Autores

Santos, C.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO) ; Vital, S.R.O. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE) ; Girão, O. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO) ; Santos, J.L. (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE)

Resumo

O presente trabalho tem por objetivo detectar a ocorrência de áreas suscetíveis à erosão na Bacia Hidrográfica do Rio Jaguaribe, localizado na cidade de João Pessoa, estado da Paraíba. Para tanto, foi estabelecida a relação entre variáveis geomorfológicas e de cobertura da terra, a partir de dados cartográficos digitais (SRTM e imagens de satélite). Esses dados foram mensurados em ambiente SIG a partir do processo de álgebra de mapas, tendo como produto final o mapa de suscetibilidade a erosão. Na ocasião, foram consideradas as variáveis declividade, cobertura da terra e orientação das vertentes. Os resultados indicaram que as áreas de maior grau de suscetibilidade a erosão resultam da correlação entre o maior grau de declividade, a exposição do solo e a orientação das vertentes predominantemente para leste e sudeste.

Palavras chaves

Erosão; álgebra de mapas; bacia do rio Jaguaribe

Introdução

A urbanização desencadeia um processo de intensas transformações antrópicas realizadas na superfície terrestre. Tal processo se materializa na alteração da dinâmica hidrológica e geomorfológica do espaço urbano, em decorrência da retirada da vegetação e pela introdução de novos materiais sobre o solo, dentre outros aspectos. Um dos primeiros reflexos da formação de um núcleo urbano sobre um ambiente fluvial são as alterações sobre o escoamento superficial, pois a impermeabilização do solo acarretará na diminuição da infiltração da água das chuvas, e, em alguns casos, na impermeabilização total, aumentando, consideravelmente, o escoamento superficial, o que promove um maior poder erosivo das áreas de solo exposto, tendo como consequência, o assoreamento dos canais fluviais da bacia hidrográfica. Uma vez que o canal se encontra assoreado, a sua capacidade de armazenamento diminui, tornando a área mais suscetível à ocorrência de enchentes e inundações. Para Gregory (2006), o processo de impermeabilização do solo resulta também no aumento da vazão do rio, pois promove um aumento significativo na disponibilidade de água no canal, principalmente em situação de extrema pluviosidade, o que irá promover um maior processo erosivo das margens. A exposição do solo acelera os processos erosivos mediante o escoamento superficial difuso (erosão em lençol), a concentração dos fluxos (erosão em ravinas), podendo evoluir para um escoamento mais concentrado, chegando a formar voçorocas, que são incisões mais profundas no solo, as quais atingem o lençol freático (GUERRA E MARÇAL, 2012). O clima, a natureza do solo, a declividade do terreno e ao manejo do solo, são fatores que condicionam o grau de suscetibilidade a erosão dos solos (Lepsch, 2010). Para Guerra et al. (2010), a ação da chuva representa o principal fator da erosão. Quando ocorre decorrente de ações humanas, o processo erosivo constitui o mais sério impacto humano causado ao meio ambiente (GOUDIE, 1990). No município de João Pessoa (PB), assim como em diversos outros municípios de grande e médio porte, pode-se detectar problemas dessa natureza. Umas das áreas mais impactadas no referido município, corresponde à Bacia Hidrográfica do Rio Jaguaribe, apresentando a ocorrência de áreas de risco relacionados a erosão do solo e movimento de massa, além dos riscos de natureza hidrológica: enchentes, inundações e alagamentos (VITAL et al, 2016; SANTOS, 2016). A referida bacia encontra-se inserida entre as coordenadas 29000 mE 9214000 mN e 300000 mE 9206000 mN, no fuso 25 Sul, num contexto totalmente urbano, desde sua nascente até sua foz, o que contribui substancialmente para o aumento de sua vulnerabilidade à ocorrência de impactos ambientais. Conforme Melo (2001), o processo de urbanização na área se iniciou com maior ênfase a partir da década de 1980. Nesse período, foi possível observar a expansão de grande número de aglomerados inadequados, concomitantemente às áreas de alto padrão imobiliário. Desse modo, o presente trabalho tem por objetivo detectar a ocorrência de áreas suscetíveis à erosão na Bacia Hidrográfica do Rio Jaguaribe a partir da relação entre variáveis geomorfológicas e de cobertura da terra.

Material e métodos

A classificação das áreas susceptíveis a erosão na bacia do rio Jaguaribe foi elaborada a partir de um processo de álgebra, envolvendo os mapas de declividade, cobertura da terra e orientação das vertentes, atribuindo pesos para cada mapa e para suas respectivas variáveis, conforme sua maior ou menor influência quanto a ocorrência de processos erosivos. A classificação da cobertura da terra foi realizada a partir da aplicação da classificação supervisionada de imagem de satélite, que consiste numa técnica de sensoriamento remoto, bastante utilizada como método para reconhecer os elementos que recobrem a superfície terrestre. Esta etapa consistiu, basicamente, em identificar os tipos de cobertura da terra existentes na imagem, a partir da sua resposta espectral. Com o auxílio do software SPRING foi realizada a leitura dos pixels referentes a cada tipo de cobertura da terra, sendo necessário realizar primeiramente a coleta de amostra de pixels. A imagem utilizada foi obtida a partir do satélite Rapideye, no ano de 2013. Essa imagem possui resolução espacial de 5 metros, 3 bandas no visível e duas no infravermelho próximo, além de possuir alta eficiência em termos de resolução temporal. Foram diferenciadas cinco classes de cobertura da terra (água; vegetação nativa; vegetação secundária; urbanização e; urbanização/solo exposto). O critério estabelecido para a definição das classes de uso baseou-se na resolução espacial da imagem de satélite e no objetivo do estudo. As informações geomorfológicas foram obtidas a partir da confecção dos mapas de declividade e orientação de vertentes. Para a extração dessas informações foi utilizada uma imagem do SRTM (Shuttle Radar Topographic Mission), obtida no TOPODATA (Banco de Dados Geomorfométricos do Brasil), com resolução espacial de 30 metros. A partir desta imagem, foi gerada uma Grade Irregular Triangular (TIN), da qual foram extraídas as referidas informações geomorfométricas. Foram atribuídos os seguintes pesos para cada elemento dos mapas temáticos, conforme o grau de relevância frente a ocorrência dos processos erosivos: • Declividade (0-3% / 3-8% = peso 1; 8-13% / 13-20% = peso 2; 20-45% / >45% = peso 3. • Cobertura da terra (Água / Vegetação nativa = peso 1; Vegetação secundaria = peso 2; Solo Exposto / Urbanização = peso 3. • Orientação das vertentes (Plano / Sudoeste / Oeste / Noroeste = peso 1; Norte / Nordeste / Sul = peso 2; Leste / Sudeste = peso 3. De posse dos mapas temáticos mencionados, foi realizada uma operação de álgebra de mapas, onde foram estabelecidos os seguintes pesos: • Declividade = 0,45; • Cobertura da terra = 0,35; • Orientação das vertentes = 0,20 O peso 0,45 foi atribuído a declividade devido a forte influência da gravidade na ocorrência de erosão. A cobertura da terra atribuiu-se o peso 0,35 por constituir um fator potencializador, ou até mesmo o gatilho para gênese do processo de erosão. No caso das vertentes, aquelas orientadas para leste e sudeste, representam as encostas mais susceptíveis a ação dos sistemas climáticos produtores de chuva atuantes na área de estudo, sendo atribuído o peso 0,20 para a orientação das vertentes.

Resultado e discussão

A partir da análise do mapa de cobertura da terra, é possível inferir, inicialmente, que a ocorrência do espelho d’água encontra-se restrita às Três Lagoas (baixo curso fluvial) e a alguns pequenos pontos esparsos ao longo do curso fluvial. As poucas situações em que esta classe aparece na classificação da imagem se deve tanto à baixa resolução espacial das imagens, não sendo possível uma melhor captura da reflectância das águas do rio, como também ao elevado nível de assoreamento ao qual a área está submetida. A vegetação nativa representa os resquícios de Mata Atlântica presente na cidade de João Pessoa, estando sua maior área de ocorrência inserida, exatamente, entre os limites da bacia do rio Jaguaribe, na transição entre o baixo e o médio curso fluvial e dentro do Jardim Botânico Benjamim Maranhão (Mata do Buraquinho). A urbanização, por sua vez, é o tipo de ocupação que está em maior evidência na área de estudo, o qual se encontra em estágio de crescimento. Sua atuação se dá em toda a extensão da bacia, onde é possível detectar áreas de baixo, médio e alto padrão. Outro destaque importante pode ser dado à classe urbanização/solo exposto. Esta se refere tanto às áreas de expansão urbana, que se encontra em estágio inicial de urbanização, predominante na porção leste da bacia; como às áreas onde ocorrem os aglomerados inadequados, onde há pouca ocorrência de ruas calçadas ou asfaltadas, as quais estão mais precisamente localizadas ao longo das margens fluviais e das vertentes. A distinção do modo de cobertura da terra na bacia do rio Jaguaribe pode ser realizada de modo associado à divisão das unidades do relevo e a distinção em áreas de alto/médio padrão imobiliário e área de baixo padrão imobiliário. As áreas de alto e médio padrão imobiliário ocorrem, predominantemente, no topo dos tabuleiros, onde o processo de impermeabilização do solo é mais intenso. No alto e médio curso fluvial, essa situação se associa a construção de pavimentação nas vias apenas na porção interfluvial, localizada entre os divisores de águas e a inflexão topo/encosta. O escoamento superficial é potencializado pela redução quase total da infiltração, aumentando o poder erosivo das águas pluviais que entram em contato com o solo desnudo nas vertentes. Outra forma de cobertura da terra encontrada na bacia do rio Jaguaribe, são os aglomerados inadequados de baixo padrão imobiliário, inseridos nas bordas dos tabuleiros, no sopé das encostas e na planície fluvial, que se caracteriza por ser um tipo de ocupação que normalmente apresenta infraestrutura inadequada, marcada pela construção de sistemas de drenagem clandestinos e o lançamento de esgotos e efluentes. O contexto acima apresentado resulta na formação de pequenas incisões erosivas no solo, como também, incisões profundas e amplas como as voçorocas, aumentando a carga de sedimentos carreada para a calha fluvial e o seu consequente assoreamento. De modo geral, em toda a extensão da bacia está ocorrendo aumento do processo de impermeabilização do solo, pois é evidente o forte processo de urbanização apresentado pela cidade de João Pessoa nos últimos anos. Este contexto foi corroborado pelo mapa de suscetibilidade à erosão (figura 2), uma vez que foi possível observar que as áreas de alto risco se encontram, justamente, distribuídas ao longo das vertentes íngremes, onde ocorre solo exposto. As áreas detectadas coincidem exatamente com algumas das áreas de risco mais conhecidas do município de João Pessoa, a exemplo do bairro São José, localizado na porção nordeste da bacia. As zonas de baixo risco correspondem, exatamente, às porções impermeabilizadas, onde se distribuem as moradias de alto e médio padrão e as zonas de médio risco às porções da inflexão topo/encosta.

Erosão em escosta

feição erosiva em encosta na bacia do rio Jaguaribe, localizada no bairro de Cruz das Armas. Fonte: Vital et al. (2016).

Mapa de suscetibilidade a erosão

Mapa de suscetibilidade a erosão da bacia hidrográfica do rio Jaguaribe

Considerações Finais

As áreas mais susceptíveis a erosão na bacia do rio Jaguaribe estão localizadas, sobretudo, ao longo das vertentes íngremes no alto curso fluvial, onde são encontradas declividades mais acentuadas, notadamente nos Bairros de Cruz das Armas, Cristo Redentor e na comunidade do Timbó; nas encostas que delimitam os terraços fluviais no médio curso (Comunidade Santa Clara), bem como nas falésias inativas localizadas no baixo curso fluvial (Bairro São José). O desmatamento das encostas e o aumento do poder erosivo da água devido impermeabilização do topo dos tabuleiros são os responsáveis diretos por desencadear processos erosivos lineares acentuados, formando incisões profundas no solo. Desse modo, é possível afirmar que a ocorrência de áreas de risco de erosão é produto das alterações da cobertura do solo, representadas pelo desmatamento, impermeabilização do solo e a ocupação de áreas suscetíveis a erosão.

Agradecimentos

Referências

GREGORY, K. J. The human role in changing river channels. In: Geomorphology, v. 79, p.172–191. 2006.
GUERRA, A. J. T. e MARÇAL, M. S. Geomorfologia Ambiental. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.
LEPSCH, I. F. Formação e conservação dos solos. São Paulo: Oficina de Textos, 2010.
GOUDIE, A. The human impact on the natural environment. Oxford, Blackwell Publishers, 1990.
GUERRA, A. J. T. O Início do Processo Erosivo. In: GUERRA, A. J. T.; SILVA, A. S.; BOTELHO, R. G. M. (Eds.). Erosão e Conservação dos Solos: conceitos, temas e aplicações. 6ª Ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010.
MELO, A. S. T. HECKENDORFF, W. D. ALVES, E. L. GUIMARÃES, M. M. M. O meio ambiente natural: componentes abióticos e bióticos. In: Melo, A. S. T. (Org.). Projeto de Pesquisa: Vale do Jaguaribe, João Pessoa: Ed. UNIPÊ, 2001.
SANTOS, C.L. Análise da suscetibilidade à ocorrência de enchentes e inundações na bacia do rio Jaguaribe – João Pessoa/PB. Dissertação (Mestrado) – Programa de pós-graduação em geografia, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2016.
VITAL, S. R. O.; FERREIRA, B.; GIRÃO, O.; SANTOS, C. L.; NUNES, F. C.; SILVEIRA, T. A. Base cartográfica digital como instrumento para a identificação de áreas suscetíveis à erosão e movimentos de massa em João Pessoa (PB), Brasil. Revista Geográfica de América Central, v. 2, n. 57, 2016.