Autores

Dias, K.G.C. (UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE) ; Cerqueda, M.L.A. (SECRETARIA MUNICIPAL DE DEFESA CIVIL DE NITEROI) ; Bastos, R.A. (UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE) ; Castro, A.P.M. (UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE)

Resumo

Desastres naturais fazem parte do cotidiano brasileiro e isso se deve principalmente ao clima e relevo predominantes no território nacional. Entretanto, a urbanização - que sofreu aceleração nas últimas décadas, ao longo de faixas litorâneas no sudeste do país, especialmente em áreas verticalizadas, evidencia e catalisa processos naturais como deslizamentos/escorregamentos e quedas/rolamentos de blocos, que afetam grande parcela da população que vivencia estes locais. Para o desenvolvimento desta pesquisa foram selecionados os bairros Fonseca e Jurujuba, localizados no município de Niterói - RJ, por estes apresentarem altos índices de ocorrência de movimentos gravitacionais de massa, e diferentes características quanto à ocupação urbana e processos predominantes em suas encostas. Através da produção de Cartas de ocupação urbana, Modelos Digitais de Elevação (MDEs) e gráficos de precipitação mensal, foi analisada a ocorrência e espacialização de movimentos de massa na Área de estudo

Palavras chaves

Movimentos de Massa; Urbanização; Precipitação

Introdução

Desastres naturais fazem parte do cotidiano brasileiro e isso se deve principalmente ao clima e relevo predominantes no território nacional. No entanto, a urbanização (acelerada nas últimas décadas) ao longo de faixas litorâneas no sudeste do país, em áreas verticalizadas, evidencia e catalisa processos naturais como escorregamentos e quedas de blocos, que afetam grande parcela da população que vive nestes locais. Neste contexto, o objetivo geral deste projeto é associar ocorrências de movimentos gravitacionais de massa nos bairros Fonseca e Jurujuba, Niterói-RJ a episódios de chuva entre os anos 2015 e 2016 e aos regimes de ocupação urbana nestes locais. Associados ao objetivo geral, os objetivos específicos são: 1) Identificar locais de ocupação consolidada e aglomerado subnormal nas áreas de estudo e relacioná-las a ocorrências de movimentos de massa; 2) Correlacionar dados de precipitação de pluviômetros locais às ocorrências; e 3) Compilar informações acerca dos fenômenos e das áreas de estudo selecionadas, a fim de contribuir para a caracterização destes locais e possíveis políticas públicas que possam ser implantadas a fim de diminuir o risco a que estas áreas e os habitantes que nela vivem estão sujeitos. O município de Niterói, localizado na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sofreu em abril de 2010 a tragédia do “Morro do Bumba”, na qual após dias seguidos de forte precipitação, houve o deslizamento e desabamento associado de dezenas de casas em parte do bairro Viçoso Jardim, culminando em mortes e pessoas desalojadas ou desabrigadas. No entanto, este episódio, associado a Lei Federal 12.608/2012 contribuíram para a intensificação de esforços do município a fim de evitar novas tragédias através de estudos que visam aprimorar a caracterização do território (Cerqueda et al., 2015). Estes esforços podem ser representados através da Secretaria Municipal de Defesa Civil de Niterói (SMDCNit), que tem trabalhado no mapeamento de áreas com risco de movimentos gravitacionais de massa, além da implantação de sistemas de alerta e alarme em algumas áreas do município, com a instalação de pluviômetros e protocolos de acionamento em caso de chuvas fortes atuando na região. Através do SIDEC – Sistema de Informação da Defesa Civil, é possível identificar atendimentos a ocorrências de movimentos gravitacionais de massa e suas respectivas informações, como: local, data, horário e relatório sobre o caso. Aliando estas informações a dados de pluviômetros administrados pela mesma Secretaria é possível analisar se há relação entre os processos de deslizamento/escorregamento e queda de blocos e volumes de precipitação no município de Niterói. Para o desenvolvimento deste trabalho foram selecionados os bairros Fonseca e Jurujuba (Figura 1), por estes apresentarem altos índices de ocorrência de movimentos gravitacionais de massa, embora apresentem características que os diferem.

Material e métodos

O desenvolvimento desta pesquisa conta com três fases de elaboração, sendo elas a coleta e compilação de dados, a análise e o desenvolvimento das informações. A fase de coleta e compilação consiste na pesquisa e leitura de referências bibliográficas e dados para a elaboração dos produtos, seguida pela análise destas referências e dados, de forma a associá-los e encontrar relações, através de padrões, semelhanças ou diferenças entre os mesmos. A fase de desenvolvimento das informações consiste na representação, através de mapas, gráficos, tabelas e propostas, das associações percebidas na fase anterior, de forma a facilitar a visualização destes dados e análises. As atividades foram realizadas em campo e em escritório. Em campo foram realizados o reconhecimento de área concomitantemente à atividade de acompanhamento no atendimento de solicitações de vistoria da Defesa Civil de Niterói.Em escritório foram realizados levantamentos bibliográficos e cartográficos, através da obtenção por meio digital de dados de diferentes órgãos, como a CPRM (Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais), ANA (Agência Nacional de Água), e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Os dados referentes aos pluviômetros e atendimentos de ocorrência foram obtidos junto às Diretorias de Minimização e Operacional, respectivamente, da SMDCNit, com o uso de sistema informatizado próprio para o controle das ocorrências. A fase de análise foi realizada com base nos dados obtidos em escritório e em campo, e os mesmos foram trabalhados de forma a proceder com o desenvolvimento das informações a partir de textos, tabelas, gráficos, mapas e modelos digitais de elevação (MDEs). A confecção das cartas temáticas e modelos digitais de elevação se deu a partir de imagens do Levantamento Aerofotogramétrico e Perfilamento a Laser de Niterói, ano 2014, e arquivos vetoriais elaborados e fornecidos pela Prefeitura Municipal de Niterói e IBGE. Para o desenvolvimento desta atividade foram utilizados os softwares ArcGIS 10.5 e QGIS 2.18. Além do desenvolvimento de cartas temáticas e MDEs, a confecção de gráficos, tabelas e dados textuais foi de suma importância, tendo sido realizada através dos programas Microsoft Word e Excel 2007. A partir das incursões a campo e interpretação das imagens das ortofotos obtidas através do Levantamento Aerofotogramétrico e Perfilamento a Laser de Niterói, 2014, além da contribuição dos arquivos vetoriais de edificações que podem ser consideradas como ocupação consolidada, e arquivos vetoriais de edificações caracterizadas como aglomerado subnormal, foi possível identificar manchas de ocupação consolidada e aglomerado subnormal na área de estudo, interpolando estes dados e caracterizando-os conforme embasamento bibliográfico. Ressalta-se que as ortofotos e arquivos vetoriais de edificações foram obtidos através do Sistema de Gestão da Geoinformação (SIGeo) da Prefeitura Municipal de Niterói, e os arquivos vetoriais de aglomerado subnormal foram obtidos através do portal online do IBGE, e através destes dados foram produzidas Cartas de Ocupação Urbana para cada um dos bairros. A partir dos relatórios produzidos pela SMDCNit foram coletadas as coordenadas projetadas dos locais em que houveram ocorrências de movimentos de massa nos bairros Fonseca e Jurujuba, nos anos de 2015 e 2016.A partir destes dados foi criado um arquivo vetorial em pontos, que foi sobreposto às cartas de ocupação urbana dos respectivos bairros, em ambiente SIG, possibilitando a associação das ocorrências e o regime de ocupação mais afetado por estes processos (Figura 2). A partir de dados de pluviômetros gerenciados pela SMDCNit, e através do Microsoft Office Excel, foram feitos gráficos de precipitação de Fonseca e Jurujuba, com dados mensais dos anos 2015 e 2016.

Resultado e discussão

Na carta de ocupação urbana do bairro Fonseca é possível identificar com facilidade a presença de uma ampla área de ocupação consolidada na região central do bairro, ao redor da Alameda São Boaventura, onde a topografia é predominantemente de pouca variação, enquanto as áreas de aglomerado subnormal ocorrem nas encostas de elevações nas regiões norte, sul e leste do bairro. Na carta de ocupação urbana de Jurujuba é possível identificar, assim como no Fonseca, o estabelecimento da ocupação consolidada nas áreas de relevo menos acidentado que, no caso de Jurujuba, correspondem a uma estreita faixa na região nordeste do bairro e, mais uma vez, a ocupação das vertentes por edificações de aglomerado subnormal é nítida. É importante relacionar os tipos de ocupação a ocorrências de movimentos gravitacionais de massa haja vista as condições em que estas edificações são construídas. A ausência de projeto elaborado por responsável técnico e supervisão por profissional habilitado, a realização de cortes e aterros nas encostas, o despejo indevido de resíduos na forma de sumidouros, são alguns dos fatores que contribuem para a ocorrência de processos erosivos e para a intensificação de movimentos gravitacionais de massa. Analisando as Cartas de ocupação urbana e ocorrências de movimentos de massa dos bairros Fonseca e Jurujuba (Figura 2) e os Modelos Digitais de Elevação (Figura 3) dos respectivos bairros é possível relacionar as ocorrências de Deslizamento/Escorregamento e Queda/Rolamento de blocos nestes locais não somente à declividade do terreno, mas também ao tipo de ocupação, no caso, áreas de aglomerado subnormal e associar estas ocorrências a situações de moradias de baixo padrão construtivo, a prática de cortes e aterros nas encostas, despejo de resíduos de forma inapropriada, remoção da vegetação nativa e substituição por espécies não apropriadas ao local, além de outros fatores que contribuem para a desestabilização do terreno e aumento da vulnerabilidade dos locais a estes processos. Como resultado da elaboração de gráficos de acumulados mensais em precipitação e quantitativo de ocorrências por mês, para cada bairro e ano, foi possível identificar relação entre as chuvas e a desestabilização do terreno através de escorregamentos e quedas de blocos. A partir dos gráficos elaborados com os dados de 2016 (Figura 4) é possível observar o mesmo padrão de tendência proporcional de crescimento, na relação chuva x ocorrências de forma geral.

Figura 1

Mapa de localização da área de estudo. Fonte: Elaborado pelos autores

Figura 2

Cartas de ocupação urbana e ocorrências de movimentos de massa (anos 2015 e 2016) nos bairros Fonseca e Jurujuba, Niterói. Elaborado pelos autores.

Figura 3

Modelos Digitais de Elevação dos bairros Fonseca e Jurujuba, Niterói. Elaborado pelos autores.

Figura 4

Gráficos de associação entre precipitação acumulada mensal e quantidade de ocorrências em Fonseca e Jurujuba, ano 2016. Fonte: Elaborado pelos autores

Considerações Finais

Com base na coleta e processamento dos dados referentes a ocupação urbana, ocorrências de movimentos de massa e regime pluvial do município de Niterói - com ênfase aos bairros Fonseca e Jurujuba nos anos de 2015 e 2016, foi possível observar que a ocorrência de desastres naturais no município, neste caso, em relação a processos geomorfológicos, está fortemente relacionada à geologia e ao regime pluvial que ocorre na região, sendo este um significativo deflagrador destes processos, principalmente durante o verão. Entretanto deve-se destacar também a atuação antrópica como contribuinte do processo de modificação do relevo, ainda que em micro ou meso escala, haja vista que procedimentos realizados durante a fixação destas ocupações, sendo elas na forma de ocupação consolidada ou aglomerados subnormais, contribui fortemente como catalisadora e intensificadora dos processos erosivos que atuam naturalmente no regime climático-geomorfológico de Niterói. Há uma necessidade de consciência coletiva por parte dos habitantes destes locais quanto a simples ações que podem reduzir a vulnerabilidade a ocorrências de movimentos de massa, tais como: não realizar cortes e aterros, não despejar resíduos, sólidos ou líquidos, diretamente no solo, não realizar queimada na vegetação nativa das encostas, entre outras. Estas ações, aliadas à obras de estabilização de encostas e drenagem, que podem ser realizadas em parceria a órgãos públicos, podem minorar o risco a ocorrências de outras tragédias.

Agradecimentos

À Secretaria Municipal de Defesa Civil de Niterói pelos dados fornecidos e conhecimento adquirido junto à equipe e à Universidade Federal Fluminense.

Referências

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CERQUEDA, M. L. A.; ALVES, A. P. R. ; PEREZ, A. ; NEVES, B. ; ESCUDEIRO, E. P. . MAPEAMENTO PRELIMINAR COM VISTAS À VULNERABILIDADE A ESCORREGAMENTOS NA COMUNIDADE COCADA NO MUNICÍPIO DE NITERÓI-RJ.. In: Primeiro Congresso Brasileiro de Redução de Riscos de Desastres, 2015, Curitiba. Primeiro Congresso Brasileiro de Redução de Riscos de Desastres, 2015.
PENHA, Hélio Monteiro ; FERRARI, André Luís ; SILVA, A. da ; BOHRER, Cláudio Belmonte de Atayde; ROSAS, R. O.; LUDKA, Isabel ; SUAREZ, Beatriz Helena Serrano ; SOUZA, F.C.A.M.F. de ; DANTAS, A. C. M. ; FARIA, Clarisse Paranhos de ; PASSOS, Wagner Sena ; BUENO, Ingrid Caroline Motta . Avaliação das Encostas de Niterói (zonas Centro, Norte e Sul) com Vista aos Fenômenos de Deslizamentos. In: 9º Simpósio de Geologia do Sudeste, 2005, Niterói. Anais do 9º Simpósio de Geologia do Sudeste, 2005.