Anais: Geomorfologia de encostas

Hidrologia Superficial sob manejo Agroflorestal: Resultados preliminares da Estação experimental Sítio Abaetetuba, Lumiar, Nova Friburgo-RJ.

AUTORES
Lessa, G.L. (PUC-RJ) ; Mattos, B.S. (UERJ -FFP) ; Oliveira, L.N. (UERJ -FFP) ; Baptista, (UERJ -FFP)

RESUMO
O presente estudo tem como objetivo compreender o comportamento da dinâmica hidrológica superficial em uma área sob diferentes tipos de uso e cobertura de solo (Pasto, Pousio, Sistema Agroflorestal-SAF e Floresta), avaliando a partir dos dados mensurados o potencial de intercepção de cada uso, no que diz respeito ao incremento nas taxas de erosão superficial bem como a proteção dos recursos hídricos.

PALAVRAS CHAVES
pluviometria; sistema agroflorestal hidrologia rio de janeiro; agroecologia

ABSTRACT
The present study aims to understand the behavior of the hydrological dynamics in a surface area under different types of use and soil covering (Pasture, Fallow, Agroforestry System-SAF and Forest), evaluated from the data measured the potential interception of each use, with respect to increased rates of surface erosion and the protection of water resources.

KEYWORDS
rainfall; erosion; agroecology

INTRODUÇÃO
As bacias hidrográficas se constituem como sistemas abertos a fluxos de energia e matéria(Coelho Netto,1994).Gregory e Walling(1973)afirmam que a abordagem sistêmica de bacias de drenagem permite uma análise das interações entre seus elementos,relacionando com as formas e processos além das variáveis dos fenômenos geomorfológicos,incluindo as inter-relações entre meio físico e ação antrópica. A erosão é um problema que tem profunda ligação com o uso/cobertura.Os problemas ambientais referentes ao modelo industrial de agricultura, compactação(Barros,2007),contaminação de solos,lixiviação e mudanças indesejadas nos fluxos hídricos(Badgley,1998). Além da introdução de pastagens nas bacias rurais como incremento nas taxas de erosão sub-superficial(Leão,2005).Remetem a necessidade de propostas alternativas de manejo agrícola,como os Sistemas Agroflorestais baseando-se em princípios como a sucessão natural (Almeida,2002).Mendes(2006)ressalta a importância da prática do pousio na redução da erosão superficial em encostas íngremes.Mendonça(2008)destaca o potencial dos SAFs na capacidade de retenção hídrica pelo compartimento de serrapilheira,bem como no aumento da infiltração da água no solo através do compartimento de raízes.Young (1997), destaca que os efeitos do manejo agroflorestal na manutenção da fertilidade do solo podem ser considerados como fatores diretos no controle da erosão,além da proteção devido à cobertura do solo fornecida pelas copas das árvores e da manta orgânica e do papel das árvores como barreira ao escoamento superficial.Segundo Oliveira(2007)os SAFs podem produzir paisagens mais sustentáveis nas bacias de uso rural, planejando- se a ocupação humana e integrando os processos e o funcionamento geográfico,ecológico e hidrológico de cada sistema local/regional. O estudo da erosão superficial no Rio de Janeiro é de grande importância,devido o predomínio do clima tropical em áreas montanhosas,solos pouco espessos e intensa produção vegetal(Mendes,2006)

MATERIAL E MÉTODOS
A área de estudo localiza-se no Sítio Abaetetuba, Toca da Onça, Lumiar, 5º distrito de Nova Friburgo-RJ. Inserida na sub-bacia do Córrego das Paineiras, localizada na bacia hidrográfica do Rio Bonito que faz parte da ÁPP de Macaé de Cima, na região serrana do Estado do Rio de Janeiro, a hidrografia é formada pela a bacia do Rio Macaé, que divide os distritos de Lumiar e São Pedro da Serra. (DNPM-CPRM,1980). O clima, segundo a classificação de Koppen, se aproxima ao tipo Cfa (clima temperado úmido com verão quente.). A geologia predominante é de rochas ígneas e metamórficas pré-cambrianas. A morfologia da região é caracterizada por serras proeminentes de relevo irregular, com morros de vertentes íngremes com suas cotas altimétricas variando entre 800 e 1100m, rodeadas por vales profundos e pequenas várzeas (DNPM- CPRM,1980). Os solos encontrados são de Cambissolos, seguido de Latossolos Vermelho-amarelo associados ao relevo montanhoso e fortemente ondulado, e de Neossolos Litólicos e afloramentos de rocha comuns em topografia mais acidentada (EMBRAPA, 1999). Segundo GOMES (2009) no Sítio Abaetetuba a classificação textural está entre franco-arenoso e franco-argilo-arenoso nos diferentes tipos de uso/cobertura (Floresta, SAF e Pasto). Para realização do estudo, foram instaladas 4 parcelas de erosão (10m x 2m) do tipo Gerlach (1967) em distintos ambientes Pasto,Pousio,Floresta e Sistema Agroflorestal (SAF), localizadas em declividades entre 25 e 30 graus. Esse procedimento tem como objetivo estabelecer uma área conhecida para a quantificação das taxas de erosão promovidas pelo escoamento superficial em cada uso/cobertura. Foram instalados e distribuídos 15 pluviômetros localizados em área de dossel aberto, possibilitando a mensuração dos valores de entrada efetiva de precipitação no sistema para a realização da comparação, no que diz respeito à mensuração da intercepção pela vegetação nos diferentes tipos de uso/cobertura do solo definidos para amostragem no estudo.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da mensuração dos dados de pluviometria, escoamento superficial e erosão no mês de março de 2012, pode-se constatar que a média pluviométrica nas áreas de pasto, pousio, floresta, SAF e sem cobertura foram, respectivamente, 38mm, 28,8mm, 21,7mm, 30,7mm e 36mm, verificou-se no sistema pasto a maior média pluviométrica, em detrimento ao sistema floresta que apresentou a menor índice, uma vez que o pasto caracteriza-se por possuir menor interceptação de cobertura vegetal. Cabe destacar que a pluviometria do dia 29 de março, apresenta maior relevância, havendo pequena variação da intercepção nas áreas de pousio, floresta e SAF, destoando da área de pasto, que obteve o maior valor (124mm). Esse quadro se repete quanto aos dados de escoamento superficial, onde o pasto apresenta os maiores valores, demonstrando que este uso se configura como um ambiente de descontinuidade hidráulica (Leão, 2005). Quanto ao escoamento superficial, foram obtidos nas áreas de pasto valores entre 0,4mm a 2,8mm, pousio 0,1mm a 1,4mm e floresta 0,2mm a 1,3mm (figura1. B). Estes resultados são provenientes da diferença da cobertura vegetal, que se configura ao pasto, sistema radicular fasciculado que propiciam os fluxos superficiais, influenciando na infiltração do solo, em detrimento ao SAF, que possui menor escoamento, variando entre 0,2mm e 1,2mm. Segundo estudos de (Gomes, 2009) desenvolvidos no Sítio Abaetetuba o SAF apresentou macroporosidade e teor matéria orgânica nos primeiros centímetros (0-5/5-10) do solo, valores próximos ao da área de mata, demonstrando o potencial desse tipo de uso no aumento da infiltração. Além disso, a textura franco arenosa encontrada para área de SAF e Mata neste mesmo estudo (Op. Cit.) também caracterizam o SAF como um ambiente de infiltração, por apresentar as frações do solo equilibradas, constituindo distribuição efetiva da porosidade. Com relação aos dados de erosão, foram analisados os quatro sistemas, em Kg/20m², onde os resultados obtidos mostraram-se similares. O pasto, com maior perda entre 0,2kg/20m² 1,2kg/20m², pode apresentar comportamento hidrológico dinâmico nos primeiros centímetros do solo, por oferecer maior proteção e apresentar uma cobertura mais homogênea da superfície mineral. O pousio com perda maior que o esperado, entre 0,1kg/20m² a 1,1kg/20m² apresenta-se como área de regeneração natural, onde a arquitetura da copa das árvores menos densa, em relação à vegetação pouco estratificada, favorece entrada maior de água, e a menor quantidade de serrapilheira agregada ao solo, evidenciando o sistema de pousio o de maior perda de sedimentos. Porém, (Santos, 2008), no município de São Pedro da Serra – RJ, notou que em o sistema de pousio tende a promove a conservação dos solos, uma vez que, apresenta de modo geral, os menores valores de perda de água e solo, com dados inferiores a 1 litro ou nulos. A floresta, que possui seus valores entre 0,2kg/20m² e 0,8kg/20m², propícia a interceptação das chuvas armazenando-a em suas copas sejam elas arbóreas ou arbustivas, e parte da mesma irá evapotranspirar retornando a atmosfera durante e após as chuvas. Ressalta-se que dentre os sistemas, o SAF, devido ao manejo realizado, apresentou menor perda de solo (0,1kg/20m). Segundo Gomes (2009) nesta área, a poda seletiva tende a contribuir para o incremento do pacote de serrapilheira influenciando como reservatório de água e diminuindo o potencial de mobilização das partículas de solo. Franco et.al. (2002) verificaram na zona da mata mineira, a variação de perda de solo nos SAFs valores entre 6,8 a 578,5kg/ha/ano, aproximando-se ao das comunidades florestais, nos sistemas convencionais, que variaram de 20,2 a 22.183,9 kg/ha/ano, demonstrando a eficiência desses sistemas na diminuição da suscetibilidade a erosão.

Gráficos de pluviometria e escoamento

Figura 1 (A) Pluviometria do mês de Março /2012 dos sistemas de pastos, pousio, floresta e SAF. Figura 1 (B) Escoamento superficial durante o período

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Percebe-se a partir de dados preliminares obtidos na estação experimental que a proposta de manejo desenvolvida através do sistema agroflorestal tem sido mais eficaz do que os demais tipos de uso e cobertura do solo utilizados para comparação no que diz respeito aos incrementos das taxas de erosão superficial, demonstrando a consonância desse tipo de manejo com as propostas da Agência Nacional de Água (ANA – Projeto Produtores de Água), Programa Rio Rural – RJ e o Plano Diretor Participativo do município de Nova Friburgo, 2007, que define a região onde o estudo vem sendo desenvolvido como área de desenvolvimento rural sustentável (ADRS).

AGRADECIMENTOS
Agradecemos ao apoio financeiro da FAPERJ no projeto E-26/111.548/211, aos coordenadores do Laboratório de Geociências da UERJ-Campus São Gonçalo (LABGEO) pelo suporte nas instalações de campo e pelo apoio nas etapas laboratoriais. Também gostaríamos de agradecer aos componentes da equipe do LABGEO pelo grande apoio dado nas etapas e procedimentos laboratoriais do experimento.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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