Autores

da Silva, I.B. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ) ; da Silva, M.V.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ)

Resumo

O objetivo deste trabalho foi realizar a caracterização morfométrica a partir de alguns parâmetros físicos da bacia hidrográfica do Rio Patu – Ceará, com o uso de técnicas de geoprocessamento, subsidiando um melhor gerenciamento da área. Entre os parâmetros físicos calculados estão: coeficiente de compacidade, fator de forma, índice de circularidade, declividade, altitude, ordem e densidade de drenagem. Utilizou-se do software ArcMap 10.3 e da imagem de radar ALOS PALSAR. Como resultado obteve-se uma área de drenagem de 998,99 km2 e um perímetro de 202,09 km. A bacia hidrográfica apresenta um formato alongado, representado pelos coeficientes de compacidade (1,79), fator de forma (0,16) e índice de circularidade (0,31). A área drenada é de sétima ordem e apresenta densidade de drenagem de 1,78 km/km2. Concluiu-se que a bacia hidrográfica do Rio Patu não é susceptível a ocorrência de inundações, possuindo drenagem bastante ramificada.

Palavras chaves

Bacia hidrográfica; Morfometria; Geoprocessamento

Introdução

O conceito de bacia hidrográfica está relacionado a uma determinada área de captação natural da precipitação que faz convergir para seu exutório. Segundo Giometti (1998), uma bacia hidrográfica é considerada a melhor unidade para se trabalhar, pois oferece subsídios que auxiliam na compreensão da organização e dinâmica dos fluxos de energia e matéria que circulam ao longo do sistema. Os sistemas, por sua vez, podem ser classificados levando em consideração critérios variados. Em relação a análise ambiental, pode-se afirmar que os mais importantes são os critérios da funcionalidade e o da composição integrativa (CHRISTOFOLETTI, 1999). O primeiro critério divide os sistemas em isolados e não isolados. Este último pode ser subdivido em sistemas não isolados fechados (com transferência de energia, apenas) e sistemas não isolados abertos (permite a troca de matéria e energia). No segundo critério, destacam-se os sistemas morfológicos, sistemas em sequência e os sistemas processos-respostas. Os primeiros são aqueles que respondem ao fluxo de matéria ou energia aos quais estão ligados. Os sistemas em sequência são compostos por uma cadeia de subsistemas dinamicamente relacionados por uma cascata de matéria e energia, onde a saída de um subsistema torna-se a entrada do subsistema seguinte. Já a combinação destes dois últimos forma os sistemas de processo-resposta. O sistema em sequência indica o “processo”, enquanto o morfológico indica a “forma”, a resposta a determinado funcionamento. A modificação na forma, por outro lado, pode alterar a maneira pela qual o processo se realiza, causando alterações qualitativas na entrada de energia. Desta forma, faz-se necessário o conhecimento dos aspectos morfométricos ao longo da área de estudo. Estes são elementos de grande importância para o entendimento do comportamento hidrológico, pois há uma estreita relação entre o ciclo hidrológico e a morfometria (VILLELA; MATTOS, 1975). Neste contexto, a delimitação da área da bacia hidrográfica e a caracterização morfométrica da mesma são de grande importância para o seu manejo adequado, além do entendimento da dinâmica ambiental local e da sua relação com o comportamento hidrológico. O clima predominante, segundo Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (2016), é o Tropical Quente Semiárido, tendo como principal sistema atmosférico a Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). Tal sistema, segundo Ayoade (2010), é o principal responsável pela geração de chuvas em todo o Nordeste setentrional. Os aspectos geológicos locais apresentam grande variedade litológica, estando inserido no domínio das áreas cratônicas brasileiras. Na área, destaca-se o Complexo Cruzeta, com as unidades Pedra Branca, Tróia e Mombaça. Em relação aos aspectos geomorfológicos, refletidos pela litologia local, predominam as unidades das depressões sertanejas e dos maciços residuais. Estudos voltados para a região, como em Moreira (2016), destacam a presença de cinco unidades pedológicas, a saber: Chernossolos Argilúvico Órtico, Chernossolos Argilúvico Háplico, Argissolos Vermelho Eutrófico, Neossolos Litólicos Eutrófico e Luvissolos Crômico Órtico. Já a vegetação local, retratada por Bertrand (1972) como sendo a síntese dos demais elementos formadores da paisagem, é composta pela caatinga arbustiva densa e aberta, floresta caducifólia espinhosa e floresta subcaducifólia tropical pluvial (IPECE, 2016). Diante do exposto, o trabalho tem como objetivo principal uma caracterização morfométrica da bacia hidrográfica do Rio Patu – Ceará, a partir de alguns parâmetros físicos e do uso de técnicas de geoprocessamento, possibilitando um melhor gerenciamento e aproveitamento dos recursos naturais da área em questão. A área de estudo localiza-se no sertão central e compreende a bacia do Rio Patu, inserida na bacia hidrográfica do Rio Banabuiú.

Material e métodos

A obtenção dos aspectos morfométricos da bacia hidrográfica do Rio Patu foi dividida em duas etapas, a saber: aquisição dos dados e delimitação da bacia; e a caracterização morfométrica da mesma a partir dos cálculos dos índices desejados, a saber: área, perímetro, declividade, altitude, coeficiente de compacidade (Kc), fator de forma (F), índice de circularidade (IC), densidade de drenagem (Dd) e ordem dos cursos d’água. Para a realização da caracterização morfométrica da bacia hidrográfica do Rio Patu, foi adquirido uma única cena do ALOS PALSAR, imagem de radar com resolução espacial de 12,5 m. A cena foi baixada gratuitamente no site da NASA “Alaska Satellite Facility (ASF)”. A imagem apresenta data de aquisição em 23 de dezembro de 2010 e órbita de número 39. A partir daí, foram realizados alguns procedimentos metodológicos na imagem, usando a extensão Hydrology do SIG ArcMap 10.3 com o intuito de retirar possíveis imperfeições e extrair, de uma maneira mais confiável possível, o limite da bacia hidrográfica do Rio Patu e sua respectiva drenagem. De princípio, utilizou-se os seguintes comandos: Fill: preencher as imperfeições na superfície do raster ALOS PALSAR; Flow Direction: gerar a direção preferencial de fluxo; Flow Accumulation: cálculo do fluxo acumulado; Watershed: delimitar a bacia hidrográfica; Stream to Feature: transformação de raster para polígono. A partir do momento em que obteve-se a delimitação da bacia hidrográfica, passou-se a realizar os devidos cálculos para obter suas diferentes características físicas. Em relação a ordem de drenagem, esta pode ser determinada segundo os critérios propostos por Horton (1945) e Strahler (1957). O presente trabalhou optou por adotar a classificação deste último, em que canais sem tributários são considerados de primeira ordem. Canais de segunda ordem são oriundos da confluência de dois canais de primeira ordem e assim sucessivamente. Desta forma, as características morfométricas – área, perímetro e comprimento da drenagem – foram calculadas na tabela de atributos dos shapes da bacia hidrográfica e da drenagem (função Calculate Geometry). As demais características físicas da bacia foram obtidas por meio da ferramenta Field Calculator. Já para o estabelecimento da ordem dos cursos d’água, recorreu- se novamente às ferramentas do ArcToolBox, sendo utilizado, na ferramenta Hydrology, o Stream Order. Neste caso, foi adotado a classificação segundo Strahler (1957). As demais características de declividade e de altitude foram obtidas a partir dos dados de radar da imagem ALOS PALSAR, onde todos os temas foram representados na escala de 1:300.000.

Resultado e discussão

A área de drenagem da bacia apresentou uma extensão de 998,99 km² e um perímetro de 202,09 km, abrangendo os municípios de Pedra Branca, Senador Pompeu e Quixeramobim (Figura 1). As características morfométricas da bacia hidrográfica do Rio Patu encontram-se sintetizadas na Figura 2. Passando para as demais características físicas, pode-se afirmar que a área em estudo apresenta-se pouco susceptível a enchentes, levando em consideração as condições normais de precipitação. Tal fato pode ser constatado pelo coeficiente de compacidade que apresentou um valor afastado da unidade (1,79) e pelo fator de forma com valor próximo de zero (0,16). O índice de circularidade também afirma que a bacia em questão possui formato mais alongado, já que o valor obtido para este índice apresentou-se bem abaixo do valor unitário (0,31). Deste modo, a forma alongada da bacia acaba por favorecer um maior tempo de concentração da água e uma baixa susceptibilidade a enchentes, já que, segundo Cardoso et al. (2006), o formato circular de algumas bacias hidrográficas acaba por favorecer uma maior concentração de volume de água no seu canal principal. Em relação a ordem da bacia hidrográfica do Rio Patu, a mesma apresenta-se como de 7a ordem segundo a hierarquização de Strahler. Tal resultado indica que o sistema de drenagem é bastante ramificado ao longo de sua área de drenagem. Estudos de morfometria em bacia hidrográfica de área semelhante, como em Pinheiro et al. (2011), mostram que a bacia do Córrego Ipaneminha em São Paulo é de 4a ordem. Já o valor calculado para a densidade de drenagem do Rio Patu foi de 1,78 km/km². Este valor demonstra que a área pode ser enquadrada como medianamente drenada, pois, segundo Villela e Mattos (1975), esse índice pode variar de 0,5 km/km² em bacias pobremente drenadas a 3,5 km/km², ou mais, em bacias bem drenadas. Observou-se também que o padrão de drenagem local é dendrítico, visto que a bacia encontra-se em área de embasamento cristalino, com rochas pouco porosas. Em relação a declividade do terreno, verifica-se que a maior parte da área drenada pela bacia do Rio Patu encontra-se em relevo suave ondulado (45,38%), seguido de relevo ondulado (32,74%) (Figura 3). Os dois juntos representam quase 80% da área total da bacia. Desta forma, pode-se afirmar que a vegetação exerce papel fundamental ao longo da área de drenagem, já que a declividade é um fator importante que influencia as velocidades das taxas de escoamento superficial e de infiltração da água no solo. Neste sentido, cita-se o exemplo de Astaras (1984) que estudou duas bacias hidrográficas em condições diferentes: uma com interferência antrópica e outra sem. Ao comparar o desenvolvimento dos dois sistemas, o autor percebeu diferentes taxas de infiltração devido a bacia antropizada apresentar menos vegetação, bem como uma diferenciação na evolução das vertentes devido as diferentes intensidades dos processos erosivos. Também são retratados os níveis altimétricos ao longo da área de estudo (Figura 4), constatando-se uma altitude média e máxima de, respectivamente, 506,5 m e 854 m. São justamente nestes setores mais elevados que, muitas vezes, ocorrem as nascentes dos cursos d’água. Por fim, pode-se considerar a bacia hidrográfica do Rio Patu como um sistema não isolado aberto e de processo-resposta, já que há uma troca de matéria e energia ao longo da área onde qualquer alteração pode promover alterações nos inputs fornecidos. Para a área, consideram-se como os principais inputs, a energia solar e a precipitação. Já como output, temos a formação da lâmina do escoamento superficial, evaporação, utilização do recurso hídrico para agricultura, pecuária e abastecimento humano, além da percolação subsuperficial em direção ao lençol freático.

Figura 1

Localização da bacia hidrográfica do Rio Patu-CE

Figura 2

Características morfométricas

Figura 3

Classes de declividade da bacia hidrográfica do Rio Patu

Figura 4

Níveis altimétricos da bacia hidrográfica do Rio Patu

Considerações Finais

A bacia hidrográfica do Rio Patu é um sistema não isolado aberto e de processo-resposta, tendo a energia solar e a precipitação como principais inputs e o escoamento superficial como principal output. Já os aspectos físicos demonstram uma bacia de forma mais alongada e não susceptível a inundações em condições normais de precipitação. Isto é comprovado pelos valores do coeficiente de compacidade (1,79), índice de circularidade (0,31) e fator de forma (0,16). As características de declividade, predominando relevo suave ondulado e ondulado, juntamente com a densidade de drenagem com valor de 1,78 km/km² apontam para uma área medianamente drenada e com significativa dissecação fluvial. A área de drenagem também apresentou significativa ramificação, sendo considerada uma bacia de 7a ordem. Tal ramificação está relacionado ao embasamento cristalino de pouca porosidade, área onde se encontra a bacia em estudo. Vale ressaltar que, nenhum dos índices calculados, isoladamente, é capaz de simplificar a complexa dinâmica que ocorre ao longo da bacia. Porém, os dados morfométricos em conjunto com as informações geradas no SIG apresentam-se como importantes instrumentos para a gestão dos recursos naturais da bacia do Rio Patu.

Agradecimentos

Referências

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