Autores

Andrade, J.H.R. (UECE/FAFIDAM) ; Souza, J.O.P. (UFPB)

Resumo

O presente estudo mostra a importância da vegetação ciliar na estabilidade dos processos de erosão de margens no rio Jaguaribe, precisamente, na sua sub- bacia do baixo Jaguaribe. Do ponto de vista metodológico, foram selecionadas nove secções para a avaliação dos processos de recuo de margens, cujas matas ciliares apresentavam condições de conservação diferenciadas. Nas margens conservadas e parcialmente conservadas apresentaram valores médios de recuo de 0,25 m ano-1 e 0,27 m ano-1, respectivamente. Já nas áreas com ausência de vegetação os recuos foram mais elevados apresentando valor médio de 1,08 m ano-1.

Palavras chaves

Erosão marginal; mata ciliar; Rio Jaguaribe

Introdução

Os ambientes fluviais vêm sendo constantemente alterados pela remoção da mata ciliar, reflexo, principalmente, da falta de planejamento do uso e ocupação dos solos nestas áreas. As matas ciliares envolvem todos os tipos de vegetação arbórea vinculada à beira de rios, independentemente de sua área ou região de ocorrência e de sua composição florística. As formações vegetais recebem diversas nomenclaturas, sendo estas conhecidas como: mata ciliar, floresta ciliar, mata de galeria, floresta ripária, floresta de brejo, entre tantas outras. A utilização do conceito de florestas ciliares ou matas ciliares é quase total, para o território brasileiro, haja visto que tais formações são visualizadas de uma forma ou de outra em todos os domínios morfoclimáticos e fitogeográficos do país (AB’SÁBER, 2004). A retirada da mata ciliar pode trazer diversas alterações no fluxo de matéria e energia dos ambientes fluviais, alterando seu equilíbrio organizado, colaborando para acelerar os processos de erosão de margens e consequentemente assoreamento dos canais fluviais, além de mudanças na qualidade e quantidade das águas dos cursos fluviais. A erosão das margens fluviais é um fenômeno natural, resultante do processo de adaptação do rio ao vale em que se situa às condições do escoamento. Esta adaptação pode fazer parte do ciclo natural do rio ou pode resultar de ações humanas. Nos dois casos a dinâmica natural do rio é modificada, tendo este a necessidade de encontrar um novo estado de equilíbrio. Durante este processo de ajuste, as margens, devido à função delimitadora do canal que têm, são particularmente afetadas (MAGALHÃES, 2010). Segundo Fernandez (1990), a erosão das margens de rios, lagos, e reservatórios é um assunto que vem ganhando destaque no cenário científico, isto decorrente dos processos ambientais, sociais e econômicos envolvidos neste fenômeno. Este mesmo autor, define a erosão marginal como o recuo linear das margens fluviais, devido à remoção dos materiais do barranco pela ação fluvial (correntes, ondas) ou por forças de origem externa (precipitação, ação eólica). As matas ciliares ocupam as áreas mais dinâmica da paisagem, tanto em termos hidrológicos, como ecológicos e geomorfológicos. Diante disto, existem uma forte interação entre os processos geomorfológicos, hidráulicos do canal fluvial, assim como da biótica aquática. Esta interação decorre primeiramente do papel desempenhado pelas raízes da vegetação na estabilização das margens (LIMA e ZAKIA, 2004). As margens de rios e de reservatórios estão sujeitas à erosão e atrito pelo fluxo hídrico. Desta feita, a vegetação da margem pode contribuir para redução da erosão, conforme as seguintes maneiras: “[...] a parte aérea se reclina e cobre a superfície e/ou reduz a velocidade do fluxo nas adjacente à interfase solo/água, enquanto as raízes abaixo do solo retêm ou mantêm fisicamente as partículas de solo no lugar [...]” (ARAÚJO et al., 2008, p.115). Conforme o mesmo autor, a extensão destas benfeitorias depende da área superficial de vegetação em contato com o fluxo e a flexibilidade dos ramos. Diante do exposto, o presente estudo tem como objetivo mostrar a importância da vegetação ciliar como agente reguladora dos processos de erosão de margens fluviais.

Material e métodos

Caracterização da área de estudo O rio Jaguaribe é um dos mais importantes do Estado do Ceará, com extensão de aproximadamente 610 km desde sua nascente na Serra da Joaninha (município de Tauá), até sua desembocadura no Oceano Atlântico no município de Fortim. Sua bacia hidrográfica com área de 74.000 km2, ocupa quase 50% do território cearense. Segundo Cavalcante e Cunha (2011), a Bacia do Jaguaribe é formada por cinco sub-bacias: Alto Jaguaribe, Médio Jaguaribe, Baixo Jaguaribe, Bacia do Banabuiú e Bacia do Salgado. O presente trabalho foi realizado na sub-bacia do baixo Jaguaribe, no município de Quixeré. O trecho em estudo apresenta uma extensão de 10 km, delimitado a partir da passagem molhada de Quixeré (localizada na zona urbana do município de Quixeré) até a passagem molhada de Sucurujuba, na zona rural do município em questão (Figura 1). Etapa de Campo Apresente etapa foi dividida em quatro momentos sendo estes a escolha das margens para estudo; instrumentalização das margens; observação dos processos erosivos das margens, coleta de solo e aplicação de teste de infiltração. A escolha das margens para monitoramento se deu a partir do grau de conservação da vegetação ciliar e os usos sobre elas. Para isto foram escolhidas nove seções para análise que foram agrupadas em três tipos de áreas, sendo estas: Área Conservada (AC), Área Parcialmente Conservada (APC) e Área Degradada (DC). Foram consideradas Áreas Conservadas, as margens que mantinham suas características naturais, sem alterações significativas na sua vegetação natural e com ausência de usos sobre elas. As Áreas Parcialmente Conservadas foram definidas como sendo aquelas em que a vegetação ciliar sofreu alterações, mas ainda predominam algumas espécies e não dispõem de atividades permanentes. Já as Áreas Degradadas, foram denominadas como sendo as margens que a vegetação foi significativamente alterada e com atividades permanentes (viveiros de camarão, áreas de irrigação entre outras). Após a escolha as margens foram instrumentalizadas para a compreensão dos processos erosivos. Neste sentido foi utilizado o método de medição direta da erosão de margens, conhecido como método dos pinos, que consiste na introdução de pinos na face das margens. A medida que a margem vai recuando, é medida a exposição do pino. Os pinos utilizados foram colocados a uma distância horizontal de 2 m de separação, sendo estes construídos de ferro, tendo 1 m de comprimento, com 5,16 mm de diâmetro. Foram coletadas amostras de solo das margens para determinar a densidade de raízes nas margens monitoradas, assim como analise granulométrica. Também foi aplicado um teste de Infiltração baseado em Maia (2014). Etapa de laboratório Para determinar o teor de raízes presentes em cada margem, as amostras foram peneiradas em peneira de malha de 5 mm. . Em seguida as amostras foram colocadas em sacos de papel e foram levadas a estufa a 70° C por 24 horas para remoção da umidade, depois foram pesadas em balança de precisão. A densidade de raízes foi obtida pela divisão da matéria seca de raiz por volume de solo amostrado transformado para kg m-3. Etapa de Gabinete Com o monitoramento do recuo dos pinos durante os 12 meses de estudos, foi determinado a taxa de erosão (cm/mês) e o volume erodido (m3/ano) para cada margem. A magnitude da erosão após cada medição foi calculada mediante a seguinte fórmula: Em = (L1 – L0) utilizada por Fernandez (1990), onde “Em” é a magnitude da erosão (cm mês-1), “L1” é o comprimento do pino exposto pela erosão (cm), “L0” é o comprimento do pino deixado exposto após cada levantamento (cm) e, “t” é o tempo transcorrido em meses entre cada campanha de campo. Já a erosão média anual foi obtido pela fórmula: Me=H.Er.Em, em que "Me"é o volume de material erodido (m3/ano), "H" é a altura da margem (m), "Er" é a erosão média anual (m/ano), "Em" é a extensão lateral da margem instrumentada (m).

Resultado e discussão

Conforme os dados da tabela 1, as áreas conservadas apresentaram maior taxa de infiltração (Zmax),cujas taxas variaram entre 9,2 cm a 11,6 cm, assim como os maiores valores de densidade de raízes (DRaiz) que oscilaram entre 4,0 a 5,8 kg/m3. As áreas parcialmente conservadas, revelaram taxa de infiltração entre 5,5 a 11,80 cm, e densidade de raiz entre 0,51 a 2,6 Kg/m3. Já nas áreas degradadas como eram esperados, apresentaram os menores valores de Taxa de Infiltração ficando entre 4,8 a 6,1 cm, e consequentemente, os menores valores de densidade de raiz que oscilaram entre 0,2 a 0,34 kg/m3. Porém quando comparamos individualmente as seções Izídio e Canela I, estas apresentaram valores de densidade de raízes e infiltração superior a seção Canelas II que é considerada uma área parcialmente conservada. No intuito de avaliar se as três áreas classificadas neste trabalho como conservada, parcialmente conservada e degradada, apresentam características diferentes em relação a disposição da vegetação, foi aplicado um o teste de média para densidade de raiz (DRaiz) e profundidade de infiltração (Zmáx), desta forma as três áreas avaliadas são diferentes, conforme tabela 2. Em relação ao monitoramento da erosão, a pesquisa estendeu-se por 12 meses e abrangeu dois períodos climáticos, uma estação de estiagem prolongada (junho de 2014 a janeiro de 2015) e uma quadra chuvosa (fevereiro a maio de 2015). Neste período o principal agente atuante na erosão das margens do trecho do rio Jaguaribe, foi ação das águas das chuvas. Segundo Fernandez (1995), ação das águas das chuvas envolvem dois aspectos importantes nos processos de erosão de encostas, sendo estes a ação das gotas das chuvas e as águas do escoamento superficial. O recuo das margens das áreas avaliadas para o período de junho de 2014 a maio de 2015, está representado pela tabela 3. Como se pode observar na tabela 3, as áreas conservadas apresentaram menor taxa de recuo anual, quando comparadas as áreas parcialmente conservadas e as áreas degradadas. As áreas degradadas apresentaram um recuo médio anual de 1,08 cm. Já as áreas conservadas e parcialmente conservadas, apresentaram, respectivamente, recuo médio anual de 0,25 e 0,27 cm. Em seus estudos Smith (1976), encontrou que uma margem sedimentar vegetada com um volume de raiz correspondente a 16-18% e com 5 cm de profundidade ofereceu cerca de 20.000 vezes mais proteção a erosão, quando relacionadas à margens com ausência de cobertura vegetal.Vale ressaltar que este estudo foi realizado em uma região mais úmida. Já Beeson e Doyle (1995), constataram que margens vegetadas poderiam ser cerca de cinco vezes mais resistentes que as não vegetadas, considerando a descarga, declividade, ângulo de curvatura, textura e altura de margens constantes. Tal fato é explicado, pois em margens vegetadas tendem a apresentarem solos com melhor drenagem. De acordo com Fernandez (1995), na maioria das vezes, as espécies vegetais com denso sistema radicular são mais benéficas que as espécies com poucas raízes no que diz respeito a redução da erodibilidade do solo. O mesmo autor relata que as margens com vegetação apresentam uma melhor drenagem em comparação com as margens desprovidas de vegetação, devido a duas razões principais: a ramagem das árvores evita que de 15 a 30% do volume da precipitação alcance a superfície do terreno; e as plantas retiram água do solo e a devolvem para atmosfera reduzindo o teor de umidade dos solos. Outra razão pela qual as margens vegetadas apresentam melhores condições de drenagem é devido ao aumento da condutividade hidráulica que decorre da presença de raízes. Este aumento de permeabilidade contribui para que a vegetação atue na estabilidade das margens reduzindo os efeitos das pressões neutras que muitas vezes geram movimentos de massa após um rápido rebaixamento do nível de água (FERNANDEZ, 1995). Conforme exposto, as margens que apresentaram uma concentração maior de raízes, ou seja, de vegetação, a exemplo da secção Água Fria que apresentou uma densidade de raiz de 4,0 kg/m3 comparadas as margens desprovidas de vegetação, como a secção Izídio com 0,3 kg/m3 tiveram menores recuo de margens, portanto, fica demonstrado mais uma vez que vegetação ciliar contribuir decisoriamente na estabilidade das margens aos processos de erosão, reforçando, a necessidade de manter a vegetação ciliar preservada.

Tabela 1

Densidade de raízes (kg m-3) e infiltração (cm) nas áreas conservadas, parcialmente conservadas e degradadas.

Tabela 2

Teste de média para densidade de raiz (DRaiz) e profundidade de infiltração (Zmax).

Tabela 3

Recuo anual das áreas monitoradas durante os doze meses de avaliação.

Figura 01

Localização da área de estudo.

Considerações Finais

Com a realização da pesquisa pode perceber que a vegetação ciliar atua como agente estabilizadora dos processos de erosão de margens fluviais. Foi constatado que nas secções conservadas e parcialmente conservadas, os valores de recuo de margens foram menores. Já nas secções degradadas os valores de recuo de margens foram maiores. Tal trabalho reforça a preservação das matas ciliares, pois elas contribuem no equilíbrio do ambiente fluvial.

Agradecimentos

Referências

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SMITH, D.G. Effect of vegetation on lateral migration of anastomosed channels of glacier meltwater river. Geol. Soc. Am. Bull, 87, p.857-860, 1976.