Anais: Geocronologia e evolução da paisagem

Dinâmica Geomorfológica do Planalto Sedimentar do Jatobá a partir do estudo dos Modelados de Acumulação e Denudação no Parque Nacional do Catimbau, Pernambuco

AUTORES
Tavares, B.A.C. (UFPE) ; Lira, D.R. (UFPE) ; Cavalcanti, L.C.S. (UFPE) ; Corrêa, A.C.B. (UFPE)

RESUMO
Nos depósitos encontrados é possível inferir dois eventos distintos na encosta, 1) deposição dos sedimentos em forma de leques com até 4 metros, 2) incisão da drenagem nos leques provindos das cabeceiras de drenagem à jusante dos depósitos. Assim pode-se identificar que o material se depositou na encosta pela ação da gravidade e intermediação de fluidos hídricos, e o material cortado é transportado pela planície fluvial devido ação da drenagem, formando os terraços fluviais nos flancos do canal.

PALAVRAS CHAVES
Eventos deposicionais; leques aluviais; Cuesta

ABSTRACT
In the sediments deposits it was possible to conclude two distinct events at the slope, 1) Alluvial fans structured by the sediments deposition with 4 meters high, 2) Incision of the drainage in the fans from the headwaters located downstream of the deposits. Thus, can be identify that the material has deposited in the slope by gravity and through the fluid water, and the sediments is transported by the fluvial plain due to the drainage action, forming the fluvial terraces at the stream sides.

KEYWORDS
Depositional events; Alluvial Fans; Cuesta

INTRODUÇÃO
A ênfase em abordar superfícies deposicionais/intempéricas (unidades morfoestratigráficas segundo a concepção de MEIS & MOURA, 1984) deve-se ao fato de essas constituírem um instrumento valioso de reconhecimento e mapeamento de depósitos quaternários e do entendimento das relações formativas entre depósitos e compartimentos de relevo (MUTZENBERG, 2007 e 2010). As superfícies de erosão estariam associadas a fases de clima seco, com chuvas concentradas, quando ocorreria a produção principal de sedimentos, correspondendo aos períodos glaciais das altas e médias latitudes, enquanto os encaixamentos da drenagem por incisão fluvial, que levariam ao escalonamento das superfícies de erosão, estariam ligados a fases de um clima úmido, interglaciais (MOURA, 2003), semelhantes às condições hodiernas. A sedimentação episódica (coluvial), propõe que o registro sedimentar é formado através de episódios de erosão-deposição, alternados por períodos de não-deposição, marcadamente refletidos nos planos de estratificação (DELLA FÁVERA, 2001). A área pesquisada foi o Parque Nacional do Catimbau, sendo uma Unidade de Conservação de proteção integral, abrangendo os municípios de Buíque, Ibimirim e Tupanatinga, no Estado de Pernambuco. O objeto de estudo foram os depósitos de leques aluvio/coluviais presentes no reverso da cuesta do planalto sedimentar do Jatobá, com o intuito de fazer a identificação e interpretação dos depósitos de encosta no contexto das mudanças climáticas do Quaternário. O estudo dos depósitos aluviais em ambientes semi-áridos, no entanto, são essenciais para elucidar o papel da dinâmica climática contemporânea, já que apenas os eventos de maior magnitude são capazes de remobilizar grandes volumes de sedimento dentro dos canais e reafeiçoar as formas a eles associadas. Assim, a partir do cotejamento das formas de deposição aluvial e seu grau de estabilidade é possível recompor o registro dos inputs climáticos diretamente associados à morfogênese na escala dos canais

MATERIAL E MÉTODOS
Inicialmente foi realizado um mapeamento geomorfológico em meso-escala (1:100.000), com base na análise do mapeamento geológico da CPRM e coleta de pontos com GPS. O mapeamento seguiu as normas estabelecidas pela comissão de mapeamento geomorfológico de detalhe da UGI (União Geográfica Internacional), como detalhado em Demek (1972). A partir do mapeamento geomorfológico foi possível localizar os corpos sedimentares da área de estudo para em seguida ser feita a análise morfoestratigráfica com o objetivo de realizar um diagnóstico da evolução do relevo no presente trabalho. Assim, foi traçado perfis topográfico dos locis deposicionais a fim de interpretar a origem desses modelados. Esse tipo de abordagem foi utilizado por Moura & Meis (1986), Mello et al. (1991 e 1995) e por Camargo Filho & Bigarella (1998) nos setores planálticos do Sul e Sudeste do Brasil, buscando associar as formas do relevo com as formações superficiais que as estruturam. As unidades deposicionais e perfis de alteração in situ passam a integrar a estrutura superficial da paisagem e, não somente, aos arcabouços litológicos constituintes dos diversos embasamentos regionais. Porém, a morfogênese de tais depósitos torna-se o alicerce dessa metodologia baseada em seus aspectos sedimentológicos, já que, os processos e modelos que aglutinam a história erosiva de uma paisagem formam o arcabouço da leitura de sua evolução (MISSURA, 2006). Desse modo a abordagem morfoestratigráfica aliada ao mapeamento geomorfológico de detalhe busca identificar um corpo litológico primordialmente pela sua feição superficial, que pode ser diferenciada ou não das unidades que lhe são contíguas, e transgredir limites temporais ao longo ao longo de sua extensão (FRYE & WILMAN, 1962). De acordo com esta metodologia, as unidades deposicionais e coberturas superficiais diversas mantêm uma relação estreita com a morfologia superficial contemporânea.

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Foram identificados depósitos alúvio/coluviais em forma de leque. Estes depósitos se apresentaram de uma forma geral com sedimentação franco-arenosa, com grãos bastante angulosos, o que demonstra que os sedimentos de uma forma geral sofreram transporte a curta distância, o que evidencia que suas áreas fontes são próximas das áreas de acúmulo desses materiais, sendo, portanto uma fácies proximal. Os leques se formam em áreas de alvéolos de denudação do reverso da cuesta. No perfil A-B e C-D (Figura 1) podem ser observados os knick- points, estes identificam os depósitos localizados na meia-encosta e no terço inferior da encosta (reverso da cuesta), as rupturas identificam as áreas de estocagem de sedimentos. As rupturas de declive identificadas na área estudadas podem ser evidências de um controle estrutural, ou seja, um controle tectônico, feito a partir das zonas de cisalhamento derivadas do lineamento Pernambuco e da falha de Ibimirim que não apenas controlou a sedimentação mesozoica como também exerce um papel fundamental para a criação dos loci deposicionais da região do Catimbau, Planalto do Jatobá (CPRM, 2007). No caso da área em questão os depósitos colúvio-aluviais se encontram ora, em segmentos da encosta ora, como uma rampa de colúvio que vai do terço superior da encosta e segue em direção ao fundo da cabeceira, avançando após o terço inferior da encosta, Perfil E-F e G-H, (Figura 1). Também é valido salientar que os materiais que estruturam os leques colúvio-aluviais são provenientes muito provavelmente da Formação Tacaratu (Siluriano), sendo um retrabalhamento desta unidade. Esta formação se porta na paisagem como uma sequencia predominantemente arenosa com presença de arenitos grosseiros. Também com presença de material fino, como quartzos angulosos e subarredondados. A formação apresenta uma cor rósea-avermelhada (Figura 2). Nos depósitos encontrados na área, é possível observar dois eventos que ocorreu/ocorrem na encosta: 1 – deposição dos sedimentos em forma de extensos leques com espessura de até 4 metros. 2 – incisão da drenagem nos leques a partir dos canais provindos das cabeceiras de drenagem à jusante dos depósitos. Assim pode-se identificar que o material se depositou na encosta pela ação da gravidade ou pela intermediação de fluidos hídricos, por sua vez, o material está sendo cortado é transportado ao longo da planície fluvial pela ação da drenagem, formando assim, terraços fluviais nos flancos do canal. Esses depósitos por apresentarem uma única litofácie, sendo esta arenosa, e extensos pacotes sedimentares, podem indicar eventos de alta magnitude que são derivados do Neógeno, podendo estar ligados a estágios mais úmidos do referido período. Isso pode ser evidenciado a partir de disposição dos pacotes sedimentares na paisagem, no qual houve primeiramente um momento de maior umidade, ou seja, mais água, desse modo mais energia entra no sistema, fazendo com que se formem os depósitos em forma de leque. Após estes episódios que possibilitaram a deposição, viria um momento mais seco, que permite a erosão desse material, ou seja, a energia que entra no sistema não é suficiente para a deposição do material e sim para a incisão dos pacotes sedimentares, a partir de eventos de chuvas intensas em curto intervalo de tempo. Também é necessário avaliar a fase bio-resistásica da paisagem. No primeiro momento de deposição, sugere-se que a vegetação presente nesta área possibilitasse a agregação dos materiais em superfície (biostasia), enquanto que a fase resistásica faria com que a vegetação ficasse mais esparsa e com isso, o material em superfície ficasse desprotegido, favorecendo a incisão dos depósitos coluviais.

Figura 01

Identificação dos perfis topográficos

Figura 02

Leques Alúvio/Coluviais

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização de marcadores e índices de ordem geomorfológica permite definir as ciclicidades atuantes dentro dos sistemas morfogenéticos, sobretudo aquelas de cunho climático e entender como as paisagens respondem às mudanças regionais e globais da circulação atmosférica. De acordo com Slaymaker & Spencer (1998) o registro sedimentar associado aos modelados de acumulação recente (pleistoceno superior/holoceno) permitem identificar respostas dos sistemas ambientais às variações de energia do sistema climático, e são uma das poucas fontes de dados na paisagem que possibilitam a construção de simulacros de cenários ambientais futuros, imprescindíveis para a compreensão do funcionamento dos sistemas geomorfológicos, e para a tomada de decisão em face da necessidade de ordenamento das ações antrópicas no espaço geográfico.

AGRADECIMENTOS
A FACEPE

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
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DELLA FÁVERA, J. D. F. Fundamentos de estratigrafia moderna. Rio de Janeiro, Ed. UERJ. 2001.

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DEMEK, J. (ed) Manual of detailed geomofphological mapping. Comm Goomorph. Surv. Mapping. IGU, Praga, 1972. 368p.