Anais: Geocronologia e evolução da paisagem

Geocronologia e Análise Geomorfológica da Depressão Periférica Paulista

AUTORES
Dias, R.L. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS) ; Perez Filho, A. (UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS)

RESUMO
O relevo de São Paulo é compartimentado em cinco províncias geomorfológicas, caracterizadas pela gênese, estrutura e litologia. A Depressão Periférica Paulista uma dessas províncias possui a forma de meia lua com topografia colinosa de aproximadamente 50 Km de largura. O estudo pretende identificar as superfícies de aplainamento, definidas na literatura por diferentes autores, por meio da datação relativa das superfícies de Cimeira, Neogênica I, Neogênica II, altos e baixos terraços fluviais.

PALAVRAS CHAVES
Geocronologia; Depressão Periférica Paul; Superfícies de Aplainamen

ABSTRACT
The relief of São Paulo is compartmentalized in five geomorphic provinces, characterized by the genesis, structure and lithology. The Paulista Peripheric Depression one of these provinces has the shape of half moon with hilly topography approximately 50 Km wide. The study will identify the planning surfaces, defined in the literature by different authors, by means relative dating of surfaces of Cimeira, Neogênica I, Neogênica II, high and low river terraces.

KEYWORDS
Geochronology; Paulista Peripheric Depre; Planning Surfaces

INTRODUÇÃO
A compartimentação do relevo paulista tem sido tema de discussão ao longo de vários anos. Dentre a literatura consultada destaca-se os trabalhos de síntese de Moraes Rego (1932), Ab’Sáber (1954), e Almeida (1964), ITP (1981) e Ross e Moroz (1997) que representam a evolução dos conhecimentos de conjunto a respeito da geomorfologia do Estado de São Paulo, em ocasiões diferentes. Tais visões do relevo paulista, ao lado de algumas contribuições monográficas regionais, foram suficientes para caracterização do território paulista, do ponto de vista morfológico. O estudo geomorfológico da Depressão Periférica Paulista tem como finalidade fornecer um levantamento e descrição das formas de relevo associadas à sua evolução, e, além disto, analisar os agentes que atuaram na esculturação dessas formas, como o clima por exemplo. A influência dos paleoclimas no relevo atual é notável devido às importantes modificações climáticas que ocorreram “recentemente”. Diversos autores, entre os quais se destacam Ab’Saber (1969, 1979), Penteado (1968), Bigarella et al. (1994) e Christofoletti (1968) citam que o relevo atual sofreu influências das mudanças climáticas, não apenas das grandes oscilações, mas de pequenas flutuações do mesmo. A escolha da área se deve ao fato que esta abrange uma província geomorfológica do Estado de São Paulo, localizada entre o Planalto Cristalino e a Zona das Cuestas, onde se verifica diferentes níveis de aplainamentos e a presença de altos e baixos terraços fluviais. Este trabalho propõe retomar discussões sobre a importância das oscilações climáticas na gênese e dinâmica das superfícies de aplainamento, que foram compartimentadas nas superfícies de Cimeira, Neogênica I, Neogênica II, altos e baixos terraços fluviais.

MATERIAL E MÉTODOS
Dada a complexidade das análises e interpretações dos elementos que compõem o sistema voltado ao entendimento das organizações espaciais, a fundamentação teórica metodológica do trabalho baseia-se na Teoria Geral dos Sistemas. Na Geomorfologia, foi introduzida por Strahler (1950), ao reconhecer um rio como um sistema aberto. Hack (1960), ao expor as bases da teoria do equilíbrio dinâmico, utilizou a idéia dos sistemas abertos, mas foi Chorley (1962) que sistematizou e mostrou as necessidades da abordagem sistêmica na Geomorfologia. Coube também à Howard (1965) a tentativa de analisar dinâmica e estudo do equilíbrio dos sistemas geomorfológicos. A obra de Chorley e Kennedy (1971) é uma contribuição para aplicação da Teoria Geral dos Sistemas. Salientam a complexidade do mundo real, e subjetividade, ao se decompor em estruturas simplificadas ou complexas. Estas estruturas são denominadas de sistemas, “um sistema é o conjunto complexo de objetos e ou atributos” (CHORLEY e KENNEDY,1971 p. 1). O mundo real deve ser visto, então, como sendo composto de sistemas interligados em escalas e complexidades variadas. Diante disto, o sistema possui muitos elementos, mas o conjunto não pode ser representado pela somatória das partes, visto ser algo individualizado e distinto, com propriedades e características que só o todo possui (QUARESMA e PEREZ FILHO, 2005). Segundo esta concepção, pode-se afirmar que as superfícies de aplainamento são formações naturais resultantes da ação da dinâmica dos fluxos de matéria e energia nos sistemas abertos. A organização espacial é um sistema complexo e, como tal, deve considerar em seu estudo o todo, as partes e as inter-relações que ocorrem entre eles. Como embasamento teórico levou-se em consideração os principais trabalhos da literatura sobre a evolução da Depressão Periférica Paulista, elaborados, entre outros, por Ab'Saber (1954, 1969, 1979), Almeida (1964), Penteado (1968), Christofoletti (1968), Nakashima (1973) e Perez Filho (1987).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Casseti (2005) define as superfícies de aplainamento com uma topografia quase plana, resultado de prolongada erosão, em condições climáticas e tectônicas estáveis. Encontram-se associadas ao processo de pediplanação, em fase climática seca. Etapa importante na história do relevo, marca o fim de longa evolução e pode constituir o início de nova etapa de erosão. A superfície mais antiga foi denominada Superfície Sul-Americana (KING, 1956) para designar a planície produzida por denudação entre o Cretáceo e Terciário Médio. Essa superfície, apesar de reconhecida por vários autores, recebeu a denominação na Depressão Periférica Paulista de Superfície do Japi (ALMEIDA, 1964), na região de Jundiaí, nivelada a 1000 a 1200 metros. Na parte centro-ocidental, na bacia de Rio Claro, esta recebeu o nome de Superfície de Cimeira, na borda do Planalto Ocidental, identificada com o reverso das cuestas regionais a 950 e 1000 metros (PENTEADO, 1968). Para Ab’Saber (1969) e Penteado (1968) a Superfície de Cimeira foi formada durante fase de aplainamento situada entre Eoceno/Mioceno, e após o Eo-terciário estabeleceu drenagem exorréica, dando início à escavação da bacia de Rio Claro. Acontecimentos erosivos pós Eo-Terciário foram responsáveis pela compartimentação inicial. Ao terminar a primeira fase de entalhamento, um período de seca de duração longa favoreceu os processos de pediplanação (PENTEADO, 1968). Esta fase de pediplanação elaborou o assoalho da bacia deixando vestígios na concavidade dos tálus, refletindo o recuo dos pedimentos e frente das cuestas, bem como nos altos patamares e interflúvios adjacentes, dispostos entre 700 a 750 metros. Esta fase de aplainamento corresponde à Superfície Neogênica (DE MARTONE, 1943), datada do limite do Pleistoceno, localmente conhecida como Superfície Interplanáltica ou Urucaia (PENTEADO, 1968) – Neogênica I. A Superfície de Urucaia do setor centro-ocidental é correlacionada com a Superfície de Indaiatuba (AB’SABER, 1969) ou Viracopos (CHRISTOFOLETTI, 1968 e NAKASHIMA, 1973) na porção oriental, na região de Campinas. Perez Filho (1987), em estudo que relaciona solos na porção centro-oriental, nos arredores de Mogi Guaçu, com superfícies geomorfológicas lembra que a superfície mais antiga corresponde ao nível de aplainamento geral denominada Superfície de Urucaia, datada do final do Plio-Pleistoceno. Ao terminar a grande fase de pediplanação Neogênica, instalou-se fase erosiva com a mudança do clima para mais úmido. Esta fase de escavação data do final do Terciário e limiar do Quaternário. Para Penteado (1968) durante a primeira fase de glaciação do Quaternário Inferior, sobreveio nova mudança climática para mais seco, de duração longa e atuação generalizada. Das fases secas do Quaternário esta deixou maiores vestígios nas superfícies interplanálticas que nivelaram os principais interflúvios da Depressão Periférica Paulista – fase Neogênica II, datada do Pleistoceno Inferior. Na parte centro-ocidental, corresponde à Superfície de Rio Claro (PENTEADO, 1968) e na parte centro-oriental à Superfície Mogi Mirim (PEREZ FILHO, 1986) – niveladas a 600 a 650 metros. Após extenso período de pediplanação da superfície Neogênica II, sucederam-se episódios curtos de mudanças climáticas, deixando marcas na paisagem regional. Os altos terraços do Rio Corumbataí e do Rio Mogi Guaçu, por exemplo, situam-se 50 a 60 metros acima das várzeas, nivelados a 580 a 590 metros, datados do Pleistoceno Médio. Nova fase úmida escavou o assoalho desses patamares separando os baixos terraços, situados 4 a 6 metros acima das várzeas, correspondentes à última glaciação, nivelados a 540 a 550 metros, datados do Pleistoceno Superior/Holoceno. Logo, a Depressão Periférica Paulista formou-se pelo conjunto de compartimentos drenados por bacias hidrográficas, que estabeleceram níveis de aplainamentos em diferentes setores, fruto da retenção de material sujeitas às oscilações climáticas, com prováveis interferências tectônicas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A evolução das superfícies de aplainamento encontrada nos principais trabalhos da literatura sobre o relevo paulista, elaborados por diversos autores, contribuem para compor o cenário regional das transformações da paisagem da Depressão Periférica Paulista, interpretadas por meio das datações relativas. Desta forma, salienta-se a necessidade atual de datações absolutas das formações superficiais e solos que recobrem os níveis de aplainamento por meio de novas geotecnologias, como por exemplo, a Luminescência Opticamente Estimulada-LOE (inferior a 1 Ma anos) , para melhor precisão das idades. Futuras interpretações, sobre a evolução do relevo, por meio do uso de datações absolutas, trarão resultados que permitirão explicar com maior clareza, corroborando ou não, as datações relativas aqui apresentadas, em decorrência de oscilações climáticas pretéritas.

AGRADECIMENTOS
Agradecimento a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) pela Bolsa de Doutorado.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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