Autores

Rosa, K.S. (FACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJ) ; Silva, A.L.C. (FACULDADE DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES - UERJ)

Resumo

Este estudo objetivou compreender o papel dos processos costeiros na origem e distribuição do lixo encontrado na praia de Itaipuaçu, por meio de monitoramentos no verão (2013 e 2016) e inverno (2013 e 2015). O litoral de Itaipuaçu (Maricá, RJ), impressiona pela elevada energia das ondas, superiores a 2 m durante as tempestades. Os monitoramentos foram realizados em 5 locais distribuídos por 9 km de litoral. Os resultados mostram uma concentração de lixo na porção oeste da praia, este trecho é o mais dinâmico e também o mais frequentado por banhistas. O lixo composto por plástico corresponde a aproximadamente 70% de todo o material observado. O aspecto desgastado do lixo e a presença de materiais que não costumam ser usados por frequentadores nas praias apontam para uma contribuição externa, possivelmente marinha. O acúmulo destes materiais sobre o pós-praia, formam a linha de deixa, mostrando a influência das ondas e correntes no transporte e retrabalhamento destes.

Palavras chaves

Itaipuaçu; lixo marinho; processos costeiros

Introdução

Este estudo objetivou analisar a influência dos processos costeiros (ondas, correntes e variação de maré) na origem e distribuição do lixo nos 9 quilômetros da praia de Itaipuaçu, caracterizar os materiais encontrados na praia e o impacto socioambiental no litoral estudado. Logo, foi necessário quantificar, classificar e avaliar o estado de conservação do material encontrado na faixa de areia emersa da praia de Itaipuaçu ao longo de duas estações do ano (verão e inverno) em 2013, 2015 e 2016. O litoral de Itaipuaçu no município de Maricá, estado do Rio de Janeiro, apresenta uma dinâmica acentuada devido à incidência de ondas de alta energia formadas sob condições de tempestades. A geomorfologia do litoral de Maricá é caracterizada por apresentar praias com declividade acentuada e amplas variações topográficas em resposta as mudanças nas hidrodinâmicas. As condições de mar nesse litoral são determinadas pela alta energia das ondas e pelas correntes que se deslocam ao longo da costa (SILVA et al., 2008; SILVA et al., 2014). A variação de maré neste trecho do litoral é de no máximo 1,5 metros (DHN), evidenciando o predomínio da ação das ondas na dinâmica costeira. O litoral de Itaipuaçu é frequentado por uma grande quantidade de pessoas, principalmente nos meses mais quentes do ano, que acabam por contribuir para o acúmulo de lixo na praia. Esse lixo oferece risco para os banhistas e compromete a qualidade ambiental da região, uma vez que esses materiais podem causar problemas devido à proliferação de animais transmissores de doenças, poluição visual e risco a saúde dos frequentadores (SANTOS et al., 2008). Os oceanos em geral estão recebendo uma quantidade elevada de resíduos sólidos deixados pelo homem, porém são as áreas costeiras as mais impactadas pela ação antrópica. Os lixos encontrados na costa e nos oceanos podem ser de origem terrestre, ou seja, deixados pelos usuários de praias, oriundos de drenagens dos rios, emissão de esgotos, atividades agrícolas e o manejo impróprio do lixo fabricado nas regiões costeiras; ou de origem marinha, deixados por navios, barcos de pesca, plataformas oceânicas (SANTOS et al.,2008). A preocupação com o lixo marinho se acentuou na década de 70, quando alguns protocolos internacionais foram criados, entre eles o International Convention for prevention of Pollution from Ships (MARPOL, 1973 e 1978, citado por SANTOS et al.,2009). Este protocolo estabeleceu leis para a redução do descarte de óleo por navios e barcos e proibiu o despejo de plástico nos oceanos. Apesar desse e de muitos outros mecanismos legais, o descarte continua, sobretudo em função da dificuldade de fiscalização nos oceanos. Nas regiões costeiras, em geral, predominam dois tipos de lixo: o local (deixado por banhistas e moradores) e o lixo não local (proveniente das correntes marinhas, das ondas e correntes junto à costa). Os resíduos em grande parte encontrados nos litorais possuem origem antropogênica. O monitoramento do lixo na região costeira é necessário para que se possa compreender o grau de impacto no ambiente e, consequentemente, nos ecossistemas costeiros, na saúde humana e na economia. O lixo superficial, como o plástico é altamente migratório através das correntes superficiais. Animais marinhos e aves acabam sendo submetidos a um elevado risco de contaminação por ingestão dos resíduos sólidos flutuantes. Outro problema causado por esses resíduos é o aprisionamento de animais marinhos, que morrem devido à dificuldade de se locomover e até mesmo de se alimentar, quando se enrolam em redes de pesca, linhas, cordas, etc. Animais afetados por esses problemas são facilmente encontrados no ambiente marinho, enrolados em redes, sacolas plásticas, tampas de garrafa plástica, e diversos materiais, que oferecem risco a vida marinha e costeira. Outro problema refere-se aos prejuízos na atividade pesqueira, pois com o aumento do lixo nos oceanos, aumentam as dificuldades

Material e métodos

A praia de Itaipuaçú foi escolhida para a realização deste estudo por apresentar problemas decorrentes do acúmulo de lixo na faixa de areia e pela elevada dinâmica deste ambiente em resposta à alta energia das ondas incidentes, principalmente durante a ocorrência de tempestades. Estudos realizados por Muehe (1975), Silva (2006) e Silva et al. (2008) neste litoral, contribuíram de forma significativa para a aquisição de conhecimentos sobre a dinâmica da praia em questão. Porém, é necessário conhecer o papel dos processos costeiros em relação a origem e distribuição do lixo, os impactos causados pelo lixo nessa praia e as principais áreas fonte. A metodologia deste trabalho consistiu primeiramente de uma pesquisa bibliográfica sobre os ambientes de praias arenosas e poluição por lixo nesses ambientes. Em seguida, foram definidos os pontos de monitoramento ao longo do litoral de Itaipuaçu. Foi utilizada a amostragem na faixa de areia da praia, para definir a quantidade, composição e grau de contaminação do litoral estudado. Para tal, foram realizados um total de 4 trabalhos de campo para a quantificação e classificação do lixo encontrado na praia. Posteriormente, os dados foram analisados considerando-se a distribuição dos materiais encontrados, o tipo de material e as prováveis fontes e processos responsáveis pela distribuição destes ao longo do litoral. Os dados foram coletados em duas estações: verão de 2013 e 2016, e inverno de 2013 e 2015. Foram escolhidos 5 locais de monitoramento, distribuídos ao longo dos 9 quilômetros do arco praial de Itaipuaçu. Para os monitoramentos foram selecionadas áreas sobre o pós-praia com dimensões de 20 x 50 metros para a identificação, quantificação e descrição do lixo. O material encontrado em cada uma dessas áreas foi devidamente contado, catalogado e fotografado. Posteriormente, foi realizada a caracterização do lixo e verificação do estado de conservação destes materiais, fundamental para se entender a relação entre a origem e distribuição destes pelos processos costeira associada à dinâmica de ondas, correntes e marés. Os dados gerados a partir dos levantamentos de campo foram processados no software Microsoft Excel, por meio do qual foram organizados em tabelas e gráficos contendo a quantidade, o tipo de material e demais observações obtidas por ocasião dos monitoramentos.

Resultado e discussão

Os resultados dos monitoramentos realizados ao longo do desenvolvimento deste estudo mostram uma maior concentração de lixo na porção oeste da praia de Itaipuaçu, próximo a Serra da Tiririca. Através do monitoramento realizado na praia de Itaipuaçu nas estações de verão de 2013 e 2016 e inverno de 2013 e 2015, verificou-se que a área do perfil A é a que apresenta maior quantidade de lixo na faixa de areia emersa da praia (tabela 1 e figura 1). A quantidade de lixo encontrada na praia de Itaipuaçu no verão de 2013 (1.369) foi quatro vezes maior que a verificada no inverno de 2013 (343) (tabela 1 e figura 1). Já no verão de 2016 esse volume diminui para (615) e no inverno de 2015 (212) ocorrendo uma redução de 34% em comparação com o verão de 2016 (tabela 1 e figura 1). Essa diferença aponta para uma poluição mais intensa no verão por conta do maior número de frequentadores na estação quente. No entanto, a quantidade de materiais observados no inverno é significativa, quando se considera que nesta época do ano a praia de Itaipuaçu é pouco frequentada devido as baixas temperaturas, comuns nessa estação. O plástico foi o material residual mais encontrado ao longo dos 9 quilômetros de litoral, correspondendo a 72% no verão de 2013 e 2016, 55% no inverno de 2013 e 61% no inverno de 2015 de todo o material encontrado, respectivamente (tabela 1 e figura 1). O plástico é um material de baixa densidade e fácil de ser transportado por longas distâncias, a sua decomposição pode levar séculos para acontecer. A predominância de lixo composto por plástico representa uma ameaça aos ecossistemas costeiros, podendo causar uma série de danos aos animais e contribuir para a degradação da praia. Lixo composto por matéria orgânica e madeira também aparece em quantidade significativa e representam o segundo e terceiro material mais encontrado na areia da praia, respectivamente (tabela 1 e figura 1). O lixo encontrado na praia de Itaipuaçu por ocasião dos monitoramentos se apresenta desgastado (figura 2), o que pode ser o resultado do retrabalhamento destes materiais pela dinâmica de ondas e correntes, em associação com as oscilações diárias da maré. Apesar da predominância de lixo no verão, boa parte do material observado em Itaipuaçu parece ser proveniente de fontes externas, possivelmente transportados de outras áreas pelas correntes costeiras. Essa característica é mais notável no inverno, quando, além do aspecto desgastado e envelhecido do lixo, foram identificados diversos itens danosos a saúde humana e ambiental, tais como: inseticidas, vidros, ferro enferrujado, madeira antrópica com pregos e vários outros (figura 2). Esses materiais, em grande parte, não parecem ter sido deixados pelos usuários da praia. Pelo contrário, parecem ser oriundos de fontes externas, seja de outras praias ou até mesmo material descartado no mar por embarcações (navios, barcos de pesca, plataformas de petróleo, etc.). O lixo flutuante encontrado na praia de Itaipuaçu (figura 2) parece ter sido trazido para esse ambiente pela dinâmica das ondas e correntes e, posteriormente, depositados sobre a faixa de areia da praia emersa (pós- praia), na área de alcance máximo das ondas durante a maré alta. Uma linha de deixa (figura 2) repleta de lixo evidencia o retrabalhamento desses materiais pelos processos costeiros. A dinâmica da praia de Itaipuaçu é caracterizada pela troca de sedimentos entre a porção emersa e submersa da praia, devido as mudanças nas condições de mar, e ao longo da mesma, em resposta a atuação da corrente de deriva litorânea (SILVA et al., 2008). Essas correntes também podem atuar com eficácia no transporte de lixo ao longo da praia. Correntes de deriva litorânea nesta praia predominam em direção a oeste sob a influência da incidência de ondas de SE. Este mesmo setor (oeste), também apresenta maior dinâmica (SILVA et al., 2008), o que tende a contribuir para a maior concentração de lixo neste setor da praia.

Tabela 1

Quantidade e composição do lixo monitorado no verão e inverno na praia de Itaipuaçu.

Figura 1

Área de estudo, locais de monitoramento e resultados da composição do lixo na praia de Itaipuaçu no verão (2013 e 2016) e inverno (2013 e 2015).

Figura 2

Materiais diversos no pós-praia em Itaipuaçu formando uma linha de deixa, marcando o alcance máximo das ondas por ocasião da maré alta.

Considerações Finais

O lixo pode provocar diversos problemas no ambiente praial, como poluição visual, problemas a saúde e bem-estar de seus frequentadores e danos aos animais marinhos. A praia de Itaipuaçu, em especial, é bastante utilizada para diversas atividades de lazer (prática de esportes, pesca, etc.). Nessa praia, o lixo tende a se concentrar na porção oeste, tanto pelo uso mais intenso deste setor da praia (principalmente no verão), quanto pela maior dinâmica de ondas e correntes que contribuem para o acúmulo de lixo no mesmo local. A predominância de materiais de plástico constitui uma ameaça aos ambientes costeiros e pode causar uma série de prejuízos aos ecossistemas marinhos. A presença de matéria orgânica e madeira com pregos enferrujados na praia colocam os frequentadores em risco e compromete o uso deste ambiente para as atividades de lazer. O aspecto desgastado do lixo e a presença de materiais que não costumam ser usados pelos frequentadores nas praias apontam para uma contribuição de fontes externas, possivelmente marinhas.

Agradecimentos

Referências

MUEHE, D. C. E. H. 1975. Análise Ambiental no Sistema Costeiro Sul-oriental do Estado do Rio de Janeiro. Dissertação de Mestrado. Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. pp. 141.

SANTOS, R. H. de M. 2000. Morfodinâmica e Sedimentologia da Praia de Itaipuaçú – Maricá-RJ. Trabalho de conclusão do curso de Geografia da Universidade Federal Fluminense. pp. 1 – 79.

SANTOS, R. H. M & SILVA, M. A. M. 2000. Morfodinâmica e Sedimentologia da Praia de Itaipuaçú. Simpósio Brasileiro sobre Praias Arenosas. pp. 73 – 74.

SILVA, A. L. C. 2006. Comportamento Morfológico e Sedimentológico do Litoral de Itaipuaçú (Maricá) e Piratininga (Niterói), RJ, nas últimas três décadas. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Geologia e Geofísica Marinha da Universidade Federal Fluminense. 153 p.

SILVA, A. L. C., SILVA, M. A. M., SANTOS, C. L., 2008. Comportamento morfológico e sedimentar da praia de Itaipuaçú (Maricá, RJ) nas últimas três décadas. Revista Brasileira de Geociências. Vol. 38 (1). p. 89/99.

SILVA, A. L. C.; SILVA, M. A. M.; GRALATO, J. C. A.; SILVESTRE, C. P. Caracterização geomorfológica e sedimentar da planície costeira de Maricá (Rio de Janeiro). Revista Brasileira de Geomorfologia, 15 (2), p. 231-249, 2014.

SANTOS, I.R., WALLNER-KERSANACH, M., BAPTISTA NETO, J. A., 2008. Poluição marinha, por resíduos sólidos. pp. 309-330.