Autores

Leite, M.R. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES) ; Almeida, M.I.S. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MONTES CLAROS - UNIMONTES)

Resumo

Este trabalho procurou compreender e mapear a configuração do relevo na bacia do Rio Gorutuba no Norte de Minas Gerais, utilizando como referência o 1º e 2º nível taxionômico da metodologia apresentada por Ross (2001). Tais procedimentos tiveram como suporte técnicas de geoprocessamento e produtos orbitais altimétricos da missão SRTM corrigidas com base em nivelamento geométrico das cartas topográficas do IBGE na escala de 1:250.000, bem como base cartográfica geológica da Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais na escala de 1:500.000. Os resultados das sobreposições em SIG de dados SRTM e dados geológicos da CPRM mostraram-se satisfatórios, uma vez que possibilitaram a elaboração de uma vasta gama de informações geomorfológicas da área de estudo.

Palavras chaves

Geomorfologia; Geoprocessamento; Rio Gorutuba

Introdução

Este trabalho objetivou mapear a configuração do relevo na bacia do rio Gorutuba no Norte de Minas Gerais, utilizando como referência a hierarquização em 1º e 2º nível taxionômico proposta por Ross (2001). Esta proposta tem suas bases derivadas de Demek (1967) a qual apresenta um caminho sistematizado para cartografar os aspectos geomorfológicos. Este objetivo se justifica uma vez que as unidades mapeadas fornecem informações fundamentais para a interpretação dos fenômenos geomorfológicos da área de estudo, contribuindo desta forma, para a análise destes terrenos a partir de levantamentos confiáveis de dados georreferenciados, possibilitando, a espacialização e localização de suas feições geomorfológicas. Do ponto de vista conceitual fundamentos desta metodologia estão calcados na dinâmica antagônica entre as forças endógenas e exógenas avaliadas e preconizadas por W. Penck (1953) e no conceitos de morfoestrutura e morfoescultura elaborados por Mecerjakov (1968). Na concepção deste autor todo relevo pertence a uma morfoestrutura, que é sua base de sustentação. Sobre as morfoestruturas encontram-se as morfoesculturas que são resultado da ação climática atual e pretérita e que apresentam diferentes resistências a estas ações, como por exemplo, diferente constituição litológica, arranjo estrutural entre outros. O avanço nas pesquisas geomorfológicas, sobretudo na cartografia geomorfológica, desde Tricart (1965) e Demek (1967), entre outros nomes da cartografia geomorfológica possibilitaram a hierarquização das unidades taxionômicas em 6 níveis ou táxons. As informações e identificações do relevo consoante aos táxons faz a distinção das unidades na ordem crescente: o 1° táxon, a morfoestrutura, corresponde a maior forma e pode ser definida pelo agrupamento genético de litologias bem como seus arranjos estruturais. As unidades morfoesculturais, que representam o 2° táxon, estão diretamente relacionadas às semelhanças genéticas e aos padrões do modelado como afirma Ross (2010). O 3º táxon representa as formas geneticamente homogêneas que estão ou foram gerados por processos, denominados de (D) denudacionais, e que são resultados da dissecação física e química e (A) agradacionais, , chamadas de formas de acumulação de materiais. O 4º táxon diz respeito as formas semelhantes, ou seja, as características fisionômicas e genéticas que individualizam um conjunto de colinas, por exemplo. Desta maneira nas cartas cujas escalas não permitem à representação destas formas as mesmas podem ser representadas por códigos de letras que indicam a gênese e o processo de geração da forma, como, por exemplo: Apf (Agradacional planície fluvial), Dc (Denudacional de topo convexo), Dp (Denudacional de superfície aplanada) entre outros. Quanto ao 5º táxon, ou ao segmento das vertentes, estas só podem ser identificadas em escalas de grande detalhe. O 6º táxon refere-se as menores unidades do relevo, representando formas lineares e pontuais de origem antrópicas, como processos erosivos atuais com presença de ravinas, voçorocas deslizamentos etc. Para a identificação dos padrões morfométricos destas unidades Ross (1992), embasado no projeto Radambrasil, adaptou a matriz de dissecação denudacional do relevo. Neste gráfico os valores no eixo das abscissas indicam a dimensão interfluvial média e é tanto maior quanto mais distante da origem dos eixos. Os valores coincidentes com o eixo das ordenadas representam o grau de entalhamento dos vales e é tanto maior quanto mais próximo da origem dos eixos. Desta forma, pode-se combinar o conjunto de letras com o índice de dissecação do relevo e informar o tipo de modelado presente, por exemplo, Dc32 (Denudacional de topo convexo, com grau de entalhamento dos vales médio (40 a 80 m) e dimensão interfluvial grande (1750 a 3750 m).

Material e métodos

Para a realização deste trabalho foi necessário o levantamento dos seguintes documentos cartográficos: • Cartas digitais altimétricas na escala de 1:250.000 oriundas do projeto Topodata e disponibilizadas pela EMBRAPA. Correspondentes as seguintes dobras, SD-23-Z-A, SD-23-Z-B-, SD-23-Z-C, SD-23-Z-D e SE-23-X-B. • Mapa Geológico do Estado de Minas Gerais, na escala de 1:1000.000, elaborado pela CPRM (2003). A elaboração do mapeamento seguiu as recomendações de Silva e Rodrigues (2009. Para a identificação das unidades morfoestruturais utilizou-se três variáveis encontradas no arquivo geológico da CPRM (2010). Eon, Classe de rochas e Era máxima estas variáveis foram agrupadas de modo a permitir a individualização das morfoestruturas. Identificadas as unidades morfoestruturais da área seguiram-se os procedimentos para identificar e individualizar as unidades morfoesculturais. No primeiro momento foi gerado o mosaico das imagens SRTM e, posteriormente, individualizada a área de analise. Subtraiu-se do mosaico as curvas de nível com eqüidistância de 50 m das quais se originou a grade triangular que, por sua vez, deu origem as seguintes derivadas: elevação, declividade e sombreamento do relevo. Na sequência, utilizando o classificador MAXVER, classificou-se os atributos das curvas de nível com eqüidistância de 50 m. Como resultado obteve-se a compartimentação altimétrica da bacia do rio Gorutuba. Cada unidade morfoestrutural foi exportada como um arquivo independente e, posteriormente, este arquivo foi utilizado para individualizar as unidades morfoestruturais. Desta maneira os procedimentos realizados para a identificação das unidades morfoesculturais foram realizados separadamente em cada recorte espacial que contemplava a morfoestrutura em analise. A identificação dos padrões morfoesculturais iniciou-se com a avaliação altimétrica, resultado da compartimentação. Nesta etapa o arquivo com a altimetria da área foi fatiado em intervalos de 50m, compatível com a eqüidistância das curvas, e posteriormente, para cada recorte espacial foi considerada a menor altitude como nível de base. Este procedimento foi importante, pois permitiu a analise da posição topográfica das formas. Na etapa seguinte foi sobreposto ao modelo altimétrico, o modelo de declividade, cujos valores de declividade e relação entre a energia potencial são expressos na tabela 03. Nesta etapa foi possível analisar os padrões do modelado e identificar áreas deprimidas, topos aplainados ou fundo de vales, além de permitir avaliar o perfil das vertentes. Por fim, as unidades espaciais que apresentaram maior semelhança entre os modelos foram agrupadas em suas características genéticas, fisiográficas e topográficas, a fim de permitir a individualização das unidades morfoesculturais analisadas. Para a última analise a figura 01 foi impressa em tamanho A1. Também foram feitas viagens de campo, totalizando 24h percorridas por 109 km, com o intuito de avaliar a classificação fina,l bem como observar detalhes de campo não contemplados pela escala de trabalho.

Resultado e discussão

No que concerne as unidades morfoestruturais três unidades foram identificadas de acordo com sua gênese, cronologia e suas características litológicas, quais sejam: a Bacia Sedimentar Cenozóica, a Bacia Sedimentar do São Francisco e a Serra do Espinhaço. Como mencionado anteriormente, cada unidade morfoestrutural foi exportada e utilizando o operador matemático do ArcGis 9.3.1 (programa licenciado para o Laboratório de Geoprocessamento da Universidade Estadual de Montes Claros) elaborou-se uma lógica booleana de procura e analise em que os critérios foram definidos com base nos modelos de compartimentação altimétrica, declividade e características litológicas. Desta forma as tabelas 01, 02 e 03 indicam, em suas respectivas colunas, as variáveis de busca e nas linhas os critérios de identificação das unidades Morfoesculturais. A Bacia Sedimentar Cenozóica correspondeu a terrenos inferiores a 650 m de altitude, conforme destaca a tabela 01, cujas declividades dominantes variam entre 0 e 2 % representando 96,99 % das declividades desta unidade. Trata-se de terrenos Cenozóicos entre o Terciário e o Quaternário contendo areias argilosas, areias quartzosas de deposição aluvionares não consolidadas e/ou mais ou menos consolidadas. Coberturas detrito-laterítica oriundas dos planaltos e das chapadas de cimeira depositados ao longo dos rios, sobretudo, ao longo dos rios Gorutuba e Salinas. . Tabela 01 – Identificação de unidade morfoescultural na morfoestrutura Bacia Sedimentar Cenozóica (B.S. Cenozóica) Unidade Morfoestrutrural Altimetria (m) Declividade dominante e % de área da declividade Litologia Unidade Morfoescultural B. S. Cenozóica < 650 0 - 6% / 96,99% Sedimentos/sedimentar Planície Fluvial Fonte: CPMR (2010), SRTM (2000). A morfoestrutura denominada Bacia Sedimentar do São Francisco possui terrenos entre 449 ate 950 m de altitude, conforme aponta a Tabela 02. As declividades oscilam entre 0-2% nas áreas aplainadas, tanto as de nível elevado quanto as de nível inferiores, e a 70% nas encostas. Verifica-se nesta unidade morfoestrutural superfícies moldadas em rochas Fanerozóicas e Proterozoicas, em sua maioria sedimentar com ocorrência de metamórficas, terrenos com variações máximas entre o Neoproterozóico e Cenozóico. Tabela 02 – Identificação de unidade morfoescultural na Morfoestrutura Bacia Sedimentar do São Francisco (B.S. do São Francisco) Unidade Morfoestrutrural Altimetria (m) Declividade dominante e % de área da declividade Litologia Morfoescultura B.S. do São Francisco <550 0 - 6% / 98,79% Sedimentar Superfície de aplainamento B.S. do São Francisco <650 0 -20% / 95,57% Sedimentar Planalto Sedimentar B.S. do São Francisco <950 0 - 6% / 93,03% Sedimentar Superfície Tabular Fonte: CPMR (2010), SRTM (2000). A terceira morfoestrutura denominada Serra do Espinhaço presente na tabela 03, apresentou terrenos com altitudes entre 448 e 1800 m. As declividades ocorrem entre 0-6%, nas áreas aplainadas de nível elevado, e ate 90% nas áreas escarpadas. Estas superfícies foram moldadas em rochas Arqueanas e Proterozóicas, em sua maioria metamórficas e ígneas, com presença de sedimentos Cenozóicos incosolidados nas áreas deprimidas. Verificou-se a ocorrência de formas tabulares intercaladas com áreas dissecadas ao longo dos vales, originadas dos desmontes de superfícies de aplainamento truncadas pela erosão. Tabela 03 – Identificação de unidade morfoescultural na Morfoestrutura Serra do Espinhaço Unidade Morfoestrutrural Altimetria (m) Declividade dominante e % de área da declividade Litologia Morfoescultura Serra do Espinhaço <700 0 - 20% / 95,88% Ígnea, Metamórfica e sedimentos Depressões Embutidas Serra do Espinhaço <900 6 -30% / 88,57% Ígnea e Metamórfica Planalto Dissecado Serra do Espinhaço <1200 20 - 90% / 95,03% Ígnea e Metamórfica Encostas e Abruptos Serra do Espinhaço >1200 0 - 20% / 90,34% Ígnea e Metamórfica Patamar de Nível Elevado Fonte: CPMR (2010), SRTM (2000). Ao final da identificação e delimitação das unidades morfoesculturais elaborou-se a Figura 01, no intuito de registrar cartograficamente o presente mapeamento. O mapa final, no entanto, foi editado em A1, tamanho no qual outras informações cartográficas, como por exemplo, distritos, rodovias, foram inseridos sem comprometerem a leitura do mapa. Figura 01 – Morfologia da Bacia do rio Gorutuba

Figura 01 – Geomorfologia da Bacia do rio Gorutuba



Considerações Finais

Ressalta-se, por fim, que o mapeamento dos padrões morfoestruturais e morfoesculturais assumem uma singular importância nos estudos do meio físico. Sua importância reside no fato de que suas dimensões, modelados e compartimentação exerce influência desde a distribuição da vegetação até na determinação de micro-climas, o que torna seu estudo e mapeamento um fator preponderante para o conhecimento dos fenômenos físicos de uma determinada região. Os estudos guiados pela taxionomia do relevo garantem um caminho metodológico satisfatório para o mapeamento destes ambientes, sobretudo quando desenvolvido com o apoio das geotecnologias. No caso específico da bacia em foco, pode se averiguar que a interpolação de informações oriundas de mapas geológicos com informações altimétricas de dados de radar, possibilitou a elaboração de uma vasta gama de informações sobre a área de estudo. Obviamente guardadas as devidas limitações impostas pela escala de trabalho e pelo nível taxionômico da análise.

Agradecimentos

Referências

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