Anais: Outros

A influência da ação antrópica na formação das planícies tecnogênicas no perímetro urbano de Presidente Prudente-SP

AUTORES
Silva, E.C.N. (UNESP (FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA)) ; Nunes, J.O.R. (UNESP (FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA))

RESUMO
Este trabalho apresenta algumas considerações acerca da formação de duas planícies tecnogênicas no perímetro urbano de Presidente Prudente-SP e aborda o ser humano como agente geológico e geomorfológico. Além de trabalhos de campo para o reconhecimento da paisagem e coleta dos materiais tecnogênicos, foram realizadas análises físicas com materiais coletados. Os sedimentos e materiais manufaturados foram relacionados com a histórica de uso e ocupação nas adjacências do ponto de coleta.

PALAVRAS CHAVES
Planícies tecnogênicas; agente geomorfológico; uso e ocupação do solo

ABSTRACT
This work presents some considerations about the formations of two technogenic plains in urban perimeter of Presidente Prudente-SP and addresses the human being as the geological and geomorphological agent. Besides the field works to recognize the landscape and collecting of technogenic materials, it has been made physical analysis with the collected materials. The sediments and manufactured materials were related with the historical of use and occupation around the collect point.

KEYWORDS
technogenic plains; geomorphological agent; soil use and occupation

INTRODUÇÃO
Assim como outras cidades, Presidente Prudente-SP passa por contínuos processos de transformação em suas paisagens, sendo esta formada por elementos naturais e sociais (SUERTEGARAY, 2000). Na busca pela compreensão das relações entre as dinâmicas da natureza e da sociedade que formam as paisagens, há um viés de estudo que tem sido trabalhado no Brasil, principalmente nos últimos vinte anos, que são os depósitos tecnogênicos. Estes são compreendidos como uma das materializações desta relação, considerados como uma classe de formação superficial (PELOGGIA, 2003). De acordo com Oliveira (1990) e Peloggia (1996), o ser humano é considerado um agente geológico, devido a comparação entre os efeitos das ações humanas na superfície terrestre e os resultantes da dinâmica natural. Para Nir (1983), o ser humano pode ser considerado um agente geomorfológico, devido a sua capacidade de modificar as características dos solos, potencializando processos erosivos e outros. Esta ação humana não ocorre de maneira homogênea na superfície terrestre, pois depende de fatores como o momento histórico e as características de determinada sociedade. Com a consideração do homem enquanto agente geológico e geomorfológico há a possibilidade de inclusão na escala do tempo geológico de um novo período relacionado à ação humana, o Quinário, e sua época correspondente, o Tecnógeno (OLIVEIRA, 2005). Desta forma, o holoceno é considerado como a transição entre o Quaternário e o Quinário. Esta afirmação é baseada em Ter-Stepanian (1988) e presente nos estudos de Peloggia (1996) e Oliveira (1990). O presente trabalho pretende demonstrar dois exemplos desta ação geológica e geomorfológica humana na formação de relevos tecnogênicos, em específico as planícies tecnogênicas, no perímetro urbano de Presidente Prudente, onde foram identificados depósitos tecnogênicos com características relacionadas às formas de uso e ocupação do solo.

MATERIAL E MÉTODOS
Foram realizados trabalhos de campo para identificação e coleta de materiais tecnogênicos, relacionando informações sobre o relevo, uso do solo e cobertura vegetal, deposição de resíduos sólidos domésticos e outras. São demonstrados neste trabalho dois exemplos estudados, relacionados à formação de planícies tecnogênicas. A coleta das amostras ocorreu com o auxílio de um tubo de PVC de seis polegadas com um metro de comprimento penetrados no corpo dos depósitos tecnogênicos. Com as amostras em laboratório, os tubos de PVC foram abertos e as camadas de deposição tecnogênicas foram identificadas. Foram utilizados como parâmetros a resistência ao toque, a cor (MUNSELL, 2000) e os materiais constituintes, sendo numeradas da camada mais superficial a mais profunda. Com materiais terrosos identificados em cada camada, realizou-se a análise granulométrica conforme adaptação da metodologia proposta pela EMBRAPA (1997). Através deste procedimento, foram determinadas as porcentagens de areia, silte e argila em cada camada de deposição, e os resultados foram transpostos para o Diagrama Textural proposto pelo U.S.D.A. (1951), determinando as texturas dos materiais. Outro procedimento adotado foi o fracionamento da areia e sua classificação através da escala de Wentworth (1922), citada por Suguio (1973). Com os dados obtidos nas análises, associado à história de uso e ocupação do solo, foi possível identificar os fatores responsáveis pela formação dos depósitos tecnogênicos, bem como classificar os respectivos depósitos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Conforme mencionado, foram reconhecidas duas planícies tecnogênicas no perímetro urbano de Presidente Prudente. Abaixo segue a localização delas (Figura 1). A planície tecnogênica, segundo Peloggia (1998), é caracterizada pela desfiguração das características naturais das antigas várzeas. Outra questão relacionada é a característica de agradação deste compartimento, ou seja, receptor de sedimentos e materiais tecnogênicos advindos das adjacências. A primeira planície tecnogênica foi reconhecida no Parque Residencial Francisco Belo Galindo, implantado em continuidade ao Jardim Morado do Sol. Sua implantação ocorreu na década de 1990. O ponto de coleta ocorreu na planície tecnogênica, ao lado de um curso d’água que a montante do ponto encontra-se canalizado. A montante, também, encontra-se um campinho de futebol imediatamente acima de um ponto no qual ocorreu descarte de sedimentos e materiais manufaturados. Foi coletada a amostra até a profundidade de 98 cm e posteriormente identificadas onze camadas componentes no testemunho, com texturas variando entre Franco Arenosa, Areia Franca e Franca (Figura 2). Apenas nas camadas mais superficiais foram identificados materiais manufaturados, sendo possível relacioná-las a fases de processo de consolidação da ocupação urbana nas áreas a montante do depósito. No caso das camadas mais profundas, estas foram relacionadas a fases de abertura dos loteamentos, inclusive com resquícios de vegetação resultantes do processo de desmatamento a montante. Quanto à resistência dos materiais sedimentares das camadas, foram registradas diferenças. Por exemplo, a camada 2 foi identificada como menos resistente que a camada 1, provavelmente pela maior quantidade de areia na camada 2. Contudo, a camada 6 foi considerada mais dura que a camada 5, mesmo possuindo o maior percentual de areia do depósito. Este fato relaciona-se com a provável compactação ocorrida nessa camada. Os materiais desse depósito foram classificados como úrbicos, ou seja, “[...] detritos urbanos, materiais terrosos que contêm artefatos manufaturados pelo homem moderno [...]” (PELOGGIA, 1996, p.60). Por ser uma área de planície, o local poderia apresentar solos hidromórficos, mas devido a processos de alteração humana da paisagem, ocorreu a formação de depósito tecnogênico, com diferentes camadas de deposição. O depósito reconhecido na Vila Nova Prudente localiza-se numa típica planície tecnogênica. O bairro foi implantado na década de 60. Na amostra coletada de 77,5 cm, as classes texturais identificadas entre as 10 camadas de deposição foram Areia e Areia Franca (Figura 2), dada a quantidade elevada da fração areia encontrada neste depósito, com um mínimo de 84%, bem como foi encontrada quantidade de areia grossa e muito grossa superior a outros depósitos estudados anteriormente em Presidente Prudente. Devido à quantidade expressiva de material tecnogênico manufaturado depositado nesta planície, pôde-se considerar que boa parte dessa areia é advinda de materiais de construção depositados nas adjacências. Com isso, os materiais encontrados foram classificados como úrbicos. Outra questão foi a quantidade de materiais manufaturados encontrados neste depósito, em especial numa profundidade de 75 cm, na última camada coletada, na qual foram observados resíduos sólidos domésticos. Este tipo de material também foi observado nas adjacências do ponto. A relação entre camadas arenosas e a possibilidade de se encontrar materiais manufaturados é outro fator a ser mencionado sobre este depósito, conforme estabelecido por Oliveira (1990). Os dois exemplos demonstram formações de planícies tecnogênicas reconhecidas devido à quantidade de sedimentos e materiais tecnogênicos presentes nas camadas de deposição e aos dados obtidos das adjacências.

Figura 1: Localização das planícies tecnogênicas estudadas no Perímetr

A figura mostra os locais nos quais foram reconhecidas as planícies tecnogênicas.

Figura 2: Esquema ilustrativo das amostras de depósitos tecnogênicos c

Esquema ilustrativo com a foto dos depósitos coletados, as texturas e materiais componentes das camadas

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A existência de planícies tecnogênicas em áreas do perímetro urbano foi reconhecida em Presidente Prudente. Contudo, devido às transformações nas características da paisagem e em vários processos e dinâmicas naturais nas cidades, abre-se a possibilidade de reconhecimento deste tipo de planície em outras cidades. Uma forma de verificação desse fato é a análise dos materiais coletados no interior da planície, podendo possuir materiais manufaturados e sedimentos relacionados a ações humanas nas paisagens, como deposição de resíduos sólidos domésticos, processos de desmatamento, terraplanagens e outros. Assim, através dos dados obtidos durante o trabalho, ficou claro que a interferência humana na paisagem, relacionada a diferentes técnicas de uso e ocupação, pode acarretar na formação de depósitos tecnogênicos.

AGRADECIMENTOS
À FAPESP e à equipe do Laboratório de Sedimentologia e Análise de Solos da FCT/UNESP.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISAS AGROPECUÁRIAS (EMBRAPA). Centro Nacional de Pesquisa de Solos (Rio de Janeiro, R.J.). Manual de Métodos de Análise de Solos. 2.ed. Rio de Janeiro, 1997. 212p. Il. (EMBRAPA – CNPS. Documentos; 1).

MUNSELL. Soil Color Charts. New Windsor, NY: Kollmorgen Instruments – Macbeth Division, 2000. Não paginado.

NIR, D. Man, a geomorphological agent: an introduction to anthropic geomorphology. Jerusalem: Keper Publishing House, 1983.

OLIVEIRA, A. M. S. Depósitos tecnogênicos associados a erosão atual. In: Congresso Brasileiro de geologia de Engenharia, 6, 1990, Salvador. Anais do 6o CBGE e IX COBRAMSEF. Salvador: ABGE: ABMS,1990. p. 411-416.

OLIVEIRA, A. M. S. et al. Tecnógeno: registro da ação geológica do homem. In: SOUZA, C. R. G. [et al] (ed.) Quaternário do Brasil. Ribeirão Preto: Holos, 2005.

PELOGGIA, A. U. G. Delineação e aprofundamento temático da geologia do tecnógeno do município de São Paulo: as conseqüências geológicas da ação do homem sobre a natureza e as determinações geológicas da ação humana em suas particularidades referentes à precária ocupação urbana. 1996, 162f. Tese (Doutorado em Geociências) - Instituto de Geociências, Universidade de São Paulo, São Paulo.

PELOGGIA, A. O homem e o ambiente geológico: geologia, sociedade e ocupação urbana no município de São Paulo. São Paulo: Xamã, 1998.

PELOGGIA, A.U.G. O problema estratigráfico dos depósitos tecnogênicos. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ESTUDOS DO QUATERNÁRIO, 9, 2003, Recife. , Anais eletrônicos... Recife, 2003. Disponível em: <http://www.abequa.org.br/busca.php>. Acesso em: 06/06/2012.

SOIL SURVEY STAFF. Soil survey manual. United States: Department of Agriculture, 1951.

SUERTEGARAY, D. M. A. Espaço geográfico uno e múltiplo. In: SUERTEGARAY, D. M. A.; BASSO, L. A.; VERDUM, R. (org). Ambiente e Lugar no urbano: a Grande Porto Alegre. Porto Alegre: Ed. Universidade/UFRGS, 2000.

SUGUIO, K. Introdução à sedimentologia. São Paulo: Ed. Edgard Blüncher Ltda.; da Universidade de São Paulo, 1973.