Autores

Gonzatto, A.A. (UNIOESTE) ; Ribeiro, F.J. (UNIOESTE) ; Fujita, R.H. (UNIOESTE)

Resumo

O Rio Ampére, faz parte da bacia hidrográfica do Rio Iguaçu, e está localizado no município de Ampére, no sudoeste do Paraná, por ser um rio totalmente municipal e pela escassez de estudo sobre o referido rio, este trabalho teve como objetivo caracterizar o Rio Ampére a partir de análises fluviomorfométricas, dando ênfase aos estudos de perfil longitudinal e índices morfométricos para determinação de zonas anômalas. Neste estudo pôde-se verificar que a bacia hidrográfica do Rio Ampére apresenta padrões e propriedades de drenagem que remetem a controles estruturais. O Rio Ampére encontra-se em desajuste fluvial, marcados pela presença de knickpoints e foram detectados anomalias de drenagem. Os resultados obtidos evidenciam que a área encontra-se sob controle estrutural e as mudanças litológicas são os responsáveis pelas irregularidades encontradas no perfil longitudinal e anomalias de drenagem.

Palavras chaves

perfil longitudinal; anomalias de drenagem; knickpoints.

Introdução

Os rios são considerados variáveis importantes para o estudo da paisagem, pois é por meio deles que podemos observar mudanças provocadas pelo meio natural e intervenção humana. Segundo Christofoletti (1980) o termo rio aplica-se ao fluxo canalizado e, por vezes, para referir a canais destituídos de água, ou seja, rio é um curso d’água canalizado que se forma da concentração de águas num vale, cujo declive contínuo permite uma hierarquização da rede de drenagem (SILVA et al, 2003). Os rios devem ser vistos em três dimensões espaciais – longitudinal, lateral e vertical – pronunciando mudanças físicas, químicas e biológicas (PETTS, 2000). Pode se acrescentar a este conjunto a dimensão temporal, visto que a morfologia do canal e as comunidades aquáticas podem alterar-se naturalmente ao longo tempo e também em decorrência de mudanças abruptas de origem antrópica, como explicitado por Ward & Stanford (1995). Qualquer alteração de ordem tectônica, climática e antrópica geram modificações nos cursos fluviais que vão à procura de seu novo equilíbrio, assim adquirem certas anomalias em seu padrão de drenagem (BARBOSA et al, 2013). Ao longo de seu percurso mudam seu volume de água, profundidade, largura e material transportado, propiciando assim uma remodelação da paisagem natural. Uma das formas de se identificar a influência estrutural e litológica para uma determinada região é a utilização de estudos de cunho quantitativo para a rede de drenagem (ANDRADES FILHO, 2010). A análise morfométrica da rede de drenagem por meio de sua representação longitudinal pode ser uma ferramenta muito importante quando aliada a estudos geomorfológicos por atentar à compreensão dos condicionantes que equilibram ou desequilibram o sistema fluvial (FUJITA, 2014). Como o sistema fluvial é um sistema complexo, a caracterização regional de uma bacia hidrográfica torna-se imprescindível para os estudos em geomorfologia fluvial, pois qualquer alteração na bacia pode afetar significantemente a rede de drenagem e, consequentemente, toda a biota a ela associada. Assim sendo, metodologias que avaliam as mudanças ambientais por meio de observações do meio físico associado ao biológico são de grande importância para avaliação da existência de impactos antropogênicos. Nos últimos anos, vêm sendo aplicadas algumas análises fluviomorfométricas para entender a influência estrutural, a partir do equilíbrio dinâmico, da evolução geomorfológica do Planalto das Araucárias, principalmente nos estados do Paraná e Santa Catarina, e mais recentemente para o estado do Rio Grande do Sul. Desta forma, o presente trabalho tem como objetivo caracterizar o Rio Ampére sob a ótica das análises fluviomorfométricas e do equilíbrio dinâmico. Busca-se também, contribuir para o avanço dos estudos sobre o Rio Ampére e sobre a evolução geomorfológica dos sistemas fluviais no sudoeste do Paraná.

Material e métodos

CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO A BH do Rio Ampére (bacia hidrográfica do Rio Ampére) encontra -se no estado do Paraná (Figura 1), e pertence ao sistema fluvial Iguaçu, no Planalto das Araucárias. A área de estudo está localizada nos domínio morfoestrutural da bacia sedimentar do Paraná sob as rochas do Grupo São Bento, nos domínios das rochas ácidas da Formação Serra Geral, representadas pelas Fácies Capanema, Campos Novos e Cordilheira Alta, estruturalmente é influenciada por faturas e falhas. De acordo com Santos et al. (2006) abrange os compartimentos geomorfológicos denominados Planalto do Baixo Iguaçu e Planalto de Capanema. Estes compartimentos correspondem a relevos com alta dissecação, topos alongados e em cristas, vertentes retilíneas e vales em V e encaixados. O regime climático se caracteriza segundo classificação de Köeppen (1948) como Cfa – Clima Subtropical Úmido (Mesotérmico). O município de Ampére possui temperaturas médias anuais que variam entre 19 e 20ºC e precipitações anuais que variam de 1800 a 2000 mm. Quanto à cobertura vegetal, encontra-se no domínio da Floresta Ombrófila Mista. MATERIAL E MÉTODOS Para este estudo foram utilizadas as bases cartográficas do IBGE (folhas topográficas MI- 2848-4, MI- 2849-3, Realeza e Santa Izabel do Oeste, respectivamente), em escala de 1:50.000. Para analisar a rede de drenagem foram utilizados os padrões propostos por Howard (1967) e o gabarito proposto por Soares e Fiori (1978). Para a confecção do perfil longitudinal foram utilizadas as variáveis de altimetria e extensão do curso fluvial, extraídas da carta topográfica e armazenadas sob a forma de tabela para então, construir o perfil longitudinal do canal fluvial no GRAPHER. Para a análise do perfil longitudinal foi utilizada a metodologia mencionada por McKeownet al (1988) a qual leva em consideração que todo curso fluvial procura o seu equilíbrio, sofrendo para isso erosão ou agradação do seu próprio leito. Assim sendo, foi determinada uma equação e uma linha de melhor ajuste ao perfil, sendo consideradas anomalias os afastamentos superiores a 10 metros dessa linha. Trechos acima da linha de melhor ajuste foram considerados áreas ascendentes e abaixo desta, áreas subsidentes. Para o cálculo do índice de gradiente (RDE) por trecho e em sua totalidade utilizou se a metodologia descrita por Hack (1973) aplicando as seguintes equações: RDE trecho = (DH/DL) x L Onde: DH é a diferença altimétrica entre dois pontos selecionados do curso d’água; DL é o comprimento do trecho analisado; L corresponde à extensão acumulada do rio até o ponto médio do trecho onde o índice RDE está sendo calculado. RDE total = (DH/Lg L) Onde: DH é a diferença altimétrica entre a cota superior e inferior do canal, ou seja, a diferença entre a cota localizada a montante do rio e a cota localizada na sua foz; Lg L é o logaritmo natural da extensão total do curso d’água. A determinação das anomalias de drenagem acontece da utilização da razão entre RDETrecho/ RDEtotal. Os valores compreendidos entre os limiares 2 e 10 correspondem a anomalias de 2ª ordem, já os valores superiores a 10, anomalias de 1ª ordem. As anomalias detectadas foram agregadas a base geológica e estrutural da área de estudo para a análise dos resultados fluviomorfométricos. E de encerramento, foi aplicado o índice Fator de assimetria de bacia de drenagem (FABD), este índice reflete a migração perpendicular eixo da bacia de drenagem que pode ser o resultado de processos fluviais internos e/ou forças externas (tectônicas). O método consiste na divisão entre a área da margem direita de uma bacia pela área total da mesma, como se pode observar na equação: FAB = 100 x (Ra/Ta) Onde: Ra = área localizada à margem direita da bacia; Ta = área total da bacia. Valores próximos a 50 = bacia se encontra em condições estáveis, valores menores que 50

Resultado e discussão

A Bacia do Rio Ampére possui um perímetro de 61,544 km, com uma área de aproximadamente 134,79 km². A partir do estudo da rede de drenagem foi realizável gerar uma pré-compartimentação da bacia em três segmentos denominados alto, médio e baixo curso. No alto curso, verifica se o predomínio de drenagens dendríticas, subdendríticas e paralelas. O médio curso exibe os padrões subdendrítico e subparalelo. Tanto no alto como no baixo curso notam-se a presença de formas anômalas em cotovelos. Já o baixo curso é encontrado por densidade de drenagem baixa e a presença de padrões paralelos e sub-paralelos. Quanto as propriedades de drenagem, sugeridas por Soares e Fiori (1978) para a Bacia do rio Ampére. Os resultados evidenciam forte controle estrutural para a bacia estudada. A presença desses padrões de drenagem e os resultados das propriedades da drenagem na área de estudo remetem a um contexto de controle estrutural que são marcados pelas presenças de lineamentos estruturais (fraturas/falhas). De acordo com Ribeiro (2016) essas características apresentadas pela rede de drenagem sugerem o controle estrutural e evidencia uma adaptação dos canais à atual paisagem. O Rio Ampére é um rio totalmente municipal, nasce a 660 m e percorre aproximadamente 43 km para desaguar no Rio Capanema 300 m de altitude, representando uma amplitude altimétrica de 360 m. Ao longo de sua extensão foram diagnosticados alguns desajustes fluviais, segmentos em convexidade (ascendente) e em concavidade (subsidência), e dois trechos em equilíbrio fluvial (Figura 2). Os trechos em equilíbrio fluvial encontram-se entre as cotas 660 a 580 m e 480 a 460 m. Os segmentos convexos (ascensão) são verificados entre as altitudes 580 a 480 m, perfazendo aproximadamente 16 km de extensão do canal fluvial. Já o segmento classificado como côncavo (subsidência) é verificado entre as altitudes 460 a 300 m, representando aproximadamente 24,6 km de extensão. Ao longo da sua extensão o Rio Ampére é constatado uma sequência de ressaltos topográficos (knickpoints), que representam níveis de base local e esses ressaltos estão associados às mudanças litológicas. Aclas Jr. et al. (2003) e Volkov et al (1967), Gornitz & Seeber (1990) e Fujita et al (2012) comentam que as variações na resistência litológica do substrato rochoso são fatores que ocasionam os desequilíbrios fluviais nos perfis longitudinais e nos locais onde as rochas possuem maior resistência litológica são encontrados os gradientes mais elevados. Com a aplicação do índice de Hack, foi possível segmentar o rio Ampére em 22 trechos (Tabela 1), sendo 11 com presença de anomalias. Foram diagnosticadas 3 anomalias de 1ª ordem e 8 anomalias 2ª ordem, os outros 11 trechos foram classificados como equilíbrio. As anomalias de 1ª ordem estão localizadas entre as cotas 480 a 460m e 380 a 340m. Já as anomalias de 2ª ordem foram notadas entre as cotas 500 a 4800m, 460 a 380m, 340 a 300m. Os trechos classificados como em equilíbrio são verificados nas demais cotas. Ao analisar a figura 3, verificamos que a área de estudo sofre forte controle estrutural, o qual influencia diretamente a organização da rede de drenagem. Percebe-se que o Rio Ampére está encaixado num sistema de falhas e as mudanças litológicas influenciam também a configuração da rede de drenagem e assimetria dos flancos. No geral, as anomalias de 2ª ordem são justificadas pela influencia estrutural, evidenciadas pela presença de falhas/fraturas, e a confluência de canais, que aumenta a vazão e o calibre dos sedimentos, o que auxilia na maior potência de canal (CARLSTON, 1969). Em relação à litologia não houve influência significativa para a ocorrência dessas alterações, quanto anomalias de 2ª ordem. As anomalias de 1ª ordem ocorrem ao longo de médio e baixo curso do rio Ampére. A anomalia alocada no médio curso é justificada pela mudança litológica, por sua vez no baixo curso pelo controle estrutural e possivelmente a ocorrência de saltos e cachoeiras. De acordo com Etchebehere (2000) e Fujita et al (2011) as anomalias de 1ª ordem podem ser originadas a partir de diversas causas, dentre elas à proximidade de áreas de intensa atividade tectônica que propicia a formação de soleiras e que constituem níveis de base local e a formação de saltos e cachoeiras, que são indícios de tectônica ativa. Por fim, verificou-se que a BH do Rio Ampére possui basculamento para o flanco direito da bacia, que apresentou um valor de fator de assimetria de bacia (FAB) de 55,85 o que corrobora com a ideia de indícios tectônicos.

Figura 1

Localização da área de estudo

Figura 2

Perfil longitudinal do rio Ampére

Tabela 1

Tabela resumo das variáveis morfométricas do Rio Ampére. Onde: RDETotal 33,7541.

Figura 3

Mapa geológico e de distribuição das anomalias de drenagem.

Considerações Finais

Neste estudo, buscou-se aplicar algumas análises morfométricas, para a bacia hidrográfica do rio Ampére, localizada em Ampére - PR. A partir dos resultados obtidos puderam-se chegar as seguintes considerações: A BH do Rio Ampére encontra-se nos domínios das rochas ácidas da Formação Serra Geral possui um forte controle estrutural, marcada pela presença de lineamentos estruturais (falhas e fraturas) bem como pelo arranjo espacial da rede de drenagem. Este controle estrutural também é evidenciado pelos padrões e propriedades da drenagem. O Rio Ampére possui irregularidades ao longo de seu perfil longitudinal. Essas irregularidades constituem segmentos em ascensão e subsidência, bem como rupturas de declive, os chamados knickpoints. Esses desajustes fluviais encontrados são ocasionados pela influência estrutural e pelas mudanças litológicas. A partir da aplicação do índide de RDE e do índice de determinação de zonas anômalas foram verificados segmentos em equilíbrio, anomalias de 1ª ordem e anomalias de 2ª ordem. As anomalias são originadas a partir dos encontros de canais, que modificam a vazão e composição do material do canal fluvial e do controle litológico e estrutural da área, que podem estar refletindo uma influência tectônica. Apesar de singelo este estudo nos proporciona novas perspectivas para os estudos de cunho fluvial nesta bacia hidrográfica.

Agradecimentos

NEPA/Unioeste-FB- Núcleo de Estudos Paleoambientais.

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