Autores

Dal Pozzolo dos Santos, D. (UFSM) ; Sayão Penna e Souza, B. (UFSM)

Resumo

Este artigo apresenta um estudo da distribuição de campos de dunas no Polo Sul de Marte (MC-30) baseado na MGD3 (Mars Global Digital Dune Database) do USGS. Foram identificados 746 campos de dunas, ocupando uma area de 74.919 Km2 ,com aproximadamente 15.000 km2 < 1 km2,pequenos campos identificados com imagens de alta resolução . Destes 425 campos de dunas estão localizadas no interior de crateras de impacto.Os tipos mais comuns são Mares de Areia(SS), Transversais (T), e Barcanóides (Bd). Outro destaque são as dunas Bullseye, alinhadas em um padrão concentrico com as bordas das crateras e não possui analogos terrestres .

Palavras chaves

Geomorfologia Planetária; Marte; Dunas

Introdução

Os Estudos de Geologia, Geomorfologia, Climatologia não se restringem ao planeta Terra, sendo importante ferramenta de comparação e análise. Conforme Mendonça (1997), p.41 “A criação de novos espaços externos a Terra é uma realidade derivada da odisseia humana em busca de novas áreas é algo concernente à própria capacidade intelectual do ser humano. Esta conquista espacial e os seus reflexos sobre a sociedade configura-se certamente um novo paradigma cientifico, quase restrito na atualidade ao domínio das ciências físicas e naturais, porém de forte conotação geográfica Isto para não falar na geologia, ramo do conhecimento com pesquisas bastante desenvolvidas sobre as características da Lua e Marte, por exemplo.” Para Baker & Twindale (1991, p.90), a Geomorfologia é mais intelectualmente estimulante e quando ocorre uma intima associação entre o cientista e a paisagem. Esta associação entre fatos e fenômenos é facilitada sem as amarras como, paradigmas obsoletos, modismos ou ideologias, sendo mais focada na descoberta de novos fenômenos e no desenvolvimento de explicações, aceitando mais facilmente paradigmas novos.Há também uma significativa valorização de estudos de fenomenos raros e anômalos e nas condições particulares que levaram a sua formação. Esses pesquisadores foram considerados até a década de 1990 considerados renegados (Maverick Geomorphologists), pois trabalhavam fora das correntes principais de pensamento geográfico. Sobre a atividade eólica no planeta Marte, Greeley (1994, p.181) comenta que devido à baixa densidade atmosférica são necessárias altas velocidades do vento para mover as partículas. A erosão e deflação gerada pelo vento leva a formação de certas formas de relevo observadas pela primeira vez pela Mariner 9, a primeira sonda a entrar em órbita de Marte, como yardangs (colinas esculpidas pelo vento), crateras erodidas e/ou encobertas por sedimentos eólicos e campos de dunas, especialmente nas latitudes médias e polares. Campos de dunas menores podem ser identificados em vários locais, muitas vezes associados com crateras de impacto. Em geral as dunas marcianas apresentam formas similares às dunas terrestres (ripple marks, barcanas, barcanóides, TARS (Transverse Aeolian Ridges, cadeias transversais eólicas), porém, dunas estrela e dunas longitudinais aparentemente devem ser muito raras, o que sugere pouca variação na direção do vento. Conforme Melosh (2011, p365) as paisagens dominadas pelo vento recebem especial atenção dos geomorfólogos por sua relativa raridade, sendo notavelmente diferente do que é comum em nosso planeta é sua instabilidade. As dunas estão constantemente movendo-se em um movimento lento, alterando suas formas. As dunas barcanas apresentam forma de lua crescente com suas pontas e sua face mais íngreme oposta ao vento. Uma duna nasce quando a deposição de areia supera a erosão pelo vento. Se o vento soprar sempre na mesma direção, a duna ganha uma forma chamada barcana. A areia salta sobre as costas da barcana e desliza para frente, fazendo a duna se mover e crescer. Um outro tipo de duna bastante raro e incomum descrito por Hayward et (2014, p.40) as dunas Bullseye, cujas cristas encontram-se alinhadas paralelas a borda da cratera da qual se encontram , formando uma série de anéis concêntricos. Estas dunas não possuem análogos terrestres, sendo mais numerosas no hemisfério sul marciano, entre as latitudes de 59ºS e 80ºS. De acordo com Fenton & Hayward (2010)p.118, uma das possíveis explicações para as dunas Bullseye é de que suas bandas transversaisconcêntricas foram criadas tanto por ventos de drenagem (catabáticos), que fluem radialmente ao redor das paredes internas em direção ao fundo da cratera, ou correntes de ar ascendentes, também radiais devido ao mesmo controle topográfico de mesoescala das paredes íngremes do interior das crateras.

Material e métodos

Para a elaboração deste trabalho foi empregada a Mars Global Digital Dunes Database (MGD3) do USGS elaborada por Hayward et al (2007), uma base de dados digital que torna possível visualizar as dunas em um contexto global, bem como uma perspectiva regional/local significativa dos processos eólicos que moldaram a superfície marciana, cruzando a localização geográfica com outros atributos como mapas geológicos e topográficos. Fornece uma ampla gama de fontes cartográficas tanto raster (imagens) quanto vetoriais (shapefiles). Os dados estão divididos em três blocos Polo Norte (NP-USGS Mars Chart MC-1) 90ºN a 60ºN Equatorial (EQ-USGS Mars Chart MC-2 a MC-29) de 65ºN a 65ºS e Polo Sul (SP NP-USGS Mars Chart MC-30) de 60ºS a 90ºS. No Polo Norte (NP-MC-1) as dunas que foram identificadas são parte de grandes mares de areia (vastas regiões de dunas) dispostos ao redor da calota polar, ocupando uma área de ~845.000 Km2 na faixa entre 75º a 80ºN.Por sua vez a maior parte dos campos de dunas na região equatorial(EQ- MC-2 a 29) ~70.000km2 e no Polo sul (SP-MC- 30) ~ 60.000 Km2 (com mais ~15.000Km2 com os dados de alta resolução) localizam- se no interior de crateras de impacto. Os dados do MGD3 estão disponíveis no website USGS < http://pubs.usgs.gov/of/2012/1259 > na projeção Polar Esterográfica. Como principal fonte de dados foram utilizadas as imagens de infravermelho termal diurno do Sensor THEMIS (Thermal Emission Imaging System) na resolução de 100m/pixel, capaz de revelar várias características. Devido ao pequeno tamanho das partículas, as dunas possuem uma inercia termal do que as rochas ao seu redor, ou seja, apresentam uma maior variação de temperatura durante o dia, o que as torna mais fáceis de detectar. Hayward et al (2014),p.39, destaca que no Banco de Dados do Polo Sul (SP) marciano além dos dados Themis foram incorporados dados de sensores de maior resolução espacial como Themis VIS (18m/pixel), MOC NA (1,5m/pixel), MRO CTX (6 m/pixel) MRO HiRISE (0,25 -0,5 m/pixel). Com estas imagens mais refinadas, identificaram ~ 15.000 km 2 de campos de dunas < 1 km2. Estes dados novos consistem principalmente de elementos que não possuem a assinatura termal típica de um campo de dunas como um fino lençol de areia não associado às formas de dunas e dunas que aparentam estar parcialmente cimentadas ou erodidas. A ausência de elementos similares nos bancos de dados EQ e NP não implica que estes não estejam presentes, muito pelo contrario é provável que existam. Para visualização e análise do foram empregados os softwares Global Mapper 15.1 e QGIS 2.14. Foram selecionadas crateras com campos de dunas na região conhecida como Promethei Terra, localizada entre as longitudes 90º E e 120º E , e as latitudes 65º S e 75ºS na qual foram comparados a área das crateras de impacto com a área dos campos de dunas.

Resultado e discussão

A Figura 1 mostra a distribuição geográfica dos campos de dunas na região do Polo Sul marciano. Foram identificados 74.919 km2 de dunas divididos em 746 campos de dunas destes 425 ou 56,97% delas encontram-se no interior de crateras. Quanto as longitudes, 97 ou 13% dos campos de dunas estão localizados entre 90ºE e 120ºE , nas regiões conhecidas como Promethei Terra Na região Promethei Terra, conforme o mapa geológico elaborado por Tanaka et al (2014)p.14 esta área é classificada como sendo mNh (middle Noachian highlands, Terras altas do período noachiano médio,com cerca de 3.96 bilhões de anos) sendo fortemente craterizada, e marcada localmente por densos vales, grabens e cordilheiras alinhadas. Composta por material indiferenciado de impacto, vulcânico, fluvial e bacia, com degradação moderada a forte. Outros depósitos pertencem à unidade Apu (Amazonian polar undiferentiated com cerca de 274 milhões de anos) formadas por gelo de água com pequenas quantidades de poeira intermixada em intervalos. Sequências locais de inferiores feitas de dunas congeladas intercaladas em camadas de gelo. A calota polar do hemisfério sul é mais fria que a calota polar do hemisfério norte devido a maior altitude, apresentando uma camada sazonal de gelo de dióxido de carbono de cerca de 300 m de espessura. Quanto aos tipos de dunas, como mostra a Tabela I, a grande presença de mares de areia (SS), dunas transversais (T) e barcanóides (Bd) sugerem um suprimento abundante de areia e regime de vento unidirecional. Cada campo de duna pode apresentar diversos tipos de dunas. Apesar do uso de imagens de alta resolução, 157 campos de dunas não puderam ser identificados. Destes os mais interessantes são aqueles que podem ter sido influenciados pela topografia local ou condições ambientais únicas de Marte, o que impossibilita a classificação baseado em análogos terrestres, necessitando criar novas categorias de dunas. A imagem da Figura 2 apresenta algumas crateras mais destacadas da região Promethei Terra. As raias de material claro sugerem material rico em sílica ou gelo e direção NW como predominante na circulação. A Cratera 1169-722 (código derivado de sua Longitude e Latitude), com diâmetro 106,65 Km e 8.933,99 Km2 de área, possui um campo do tipo (U) 4.683,75 Km2, o maior campo de dunas identificado nesta base de dados e que ocupa 52,42% do total da área do assoalho da cratera. Na cratera 1163-691, com diâmetro 42,02 Km e 1.464,6 Km2 de área, possui um campo do tipo (SS) 296,19 Km2, o campo de dunas identificado nesta base de dados e que ocupa 20,22% do total da área do assoalho da cratera. A cratera 1117-699, com diâmetro 30,54 Km e 770,25 Km2 de área, possui um campo dos tipos (SS,Bullseye) 91,74 Km2, o campo de dunas identificado nesta base de dados e que ocupa 11,91% do total da área do assoalho da cratera. Na cratera 1179-688, com diâmetro 32,12 Km e 869,58 Km2 de área, possui um campo dos tipos (Bullseye,Bd,T) 288,95 Km2, o campo de dunas identificado nesta base de dados e que ocupa 33,23% do total da área do assoalho da cratera. A cratera 1099-684, com diâmetro 24,95 Km e 508,34 Km2 de área, possui um campo dos tipos (Bullseye,SS) 112,55 Km2, o campo de dunas identificado nesta base de dados e que ocupa 22,95% do total da área do assoalho da cratera.

Figura 1

- Distribuição Geográfica dos Campos de Dunas no Polo Sul (MC-30) Fonte: USGS

Tabela 1

Tipos de Dunas no Polo Sul (MC-30)

Figura 2

Crateras em Promethei Terra Fonte: USGS Elaborado por:Santos, D. Dal. P

Considerações Finais

Podemos considerar as atividades eólicas como um link direto entre a atmosfera e a litosfera e a identificação de formas de relevo eólicas fornecendo pistas para os processos eólicos e vice-versa. As dunas são exemplos de sistemas emergentes na qual a continua aplicação de regras simples levam à origem de formas complexas. Em geral as dunas marcianas tendem a serem maiores que as suas contrapartes terrestres devido à atmosfera menos densa que permite uma dinâmica de saltitação muito maior. Embora lento, o movimento é constante, pois com exceção das dunas instaladas em crateras de impacto, a maior parte da areia ainda não encontrou seu local de deposição. Promethei Terra torna-se uma área de interesse por sua localização sobre terrenos altos e antigos do polo sul marciano, apresentando o maior campo de dunas identificado bem como um grau de variedade de tipos de dunas, inclusive concentrando as raras dunas Bullseye. A base de dados digitais MGD3 torna possível uma serie de estudos relacionando processos eólicos e a sua interação com o relevo e a geologia em escala global , regional e local, permitindo avaliar os processos que moldaram a superfície de Marte.

Agradecimentos

Referências

Baker, V.R and Twidale ,C R. The Reenchantment of geomorphology. Geomorphology 4 , (1991),73-100p,
Fenton,L.K& Hayward,R.K Southern high latitude dune fields on Mars: Morphology, aeolian inactivity, and climate change Geomorphology 121 (2010) 98–121
Greeley,R. Planetary Landscapes.2ªed. New York: Chapman & Hall,1993,286p
Hayward.R.K et al .Mars digital dune database—Progress and application [abs], in Lunar and Planetary Science Conference, XXXVIII (2007): Lunar and Planetary Institute, abstract no. 1360.
Melosh, H. J. , Planetary Surface Processes, Cambridge Univ. Press, Cambridge, 2011, 416 p
Mendonça, F. A conquista de Marte e a expansão da análise geográfica(notas para um debate) Rae’Ga, v.1Curitiba:UFPR(1997).
Tanaka,K.L et al Geologic map of Mars: U.S. Geological Survey Scientific Investigations Map I-3292, scale 1:20,000,000, pamphlet 43 p Disponível em <https://pubs.usgs.gov/sim/3292/ > Acessado em 14/05/2017