dados geográficos e
edição dos produtos cartográficos como também na obtenção dos dados necessários
aos cálculos morfométricos. Toda a base cartográfica foi organizada através do
Sistema de Coordenadas Geográficas, utilizando-se o Datum South American 1969
(SAD69). A projeção cartográfica definida para o Sistema de Banco de Dados
Geográfico foi a Universal Transversa de Mercator (UTM), sendo a área de estudo
pertencente ao fuso 23.
Também foram utilizadas as cartas topográficas escala 1: 50.000 do IBGE:
Pico do Papagaio SF-23-Y-D-V-2, Caraguatatuba SF -23-Y-D-VI-1, Maresias SF-23-Y-
D-V-4 e São Sebastião SF -23-Y-D-VI-3, editadas em 1974, 1976, 1973 e 1969
respectivamente.
Horton (1945) foi o primeiro a desenvolver estudos quantitativos de
bacias de drenagem e analisar as relações entre as características morfométricas
de uma bacia e o seu comportamento hidrológico. A análise morfométrica foi
apresentada na literatura brasileia por Christofolleti (1980) e Villela & Mattos
(1975). No programa Arcgis foram delimitadas as bacias hidrográficas
acompanhando os divisores de águas em relação às bacias circunvizinhas. Além
disso, foram extraídos dados como: Área da Bacia (A); Perímetro (P); Número de
canais (Nt); Comprimento do canal principal (L); = Distância vetorial do canal
principal Lv; = Área do círculo com perímetro igual ao da bacia (Ac).
Estes dados foram utilizados para o cálculo dos seguintes parâmetros
morfométricos: Densidade de Drenagem (Dd), Densidade Hidrográfica (Dh), Índice
de forma (k), Índice de circularidade (Ic) e Índice de sinuosidade (Is).
As bacias hidrográficas do município de Caraguatatuba pertencem a
Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos 03 (UGRHI-03) do estado de São
Paulo. Estas foram dividas em 15 bacias, para quais foram estabelecidos os
parâmetros morfométricos com vista à determinação de tendência a enchentes
(figura 1).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Densidade Hidrográfica relaciona o número de rios ou canais com a área
da bacia hidrográfica, expressa a magnitude da rede hidrográfica, indicando sua
capacidade de gerar novos cursos d'água (CHRISTOFOLETTI , 1970, p.14). Já a
Densidade de drenagem foi definida inicialmente por Horton (1945) e corresponde
ao comprimento médio de canais de uma bacia por unidade de área. Em relação à
densidade de drenagem quanto maior o índice menor é a capacidade de infiltrar
água, valores baixos indicam que a região é mais favorável à infiltração
contribuindo com o lençol freático.
Segundo Hiruma & Ponçano, 1994 para a definição de classes de densidade
de drenagem os limites seriam para alta densidade valores superiores a 2.50,
média densidade valores entre 1.25-2.50 e baixa densidade de drenagem abaixo de
1.25.
As classes utilizadas neste trabalho para a determinação da tendência a
enchentes das bacias para os parâmetros de densidade de drenagem e hidrográficas
foram as seguintes: Para a Densidade hidrográfica os intervalos foram: Alta <
2.0; Moderada 2.0 – 4.0; Baixa > 4.0. Enquanto para a Densidade de drenagem:
Alta < 1,50; Moderada 1.50-3.0; Baixa > 3.0.
Consideramos que bacias com maior Densidade de drenagem e hidrográfica - bacias
mais bem desenvolvidas - têm menor tendência a cheias rápidas, já que possuem
maior número de ramificações de drenagem conduzindo a diminuição da velocidade
de escoamento.
O Índice de forma representa a relação existente entre o perímetro da
bacia e a área que ela possui. Para o Índice de Forma (K) os valores que se
aproximam da unidade 1 configuram bacias que tendem a ser circulares (GANDOLFI,
1971). Este índice conforma conclusões e resultados semelhantes ao Índice de
circularidade, pois evidencia bacias com maior tendência a cheias rápidas.
Já o Índice de Circularidade (Ic) representa a relação entre a área
total da bacia e a área de um círculo de perímetro igual ao da área total da
bacia. Sendo assim, Ic=0,51 representa um nível moderado de escoamento, não
contribuindo na concentração de águas que possibilitem cheias rápidas. Valores
maiores que 0,51 indicam que a bacia tende a ser mais circular, favorecendo os
processos de inundação (cheias rápidas). Já os valores menores que 0,51 sugerem
que a bacia tende a ser mais alongada favorecendo o processo de escoamento mais
lento (MULLER, 1953 e SCHUMM, 1956 apud LANA 2001).
O Índice de Sinuosidade (Is) relaciona o comprimento verdadeiro do canal
(projeção ortogonal) com a distância vetorial (comprimento em linha reta) entre
os dois pontos extremos do canal principal (SCHUMM, 1963 apud LANA 2001).
Valores próximos a 1,0 indicam que o canal tende a ser retilíneo. Já os valores
superiores a 2,0 indicam canais tortuosos e os valores intermediários sugerem
formas transicionais, regulares e irregulares.
As classes utilizadas para os parâmetros de Índice de Forma, Índice de
Circularidade e Índice de Sinuosidade para a determinação da tendência a
enchentes das bacias foram as seguintes:
• Para o Índice de Forma os intervalos foram: Alta < 1.50; Moderada 1.50-
1.75; Baixa > 1.75;
• Para o Índice de Circularidade os intervalos foram: Alta > 0.55;
Moderada 0.45- 0.55; Baixa < 0.45;
• Para o Índice de Sinuosidade os intervalos foram: Alta < 1.40; Moderada
1.40-1.75; Baixa > 1.75.
Os intervalos estabelecidos para os parâmetros morfométricos quanto à
tendência a enchentes das bacias hidrográficas foram agrupados em um quadro
(figura 2) e preenchidos com as cores verdes, laranja e vermelho, conforme a
tendência a enchentes destas bacias.
Este quadro permitiu a melhor visualização dos resultados, portanto
levou a uma interpretação mais adequada destes. No quadro (figura 2) as bacias
com maiores tendências a cheias são as bacias 1, 10, 13 e 15, que são bacias
menos desenvolvidas hidrograficamente. Secundariamente estão as bacias 3, 8 e 12
como as de maior suscetibilidade a enchentes.
Figura 1
Localização da área de estudo e das sub-bacias
hidrográficas pertencentes ao município de
Caraguatatuba (SP).
Figura 2
Quadro de dados básicos e resultados obtidos na
análise de parâmetros morfométricos das bacias.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A análise morfométrica das bacias permitiu a detecção de irregularidades na
configuração dos cursos de água fornecendo um retrato da atual estado de
equilíbrio ou desequilíbrio em que essas bacias hidrográficas se encontram
quanto à tendência a enchentes.
É importante salientar que todas as bacias da região estão suscetíveis a
enchentes se submetida a eventos climáticos extremos como o ocorrido em 1967,
pois em condições de anomalias pluviométricas as bacias atingem seu limite de
vazão.
Além dos atributos morfométricos também devem ser consideradas as
limitações ou más projeções da estrutura de escoamento pluvio-fluvial, pois as
bacias ao atingirem a planície costeira sofrem retificações dos canais que
diminuem a área de dispersão e captação da água, facilitando obviamente o
transbordamento. A análise dos parâmetros morfométricos poderia ter sido
dificultada pelo número de dados, da mesma forma que a comparação entre bacias
para classificação da tendência a enchentes, no entanto a utilização do SIG
permitiu a conclusão do trabalho.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior)
pela concessão de bolsa de doutorado imprescindível ao desenvolvimento da
pesquisa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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