Anais: Geomorfologia fluvial
Anomalias de drenagem da bacia do ribeirão São Pedro, Paraná, Brasil
AUTORES
Camolezi, B.A. (UEM) ; Fortes, E. (UEM) ; Manieri, D.D. (UFPR)
RESUMO
Este trabalho teve o objetivo de correlacionar dados morfométricos obtidos a
partir do índice de Relação Declividade-Extensão (RDE), Fator de Assimetria de
Bacias (FAB) e Fator de Simetria Topográfica Transversal (FSTT), com dados
morfoestruturais. Os resultados apresentaram relação entre si, indicando um número
maior de anomalias no setor centro-oeste da bacia, evidenciando controle
estrutural da rede de drenagem e das escarpas associadas.
PALAVRAS CHAVES
anomalias de drenagem; análise morfoestrutural; análise morfométrica
ABSTRACT
This paper aimed to correlate morphometric data obtained from the Stream Length
Index, Asymmetry Factor and Drainage Basin Symmetry, with morphostructural data.
The results showed a relation between them, indicating a greater number of
drainage anomalies in the central-western sector of the basin, suggesting
structural control of drainage network and associated escarpments.
KEYWORDS
drainage anomalies; morphostructural analysis; morphometric analysis
INTRODUÇÃO
A rede de drenagem é um importante elemento geomorfológico, pois sua arquitetura
e geometria podem dar subsídios ao entendimento da evolução geomorfológica de
determinada área, visto que é sensível à processos tectônicos, mesmo que
pequenas em escala e magnitude (SCHUMM, 1993). A drenagem é ainda um bom objeto
de análise em estudos morfotectônicos, sendo o primeiro elemento a dar uma
resposta às alterações crustais, que através de análises da sua configuração,
formas, associadas à assimetria de vales e controle deposicional, sugerem
mudanças nos níveis de base (HOWARD, 1967; ETCHEBEHERE, 2000; SCHUMM et al.,
2000).
Alguns parâmetros morfométricos podem ser aplicados com o intuito de auxiliar na
caracterização, na quantificação e na fundamentação teórica sobre alterações ou
anomalias, bem como no controle estrutural da rede de drenagem. Alguns destes
parâmetros foram desenvolvidos em meados do século XX, entre os quais podemos
destacar: Horton, (1945); Strahler, (1952); Howard, (1967); Hack, (1973);
Burnett; Schumm, (1983) dentre outros.
Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo aplicar três índices
morfométricos: Índice de Relação Declividade-Extensão (RDE), Fator de Assimetria
da Bacia (FAB) e Fator de Simetria Topográfica Transversal (FSTT). Os resultados
obtidos permitem o estabelecimento de correlação das informações com os dados
morfoestruturais e morfotectônicos levantados por Manieri (2010). A análise
correlativa possibilitou testar as aplicabilidades dessas metodologias nos
estudos geomorfológicos e neotectônicos.
A bacia hidrográfica do ribeirão São Pedro abrange uma área de pouco mais de 140
km², num importante contexto geológico-geomorfológico de borda de planalto da
Bacia Sedimentar do Paraná, onde ocorrem basaltos da Formação Serra Geral
(JKsg), arenitos das formações Botucatu (JKb) e Piramboia (TrJb), arenitos,
siltitos e argilitos da Formação Rio do Rasto (Prr).
MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados para a elaboração deste trabalho as cartas topográficas de
Faxinal e de Rio Bom, ambas na escala de 1:50.000 (DSG, 2000a,b). Também se
utilizou do mapa morfoestrutural da bacia do ribeirão São Pedro (MANIERI, 2010),
elaborado com base em fotografias aéreas do ITCG (Instituto de Terras,
Cartografia e Geociências), com escala de 1:25.000, da década de 1980, imagens
de radar do projeto TOPODATA (VALERIANO, 2005) e dados coletados em campo.
Aplicadas à identificação de anomalias de drenagens, alguns métodos vem sendo
difundidos como o índice de relação declividade-extensão (HACK, 1973)
apresentado na Eq. 1, fator de assimetria de bacias (HARE; GARDNER, 1985),
apresentado na Eq. 2 e fator de simetria topográfico transversal (HARE; GARDNER,
op. cit.) apresentado na Eq. 3, todos utilizados neste trabalho. Após aplicação
das metodologias supracitadas, procedeu-se a análise dos resultados com base nos
dados morfoestruturais da área, levantados e sistematizados por Manieri (2010).
RDE total = (ΔH/log L); RDE trecho = (ΔH/ΔL) x L Eq. (1)
Onde: ΔH é igual a diferença altimétrica entre os extremos do canal ou do trecho
selecionado, log é o logaritmo natural, L é a extensão total do curso d’água e
ΔL é a extensão do trecho selecionado.
FAB = 100 x (Ra/Ta) Eq. (2)
Onde: Ra = área localizada à margem direita da bacia; Ta = área total da bacia.
T = Da/Dd Eq. (3)
Onde: Da = corresponde à distância da linha média do eixo da bacia de drenagem
até a linha média do cinturão do meandro ativo; Dd = a distância da linha média
da bacia ao divisor da bacia.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
O canal principal da área de estudo foi dividido em 31 trechos. Estes trechos
foram definidos entre cotas topográficas, com equidistância de 20 metros.
Destes, 13 apresentaram-se em equilíbrio, 9 com anomalias de segunda ordem e 9
com anomalias de primeira ordem. A interpolação dos resultados de RDE (Figura
1a) mostrou que a área com maiores índices de anomalia de primeira ordem está
localizada na porção Oeste da bacia, próximo ao médio curso. Já as áreas de
anomalias de segunda ordem ocorrem por toda a extensão da área de estudo. As
áreas em que ocorrem trechos em equilíbrio estão mais ao Norte da bacia e no
baixo curso.
Os trechos que apresentaram maiores índices de anomalia foram aqueles
localizados entre as cotas de 720 e 560 metros, perfazendo uma extensão total de
1231,12 metros. Esses trechos apresentaram os seguintes valores: Cota 720-700 –
82,76; Cota 700-680 – 38,65; Cota 680-660 – 78,66; Cota 660-640 – 101,56; Cota
640-620 – 71,47; Cota 620-600 – 69,01; Cota 600-580 – 16,93 e Cota 580-560 –
11,45.
O perfil longitudinal do canal principal (Figura 1b) apresentou dois
comportamentos distintos. Em ambos os casos o perfil longitudinal apresenta-se
com um desajuste de aproximadamente 100 m em relação à linha de melhor ajuste,
porém no primeiro caso o perfil apresenta-se em forma convexa, e no segundo em
forma côncava, indicando probabilidade de trechos em ascensão e em subsidência,
respectivamente.
O valor médio do FSTT encontrado para a área de estudo foi de 0,25, enquanto que
em algumas áreas esse valor chegou a 0,89. Percebe-se que os valores mais altos
de FSTT estão deslocados para a margem direita da bacia no médio e baixo curso,
sendo que apenas no alto curso é que o canal esta deslocado para a margem
esquerda da bacia.
Para a bacia do ribeirão São Pedro, o fator de assimetria de bacia (FAB)
resultou num valor 44. Este valor pode revelar um provável basculamento para a
margem direita da bacia, em pequena magnitude (valor próximo a 50), que pode ter
proporcionado um deslocamento do canal principal.
Os dados morfométricos de anomalias, tanto pelo Índice de RDE (Figuras 1a e 1b)
quanto pelos índices de FSTT, permitem estabelecer uma análise correlativa com
os dados morfoestruturais levantados por Manieri (2010). As maiores anomalias de
RDE (entre 70 e 100), correspondem à zona limítrofe entre o Compartimento
Morfoestrutural das Cimeiras Basálticas (CMCB) e Compartimento Morfoestrutural
das Superfícies Inumadas (CMSI), que se destacam por escarpas estruturais e
erosivas (ver figura 40 de Manieri, 2010). Nessa área ocorre a mais alta
densidade de lineamentos de toda bacia, com direções predominantes N40-60W,
conforme Manieri (2010), concordante com a disposição geral da escarpa e
discordante do sentido geral da bacia.
Os índices de FSTT, também evidenciam fortes anomalias junto à zona limítrofe do
CMCB e CMSI, formando uma faixa alongada de anomalias de 1ª ordem, concentradas
na parte oeste da bacia. Convém destacar, que a mais ampla zona em equilíbrio
dentro da bacia, encontra-se na margem oposta. Esta zona em equilíbrio
corresponde à área de maior densidade de drenagem da bacia e onde os
interflúvios encontram-se mais arrasados.
Apesar da difícil compreensão do arranjo dos blocos tectônicos, a partir da
ánalise correlativa da morfometria com a morfoestrutura, fica evidente a
importância dos índices de anomalias como indicador de atividade tectônica,
mesmo com a presença da erosão diferencial e influência paleoclimática.
Figura 1a e 1b
Figura 1 - a) interpolação dos resultados do RDE; b)
perfil longitudinal do ribeirão São Pedro e
anomalias localizadas
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A aplicação das três metodologias utilizadas (índice de relação declividade-
extensão, fator de assimetria de bacias e fator de simetria topográfica
transversal) foi importante, pois seus resultados apresentaram relação entre si.
A presença das anomalias verificadas pelos índices mencionados acima corroboraram
com os dados presentes no mapa morfoestrutural de Manieri (2010), mostrando dessa
forma a eficiência dos métodos propostos.
Tanto os índices aplicados neste trabalho quanto os dados de comportamento
morfoestrutural revelaram controle estrutural da rede de drenagem, com presença de
anomalias significativas ao longo da bacia do ribeirão São Pedro.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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