Autores

Estevam, A.L.D. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA) ; Santos do Nascimento, A. (UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA) ; Sousa Santana, N. (IFBA)

Resumo

O objetivo deste trabalho é analisar a metodologia aplicada ao ensino de Geomorfologia tendo como base o uso da paisagem como instrumento metodológico. A aplicação de conceitos, fenômenos e processos geomorfológicos desenvolvidos através de aulas expositivas, a análise de literatura especifica associada à prática de campo na Região da Chapada Diamantina no Estado da Bahia. A metodologia consiste no desenvolvimento de plano de trabalho com conteúdos previamente delineados de acordo com o perfil da turma, temas e formato de avaliações que permitem aos discentes a assimilação sistemática dos conhecimentos básicos da Disciplina Geomorfologia. Os resultados obtidos foram extremamente animadores para além das notas auferidas. A avaliação dos discentes com relação a qualidade do curso foi positiva no tocante ao aprendizado e na assimilação sobre as formas e processos geomorfológicos.

Palavras chaves

Metodologia; Geomorfologia; Paisagem

Introdução

O presente estudo é resultado de reflexões a cerca de métodos mais adequados ao ensino da disciplina Geomorfologia. O conjunto de ideias aqui analisadas e discutidas é resultado da docência desenvolvida ao longo de 15 anos nos trabalhos aplicados ao aprimoramento dos modelos de ensino e aprendizagem em Geografia Física nas Universidades Estaduais da Bahia (UESC, UESB e UNEB). Vale ressaltar que a utilização da paisagem como instrumento e objeto de investigação é a principal ferramenta metodológica para o ensino dinâmico dos conteúdos aplicados a análise da gênese e evolução do relevo. As reflexões contidas nesta produção resultaram do trabalho contínuo desenvolvido nas aulas expositivas, aulas práticas, projetos de pesquisas, orientação de iniciação científica, cursos de extensão, palestras, orientações de TCC, participação em bancas de concurso e bancas de defesa de teses e dissertações, além das minhas produções no mestrado e doutorado sempre perseguindo a temática geomorfológica. Ao deparar-se com grupos de discentes extremamente avessos ao aprimoramento em Geomorfologia, buscou-se ao máximo desenvolver metodologias instigantes que conferissem a prática do ensino o caráter dinâmico e evolutivo da paisagem a partir de uma abordagem integralizadora dos processos e formas. Foram utilizados para tanto do Método Geossistêmico. Método este teorizado e aplicado na análise paisagística pelo pedólogo russo Sotchava na escola europeia e exaustivamente utilizados no ensino e pesquisa aplicada na Geografia Física brasileira. Cabe destacar aqui o papel relevante dos inestimáveis geógrafos Carlos Augusto de Figueiredo Monteiro Aziz Ab´Saber ambos pertencentes ao Departamento de Ciências Humanas da USP e a contribuição de Antônio José Teixeira Guerra (IBGE). Os referidos autores consubstanciaram numa rica produção literária e cartográfica com enfoque para a sistematização dos estudos das paisagens brasileiras a partir do uso inequívoco da Teoria Geral dos Sistemas balizados sobre a prática cotidiana dos roteiros de campo. No contexto explicitado, as feições de relevo assim como as estruturas geológicas encontradas na Chapada Diamantina ao longo do estado da Bahia circunscrevem um acervo natural e patrimonial para ensino da Geomorfologia Estrutural. Tal patrimônio não deve estar desvinculado da prática pedagógica, mas sim inserido no contexto dos trabalhos em sala de aula e no estudo das literaturas. Neste contexto, propõe-se trabalhar a Geomorfologia de forma interativa às mais diversas áreas de conhecimento da geografia num ambiente dinâmico e diversificado, como pode ser observado em Oliveira (2009). Neste trabalho, analisa-se procedimentos metodológicos aplicados ao ensino da Geomorfologia Fundamental, utilizando-se das unidades geoestruturais do conjunto paisagístico da Chapada Diamantina. O primeiro elemento nesta discussão refere-se ao elenco e ordenamento de conteúdos aplicados, num segundo momento buscou-se entender de que forma esses conteúdos auxiliam o conhecimento da dinâmica genética e evolutiva desta feição de relevo em escala regional. A discussão sobre as Teorias Geomorfológicas é essencial a compreensão dos fenômenos em escala megageomorfologia. A gênese das grandes superfícies de relevo segundo as concepções do Ciclo Geográfico introduz ao curso de Geomorfologia o preceito teórico necessário a compreensão dos modelos evolutivos assim como a discussão básica sobre conceitos indispensáveis ao estudo como o esclarecimento sobre níveis de base, talvegues, interflúvios, modelados e erosão diferencial. Considera-se que estes temas devam fazer parte do cotidiano das aulas de Geomorfologia. Sendo assim, a análise do processo de sistematização da Geomorfologia enquanto ciência é imprescindível, para tanto destaca-se as ideias contidas em KING (1956).

Material e métodos

Esta perspectiva metodológica foi idealizada sob a forma de 03 (três) fases distintas e interdependentes. Destacaram-se as seguintes: Fase I – Momento de discussão dos conteúdos em sala de aula Posteriormente as discussões sobre os conteúdos apoiados nas literaturas básicas efetuou-se a primeira avaliação, consubstanciada na aplicação de Lista de Exercícios aplicados ao grupo de discentes com o objetivo de conferir a devida consistência teórica aos conceitos, categorias e fenômenos geomorfológicos de forma a estimular o raciocínio lógico (OLIVEIRA, 2006). Fase II – Preparação para o trabalho de campo em Geomorfologia O roteiro definido para a aula de campo foi o roteiro que abrange parte do Recôncavo Baiano nas cidades de Santo Antônio de Jesus, Cruz das Almas e Cachoeira. Posteriormente a cidade de Feira de Santana e Riachão do Jacuípe. Por fim, a Região de entorno dos municípios de Capim Grosso e Jacobina. Nesta fase os alunos realizaram pesquisas sobre os aspectos ambientais do roteiro delineando o perfil das feições de relevo e a paisagem geral dos domínios morfoestruturais visitados. Fase III – Campo como método exploratório de hipóteses Nesta fase os conteúdos discutidos em sala a partir das aulas expositivas, das análises de artigos de Geomorfologia e a realização das listas de exercícios subsidiaram a realização de inúmeras discussões sobre hipóteses a cerca da gênese e evolução das formas de relevo visitadas. As Teorias Geomorfológicas (Pediplanação, Peneplanação, Equilibrio Dinâmico, Etchplanação) analisadas anteriormente, associadas aos estudos dos fenômenos ativos das ciências Geológica e Geomorfológica correspondem aos instrumentos ideais para estimularem o raciocínio lógico na exploração das hipóteses sobre os processos envolvidos na evolução do relevo, conforme Valadão (1998). Destaca-se que as discussões são produzidas no intuito de estimular o raciocínio lógico sobre a evolução da paisagem. Dos pontos analisados no roteiro de campo descrito anteriormente enfatizou-se os seguintes domínios geomorfológicos: i. Domínio dos Tabuleiros Interioranos; ii. Domínio da Depressão Sertaneja; iii. Domínio da Serra da Jacobina; iv. Domínio da Serra do Tombador. Fase IV – Revisitando o roteiro de campo Na primeira aula posterior ao Trabalho de Campo, realizou-se discussão em sala de aula sobre os conteúdos e as questões práticas idealizadas no transcorrer da viagem. Foi produzido croqui no quadro branco representativo do perfil geológico e geomorfológico dos Domínios Morfológicos. Foram discutidas questões sobre legenda geológica, geomorfológica e das cronologias das estruturas geológicas. No referido contexto, buscou-se abarcar as unidades de uso sócio econômica da paisagem.

Resultado e discussão

As discussões referentes aos conteúdos constituem a tônica do método aplicado com o intuito de estimular o raciocínio lógico sobre a evolução da paisagem. Dos pontos analisados no roteiro de campo descrito anteriormente, enfatizou-se os seguintes domínios geomorfológicos: i. Domínio dos Tabuleiros Interioranos; ii. Domínio da Depressão Sertaneja; iii. Domínio da Serra da Jacobina; iv. Domínio da Serra do Tombador. i. Domínio dos Tabuleiros Interioranos - Foram analisadas as vertentes da feição tabular (BR 101 – proximidades do acesso a Santo Antônio de Jesus). No seu contexto regional a paisagem investigada enquadra-se geomorfológicamente no Domínio dos Tabuleiros Interioranos. Foram levantadas discussões sobre a constituição geológica dos terrenos. Neste contexto, foi abordado também as características do clima e suas interferências na produção das formas de relevo. Tendo em vista certa compreensão dos aspectos influenciadores na evolução das formas foi realizada discussão a respeito dos processos genéticos, levantou-se discussão sobre a importância das formações vegetais e dos sistemas hidrográficos para a produção dos modelados assim como os moldes de uso dos solos. Questões paleoclimáticas também foram levantadas discutindo-se temas como as glaciações, oscilações do nível do mar e suas repercussões para a evolução da paisagem continental. As discussões foram possíveis devido à compreensão da interação entre fatores climáticos e da dinâmica interna para a produção dos relevos. Conhecimentos sobre termos como talvegues, mantos de alteração, sistemas de drenagem e equilíbrio dinâmico das vertentes, ampla discussão sobre os modelos de apropriação do relevo foi realizada com base nos processos de exploração da pecuária e dos demais modelos de uso dos solos como a agricultura e a urbanização, segundo Christofoletti (1973). ii. Domínio da Depressão Sertaneja - No Domínio da Depressão Sertaneja foram discutidos os seus processos genéticos e evolutivos. Tais discussões aconteceram na região do vale do Rio Jacuípe e nas proximidades do Município de Capim Grosso. Nesses ambientes foram discutidas no modelo de Pediplanação referenciando os processos de regressão paralelas das vertentes e produção de feições residuais do tipo Inselbergs. Os pontos de discussão levantados partiram da dinâmica climática e intempérica, ou seja, indagações sobre quais as hipóteses dos processos envolvidos na formação dos Pedimentos e dos Inselbergs. Foram discutidos os diversos processos de depredação ambiental tais como o desmatamento generalizado das caatingas no Domínio da Depressão Sertaneja e a proliferação de queimadas como método de utilização dos solos. Explorou-se discussões sobre os impactos resultantes das atividades antropogênicas e suas consequências como a erosão dos solos e o assoreamento das drenagens locais. Para o aprofundamento dos temas relacionados exigiu-se dos discentes a devida atenção e conhecimentos prévios com ideias consistentes. As discussões são de extrema importância, pois os conteúdos vão sendo desvelados pelos próprios discentes. O trabalho docente consiste apenas no papel de norteamento das discussões para alcançar o objetivo mais próximo dos processos envolvidos na dinâmica da paisagem. Cabe ressaltar que as discussões são encerradas apenas a após a discussão de todas as hipóteses e formação das conclusões. iii. Domínio da Serra da Jacobina e da Serra do Tombador - Constituem duas unidades estruturais de significada expressão altimétrica, correspondem a prosseguimentos estruturais das cordilheiras do Espinhaço mineiro com prolongamento Norte e Sul e evidenciando bifurcação no território baiano de sessões de anticlinais arrasados constituídos essencialmente de rochas quartzíticas com idades estimadas no Proterozóico Médio e Superior. Os terrenos geológicos altamente afetados pelo diastrofismo resultaram em sistemas de delineamentos estruturais altamente didáticos e apropriados ao ensino de Geomorfologia. Dentre os temas analisados, discutiu-se a relevância dos processos tectônicos que constituíram um dos mais proeminentes sistemas de relevos do estado da Bahia, conferindo também através dos processos diastróficos expressiva gênese de reservas mineralógicas. A serra do Tombador constitui-se numa escarpa de falha de com 75 Km de extensão com terrenos formados no transcorrer do Proterozóico Médio localizadas na região central do estado Bahia. Vale ressaltar que seus aspectos morfológicos, mineralógicos, sedimentológicos e estratigráficos são amplamente estudados desde o inicio do século. Constitui-se numa das regiões mais estudadas do Brasil. Grupos de docentes pesquisadores e aulas práticas dos cursos de Geomorfologia e Geologia das mais diversas universidades brasileiras ocorrem nesta região devido a sua riqueza de registros geológicos e feições de relevo. O contexto de estudo abordado nos remete a gênese de bacias sedimentares em sistemas de cratônicos, cujos conceitos e temas já tinham sido abordados em sala. Diretamente foram discutidos temas como paleoclimas no transcorrer há mais de um bilhão de anos antes do presente e paleopaisagens distintas das atuais com predominância de ambientes desérticos. Sobre este arcabouço estrutural foram gerados relevos custiformes, relevos tabulares assim como as serras da Jacobina e do Tombador. Tais questões são tratadas com o grupo de forma a induzir o raciocínio lógico. Foram analisados barrancos, vertentes e depressões ao longo da Br 324 no sentido Jacobina à cidade de Morro do Chapéu. Foram visualizados espessos estratos de quartzitos com forte inclinação geral NNE-SSW . Após breves discussões foram diagnosticados sistemas de cuestas típicas de ambientes deposicionais de borda de bacias sedimentares. Essa região constitui-se num verdadeiro museu geológico com registros precisos da dinâmica tectônica e deposicional da antiga bacia sedimentar. A relevância da compressão a cerca da erosão diferencial e da mineralogia das rochas para o entendimento da formação dos relevos são a tônica das aulas ao longo das serras da Jacobina e do Tombador. O resíduo do relevo cuestiforme é observado na Serra do Tombador ao longo da BR 324 no sentido Morro do Chapéu para Jacobina. No from (parte frontal do relevo cuestiforme direcionada para a borda externa da Bacia Sedimentar) da cuesta foi observada uma depressão escavada ao longo dos rebordos de uma antiga bacia sedimentar. Tais conclusões são consideradas a partir de inúmeras discussões e análises do direcionamento dos estratos sedimentares e posicionamento do local mediante ao contexto geológico regional da antiga bacia de sedimentação. Ocorreram inúmeras discussões subsidiadas pela utilização da Carta Topográfica da SUDENE escala 1.1:00.000 e Mapa Geológico do Estado da Bahia com escala de 1: 1. 000.000. Foram discutidos detalhadamente no transcorrer do Trabalho de Campo em todos os locais analisados as repercussões das atividades antropogênicas e suas repercussões econômicas. A apropriação do relevo foi caracterizada e discutida com base nos moldes dos usos solos. A saber, foram analisadas as atividades econômicas como a pecuária, o processo de urbanização e da mineração sobre as unidades da paisagem. Assim como os usos múltiplos dos recursos hídricos e os impactos ambientas advindos do desmatamento generalizado nos ambientes visitados e seus impactos sobre as bacias hidrográficas inseridas ao longo do roteiro. Os conteúdos ministrados em sala de aula forma exaustivamente explorados no transcorrer do trabalho de campo. Neste sentido, as fases descritas no item materiais e métodos consubstanciaram um curso de Geomorfologia produtivo e relevante à formação do licenciado em Geografia.

Considerações Finais

A análise da literatura proporcionou as condições necessárias para que os conteúdos fossem trabalhados de forma sistemática e em condições didático pedagógicas mais adequadas ao ensino de Geomorfologia. Este trabalho estimulou a reflexão sobre os procedimentos pedagógicos de forma a intensificar formas variadas e de se trabalhar os conteúdos geomorfológicos propiciando aos discentes o desenvolvimento de consciência reflexiva sobre as hipóteses acerca dos elementos evolutivos da paisagem nos seus diversos níveis escalares. A discussão sobre conjunto de hipóteses foi a tônica da metodologia utilizada, ou seja, é imprescindível, discutir-se os terrenos geológicos e sua constituição mineralógica associando-os à sua participação conjunta com os sistemas de falhamentos e dobramentos para a produção das feições geomorfológicas. Tais ideias exigem conhecimento prévio do glossário geomorfológico e geológico. Os resultados foram extremamente positivos para o processo ensino e aprendizagem. Os discentes detiveram o tempo necessário para aprimorar e assimilar os conceitos de fundamentação da Geomorfologia consubstanciados na realidade paisagística regional, a partir do trabalho de campo como marco metodológico. O referido trabalho prossegue no intuito de aprimorar a prática pedagógica no ensino superior em Geomorfologia.

Agradecimentos

Referências

CHRISTOFOLETTI, A. As Teorias Geomorfológicas. Noticia Geomorfológica.1973.
OLIVEIRA, A.O.S.P.A., NUNES, J. A. O. Contextos e significados do relevo para o ensino de Geomorfologia. Caderno Prudentino de Geografia, nº31, vol.1. 2009.
OLIVEIRA, A. O. S. A. Contribuição teórico-metodológica no ensino de Geomorfologia. Anais do VI Simpósio Nacional de Geomorfologia – Regional Conference on Geomorphology. Goiania. 2006.
KING, L. C. Geomorfologia do Brasil Oriental. Revista Brasileira de Geografia.1956.
VALADÃO, R.C. Evolução de longo termo do relevo do Brasil Oriental: desnudação, superfícies de aplanamento e soerguimentos crustais. Tese (Doutorado em Geologia) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 1998.