Autores

Ramos, D.A.M.C. (UFPE) ; Monteiro, K.A. (UFAL) ; Correa, A.C.B. (UFPE)

Resumo

O presente artigo tem como objetivo demonstrar a técnica morfométrica de relação declividade-extensão (RDE) e sua aplicabilidade para o estudo do relevo estabelecido em bacias hidrográficas. A pesquisa consistiu na análise dos padrões morfométricos do relevo e da drenagem na bacia do rio Piancozinho, localizado parte no estado de Pernambuco parte no estado da Paraíba, ambos localizados na região Nordeste do Brasil. Esta abordagem permite ao pesquisador não só caracterizar a área de estudo em função de suas drenagens mas também de identificar pontos relevantes para analise, tendo em vista que ao se detectar anomalias pode-se afirmar que a drenagem não encontra-se ajustada ou em equilíbrio. Para a confecção do presente trabalho foram utilizados dados topográficos do projeto SRTM (Shuttle RadarTopographyMission), com resolução espacial de 30 x 30 m, trabalhado em software específico de geoprocessamento.

Palavras chaves

técnica morfométrica; drenagem ; bacia do rio Piancozinho

Introdução

Os cursos d'água são considerados os elementos mais sensíveis às modificações tectônicas crustais, respondendo de imediato a processos deformativos, mesmo àqueles de pequenas escalas e magnitudes (Volkov et al., 1967; Ouchi, 1985; Phillips e Schumm, 1987; Schumm, 1993; Wescott, 1993). Tais características os tornam elementos apropriados a análises de cunho neotectônico, buscando determinar áreas sujeitas a movimentações, permitindo, inclusive, analisar quantitativamente estas deformações. A identificação de atividade neotectônica no interior continental, onde haja baixo registro de sismicidade ou as deformações crustais que sejam assísmicas, ainda pode ser classificada como um esforço heurístico. Desta forma, as técnicas morfométricas que exploram atributos relacionados aos perfis ou ao traçado dos cursos d'água apresentam um potencial relativamente elevado para a detecção e a avaliação de deformações (ETCHEBEHERE, 2000; ETCHEBEHERE et al, 2004). Sendo assim, apresenta-se, neste trabalho, a aplicação da técnica denominada "Relação Declividade-Extensão - RDE", também conhecida como "Índice de Hack", como metodologia procurando estabelecer um vínculo formativo entre a concentração de anomalias e regularidades, dos referidos padrões morfométricos e a distribuição dos compartimentos de relevo, a fim de instituir um vínculo formativo de caráter lito-estrutural na bacia do rio Piancozinho. Esta técnica possibilita uma avaliação rápida, eficaz e de baixo custo acerca dos aspectos morfométricos de uma bacia e do quadro neotectônico de determinada região, servindo de modelo de aplicação regional para áreas cratônicas. Da mesma forma, este enfoque alternativo pode se somar a outras abordagens (geodésicas, geofísicas, geotécnicas, geológicas e geomorfológicas), contribuindo para o aprimoramento de análises do relevo e tornando os modelos e as interpretações mais consistentes, especialmente para regiões intraplacas como é o caso da maior parte do território brasileiro. A Bacia do rio Piancozinho localiza-se no ambiente semiárido Nordestino, entre os Estados de Pernambuco e da Paraíba abrangendo uma superfície de aproximadamente 409 Km². O Riacho Piancozinho, nasce no município de Triunfo, Estado do Pernambuco e desagua no Rio Piancó, Paraíba. Ao todo a bacia abrange parte dos municípios de Triunfo, Santa Cruz da Baixa Verde, São José da Princesa, Princesa Isabel, Manaíra, Curral Velho e Boa Ventura. Para Christofoletti (1980), a drenagem fluvial é composta por um conjunto de canais de escoamento inter-relacionados que formam a bacia de drenagem, definida como a área drenada por um determinado rio ou por um sistema fluvial. Para a geomorfologia, a importância dos estudos hidrológicos reside em reconhecer, localizar e quantificar o fluxo de água nas encostas, de onde se podem definir os gradientes topográficos e, portanto, o próprio relevo (CORREA,1997). Padrões morfométricos de relevo são utilizados como indicadores de mudanças ocorridas ao longo dos cursos de drenagem, e de acordo com Teodoro et al (2007), esta análise tem como objetivo elucidar as várias questões relacionadas com o entendimento da dinâmica ambienta local e regional, podendo os parâmetros utilizados revelar indicadores físicos específicos para determinado local, de forma a qualificarem as alterações ambientais. Neste contexto, as características morfométricas do padrão drenagem e do relevo refletem algumas propriedades do terreno, como infiltração e deflúvio das águas das chuvas, e expressam estreita correlação com a litologia, estrutura geológica e formação superficial dos elementos que compõem a superfície terrestre (PISSARA et al, apud TEODORO et al, 2007). A análise morfométrica possui técnicas utilizadas por ser de baixo custo. Inicialmente aplicada no Brasil por Etchebehere (2000), os cálculos do RDE servem para identificar setores ao longo do perfil longitudinal da drenagem que se mostrem em desacordo com a curva ideal de equilíbrio.

Material e métodos

ÍNDICE DE HACK OU RELAÇÃO DECLIVIDADE EXTENSÃO (RDE) Ao propor o índice de gradiente (stream-gradient index), Hack (1973) contribui com um elemento bastante prático para o estudo do perfil longitudinal das drenagens, visando estabelecer a distância que estas estariam do perfil ideal de equilíbrio permitindo. Para Martinez (2005), este elemento veio solucionar o problema de se determinar e identificar valores anômalos no gradiente do perfil longitudinal, uma vez que este apresenta, na maioria das vezes, uma diminuição gradativa da declividade da cabeceira à foz, não necessariamente demonstrando a existência de pontos anômalos. O índice RDE é calculado de acordo com a seguinte fórmula: RDE = (ΔH/ΔL).L Onde: ΔH= diferença altimétrica entre dois pontos extremos de um seguimento ao longo do curso d’água; ΔL= projeção horizontal da extensão do referido segmento; L= comprimento total do curso d’água a montante do ponto para o qual o índice está sendo calculado. Este cálculo do índice RDE pode ser aplicado também para o canal fluvial em sua totalidade. Para isto, leva-se em conta a diferença altimétrica entre a cota superior e inferior do canal, ou seja, a variação ocorrida na altitude da cota da cabeceira e da cotada foz do canal (em metros), e o logaritmo natural da extensão total do curso de água. Sendo a fórmula: RDEtotal = ΔH/lnL Seeber e Gornitz (1983) relacionaram os valores encontrados para cada trecho com o valor encontrado para o canal inteiro, fato que permitiu identificar trechos com valores anômalos ao longo do canal. No que se refere às anomalias de drenagem, classificam como anômalos os índices de RDEtrecho que divididos pelo índice RDEtotal obtiverem valores acima de 2 (dois). Tais anomalias dividem-se em duas categorias, ou seja, anomalias de 2ª ordem são as que a divisão dos índices obtenham resultados entre os limiares 2 (dois) à 10 (dez), e as anomalias de 1ª ordem são as que este resultado é igual ou superior a 10 (dez). Esta classificação, traduzida como sendo as anomalias de primeira ordem, é encontrada em locais muito íngremes, as anomalias de2ª ordem encontradas em locais íngremes e quando o índice calculado é menor que 2(dois) os trechos são pouco íngremes, configurados como gradiente próximo ao ideal. Desta forma a partir do estudo do perfil longitudinal e da aplicação de parâmetros morfométricos como o índice de gradiente (RDE), pode se ter uma base, em gabinete, das características de drenagem de uma bacia hidrográfica no que diz respeito aos processos que estruturam seu perfil, sendo estes processos ligados à feições morfoestruturais e morfotectônicas desenvolvidas na área em análise. Para a confecção do presente trabalho foram utilizados dados topográficos do projeto SRTM (Shuttle Radar TopographyMission), com resolução espacial de 30 x 30 m, trabalhados em software específico de geoprocessamento, o ArcGis 10.1. Os dados SRTM foram obtidos em ambiente digital do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais – INPE. Foram calculados os índices RDEtrecho e RDEtotal do rio principal da bacia do Rio Pancozinho e de mais duas drenagens que possuíam comprimento maior do que 10km. Posteriormente os resultados obtidos em cada trecho foram divididos com o RDE total da drenagem. Os valores obtidos da relação entre os RDEs dos trechos e o RDE total indicam valores de anomalias no perfil longitudinal da drenagem, de acordo com Seeber e Gornitz (1983), onde valores entre 0 e 2 não apresentam anomalias, valores entre 2 e 10 apresentam anomalias de segunda ordem e valores acima de 10 são anomalias de primeira ordem.

Resultado e discussão

Na Bacia do Rio Piancozinho foram medidos os RDE’s e obtidas as anomalias de 3 drenagens maiores. A utilização do método RDE gerou para cada rio uma tabela de valores que foram plotados como pontos na figura 1. Foram analisados 105 trechos nos rios selecionados, destes 105 trechos 18 correspondem a anomalias de primeira ordem, o que significa que esses trechos representam áreas com quebras bruscas nos patamares, essas anomalias de segunda ordem estão relacionadas geralmente a áreas com expressiva deposição ou aspectos tectônicos, podendo esta técnica servir por exemplo para identificação de áreas com expressiva sedimentação e de movimentos tectônicos mais recentes como os estudados pela neotectonica. Os outros pontos mensurados classificam-se como anomalias de 2º ordem ou como não-anômalos. Dos valores obtidos 39 trechos apresentaram anomalias de 2º ordem, vistas como aceitáveis já que não se apresentam com mudanças significantes em seus perfis, são knick points que podem ser explicados por fatores que não estejam relacionados diretamente a morfotectonica, estão relacionados ao controle das formas de fluxo. 48 trechos tiveram como resultados valores que são considerados não anômalos, ou seja, pontos onde a drenagem encontra-se praticamente ajustada. Para tal foram utilizados valores métricos obtidos em ambiente GIS, no intuito de identificar índices que expressassem anomalias no perfil longitudinal.

Mapa de anomalias de drenagem do Rio Piancozinho



Considerações Finais

A aplicação desse método de análise permitiu a identificação de setores da bacia onde são encontrados trechos considerados anômalos, quando relacionados com a suavização ideal do canal. Entretanto, o principal mérito deste método, além da identificação de anomalias é a quantificação das mesmas, possibilitando a localização de setores onde a drenagem possui uma incisão considerável em pouca extensão quando comparado com o total do canal. Esta identificação permite uma futura correlação com os elementos que condicionam a ruptura, pois ao obter-se o setor das principais rupturas quantificadas, pode- se verificar a existência ou não de relação com elementos estruturais como falhas, zonas com erosão diferencial e zonas de cisalhamanto ao interpolar os mesmos com dados geológicos, estruturais e morfotectônicos.

Agradecimentos

Referências

ETCHEBEHERE, M. L. C. Terraços neoquaternários no vale do Rio do Peixe,Planalto Ocidental Paulista: implicaçõesestratigráficas e tectônicas. 2000. 2v. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade EstadualPaulista, Rio Claro.
ETCHEBEHERE, M. L.; SAAD, A. R.; FULFARO, V. J.; PERINOTTO, J. A. J., Aplicação do Indice ”Relação Declividade-Extensão – RDE” na Bacia do Rio do Peixe (SP) para detecção de deformações Neotectônicas. Revista do Instituto deGeociências - USP, v. 4, N. 2, p. 43-56, outubro de 2004.
SEEBER, L., and V. GORNITZ. River profiles along the Himalayan arc as indicators of active tectonics. Tectonophysics, 1983.