Autores

Silva, B.A. (UNIOESTE) ; Hayakawa, E.H. (UNIOESTE) ; Martins, V.M. (UNIOESTE) ; Danzer, M. (UNIOESTE)

Resumo

O levantamento de solos tem se destacado no apoio ao planejamento do uso da terra. Informações oriundas de Modelos Digitais de Elevação (MDE) como altimetria, declividade e curvatura do terreno auxiliam na prática de levantamentos detalhados e rápidos dos aspectos fisiográficos da paisagem, mostrando-se essenciais, também, para o mapeamento do solo. Neste sentido, o presente trabalho tem como objetivo levantar dados referentes aos atributos do relevo, a partir de imagens de radar, para auxiliar na elaboração do mapa de solos da Folha Topográfica de Marechal Cândido Rondon-PR. Para isso foram levantadas informações de altimetria e declividade, a partir da manipulação da imagem SRTM, usando os softwares Spring 5.4 e QGis 2.10, juntamente com informações da curvatura vertical e horizontal do terreno disponibilizados pelo TOPODATA. Foram gerados mapas temáticos e perfis topográficos para aferir as observações em campo e delimitar espacialmente as classes de solos da área de estudo.

Palavras chaves

geoprocessamento; mapeamento; morfologia das vertentes

Introdução

O levantamento de solos é essencial para o planejamento da ocupação da terra e possibilita conhecer sobre o que a sociedade se organiza espacialmente. Com o incremento de tecnologias nos levantamentos de solos, como imagens de satélites, Sistemas de Informações Geográficas, técnicas de geoprocessamento, entre outras, têm dinamizado e acelerado a obtenção de informações referente à distribuição dos solos na paisagem. Os estudos da relação solo-relevo que utilizam os dados referentes a atributos do terreno (inclinação e a declividade do terreno, a orientação e a curvatura da superfície terrestre) são úteis para compreender a origem, a distribuição e a diversificação dos solos na paisagem (PASSOS, 1987; CAMPOS et al., 2006). Assim é preciso aprofundar a discussão sobre a influência do relevo, da altitude e das formas das vertentes na formação dos solos (SOUSA JUNIOR & DEMATTÊ, 2008). Bigarella et al. (1996) discutem como a topografia local influencia a distribuição do solo na paisagem e que as propriedades dos solos variam lateralmente de acordo com a posição topográfica, a orientação e a declividade da vertente condicionadas pelo fluxo hídrico. Os dados digitais do terreno proporcionam algumas vantagens em relação ao método tradicional de separação das unidades de mapeamento. As variáveis oriundas do MDE mostram-se como ferramentas que podem melhorar a predição de ocorrência dos tipos de solos (IPPOLITI et al., 2005). Segundo (VALERIANO, 2008) a curvatura vertical e horizontal do terreno relaciona-se com a intensidade dos processos de migração e acúmulo de água, minerais e matéria orgânica no solo através da superfície, proporcionados pela gravidade. Deste modo, desempenha papel importante sobre o balanço hídrico e o equilíbrio entre os processos de pedogênese e morfogênese. Troeh (1965) apud Resende (2007) caracteriza as pedoformas em lineares, convexas e côncavas. Essas formas conjugam-se com formas horizontais (planares, convergentes e divergentes), formando nove tipos de pedoformas. Várias pesquisas têm sido realizadas com o objetivo de entender a distribuição e o comportamento dos sistemas pedológicos na abrangência da área de estudo, tendo como pressuposto a relação solo-relevo. Assim como os recentes estudos (MAGALHÃES, 2008; ROCHA, 2011; MAGALHÃES, 2013; SILVA, 2014; CALEGARI & MARCOLIN, 2014; DANZER, 2015 etc) que, de alguma forma, abordaram a compreensão da relação solo-paisagem. Neste sentido, o objetivo deste trabalho é levantar informações sobre os atributos da superfície do terreno, tais como a forma da vertente, declividade e altimetria a partir de MDE. Com isso auxiliar na interpretação da distribuição espacial dos solos na paisagem como base para o levantamento de solos da área de estudo.

Material e métodos

A Folha Topográfica de Marechal Cândido Rondon (SG-21-X-B-VI-2) recobre parte dos municípios de Marechal Cândido Rondon, Quatro Pontes, Toledo, Entre Rios do Oeste, Pato Bragado, Santa Helena e Ouro Verde do Oeste, no Extremo Oeste do Estado do Paraná. A litologia da área de estudo é composta por rochas basálticas da Formação Serra Geral, Grupo São Bento, originada pelo vulcanismo do tipo fissural no final do período Jurássico, início do Cretácio (ZALÁN et al., 1990; NARDY et al., 2002; MINEROPAR, 2006). O clima é do tipo Cfa, temperado e chuvoso, sem a ocorrência de estação seca e moderadamente quente. As temperaturas médias no verão são superior a 22ºC e no inverno inferiores a 18ºC. (AYOADE, 2010; PARANÁ, 2013). A precipitação nessa região é homogênea no decorrer do ano, em média 1400 mm à 2000 mm (LIMBERGER, 2007). O relevo na área de estudo apresenta diferenças no padrão das formas. Bade (2014) subdivide as principais unidades morfoesculturais que compõem a paisagem da região em: Unidade de São Francisco (vertentes convexas nos topos, retilíneas nas médias vertentes e côncavas nos fundos de vale); Unidade de Foz do Iguaçu (vertentes retilíneas); Unidade de Marechal Cândido Rondon (vertentes retilíneas/convexas nos interflúvios, retilíneas nas médias vertentes e côncavas nos setores de fundo de vales) e Unidade de Nova Santa Rosa (vertentes longas e retilíneas). A rede hidrográfica da área de estudo faz parte da Bacia do Paraná III (BP- III). Os principais rios que controlam a esculturação do relevo na área de estudo, juntamente com os seus afluentes, são o Rio Marreco, Arroio Fundo, Rio São Francisco, Rio Guaçu e o Rio Paraná (nível de base regional). As cabeceiras de drenagem dos rios Marreco e Arroio Fundo caracterizam a transição entre as Unidades Morfoesculturais de Foz do Iguaçu e São Francisco, onde se percebe o recuo das vertentes na direção leste da bacia do BP-III. Os arquivos vetoriais e matriciais utilizados para a elaboração dos mapas temáticos foram adquiridos nos sites das seguintes instituições: - Instituto de Terras, Cartografia e Geociências (ITCG): Carta topográfica (1:50.000); - TOPODATA (VALERIANO, 2008): Curvatura vertical e horizontal do terreno; - Earth Explorer (USGS): Imagens de radar SRTM; - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): Rede Hidrográfica, Limites municipais e estaduais. Os arquivos foram armazenados em um banco de dados geográfico para posterior integração, análise e geração dos mapas temáticos e perfis topográficos a partir dos softwares Spring 5.4 e QGis 2.10. Foram gerados os mapas de topografia, declividade e de curvatura do terreno. O mapa temático referente à curvatura vertical e horizontal do terreno (Figura 1) foi elaborado a partir dos dados organizados por (VALERIANO, 2008) disponibilizados no site do TOPODATA. A curvatura vertical expressa o formato da vertente em convexo, retilíneo ou côncavo e é representado na legenda pelos algarismos 1, 2 e 3, respectivamente. Enquanto que a curvatura horizontal expressa o formato da vertente em divergente, planar ou convergente e é representado pelos algarismos 1, 2 e 3 (VALERIANO, 2008).

Resultado e discussão

A descrição topográfica e morfológica das vertentes foi realizada a partir de quatro perfis topográficos selecionados em diferentes setores geomorfológicos da paisagem, associando as classes de declividade com as formas vertical e horizontal em cada segmento das vertentes. O perfil 1 (Figura 2) apresenta predomínio de formas retilíneas-divergentes e retilíneas-convergentes (Figura 2-B-I-I), destacando a presença de dois segmentos de transição marcados pelas formas convexas-divergentes e côncavas-convergentes (Figura 2-B-II/C-II e B-IV/C-IV), do segmento superior (topo) para a base da vertente, respectivamente. Esse perfil topográfico representa um compartimento com relevo suave ondulado, com vertentes longas (aproximadamente 2 km de extensão) e declividades entre 3-8% e 8-20% (Figura 4). Nesse perfil, a morfologia da vertente favorece a formação de solos evoluídos pedogeneticamente, principalmente no segmento de topo. Conforme destaca Gessler et al. (2000), as superfícies com formas retilíneas e planares, como os setores de topo, apresentam condições de estabilidade ambiental ideal para o desenvolvimento da pedogênese em relação à geomorfogênese. Por outro lado, as superfícies instáveis, como aquelas representadas pelos segmentos de vertentes curtos, convexos e divergentes possuem, normalmente, solos menos desenvolvidos (VIDAL-TORRADO; LEPSCH; SOUZA FILHO, 1999). A mudança abrupta na forma da vertente, que passa de retilínea para convexa, indica a transição para solos menos evoluídos. Nesse segmento, o transporte e a perda de matéria são mais intensos, facilitados pelo aumento da declividade e pela forma convexa (GESSLER, et al.; 2000). À jusante do perfil topográfico 1, o segmento de vertente apresenta características morfológicas convexas–divergentes (Figura 2-B-IV/C-IV), semelhantes àquelas da ruptura do último segmento descrito. No perfil 2 (Figura 2-E-I/F-I), o segmento de topo é curto, retilíneo- divergente, seguido de uma ruptura de declive, convexa-divergente (Figura 2- E-II/F-II). Esses dois segmentos enquadram-se nos setores de relevo ondulado, com predomínio de declividades superiores a 20%. As formas divergentes reduzem a velocidade e a intensidade dos processos pedogenéticos, influenciando na espessura e na variação espacial dos solos conforme destacam Bigarella et al. (1996). Os autores verificaram que nas vertentes mais inclinadas, a drenagem é rápida se comparada com as áreas mais planas, o que reduz o tempo de permanência da água no solo e, por consequência, a velocidade e a intensidade dos processos formadores do solo. Os segmentos subsequentes (Figura 2-E-III/F-III) são caracterizados por formas retilíneas-convergentes associadas às retilíneas-divergentes. Esse tipo de morfologia relaciona-se à formação de solos mais profundos, embora possa desencadear perda de materiais menos intensa em relação aos tipos de forma que caracterizam os segmentos à montante da vertente. Nos setores em que se destacam as morfologias retilíneas-convergentes, podem ser encontrados solos influenciados por fluxos hídricos concentrados, associados aos canais fluviais nos setores representados pelo perfil em questão. À jusante do perfil 2, a forma retilínea-planar (Figura 2-E-IV/F- IV) e a declividade (0-3 e 3-8%) favorecem a pedogênese em detrimento da erosão, corroborando com estudos de Bonfatti (2012). No perfil 3 (Figura 3-H-I/i-I) predominam formas retilíneas-convergentes e retilíneas-divergentes e declividades inferiores a 8%. O segmento retilíneo- convergente antecedendo a transição morfológica para o trecho à jusante com declividades superiores a 8% (Figura 4) com predomínio da forma retilínea- divergente (Figura 3-H-II/i-II). No setor de média vertente a declividade aumenta para valores em torno de 20-30%. Essa classe de declividade desencadeia alterações na infiltração hídrica e na evolução do solo como no aceleramento do transporte de material. No sopé da vertente predomina a forma côncava-convergente, favorecendo a concentração de umidade e de material transportado do setor de montante (GESSLER, et al.; 2000). O perfil 4 localiza-se num ambiente geomorfológico mais dissecado, predominando topos curtos, vertentes íngremes, declividades superiores a 20% e alguns segmentos com inclinação até 45%. À montante do perfil, a vertente apresenta forma convexa-divergente (Figura 3-K-I/L-I) e a circulação hídrica é mais rápida, restringindo a pedogênese. Na média vertente, encontram-se as formas retilínea-planar, retilínea-côncava e retilínea-convexa (Figura 3-K- II/L-II) associadas às declividades de 20% e 30%. Na baixa vertente predominam formas côncava-planar e convexa-planar (Figura 3-K-III/L-III). Esse perfil apresentou predomínio de declividades superiores a 20% e de formas côncavas e convergentes, o que auxilia na concentração do fluxo hídrico, determinando processos erosivos mais intensos.

Representação da curvatura horizontal e vertical da área de estudo.

Mapa temático representando as formas verticais convexas, côncavas e retilíneas; e as formas horizontais convergentes, divergentes e planares.

Representação gráfica da topografia e da morfologia dos perfis 1 e 2.

Figura temática representando graficamente a topografia do terreno as formas das curvaturas da vertente selecionada.

Representação gráfica da topografia e da morfologia dos perfis 3 e 4.

Figura temática representando graficamente a topografia do terreno as formas das curvaturas da vertente selecionada.

Mapa de declividade da área de estudo.

Mapa temático representando as classes de declividade e a localização de cada perfil topográfico.

Considerações Finais

A partir dos dados de curvatura vertical do terreno (côncava, retilínea e convexa) e curvatura horizontal (convergente, planar e divergente) foi possível inferir os limites de transição lateral dos solos, assim como inferir o grau de desenvolvimento vertical desses corpos em função da ação da água ao longo da vertente. As geotecnologias, incluindo os dados provenientes de Modelos Digitais de Elevação auxiliaram na obtenção rápida e precisa de dados, referentes às formas de vertente, à delimitação e ao mapeamento dos solos na vertente. Elas permitiram a integração das informações sobre os elementos físicos que compõem a paisagem, de modo que a caracterização das formas de vertentes apresenta-se como importante base de informação para a delimitação espacial dos solos na paisagem. Contudo, devem ser descritos mais perfis topográficos que demonstrem os padrões das formas de vertentes predominantes na área, auxiliados de observações e descrições em campo. Assim como, coletas de amostras de solos, descrições morfológicas, análises físicas, químicas e a classificação taxonômica dos solos. Com isso, gerar o mapa de solos da área de estudo.

Agradecimentos

A Capes e ao CNPq pela concessão da bolsa de estudo e aos professores orientadores deste trabalho.

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