Autores

Lopes Oliveira, F. (UERJ/UMINHO) ; Carvalho da Silva Bezerra, H. (FEBF/UERJ)

Resumo

O Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (RJ) se projeta por sua peculiar geodiversidade, pois abriga raras rochas e feições, que indicam a possibilidade da ocorrência de atividades vulcânicas na região. Através da aplicação de entrevistas junto aos visitantes, em janeiro de 2015, foi diagnosticado que o principal interesse dos mesmos na Unidade se relaciona ao lazer, sendo a principal atividade realizada o banho em rios, cachoeiras e poços. O artigo objetiva analisar a função geomorfológica recreativa do Parque como potencialidade à geoconservação. Como principais resultados encontrados, observa-se que a visitação está intimamente ligada aos aspectos geomorfológicos do Parque, vertentes e cursos fluviais. Tal indicativo contribui para elaboração de estratégias de educação ambiental para a geoconservação, onde se corrobora não apenas para a promoção de conhecimentos para a população, mas também, para o senso de conservação das características abióticas por parte dos visitantes.

Palavras chaves

Função Geomorfológica; Área Protegida; Geoconservação

Introdução

Sendo um tema ainda recente no Brasil, na literatura internacional a geoconservação tem objetivado, principalmente, a proteção da geodiversidade que tenha peculiaridades seja por sua atratividade geoturística, raridade, valor cênico, didático e/ou científico; buscando, assim, o benefício das gerações atuais e futuras (SHARPLES, 2002; GRAY, 2004; 2013; BRILHA, 2005; 2015; NASCIMENTO et al., 2008; SILVA et al., 2008; COSTA, 2012; OLIVEIRA; COSTA, 2014). Segundo Brilha (2005), geoconservação - conservação da natureza abiótica e processos naturais associados -, em sentido amplo, tem como objetivo a utilização e gestão sustentável de toda a geodiversidade; e em sentido restrito, abrange apenas a conservação de certos elementos da geodiversidade que evidenciem qualquer tipo de valor superlativo, isto é, cujo valor se sobrepõe à média. Entende-se por geodiversidade, de acordo com Gray (2004, p.8), “[...] a variedade (diversidade) natural dos aspectos geológicos (rochas, minerais, fósseis), geomorfológicos (formas de relevo, processos) e do solo, incluindo suas coleções, relações, propriedades, interpretações e sistemas”. Ou seja, uma tríade constituída por materiais, formas e processos do mundo abiótico (GUIMARÃES et al. 2009). Em 2013, Gray amplia a definição de geodiversidade, incorporando topografia e aspectos hidrológicos. Entretanto, para uma efetiva geoconservação é fundamental ocorrerem diversas relações com a sociedade, garantindo a educação e o avanço científico na área das geociências, tanto para geração atual como para vindouras; inserindo-se no enquadramento legal associado com a conservação da natureza e o ordenamento do território; e permitindo, também, o desenvolvimento socioeconômico local, por intermédio da geovisitação. Neste contexto, o inventário, caracterização, conservação, divulgação, e monitoramento de sítios da geodiversidade e geossítios são essenciais para garantir a ligação destes com a sociedade, o que pode subsidiar ações de educação ambiental e geoconservação (BRILHA, 2009; 2015; BEZERRA et al., 2015). Neste contexto, a identificação da função da geodiversidade junto à sociedade torna-se fundamental uma vez que pode contribuir, a partir do conhecimento do valor e uso da natureza, para criação de estratégias recreativas e/ou educativas de conscientização e sensibilização ambiental, ou seja, colaborando por meio da educação ambiental para conservação da própria geodiversidade. De acordo com o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), os Parques Nacionais são apropriados para o desenvolvimento de estratégias de educação ambiental, pois são Unidades de Conservação (UC) que têm como objetivo básico, segundo seu Art. 11, “a preservação de ecossistemas naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo” (SNUC, 2000). A presente pesquisa faz parte de um projeto maior, de doutoramento, em desenvolvimento que tem como área de estudo o Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (PNMNI), localizado na Baixada Fluminense do Estado do Rio de Janeiro (figura 1). Trata-se de um Parque com grande beleza cênica e espaços recreativos e educativos naturais que agregam feições específicas que indicam a existência de um complexo vulcânico instinto de cerca de 70 milhões de anos (MOTOKI; MOTOKI, 2011). Diante disso, o presente trabalho objetiva analisar a função recreativa da geomorfologia do Parque indicando a sua potencialidade na educação ambiental e geoconservação, a partir de um estudo realizado junto aos visitantes do PNMNI.

Material e métodos

Foram realizadas pesquisas bibliográficas sobre os temas: geoconservação e geodiversidade, e funções da geodiversidade, e feitos trabalhos de campo para aplicação de questionário semiaberto junto aos visitantes do PNMNI, nos dias: 16, 17 e 18 de janeiro de 2015. Das questões existentes no questionário aplicado na pesquisa maior, foram selecionadas as seguintes perguntas para análise neste trabalho: “Qual é o principal interesse de visitar o PNMNI?” e “Qual é a principal atividade que praticou hoje no PNMNI?”. Objetivando, assim, obter informação sobre o interesse de uso do público dos que visitam o PNMNI, como também, das potencialidades para estratégias de valorização, conscientização e sensibilização do Parque. A partir disso, foram realizadas análises e considerações a respeito do interesse e atividades do visitante, das funções da geomorfologia do Parque, e das possibilidades de educação ambiental e geoconservação da Área Protegida.

Resultado e discussão

Em 2014, Murray Gray, define seis valores da geodiversidade: intrínseco, cultural, estético, econômico, funcional e científico/educacional. Tal definição tem como objetivo auxiliar na identificação dos geovalores, no reconhecimento de geopatrimônios, no destaque de geossítios de maior relevância científica, e na decisão do que é suficientemente significativo para conservar, podendo assim, subsidiar estratégias de geoconservação. Em 2013, o mesmo autor, discute as funções e serviços geossistêmicos dos valores da geodiversidade, exceto o intrínseco. Identificando os serviços de: cultura, conhecimento, provisão, regulação e suporte. Diante disso, e na perspectiva do uso da geomorfologia por visitantes em UC, podemos indicar a função recreativa que as geoformas têm, uma vez que as mesmas permitem atividades ligadas ao lazer como, por exemplo: banho (rios, cachoeiras e poços), trilhas com diferentes declividades do relevo (figura 2), rapel, e voo de asa delta. Tais costumam ser, em geral, muito atraentes à visitação, sendo, em muitos casos, o motivo para mesma. Com base nessa ideia, foram aplicadas questões junto aos visitantes do PNMNI, no período do verão de 2015, objetivando investigar quais são os principais interesses de visitação no Parque, e os destinos das suas visitações de fato. Um indicador que infere diretamente no uso público de um Parque Natural, e que é de grande importância no que se refere criação de medidas de educação ambiental e de geoconservação para a UC, é o percentual dos principais interesses do visitante. Esta análise permite subsidiar ações e práticas para a Área Protegida, a partir da identificação da motivação e hábito do próprio visitante. Com a análise dos dados referentes à aplicação das questões, pode-se observar que dos 42 visitantes, sendo 22 mulheres e 20 homens, 64% dos visitantes utilizam a Unidade visando o lazer, 17% destes objetivam um maior contato com a natureza, seguidos de 12% que buscam conhecimento, 5% têm interesse na prática de atividade física, e 2% em trabalho voluntário (figura 3). A importância da educação ambiental e da geoconservação, neste cenário, se concebe quando o visitante, ao fazer uso de elementos da geodiversidade, como: a cachoeira e as trilhas; e ao buscar conhecimentos sobre a possibilidade da existência passada do vulcão no Parque, pode passar por um programa e/ou atividade educativa que lhe gere maior conhecimentos, e um senso de conservação ambiental. Em paralelo, e igualmente relacionado às atividades de educação ambiental e geoconservação possíveis de se desenvolverem no Parque, está o indicador das principais atividades praticadas pelos visitantes na Unidade. A análise desta porcentagem permitiu identificar que, nos dias da aplicação dos questionários, 62% dos visitantes tiveram o banho de cachoeira como atividade principal, 19% dos visitantes realizaram caminhada na Estrada da Cachoeira (principal via de acesso do Parque), seguidos de 17% que realizaram caminhadas em trilhas pelo Parque, e 2% informaram que o piquenique foi a principal atividade que realizaram no dia da aplicação do questionário (figura 4). Analisando em conjunto os dois indicadores: principais interesses e principais atividades praticadas pelos visitantes (figuras 3 e 4), pode-se indicar que o uso público do PNMNI tem uma grande relação com a natureza, em particular, sua geodiversidade no que se refere à geomorfologia. Podemos ver essa relação, principalmente, no interesse de ir ao Parque para ter, ali, contato com a natureza, 17% (figura 4). Já com relação às práticas de lazer pretendidas e realizadas no Parque está o banho (em rio, cachoeiras e poços), a mais recorrente, 62%, o que indica a importância da geomorfologia da área como atrativo à sua visitação, seguindo depois a caminhada em trilhas. Tais indicadores são importantes no planejamento e elaboração de estratégias de educação ambiental, pois as mesmas podem partir de atividades de lazer e recreação, utilizando os espaços mais visitados para implementação de equipamentos interpretativos, como painéis, e práticas recreativas/educativas, como trilhas guiadas e discussões educativas e ambientais, dentre outros. Sendo assim, ressalta-se a importância função recreativa da geomorfologia, indicando a sua potencialidade na geoconservação, a partir da utilização de espaços frequentemente visitados pela sociedade que busca nestas áreas protegidas, a priori, como é o caso do PNMNI, a recreação.

Figura 1

Localização da área de estudo.

Figura 2

Atividades recreativas no PNMNI - a) Poço das Cobras (18/01/2015); Trilha da Varginha (13/03/2015). Fotos: Flávia Lopes Oliveira.

Figura 3

Gráfico com as porcentagens dos principais interesses de visitar o PNMNI.

Figura 4

Gráfico com as porcentagens das principais atividades praticadas pelos visitantes no PNMNI.

Considerações Finais

O presente artigo permitiu observar que, através dos indicadores levantados por meio das entrevistas realizadas junto aos visitantes do PNMNI, um dos principais interesses do Parque, por parte dos visitantes, relaciona-se ao lazer. Neste sentido, a mesma análise das entrevistas, em referência ao uso público na Unidade, aponta como atividade principal o banho (rios, cachoeiras e poços), onde a expressiva relação com a natureza, em particular de sua geodiversidade no que se refere a sua geomorfologia é notável. Logo, a relevância da geomorfologia da área através da função recreativa como atrativo a visitação, se projetam como significativos aspectos passíveis a subsidiar a elaboração de estratégias de educação ambiental para a geoconservação, onde a implementação de equipamentos interpretativos, e o desenvolvimento de discussões educativas e ambientais, por exemplo, corroboram para a promoção de conhecimentos das geociências, e do senso de conservação ambiental, assim, a médio e longo prazo, a população, que a priori busca somente a recreação, poderá a partir construir competências de conservação das características abióticas do Parque.

Agradecimentos

Agradecimento à Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ) pela bolsa de doutorado no Brasil e no exterior (Doutorado Sanduíche); ao departamento de extensão da UERJ (DEPEXT) pela bolsa de extensão; ao Grupo de Estudos Ambientais (GEA/UERJ); ao Núcleo Interdisciplinar de Estudos do Espaço da Baixada Fluminense (NIESBF/FEBF/UERJ), e ao Parque Natural Municipal de Nova Iguaçu (PNMNI).

Referências

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