Autores

Rosa, L.E. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; Cherem, L.F.S. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; Nunes, E.D. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS) ; Bayer, M. (UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS)

Resumo

A Serra Geral de Goiás corresponde a uma cuesta que divide duas paisagens com diferentes ocupações, o Vão do Paranã de Goiás e o Chapada do Oeste da Bahia. Ao longo de sua crista são observados diversas feições oriundas de processos gravitacionais que podem ser associados a aspectos de degradação ambiental ou de morfodinâmica. Nesta perspectiva, objetiva-se avaliar quais são os fatores controladores da dinâmica dos processos gravitacionais da cuesta no município de Posse (GO). Para tanto, a metodologia contou com a averiguação de aspectos climatológicos, geológico-geomorfológicos e cobertura e uso. Os resultados indicam que os movimentos de massa já eram observados antes da ocupação agropecuária do Oeste da Bahia, e podem estar associados a precipitações acumuladas superiores a 500 mm, a aspectos hidrológicos do Aquífero Urucuia e a suscetibilidade diferencial entre formações do Grupo Urucuia. Os resultados contribuem no entendimento da morfodinâmica de cuestas em ambientes tropicais.

Palavras chaves

Impactos ambientais; gestão do território; fatores controladores

Introdução

O limite entre os estados de Goiás e da Bahia corresponde a crista de uma cuesta na borda da bacia sedimentar do Urucuia, no Cráton do São Francisco (GASPAR; CAMPOS, 2007). Essa cuesta divide a região da Chapada do Oeste da Bahia, região sob intensa pressão do agronegócio, da região do Vão do Paranã (GO) (BRASIL, 2012). Ao longo dessa cuesta, conhecida como Serra Geral de Goiás, existem inúmeras feições correlatas a processos erosivos e gravitacionais que tem sido associadas à ocupação no reverso da cuesta em desconformidade. Em geral, a morfodinamica dessas cuestas é, em ambientes naturais, controlada por movimentos de massa e processos erosivos acelerados, independente do contexto climático regional (GOUDIE, 2004). Essa dinâmica já foi tratada em diversos estudos (CASSETI, 2005; SALGADO, 2007, BRASIL, 2009). Zancopé et al., (2013) afirmam que as feições erosivas e deposicionais visitadas em campo na Serra Geral de Goiás, próximo ao Parque Estadual de Terra Ronca, podem ser consequências da ocupação ilegal da área de proteção permanente (APP) ao longo da crista da cuesta no estado da Bahia. Já mais a sul, no município de Posse, a natureza dessas feições carecem de estudos. Nesse sentido, o trabalho objetiva avaliar quais são os fatores controladores da morfodinamica das feições gravitacionais no trecho da cuesta da Serra Geral de Goiás inserido no município de Posse. Os testes analisaram a relação espacial e temporal da ocorrência dessas feições com o avanço da fronteira agrícola, a partir da identificação e classificação dessas feições em uma série temporal de imagens de satélite para os anos de 1990, 1996, 2002, 2008 e 2014, e a respectiva correlação com a expansão da fronteira agrícola nos mesmos anos com eventos de chuvas extremas para os últimos 40 anos (1977-2016). Ademais, observou-se o local de ocorrência dos movimentos de massa à aspectos lito-geomorfológicos e hidrológicos.

Material e métodos

A análise dos movimentos de massa exibe como referencial teórico- metodológico a classificação quanto à forma (corrida; escorregamento, rotacional e planar; e queda de blocos); bem como o período de observação da última dejeção (antiga, atual e recente), (FERNANDES; AMARAL, 2000; ZANCOPÉ et al., 2013). O procedimento metodológico adotado quanto ao acompanhamento temporal dos movimentos consiste em três etapas. A primeira consiste no mapeamento da cobertura e uso do solo de imagens Landsat TM 5 e OLI 8, de ponto/órbita 270/70, em uma série temporal de 1990, 1996, 2002, 2008 e 2014. Desse mapeamento, na segunda etapa, foram selecionadas as áreas com ocorrência de solo exposto para detalhamento de movimentos de massa em imagens aéreas de alta resolução, como Geoeye e Spot, visando classificar, em ultra detalhe, os movimentos de massa (corrida; escorregamento, rotacional e planar; e queda de blocos), que após foram validados em campo. Na terceira e última etapa de acompanhamento temporal, observou-se os dados de pluviometria acumulada mensal, sendo analisados os meses mais chuvosos, a partir da série temporal dos últimos 40 anos (1977-2016). Destaca-se que foram considerados nesta classificação, a gênese do movimento, visto que, em alguns momentos, os movimentos rotacionais, planares e de corrida se coalescem podendo divergir quanto a classificação. Na avaliação das imagens Landsat foram considerados apenas os movimentos recentes, visto que, nestas imagens são permitidos observar a carga detrítica em condições de baixa resiliencia (ZANCOPÉ et al., 2013). Quanto a averiguação dos eventos pluviométricos foram analisados os dados da estação meteorológica convencional de Posse - GO (Est. 83332), que possibilitou a observação de fatores da chuva, como frequência e magnitude, durante o período analisado. Para tanto, foram considerados um recorte temporal de dados de quase 40 anos, para observação do comportamento das chuvas anuais e mensais. Por fim, correlacionou-se a ocorrência os movimentos movimentos de massa com os aspectos lito-geomorfológicos e hidrológicos (LACERDA FILHO et al.,2008; GASPAR; CAMPOS, 2007). Desta maneira, as séries de dados foram interpretadas em conjunto para analisar quais são os fatores controladores dessa dinâmica.

Resultado e discussão

A análise dos movimentos de massa permitiu constatar uma diminuição areal entre 1990 e 2008, com retomada do crescimento em 2014, evidenciando que os mesmos apresentam diferentes pulsos de dejeção de sedimentos. Contudo, nota- se que pouco mudou em relação à quantidade total dos movimentos, onde foram observados 29 no ano de 1990, e 25 no ano de 2014, conforme Tabela 1. No primeiro ano, 1990, o estudo percebeu que o fenômeno ocupava uma área de 378,79 hectares, sendo responsável por aproximadamente 78% da área mapeada, enquanto na avaliação subsequente, em 1996, esta feição era responsável por 42,51% da área, em que neste ano foi superado pelos movimentos planares. Já nos anos de 2002, 2008, e 2014 retoma-se o predomínio dos movimentos rotacionais, onde os movimentos planares entram em “equilíbrio”, visto a percepção do processo de resiliência nestes locais, conforme Figura 1. Quanto ao uso e cobertura, o avanço e aumento da ocupação agropecuária em direção à escarpa, pouco contribuiu para o avanço dos movimentos de massa, visto a sua redução areal proporcionada entre 1996-2008, apesar do crescimento na utilização das terras no reverso da escarpa. Destaca-se que entre os movimentos de massa observados, o predomínio está nos arenitos da unidade geológica Grupo Urucuia (Formação Posse e Serra das Areias) (LACERDA FILHO et al., 2008). A Formação Posse é composta por arenitos muito finos, finos, médios, quartzosos e bem selecionados. Já a Formação Serra das Araras consiste em bancos de arenitos maiores de 0,5 a 2m, com associações de argilitos e conglomerados avermelhados (LACERDA FILHO et al., 2008). A partir da distinção destas diferentes formações observou-se em campo que os movimentos de massa estão predominantemente sobre os arenitos da Formação Posse. Assevera-se que a maior ocorrência destes movimentos em arenitos “puros” é pela baixa coesão entre os agregados destas estruturas, diferentemente da Formação Araras, já que os argilitos e as lateritas possuem uma maior coesão pelos os agentes cimentantes em suas estruturas. Além disso, a região de estudo apresenta um sistema de aquífero subterrâneo poroso regional, o Urucuia. Este sistema apresenta limite divergente à Serra Geral de Goiás e demais bacias hidrográficas, evidenciado por uma linha de ruptura quase paralela e próxima à BR-020, em que as águas subterrâneas direcionam suas linhas de fluxo em sentido E-W, em direção a Serra Geral de Goiás (GASPAR; CAMPOS, 2007). Ademais, indica-se que toda contribuição das águas superficiais provém do fluxo de base subterrâneo, o que pode acarretar no aumento na incidência de movimentos (BRASIL, 2012). Em uma análise temporal de trinta e sete anos, observa-se que o município de Posse (GO) apresenta uma precipitação média anual de aproximadamente 1.400 mm, sendo que o ano de 1983 apresenta a maior precipitação média registrada, com 1.931,4 mm de chuva. Já o ano de 2007, exibe a menor média com 820,8 mm ano. Quanto a distribuição, as chuvas se concentram principalmente nos meses de dezembro, março, fevereiro e novembro respectivamente, demonstrando resultados similares aos encontrados por Luiz (1997) na região do Vão Paranã. Ademais, a principal concentração de chuvas ocorre no mês de dezembro no município de Posse (GO), apresentando um domínio de 54,05% dos dados amostrais observados, indicando que os movimentos de massa observados no período de estiagem (maio-agosto) podem ter apresentado influência das fortes chuvas obtidas nos meses pretéritos, sobretudo o de dezembro, marcados em negrito no eixo “Y”, conforme Figura 2. A partir da observação dos dados de chuva, constatou-se que no mês de dezembro do ano de 1989, ocorreu um acumulado de 585,2 mm de chuva, sendo o maior acúmulo observado no período amostral de trinta e sete anos. Infere-se que esta concentração de precipitação pode ter influenciado na reativação dos movimentos de massa do município no ano de 1990, que aliado as condicionantes já apresentadas, podem ter sido responsáveis pela grande entrada de energia no sistema. Nos anos subsequentes, observa-se uma tendência de melhor distribuição e diminuição da concentração das chuvas, sendo o ano de 2007, no mês de dezembro, responsável pela menor das maiores concentrações de chuvas anuais com 203,4 mm de chuva, registrados no mês de dezembro.

Tabela 1

Movimentos de massa no município de Posse (GO).

Figura 2

Evolução dos movimentos de massa entre 1990 e 2014.

Figura 2

Principal concentração de chuva mensal em milímetros no município de Posse (GO) entre 1977- 2014.

Considerações Finais

A análise dos fatores controladores dos processos erosivos e gravitacionais evidenciou que a cobertura e uso, especialmente a expansão da fronteira agrícola do Oeste da Bahia, exibe baixa relação com a ocorrência e reativação de movimentos de massa na cuesta da Serra Geral de Goiás. Por outro lado, o início e reativação das feições erosivas e gravitacionais teve alta relação com os meses de alta concentração de pluviosidade. Desta maneira, entende-se que a correlação espacial entre a magnitude e distribuição das chuvas, litologias mais suscetíveis (Formação Serra das Araras) e direcionamento dos fluxos subsuperficiais em sentido à escarpa da Serra Geral tem propiciado a formação destes movimentos de massa. Análises de outra natureza podem auxiliar a confirmar esses resultados.

Agradecimentos

Agradecemos ao CNPq (Ch MCTI/CNpq/Universal 14/2014 - processos 461869/2014-4 e 462421/2014) pelo apoio financeiro.

Referências

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BRASIL. Relatório diagnóstico Sistema Aquífero Urucuia bacia sedimentar Sanfranciscana. CPRM Serviço Geológico do Brasil, MME. Brasília: v.10, 2012.
CASSETI, V. Geomorfologia. Goiânia: FUNAPE, 2005. http://www.funape.org.br/geomorfologia. Acessado no mês 02/2016.
FERNANDES, N. F.; AMARAL, C,P.Do. Movimentos de Massa: Uma abordagem geológico -geomorfológica. In: GUERRA, A. J. T.; CUNHA, S. B. (Org.). Geomorfologia e Meio Ambiente. Rio de Janeiro: 3.ed. Bertrand Brasil, 2000. p. 123-194.
GASPAR, M.T.P; CAMPOS J.E.G. O sistema aquífero Urucuia. Revista Brasileira de Geociências. n. 37, v.4 (suplemento), p. 216 -226. São Paulo: 2007.
GOUDIE, A.S. Encyclopedia of Geomorphology. International Association of Geomorphologists. Londres: v.1. 1.ed. 2004.
LACERDA FILHO, J. M., (Coord). GOIÁS (Estado). Secretaria de Indústria e Comércio. Superintendência de Geologia e Mineração. Geologia do estado de Goiás e Distrito Federal. Goiânia: 2008.
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ZANCOPÉ, M.H.C; MOMOLI, R.S.; BAYER, M. Movimentos de massa nas nascentes do Rio São Vicente, Parque Estadual “Terra Ronca”. Estudo técnico – SEMARH. Goiânia: 2013.