Autores

Pontes, R.C. (UNIVERISDADE FEDERAL DE SANTA MARIA) ; Aguiar, L.M. (UNIVERISDADE FEDERAL DE SANTA MARIA) ; Manoela, M. (UNIVERISDADE FEDERAL DE SANTA MARIA) ; Werlang, M.K. (UNIVERISDADE FEDERAL DE SANTA MARIA) ; Viera, V. (UNIVERISDADE FEDERAL DE SANTA MARIA)

Resumo

O presente trabalho como objetivo principal a utilização técnicas de Geoprocessamento e Sistema de Informação Geográfica (SIG) para proceder à análise de variáveis morfométricas da Microbacia do Arroio Cancela, localizada no município de Santa Maria - RS. Para isso, processaram-se os dados da base cartográfica da área de estudo, referentes às curvas de nível, aos pontos cotados e à área da bacia hidrográfica. Com a manipulação dos dados no programa ArcGIS 10.1, foi possível gerar o Modelo Digital do Terreno (MDT), a declividade, a hipsometria e os índices morfométricos. A partir dessas informações, realizou-se a análise morfométrica da área de estudo, tornando evidentes suas características topográficas e a dinâmica da bacia hidrográfica. O uso das técnicas de Geoprocessamento permitiu, assim, agilidade na análise da morfometria, compondo a caracterização geral da bacia hidrográfica e o entendimento de seu funcionamento.

Palavras chaves

Bacia hidrográfica; Delimitação automática; Geoprocessamento

Introdução

A caracterização morfométrica de uma bacia hidrográfica é um dos primeiros e mais comuns procedimentos executados em análises hidrológicas ou ambientais e tem como desígnio elucidar as várias questões relacionadas ao entendimento da dinâmica ambiental local e regional (TEODORO et al., 2007). Para Heller e Pádua (2006), uma bacia hidrográfica é uma unidade fisiográfica, limitada por divisores topográficos, que recolhe a precipitação e age como um reservatório de água e sedimentos, defluindo-os em uma seção fluvial única. Para Christofoletti (1980), a análise morfométrica de bacias hidrográficas pode ser dividida em 4 itens: 1. ordenação ou hierarquização da rede de drenagem; 2. análise linear da rede de drenagem; 3. análise areal da bacia hidrográfica, englobando vários índices que utilizam medições planimétricas, além da lineares; e 4. análise hipsométrica. As fórmulas para a obtenção dos parâmetros morfométricos podem ser encontradas em Antoneli e Thomaz (2007), Christofolletti (1969), Villela e Mattos (1975), Tonello (2005) e Cardoso et al. (2006) sendo: área, perímetro, fator de forma, coeficiente de compacidade, índice de circularidade e densidade hidrográfica. A primeira fórmula consiste em toda área drenada pelo sistema pluvial inclusa entre seus divisores topográficos, projetada em plano horizontal, sendo elemento básico para o cálculo de diversos índices morfométricos (TONELLO, 2005). O fator de forma, por sua vez, relaciona a forma da bacia com a de um retângulo, correspondendo à razão entre a largura média e o comprimento axial da bacia, sendo influenciada por algumas características, principalmente pela geologia. Outra fórmula é o coeficiente de compacidade, que relaciona a forma da bacia com um círculo. Constitui a relação entre o perímetro da bacia e a circunferência de um círculo de área igual à área da bacia (CARDOSO et al., 2006). De forma similar ao coeficiente de compacidade, o índice de circularidade tende para a unidade à medida que a bacia se aproxima da forma circular e diminui à medida que a forma se torna alongada, por fim, a densidade hidrográfica é a relação existente entre o número de rios ou cursos d’água e a área da bacia hidrográfica. A finalidade deste índice é comparar a frequência ou a quantidade de cursos d’água existentes em uma área de tamanho padrão, como, por exemplo, em um quilômetro quadrado (CHRISTOFOLETTI, 1969). O relevo pode ser caracterizado pela declividade, pela altitude e pela amplitude altimétrica. A declividade relaciona-se com a velocidade em que acontece o escoamento superficial, afetando o tempo que a água da chuva leva para concentrar-se nos leitos fluviais que constituem a rede de drenagem das bacias. Ressalta-se que os picos de enchente, infiltração e susceptibilidade para erosão dos solos dependem da rapidez com que ocorre o escoamento sobre os terrenos da bacia (VILLELA; MATTOS, 1975). Segundo Cardoso et al. (2006), Robert E. Horton, em 1945, foi quem propôs de modo mais preciso os critérios de ordenação dos cursos d’água. Ainda conforme Cardoso et al. (2006), outra metodologia para descrever a ordem dos cursos d’água foi proposta por Arthur Newell Strahler. Para Strahler (1952 apud CARDOSO et al., 2006), Já a densidade de drenagem, segundo Christofoletti (1969), correlaciona o comprimento total dos canais ou rios com a área da bacia hidrográfica. O índice de sinuosidade, consiste na relação entre o comprimento do canal principal e a distância vetorial entre os extremos do canal. O objetivo geral deste estudo busca analisar as características morfométricas dessa microbacia, com os seguintes objetivos específicos: a) delimitar e caracterizar, por meio de geotecnologias, a microbacia hidrográfica do Arroio Cancela, situada na área urbana do município de Santa Maria; b) gerar o Modelo Digital do Terreno (MDT); calcular os atributos morfométricos. Este estudo também visa contribuir para um melhor conhecimento da área em questão e auxiliar estudos futuros.

Material e métodos

O processamento dos dados foi realizado por meio das seguintes etapas: 1) aquisição da base vetorial contínua do Rio Grande do Sul em escala 1:50.000, especificamente para curvas de nível, pontos cotados, hidrografia e limites municipais; 2) projeção dos dados para o sistema de coordenadas Universal Transversa Mercator (UTM) e sistema de referência Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas(SIRGAS 2000); 3) interpolação dos valores altimétricos para a geração da grade triangular irregular e do modelo digital de elevação; e 4) delimitação automática da microbacia de interesse. Para a elaboração do Modelo Digital de Elevação (MDE) podem ser utilizadas variadas técnicas de geoprocessamento: ortofotos, imagens de satélite, imagens de radar, extração de dados de fotogrametria e também pela vetorização ou digitalização de dados oriundos de cartas topográficas, como, por exemplo, curvas de nível e pontos cotados etc. Como mostra König (2014), é crescente o requerimento de materiais que representem de maneira satisfatória as características diversas do ambiente, de preferência em um formato numérico para fins de geoprocessamento. No caso específico deste trabalho, optou-se por utilizar a base cartográfica vetorial contínua do Rio Grande do Sul (Hasenack; Weber, 2010), contendo os dados da altimetria (pontos cotados e curvas de nível), resultantes da vetorização de 462 cartas da Diretoria de Serviço Geográfico do Exército (DSG) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na escala 1:50.000, em um recorte para abranger apenas a área urbana do município de Santa Maria. Para realizar o procedimento de elaboração da Grade Triangular Irregular (TIN) no programa ArcGis, utilizaram-se como dados de entrada os pontos cotados e as curvas de nível do recorte da área. A etapa de processamento a extração da drenagem foi efetuada com o arquivo raster de MDE, gerado a partir da TIN, por meio de uma sequência de procedimentos automatizados através do ArcHydro tools, que permitem obter os dados da direção de fluxo, o fluxo acumulado, a definição e segmentação dos cursos d’água, a delimitação das bacias, entre outros atributos. As ferramenta de geoprocesamento inseridas no ArcHydro, permitem manipular os dados geoespaciais dos recursos hídricos conforme as etapas descritas a seguir: a) definição da direção de fluxo da drenagem em cada célula (Flow Direction), gerando uma grade regular com as direções baseadas na maior linha de declividade encontrada no MDE. A direção de fluxo deve conter apenas os valores 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64 e 128, que representam as oito células adjacentes por onde a água deve fluir; b) identificação e preenchimento dos vazios na imagem; c) acumulação do fluxo (Flow Accumulation) de acordo com Rennó et al. (2008). A direção de fluxo define as relações hidrológicas entre pontos diferentes dentro de uma bacia hidrográfica. Segundo Sobrinho et al. (2010), a continuidade topológica para as direções de fluxo é necessária para que uma drenagem funcional possa existir. As conexões hidrológicas de direção de fluxo entre dois pontos em uma superfície não são as mesmas que aquelas baseadas em distância euclidiana. Os vazios das células da imagem que não continham informações referentes à altitude ou que continham informações que não eram verdadeiras foram corrigidos para o preenchimento de informações altimétricas. Essa etapa consiste em preencher um conjunto de uma ou mais células que não contém nenhuma célula com altitude menor ao seu redor e dessa maneira, os valores modificados eliminam os problemas de vazios nas células. Caso estas estejam rodeadas por células de elevação superior, o valor referente à água que está contida nas células não será verdadeiro. Com o resultado do processamento dos dados realizados na sequencia estabelecida pelos algoritmos do ArcHydro, procedeu-se a elaboração dos mapas de altitudes e declividades da área de estudo, bem como a análise dos parâmetros morfométricos da bacia.

Resultado e discussão

Para a criação do mapa altitudes da área, foi estabelecido o intervalo altimétrico que corresponde à região, conforme observado nas propriedades do modelo, considerando-se os valores máximo e mínimo. No caso da região da bacia, esses valores variam de 53 a 373 metros de altitude. Consideraram-se cinco classes, identificadas com cores mais fortes para áreas de maior altitude e cores mais fracas para áreas de menores altitudes (Figura 1). O mapa de declividade foi elaborado a partir dos dados SRTM, recortado para abranger apenas a área de estudo, com o uso das ferramentas contidas na extensão Spatial Analyst do ArcGIS 10.1 (Figura 2). Segundo Silva e Rodrigues (2009), o mapa de declividade tem o objetivo de demonstrar as inclinações de uma área em relação a um eixo horizontal. Serve como fonte de informações acerca das formas do relevo, das aptidões agrícolas, dos riscos de erosão, das restrições de uso e da ocupação urbana, por exemplo. As classes adotadas, no que diz respeito aos terrenos, foram as estabelecidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) (2014): a) plano – superfície de topografia esbatida ou horizontal, onde os desníveis são muito pequenos, com declividades variáveis de 0 a 3%; b) suave ondulado – superfície de topografia pouco movimentada, apresentando declives suaves, predominantemente variáveis de 3 a 8%; c) moderadamente ondulado – superfície de topografia pouco movimentada, constituída de um conjunto de colinas e/ou outeiros, apresentando declives moderados, predominantemente variáveis entre 8 e 20%; 30 d) forte ondulado – superfície de topografia movimentada, formada por outeiros e/ou morros (elevações de 50 a 100m e de 100 a 200m de altitudes relativas, respectivamente) e raramente por colinas, com declives fortes, predominantemente variáveis de 20 a 45%; e) montanhoso – superfície de topografia vigorosa, com predomínio de formas acidentadas, usualmente constituídas de morros, montanhas, maciços montanhosos e alinhamentos montanhosos, apresentando desnivelamentos relativamente grandes e declives fortes e muito fortes, predominantemente variáveis de 45 a 75%; f) escarpado – áreas com predomínio de formas abruptas, compreendendo superfícies muito íngremes e escarpamentos, tais como aparados, itaimbés, frentes de cuestas, falésias, vertentes de declives muito fortes, usualmente ultrapassando 75% de declividade. A microbacia do Arroio Cancela é de segunda ordem (STRAHLER, 1952 apud CARDOSO et al., 2006), com uma área de 4,83 km² e um perímetro de 9,01 km. O comprimento do canal principal é de 3,06 km, com uma rede de drenagem total de 43,05 km. A densidade de drenagem é de 8,91km/km², indicando, dessa forma, que a microbacia tem uma média capacidade de drenagem. A densidade de drenagem é um fator importante para indicar o grau de desenvolvimento do sistema de drenagem de uma bacia. Sendo assim, este índice fornece uma indicação da eficiência da drenagem da bacia, a qual é expressa pela relação entre o somatório dos comprimentos de todos os canais da rede–sejam eles perenes, intermitentes ou temporários– e a área total da bacia (ANTONELI; THOMAZ, 2007). Christofoletti (1969) destaca que valores menores que 7,5 km/km2indicambaixa densidade de drenagem, enquanto que valores entre 7,5 e 10,0 km/km2indicammédia densidade. Valores acima de 10,0 km/km2, por sua vez,apontam umaalta densidade hidrográfica. A bacia em estudo caracteriza-se por termédia densidade de drenagem, ou seja, apresenta um relevo declivoso com rampas acentuadas. Já de acordo com Villela e Mattos (1975), esse mesmo índice (densidade de drenagem) pode variar de 0,5 km2/km2, em bacias com drenagem pobre, a 3,5 km/km2 ou mais, em bacias bem-drenadas, o que indica que a bacia em estudo possui média capacidade de drenagem. O fator de forma é de 0,5158, e o índice de circularidade é de 0,75, indicando que o perímetro da bacia tem uma forma mais arredondada euma tendência mediana de cheias (CARDOSO et al., 2006). O índice de sinuosidade próximo a um indica que os canais tendem a ser retilíneos, ao passo que os valores superiores a 2,0 indicam que os canais tendem a ser tortuosos. Os valores intermediários, por sua vez, indicam formas transicionais, regulares e irregulares. Dessa forma, o Arroio Cancela possui um canal retilíneo, o qual, segundo Antoneli e Thomaz (2007), favorece um maior transporte de sedimento. Os resultados da caracterização morfométrica da microbacia do Arroio Cancela estão apresentados na tabela 1, exposta a seguir.

Figura 1.

Mapa de altitudes da Bacia do Arroio Cancela.

Figura 2

Mapa de declividades da Bacia do Arroio Cancela.

Tabela 1

Resultados da caracterização morfométrica da bacia do Arroio Cancela.

Considerações Finais

Os objetivos propostos foram alcançados satisfatoriamente, sendo que os resultados obtidos permitiram observar o comportamento do escoamento superficial das águas e a interpretação dos índices calculados, concluindo que a microbacia do Arroio Cancela tem uma média capacidade de drenagem com uma tendência para o formato arredondado, indicando uma média capacidade de cheias. A análise dos MDE e suas drenagens são pertinentes para a escala regional, porém recomenda-se que esses estudos sejam ampliados para outras escalas de análise. A metodologia aplicada no desenvolvimento das atividades propostas mostrou- se pertinente para a análise morfométrica da área de estudo. Os processos automatizados da ferramenta ArcHydro são executados de forma ágil e sistemática, o que, para áreas de grande extensão, promove uma aplicabilidade de baixo custo e alta precisão dentro dos padrões cartográficos. Esta pesquisa apresenta uma prévia das análises que podem ser feitas em estudos hidrológicos a fim de aprofundar os diagnósticos ambientais. Os dados utilizados para o mapeamento podem ser muito úteis para uma tomada de decisão, bem como para monitorar as ações e as necessidades de uma bacia hidrográfica. As análises morfométricas e hidrológicas de bacias hidrográficas são de grande importância para o desenvolvimento sustentável, pois as características das variáveis estudadas estão atreladas aos processos geomorfológicos e hidrológicos e à ocupação do solo.

Agradecimentos

Referências

ANTONELI, V; THOMAZ, E.L. Caracterização do meio físico da bacia do Arroio BoaVista, Guamiranga-PR. Rev. Caminhos da Geografia, Uberlândia, v.8, n.21, p46-58, jun.2007.

CARDOSO, C. A. et al. Caracterização morfométrica da bacia hidrográfica do rio Debossan,Nova Friburgo-RJ. Árvore, Viçosa, v. 30, n. 2, p. 241-248, 2006.

CRISTOFOLETTI, A. Análise morfométrica de bacias hidrográficas. Rev.Geomorfologia, Campinas, v.18, n.9, p.35-64, 1969.

CHRISTOFOLETTI, A. Geomorfologia. São Paulo: Edgard Blücher, 1980.
EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA (EMBRAPA). Brasil em
relevo. Disponível em: <http://www.relevobr.cnpm.embrapa.br/download/rs/rs.htm>. Acessoem: 13 out. 2017.

HELLER, L. PÁDUA, V. L. Abastecimento de água para consumo humano. BeloHorizonte: Ed. UFMG, 2006.

KÖNIG, D. Comparação de métodos de interpolação na geração de modelos digitais deelevação: estudo de caso em área no município de São José, Santa Catarina. In: SIMPÓSIO MINEIRO DE GEOGRAFIA, 1., 2014, Alfenas. Anais... Alfenas: Unifal, 2014. p. 1794-1805.

RENNÓ et al. HAND, a new terrain descriptor using SRTM-DEM: Mapping terra-firmerainforest environments in Amazonia. Remote Sensing of Environment, New York, v. 112, n.9, p. 3469-3481, 2008.

SILVA, T. I.; RODRIGUES, S. C. elaboração de um tutorial de cartografia geomorfológicacomo alternativa para o ensino de geomorfologia. Revista Geográfica Acadêmica, BoaVista, v. 3, p. 85-94, 2009.

SOBRINHO et al. Delimitação automática de bacias hidrográficas utilizando dados SRTM. Revista Engenharia Agrícola, Jaboticabal, v. 30, p. 46-57, 2010.

TEODORO, V. L. I. et al. O conceito de bacia hidrográfica e a importância da caracterizaçãomorfométrica para o entendimento da dinâmica ambiental local. Revista Uniara, Araraquara,v. 20, p. 137-156, 2007.

TONELLO, K. C. Análise hidroambiental da bacia hidrográfica da cachoeira das
Pombas, Guanhães, MG. 2005. 69 f. Tese (Doutorado em Ciências Florestal) -Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, 2005.

VILLELA, S. M.; MATTOS, A. Hidrologia aplicada. São Paulo: McGrawHill do Brasil,1975.