Autores

Brito, D.G. (UEPB) ; Melo, J.A.B. (UEPB)

Resumo

Este trabalho analisa o projeto educacional desenvolvido no âmbito do Subprojeto Geografia, integrante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID/CAPES/UEPB, realizado na Escola Estadual São Sebastião, Campina Grande- PB, na turma do 1° B do Ensino Médio, abordando o relevo vivido e percebido pelos alunos, mediante a confecção de maquete, estudo do meio e uma palestra com representante da Defesa Civil. Teve como objetivo possibilitar aos discentes compreenderem as mesoformas do relevo ocupadas em sua cidade de vivência e os respectivos problemas socioambientais oriundos dessa ocupação. A partir das atividades, além do interesse que foi despertado, os discentes compreenderam a importância de estudar o relevo, haja vista que interfere na espacialidade que vivenciam, sendo fundamental que sua ocupação se dê de maneira adequada, demonstrando que o ensino de Geografia pode contribuir para uma formação cidadã.

Palavras chaves

Ensino de Geografia; Relevo; Lugar

Introdução

A Geografia escolar, ao longo de sua história, tem sido eivada de críticas por mobilizar o aporte teórico-metodológico tradicional na elaboração de práticas de ensino. Nesta perspectiva, a disciplina apresenta-se ao alunado de maneira enciclopédica, mnemônica e fragmentária, ou seja, o seu estudo torna-se desinteressante. Nesse contexto, constitui desafio aos professores de Geografia a construção de metodologias coerentes com as novas abordagens para a disciplina e com o seu significado social. Os conteúdos geográficos devem propiciar aos discentes reflexões acerca do seu espaço vivido e percebido, a fim de que compreendam a realidade que os cerca e, assim, percebam seu papel enquanto cidadãos que atuam na construção do espaço geográfico. Desse modo, as metodologias empregadas poderão despertar seus interesses, refutando o estereótipo construído em torno da Geografia. Dentre os conteúdos geográficos, destaca-se o relevo, que se consolidou no currículo por meio das macroformas, como os planaltos, planícies, depressões e montanhas, isto é, de grandes dimensões sendo, por vezes, abordadas meramente de maneira conceitual e reprodutivista. Diante dos novos referenciais para o ensino de Geografia, torna-se necessário reportar o relevo a escala do cotidiano dos alunos, a fim de que compreendam a relevância de estudá-lo, como propõe Ascenção (2009) e Morais (2011). Assim, fazem-se necessárias estratégias que, além de dinamizar as aulas, propiciem a espacialização do fenômeno, isto é, uma análise do relevo em interação com demais componentes espaciais que produzem o lugar dos discentes, como os fatores sociais, físicos, econômicos, políticos e as consequências desta integração. Ciente dessas possibilidades foi desenvolvido no âmbito do Subprojeto Geografia/PIBID/UEPB um projeto educacional, em uma turma do 1° ano do Ensino Médio da Escola Estadual de Ensino Fundamental e Médio São Sebastião, localizada na cidade de Campina Grande, PB, abordando a escala do mesorrelevo do sítio urbano, que consiste nos divisores de águas, vertentes, vales, fundos de vales e planícies de inundação, fazendo uso das categorias lugar e paisagem, tendo como estratégias a confecção de maquetes, estudo do meio e uma palestra com o representante da Defesa Civil municipal. Almeja-se a construção de uma prática de ensino com um significado social e subjetivo para o aluno, capaz de integrar os fenômenos espaciais, físicos e sociais, de modo que percebam a influência do relevo na organização espacial da cidade e, em especial, em seu cotidiano constituindo, assim, um esforço a unificação do conhecimento geográfico e, principalmente, a contemplação da formação cidadã. A intervenção implementada na turma teve como objetivo geral compreender as mesoformas do relevo ocupadas em sua cidade de vivência e os respectivos problemas socioambientais oriundos dessa ocupação. Como objetivos específicos, buscou-se compreender a relação entre as formas de relevo e a valorização/ desvalorização imobiliária; analisar a atuação do Estado em relação às consequências ambientais, conforme o grupo socioeconômico que se espacializa no solo urbano; construir reflexões que subsidiem uma formação cidadã. No caso do presente artigo, o objetivo consiste em analisar a execução do projeto de intervenção no âmbito das ações do Subprojeto Geografia, PIBID/CAPES/UEPB, realizado na E. E. E. F. M. São Sebastião, Campina Grande-PB.

Material e métodos

O Subprojeto de Geografia, integrante do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência – PIBID/UEPB atua na Escola Estadual São Sebastião, localizada no Bairro Lauritzen, na cidade Campina Grande-PB. O recorte espacial para a implementação deste projeto é a turma 1° “B” do Ensino Médio, no turno da tarde, que apresenta 27 discentes. O projeto foi desenvolvido entre os meses de maio e julho junto ao professor supervisor. A metodologia proposta é composta por cinco etapas: a) Inicialmente, foi dada sequência aos conteúdos do currículo trabalhados nas aulas de Geografia, referentes à “Linguagem Cartográfica e Leitura de Mapas”, “A Litosfera: evolução geológica da Terra”, “Constituição da crosta terrestre: tipos de rochas”, “Estrutura geológica e as macroformas do Relevo terrestre”, “Unidades Morfoestruturais Brasileira”; b) Em seguida, o projeto foi apresentado à turma. Deu-se início a oficina de confecção da maquete a partir do recorte da Carta Topográfica de Campina Grande-PB. Utilizou-se papel manteiga, placas de isopor de 15 mm, cola de isopor, massa corrida, lixas, tintas acrílicas com cores para hipsometria, pincéis, marcadores de mapa e os nomes dos bairros. O procedimento de construção foi: desenho das curvas de nível e sua transposição para as folhas de isopor, colagem das camadas (assumido pela bolsista); cobertura da superfície de isopor com massa corrida pelos discentes, lixamento, pintura e a localização com a inserção dos bairros; c) Utilização da maquete para a construção dos conceitos de divisores de água, vertentes, vales fluviais e planícies de inundação. Posteriormente, com a maquete, slides e vídeos, discutiu-se como este relevo foi apropriado no processo de urbanização e as problemáticas ambientais decorrentes; d) Formação de cinco equipes para a realização de um estudo do meio comparativo da paisagem da Comunidade Rosa Mística e do Bairro Alto Branco; e) Por fim, representantes da Defesa Civil de Campina Grande-PB realizaram uma palestra com a turma. Neste sentido, o projeto baseou-se na concepção de que os alunos apresentam um conhecimento geográfico construído em seu lugar de vivência. A pesquisa desenvolveu-se sob a forma de pesquisa ação, com uma abordagem qualitativa. Como subsídio, foram realizadas revisões bibliográficas e pesquisa de campo no entorno da escola.

Resultado e discussão

A princípio, o professor supervisor introduziu os conteúdos mencionados na metodologia e, posteriormente, iniciaram as intervenções didático-pedagógicas pela bolsista PIBID. Em sequência, foram apresentadas as propostas do projeto aos alunos, problematizando a interferência do relevo em seu cotidiano. Estes perceberam a necessidade de conhecer o relevo de sua cidade, isto é, estudá-lo em outras escalas, como as planícies de inundação, vales, vertentes e divisores, para que pudessem compreender os desafios que se originam da interação sociedade-natureza. Com isso, deu-se início a confecção da maquete. As etapas que haviam sido assumidas pela bolsista foram explicadas. Assim, foi iniciada atuação dos discentes, com a cobertura da maquete com a massa corrida, que visou torná-la mais resistente e com melhor acabamento. Após a secagem, os discentes lixaram- na para tornar a superfície lisa. Em sequência, pintaram-na com as cores hipsómetricas. Para finalizar, foi inserida a legenda e as convenções dos fluxos de água (Figura 1 e 2). Com a maquete pronta, foi utilizada como um recurso didático a partir da sua correlação com a carta topográfica, a fim de ressignificar os conhecimentos necessários à compreensão das curvas de nível e seus fundamentos de leitura. Portanto, a confecção da maquete e sua utilização favoreceu a construção do conhecimento, corroborando com os resultados obtidos por Silva (2012): A maquete possibilitou aos alunos partir de uma visão do bidimensional para a visão tridimensional dos fatos representados, aproximou-se o que era abstrato para um fato real e concreto. A maquete e a carta topográfica transmitiram informações semelhantes, mas só que com o uso da maquete os alunos conseguiram com mais tranquilidade e de forma rápida assimilar os dados e responder o que se pedia (ibidem, p.57). Desse modo, a aquisição destes conhecimentos possibilitou a compreensão do relevo representado. Ao norte da cidade de Campina Grande, o médio curso da bacia do Riacho das Piabas é marcado por declives muito acentuados, onde ocorrem os divisores de águas, com a presença vales estreitos, ladeados por relevo mais elevado. Assim, em episódios pluviosos a resposta da bacia é rápida, ocasionando enchentes, no percurso canalizado que se inicia no bairro da Conceição (Rosa Mística) até o Açude Velho (PEREIRA, 2012). Assim, foram explicadas, a partir da maquete, as formas de relevo presentes naquela área da cidade para que os discentes construíssem os seus próprios conceitos geomorfológicos. Desta forma, os discentes foram capazes de construir seus próprios conceitos, isto é, seus conhecimentos foram mobilizados e sistematizados, alcançando a aprendizagem e a compreensão do relevo local. Além disso, foi abordado como estas formas interagem no ambiente urbano e os fenômenos que surgem da sua apropriação, ampliando seus conhecimentos prévios sobre as enchentes e os alagamentos que ocorrem na área. Desse modo, perceberam que o relevo do lugar favorece a ocorrência de enchentes e alagamentos ao associar-se ao modo de ocupação, através da impermeabilização do solo, a disposição inadequada dos resíduos sólidos que dificultam a dispersão da água e a ocupação da planície da inundação do Riacho das Piabas, situado em um fundo de vale, que expõe a população da Comunidade Rosa Mística/ Buraco da Jia a tais riscos. Em seguida, ao discutir o processo de urbanização da cidade, abordou-se o surgimento de uma comunidade Rosa Mística/ Buraco da Jia, pois se situa próxima à escola e consiste no lugar de moradia de uma parte considerável da turma. Sua origem data da década de 1940, quando a cidade de Campina Grande passou por um intenso crescimento econômico e industrial. Localiza-se em um fundo de um vale estreito, ladeado por relevo mais elevado. Tornou-se local de moradia de indivíduos oriundos do êxodo rural e ali se instalaram, nas margens do riacho, diante das suas péssimas condições financeiras. O Estado atuou de forma pontual ao retirar uma parte da população que ocupava as margens do riacho, porém logo novos moradores ocuparam tais áreas. Além disso, o Estado realizou de forma inadequada à canalização, pois não retirou a população da proximidade do canal (ARAÚJO, 2014). Assim, as condições do relevo, os fatores socioeconômicos e a ineficaz atuação do Estado, torna a comunidade Rosa Mística uma das áreas mais vulnerável a desastres hidrológicos, causando enormes transtornos aos moradores, como o desabamento de casas, contato com agentes patógenos, perdas de seus pertences, dentre outros. Em seguida, foram formados cinco grupos, sendo entregue a estes o caderno de pesquisa para investigarem e compararem as paisagens de dois espaços na cidade de Campina Grande, a Comunidade Rosa Mística e o entorno da escola que compreende os bairros Lauritzen e Alto Branco, por ambos constituírem espaços de vivência dos discentes, de modo a destacar os aspectos do relevo, o perfil socioeconômico da população, os problemas decorrentes da ocupação do relevo e a atuação do Estado. Posteriormente, os discentes apresentaram o estudo o meio, compartilhando com os demais colegas aquilo que os chamou sua atenção na paisagem, discutindo o texto que haviam produzido, juntamente com as entrevistas aos moradores e as imagens que representam as paisagens investigadas, presentes no caderno de campo (Figura 3). A partir do estudo do meio, os discentes demonstraram que existem diferenças entre as áreas pesquisadas do ponto de vista do relevo, explicando através da produção textual e das imagens registradas. No caso do entorno da escola o relevo condiciona amenidades por ser uma área dispersora de águas pluviais. Em relação a Rosa Mística configura uma área de risco, haja vista que ocorre um direcionamento das águas dos divisores para o fundo do vale fluvial afetando as moradias precárias que ocupam a planície de inundação do Riacho das Piabas, expondo-as às enchentes. Corroborando com as colocações de Morais (2011): Os riscos ambientais, por exemplo, estão relacionados á características físico- naturais da área, ao desenvolvimento tecnológico e ao poder aquisitivo da população que se apropriou daquela área, pois de acordo com a renda que cada um possui é que ocorre a seleção do lugar onde morar e dos recursos tecnológicos que serão utilizados para realização das obras de engenharia (MORAIS, p.22). Assim, os alunos relacionaram o relevo à especulação imobiliária ao relacionar a ocupação destas formas de relevo ao perfil dos moradores, pois o entorno da escola é ocupado por uma população de alto poder aquisitivo, sendo uma área dispersora de águas. Já em relação Rosa Mística, o perfil socioeconômico que ocupa esta área é uma população carente, pois constitui uma área alagadiça ocupada por moradias precárias. Também identificaram a atuação do Estado em ambas às áreas, vindo à tona que o Estado não é neutro, pois este dá preferências às áreas nobres, em detrimento das áreas carentes, em relação à realização de obras de engenharia, como a canalização e o saneamento básico de modo geral. Assim, o Estado no contexto não dota os grupos sociais de uma equidade social para que todos tenham acesso à qualidade de vida. Por fim, desenvolveu-se uma palestra com representantes da Defesa Civil de Campina Grande-PB, com a finalidade de demonstrar aos discentes o papel deste órgão na sociedade em relação à minimização de desastres e a importância do relevo para delimitação de áreas de risco na cidade. Assim, ao longo da palestra foram discutidas as áreas de ri

Figura 1

Confecção da maquete pela bolsista PIBID e alunos

Figura 2

Maquete da Bacia Hidrográfica do Riacho das Piabas, Campina Grande

Figura

Apresentação dos Cadernos de pesquisa

Figura 4

Palestra com a Defesa Civil

Considerações Finais

Ao término das atividades, foi possível constatar que o projeto educacional obteve resultados positivos, em que se observou a interação dos alunos e os conhecimentos trabalhados em sala de aula e, especialmente, com a realidade que vivenciam, sendo fundamental para construção de uma Geografia para além do estereótipo tradicional. Por meio da maquete, os conhecimentos cartográficos foram mobilizados para representação do relevo de seu espaço de vivência e esta subsidiou a aprendizagem e o desenvolvimento de compreensão espacial ao possibilitar análises da espacialidade do relevo, isto é, uma visão mais integrada do espaço geográfico. Com o estudo do meio e a palestra, proporcionou-se a identificação de problemas e alternativas, pois os problemas urbanos socioambientais oriundos da ocupação do relevo são passíveis de ser solucionados e/ou minimizados, basta que o Estado atue conforme suas atribuições, retirando a população de áreas de risco ou a realização de obras de engenharia. Desse modo, o alunado conscientizou-se que os fenômenos hidrológicos são originados a partir da ocupação inadequada do relevo, assim, a minimização dos fenômenos é passível de ser solucionada. De modo que a população deve reivindicar políticas públicas que proporcionem uma racionalização da ação antrópica no meio físico. Assim, o aluno torna-se esclarecido e questionador dessa realidade e passa a cobrar soluções coerentes, isto é, exercendo sua cidadania.

Agradecimentos

Referências

ARAÚJO, C. M. O papel do Estado e dos moradores no processo de consolidação da Comunidade da Rosa Mística, Campina Grande / PB. 2014. 136 f. Dissertação (Mestrado). Departamento de Ciências Geográficas, Universidade Federal de Pernambuco, Recife. 2014.
ASCENÇÃO, V. O. R. Os conhecimentos docentes e a abordagem do relevo e suas dinâmicas nos anos finais do Ensino Fundamental. 2009. 150 f. Tese (Doutorado), Departamento de Geografia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte. 2009.
MORAIS, E. M. B. O ensino das temáticas físico-naturais na Geografia Escolar. 2011. 309 f. Tese (Doutorado). Departamento de Geografia da Faculdade de filosofia, ciências e letras da Universidade de São Paulo, São Paulo. 2011.
SILVA, E. M. Maquete como recurso didático no ensino de geografia. 2012. 68 pg.
Monografia(Graduação). Instituto Federal Minas Gerais, Ouro Preto, Minas Gerais. 2012.
PEREIRA, Anacleto Batista dos Santos. Caracterização Geoambiental urbana da bacia hidrográfica do Riacho das Piabas em Campina Grande-PB. Campina Grande, 2011. 45p. Monografia (Especialização em Geoambiência e Recursos Hídricos do Semiárido).