Autores

Manosso, F.C. (UTFPR)

Resumo

Esse trabalho objetiva de apresentar a configuração geral do relevo nas áreas classificadas como de alta e baixa geodiversidade da região da Serra do Cadeado, Paraná (PELLITERO et al, 2014). Entende-se por geodiversidade a variedade de elementos abióticos presentes no território, em diferentes escalas e processos, que possam influenciar a paisagem atual. O método da riqueza de geodiversidade (SERRANO e RUIZ FLLAÑO, 2007 e PEREIRA et al, 2013) foi aplicado para identificar, por meio de uma grade regular com tamanho de 11 hectares, o número de diferentes elementos. As áreas de baixa geodiversidade geralmente possuem um relevo de colinas suaves, convexas e solos espessos sobre a litologia basáltica, e as áreas de alta geodiversidade correspondem a faixa da borda planáltica da Formação Serra Geral, com rupturas no relevo, contato entre litologias, afloramentos rochosos, quedas d’água, cavernas, lapas e ainda diques de diabásio de topos estreitos e alinhados no sentido Sudeste-Noroeste.

Palavras chaves

Geodiversidade; Formas de relevo; Serra do Cadeado-PR

Introdução

O termo geodiversidade refere-se a variedade ou quantidade de elementos naturais abióticos diferentes que possam compor a paisagem, desde estruturas e bases geológicas, geomorfológicas, pedológicas e hidrológicas (PELLITERO, 2011; KOZLOWSKI, 2004; NIETO, 2002; MARTINEZ et al, 2008). Geralmente pode-se conceber como estruturas complementares e que são base para a própria biodiversidade (SERRANO e RUIZ FLLAÑO, 2007; BRILHA, 2005). A geodiversidade, por meio das particularidades dos elementos abióticos, é um componente básico para a transformação biológica e socioeconômica da paisagem. Elementos como as formas de relevo , os solos e o clima, apresentam-se sempre como potenciais ou limites para o desenvolvimento de práticas humanas sobre a superfície. Para a compreensão da distribuição da geodiversidade sobre o território é necessário sua análise espacial de diversidade e frequência dos elementos que a compõe e seus possíveis processos ativos. Embora cada elemento da geodiversidade possua um papel específico na paisagem desde a escala de ecossistema (ODUM, 2007) até a escala microscópica, o reflexo nas formas de relevo são bastante evidentes (SERRANO e RUIZ FLLAÑO, 2007). A análise, bem como as aplicações do conhecimento sobre a geodiversidade requer uma definição de escala cartográfica proporcional à ocorrência dos elementos abióticos considerados. Este trabalho, visa apresentar, portanto, a distribuição espacial da riqueza da geodiversidade da região da Serra do Cadeado, Norte do estado do Paraná e os tipos de formas de relevo associadas às áreas classificadas como alta e baixa geodiversidade.

Material e métodos

A região da Serra do Cadeado está localizada na região Sul do Brasil (Figura 1), Norte do estado do Paraná, limite oriental da bacia sedimentar do Paraná e apresenta altitudes entre 400 a 1250 metros. Sua estrutura está associada a uma escarpa Triássica com forte presença de lineamentos e diques de diabásio discordantes a diferentes camadas de arenitos, siltitos e argilitos, que abrigam registros geológicos, geomorfológicos e paleontológicos desde o Paleozóico até o Cretáceo. Nesse estudo, o recorte espacial foi realizado com base nos municípios inseridos no contexto da Serra do Cadeado (Cruzmaltina, Faxinal, Mauá da Serra, Ortigueira e Tamarana, conforme Figura 1 e 2) Sua área de escarpa possui encostas bem marcadas pela transição basalto e arenito silicificado (passagem do Segundo para o Terceiro Planalto Paranaense), com fortes rupturas de relevo e as demais áreas configuram colinas suaves intercaladas por alguns vales entalhados que entremeiam vários diques de diabásio sobressalentes na superfície gerando topos com cristas estreitas, alinhados no sentido Sudeste-Noroeste. Diferentes formas de quantificação da geodiversidade foram aplicadas buscando entender a distribuição da riqueza da geodiversidade e até mesmo suas possíveis relações entre os elementos abióticos e bióticos (PELLITERO e MANOSSO, 2012; PELLITERO et al, 2014, HJORT e LUOTO, 2010; KATERINA, J. e DUŠAN, 2008; ZWOLINSKI e STACHOWIAK, 2012; CARCAVILLA et al. 2007; MANOSSO e NÓBREGA, 2015, PEREIRA et al, 2013). Sobre essa área, organizou-se uma base cartográfica dos elementos da geodiversidade em um ambiente de Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) com apoio do software ArcGis 10 (Quadro 1). Esta base foi segmentada e transformada em elementos rasters para posterior sobreposição a uma grade regular de pixels amostrais com tamanhos de 11 hectares (PELLLITERO et al, 2014), por onde efetuou-se o cálculo da riqueza da geodiversidade (PEREIRA et al, 2013) que constitui a soma simples dos diferentes elementos de geodiversidade presentes em cada unidade da referida grade espacial. Os elementos de geodiversidade utilizados na aplicação foram selecionados conforme disponibilidade de mapeamentos pré-existentes em escala compatível a 1:250000. Para geologia, considerou-se as formações, as tipologias de rochas, ocorrência de fósseis, diques e lineamentos. Para geomorfologia considerou-se os compartimentos geomorfológicos do estado do Paraná, mais a presença dos corpos hídricos e características climáticas (temperatura e precipitação). Para pedologia, as diferentes classes de solo, em seu primeiro e segundo nível. Realizado o mapa de distribuição espacial da riqueza da geodiversidade (Figura 2) sobre a matriz regular, verificou-se as principais formas de relevo presentes na paisagem nas regiões que apresentaram alta e baixa geodiversidade, a fim de verificar como a diversidade de elementos abióticos considerados na base cartográfica e quais elementos influenciam na configuração geomorfológica regional dessas áreas. A descrição foi baseada na construção de modelos digitais do terreno com o auxílio do software Golden Surfer 9.0, dados SRTM (Shuttle radar topography mission data – SRTM, NASA, 2000) e reconhecimento de campo. Foram consideradas áreas com baixa geodiversidade os pixels da grade que apresentaram de 1 a 3 elementos e as áreas com alta geodiversidade foram associadas aos pixels que abrigam de 8 a 10 diferentes elementos (Figura 2).

Resultado e discussão

O mapa da Figuras 2 apresenta uma grade de pixels que mostra a distribuição espacial do índice de geodiversidade na área de estudo, ou seja, a variedade de elementos classificados presentes em cada célula amostral da grade. Nesse caso, quanto maior a variedade de elementos na mesma área, maior é a geodiversidade correspondente. As áreas representadas entre 1 e 3 elementos da geodiversidade (Figura 2 e 3), ocorrem sobretudo sobre a faixa que compreende o Terceiro Planalto Paranaense (Norte e Noroeste), de litologia basáltica da Formação Serra Geral, mais homogênea e que abriga colinas suaves convexas, podendo apresentarem-se retilíneas sobre alguns vales mais encaixados no terço inferior das vertentes ou ainda côncavas no entorno de cabeceiras de drenagem. Possui baixa variação pedológica, solos espessos (Latossolos e Nitossolos vermelhos) e raras anomalias no relevo, o qual é planáltico com topos alinhados, convexos e amplos, entremeados a vales abertos e de baixa amplitude topográfica e canais de pequena ordem. Essa paisagem abriga um predomínio de uso agrícola mecanizado de culturas temporárias, como soja, milho, trigo e aveia e alguns recortes isolados de silvicultura (Pinus e Eucalipto) ou hortefrutes. Outras áreas que apresentam baixa geodiversidade são setores de terreno sedimentar na região Sudeste da Figura 2, onde litologias areníticas e de siltitos ou argilitos produzem colinas suaves de baixo declive e que homogenizam as formas de relevo superficial e os tipos de vales, inclusive tornando a densidade hidrográfica mais baixa e menos controlada. Conforme os resultados apresentados no mapa da Figura 2, a maior variedade de elementos da geodiversidade (Figura 2 e 4) concentra-se sobre a faixa da escarpa que marca o relevo na passagem do Segundo para o Terceiro Planalto Paranaense. Nessa faixa afloram os arenitos silicificados da Formação Botucatu, controlando a cornija da escarpa. Junto ao front da escarpa desenvolvem-se depósitos coluviais organizados de maneira bastante irregular, os quais atualmente estão sendo intemperizados e retrabalhados formando pequenos vales anaclinais, de elevado gradiente (FORTES et al, 2008; SANTOS, 2007; COUTO et al, 2011). Nos contatos entre os basaltos da Formação Serra Geral e sobretudo entre a base da Formação Botucatu com a Formação Pirambóia e a Formação Rio do Rastro, na sequência, desenvolvem-se formas erosivas de lapas, cavernas e um conjunto diversificado de cachoeiras em drenagens que entalham essas rupturas no relevo distribuídos principalmente sobre a transição da litologia basáltica e arenítica (Formação Botucatu) e que exercem um papel erosivo no recuo da faixa escarpada. Embutidos a essa faixa da escarpa, são comuns os diques de diabásio que dispostos predominantemente no sentido Sudeste-Noroeste (Figuras 4), influenciam na forma dos vales de forma discordante às Formações supracitadas, controlando a drenagem e alinhados na mesma disposição NW-SE. Com cristas bastante estreitas e alinhadas, encostas retilíneas, com bases convexas e forte declive, evidenciam os solos rasos e presença de blocos de basaltos não intemperizados junto à superfície. A área de maior representatividade da região de alta geodiversidade na região de estudo compreende toda faixa marcada pela escarpa da Serra do Cadeado (Figura 4), que exibe contatos dos basaltos (Formação Serra Geral) com os arenitos Botucatu-Pirambóia, que sob condições de declives fortes, apresentam afloramentos na superfície, Neossolos e alguns Argissolos, que estão basicamente ocupados por campos naturais, pastagens e vegetação original. A vegetação original, devido às condições de altitude (900 a 1250 metros) que encerram médias anuais de temperaturas mais amenas, pode variar sua estrutura e composição. Em frente à escarpa, o terreno exibe também cristas dos diques de diabásio, de forma isolada que aparentam ser morros residuais, testemunhos de antigas superfícies. Associado à Figura Figura 2, é possível observar um histograma de distribuição por pixels e número de elementos da geodiversidade, pelo qual pode-se perceber a frequência no território das áreas com alta, média e baixa geodiversidade ao longo da área de estudo, sendo nesse caso, as áreas com média geodiversidade, mais frequentes e com baixa e alta, menos frequente. Elementos da geodiversidade como os Neossolos, áreas com o registro fóssil, Formação Rio do Rastro e Teresina estão ocupando a maior parte da área, mas por outro lado não são necessariamente os elementos mais frequentes no território. A Formação Botucatu- Pirambóia, cachoeiras, afloramentos rochosos e Formação Irati, por exemplo, possuem uma alta frequência, mas cobrem um espaço territorial menor. A concentração dos elementos que ocupam um espaço territorial pequeno e por outro lado têm uma frequência elevada num setor, potencializa a alta geodiversidade. Elementos com baixa frequência e que correspondem a grandes áreas territoriais podem indicar áreas de baixa geodiversidade, que tendem a homogeneizar a paisagem ou a uma distribuição desigual da riqueza de geodiversidade existente.

Figura 1. Localização da Serra do Cadeado na América, Brasil e estado

Localização da Serra do Cadeado na América, Brasil e estado do Paraná.

Figura 2. Mapa do índice de riqueza da geodiversidade da região da Ser

Mapa do índice de riqueza da geodiversidade da região da Serra do Cadeado-PR (PELLITERO et al, 2014).

Figura 3. Modelagem digital do terreno e colinas convexas amplas de um

Modelagem digital do terreno e colinas convexas amplas de um recorte amostral representativos de áreas com baixa geodiversidade na região d

Figura 4. Modelagem digital do terreno e representação fotográfica de

Figura 4. Modelagem digital do terreno e representação fotográfica de dois (A e B) recortes amostrais de áreas com alta geodiversidade na região.

Considerações Finais

Pode-se considerar que o método da identificação, classificação e quantificação da geodiversidade (PEREIRA et al, 2013 e PELLITERO et al, 2014) é uma importante ferramenta para identificar áreas com características físicas particulares, associadas a diferentes processos de gênese. A identificação dessas áreas podem subsidiar outras formas de entendimento da paisagem, bem como oferecer instrumentos para a própria gestão diferenciada do território, como por exemplo a classificação de áreas prioritárias para conservação ou proteção e ainda a correlação com outros elementos da paisagem. Nesse caso procurou-se relacionar a geodiversidade alta ou baixa com a configuração geral do relevo, sendo que áreas com baixa geodiversidade geralmente apresentam um relevo de colinas suaves, convexas e solos espessos sobre a litologia basáltica, e as áreas com alta geodiversidade correspondem a faixa da borda planáltica da Formação Serra Geral, com fortes rupturas no relevo, contato entre litologias, afloramentos rochosos, quedas d’água, cavernas, lapas e ainda diques de topos estreitos, alinhados no sentido Sudeste-Noroeste. E mesmo em escalas cartográficas e unidades amostrais distintas, as áreas de alta geodiversidade identificadas neste caso, coincidem com as áreas de média e alta geodiversidade encontradas por Pereira et al (2013).

Agradecimentos

A Universidade Tecnológica Federal do Paraná, A Fundação Araucária e a Universidade Estadual de Maringá.

Referências

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