Anais: Interações pedo-geomorfológicas

Características físicas e químicas de paleossolo de 44Ka do município de Lapa - PR

AUTORES
Camargo Filho, M. (UNICENTRO) ; Bertotti, L.G. (UNICENTRO) ; Silva, D.W. (PPGG - UNICENTRO) ; Passos, J.R. (PPGG - UNICENTRO) ; Kataoka, A.M. (UNICENTRO)

RESUMO
Em encosta ao sul do rio Iguaçu, município da Lapa-PR, foi identificada paleossolos em baixa encosta. Esses paleossolos foram datados por 14C em 44Ka. Com base no afloramento do pacote pedossedimentar foi construída seção sistemática e foram coletadas amostras para análises físico-químicas cujos resultados permitiram avaliar alterações, perdas e ganho de material durante o processo de formação dos solos. O resultado permitiu avaliar possíveis mudanças no pedoambiente de formação dos paleossolos.

PALAVRAS CHAVES
Paleossolos; Paleopedologia; Ambientes pretéritos

ABSTRACT
On the south side of the Iguazu River Lapa (PR), has identified the presence of paleosols in lower slope. These paleosols were dated by 14C in 44Ky. Based on package outcrops pedossedimentar section was built systematically and was collected samples for physicochemical analyzes to obtain data that allow assessing changes, loss and gain of material during the process of soil formation. The results allowed evaluate possible changes in pedoenvironment formation of paleosols.

KEYWORDS
Paleosols; Paleopedologie; past environments

INTRODUÇÃO
No município da Lapa (PR), sul do segundo planalto paranaense, nas suas encostas localizadas na margem esquerda do rio Iguaçu os sedimentos quaternário ocupam os fundos de vale, as margens do rio Iguaçu, cabeceiras de drenagem e sedimentos que recobrem as encostas. De forma geral o terreno é constituído por colinas amplas e pouco arredondadas, cujas vertentes são predominantemente convexas entremeando as encostas correm mesetas estruturais de litologia arenítica (arenito Lapa, Grupo Itararé) mais resistente aos processos erosivos do que os sedimentos Permo-carboníferos do Grupo Itararé (CANUTO, 1985). Pontualmente, no local de trabalho, a encosta se estende por aproximadamente 600m, com forma convexo retilíneo passando a côncavo-retilíneo da média para a baixa encosta, com fases laterais côncavas. Cortando longitudinalmente a encosta há uma concavidade para onde convergem fluxos superficiais originados pelas chuvas. Atualmente, esta concavidade recebe também fluxos concentrados oriundos da estrada construída na porção mais elevada da encosta. A partir do terço inferior da média encosta o centro da concavidade torna-se plano, muito úmido, com pequenas ravinas que evoluem para voçoroca na baixa encosta. Em parte da parede direita desta voçoroca, denominada Monjolo, o corpo pedológico sedimentar encontra-se exposto, permitindo descrições e coleta de amostras deformadas e indeformadas. A litologia da encosta é constituída por arenitos Lapa que ocupam o topo da encosta, siltitos e folhelhos que afloram na média para baixa encosta e diamictitos e/ou arenitos conglomeráticos que ocupam a baixa encosta. O solo dominante na área de estudo é o Cambisolo álico. Na baixa encosta encontra-se pacote de paleossolos que foram datados por 14C em 44.000 anos A.P. As unidades de paleossolos e material pedológico e sedimentar foram submetidos a análises químicas e físicas no intuído de identificar possíveis indicadores do pedoambiente de formação dessas unidades paleopedológicas.

MATERIAL E MÉTODOS
A caracterização física e química de paleossolos em encosta na área de estudo contou com levantamentos de campo e análises laboratoriais. Os trabalhos de campo consistiram no reconhecimento e distribuição espacial das sequências pedossedimentares na encosta Monjolo. Neste reconhecimento foram considerados e individualizados solos soterrados recentemente de unidades coluviais e unidades organo-minerais. O reconhecimento da área de trabalho permitiu a elaboração de estratégias ou procedimentos para coleta de amostras destinadas a ensaios laboratoriais e construção de perfil sistemático do afloramento. Os critérios utilizados no reconhecimento de paleossolos e unidades pedológicas e sedimentares existentes na baixa encosta Monjolo foram os recomendados pela “Working Group on the Origem and Nature of Paleosols” (1971) apud Fenwick (1985). Os ensaios laboratoriais se destinaram a análise granulométrica, densidade real e aparente; porosidade total; teor de matéria orgânica, acidez e química total. A construção da seção sistemática considerou apenas unidades passíveis de serem individualizadas a olho nu. A transição entre as unidades de paleossolos e sedimentos foi efetuada de acordo com o recomendado pelo IBGE (1995). A granulometria seguiu a rotina convencional de separação de grosseiros, via peneiramento, e finos, pelo sistema de pipetagem, método 1.16.1 da EMBRAPA (1979), adaptado. As análises de densidade real foram efetuadas pelo método o Balão Volumétrico adotado pela EMBRAPA (método 1.12 – EMBRAPA, 1979). A obtenção da densidade aparente utilizou o método do Anel Volumétrico (método 1.11.1 – EMBRAPA, 1979) e a porosidade total foi obtida através da formula Nt%=Dr-Dap/Drx100%. Os teores de matéria orgânica foram obtidos a través do método da queima (método da queima (método 2.2 da EMBRAPA, 1979). A acidez foi obtida através de rotina laboratorial descrita por Thomé (1997). A química total foi realizada no laboratório de Mineralogia da UTFPR (LAMIR).

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os dados de campo permitiram individualizar quinze unidades que compõem o afloramento dos paleossolos e unidades pedológicas associadas (Figura 1). Os dados granulométricos demonstram que as unidades coluviais (IV, III, II, I e IA) têm textura areno-siltosa, enquanto os paleossolos são franco arenosos; a exceção dos paleossolos P1.1, P2.1 e P2.3, que têm textura franco-argilo-arenosa, a mesma textura do horizonte Ap. A densidade real possui poucas variações entre o horizonte Ap e o Colúvio I, cujos valores estão entre 2,71g/cm3 (Ap) e 2,76g/cm3 (II) e 2,71g;cm3 (I). Na unidade de contato (IA) com o paleossolo (P3.3) a densidade real é de 2,8g/cm3 para ambas. A partir da unidade P3.3, em direção a base do perfil estudado, a densidade real varia entre 2,8g/cm3 e 2,62g/cm3. Os valores de densidade aparente variam de 1,626g/cm3 (Ap) a 1,558g/cm3 (I). A partir da unidade IA (1,580g/cm3), em direção à base do perfil, a densidade aumenta progressivamente até a unidade P2.3 (1,930g/cm3). Na unidade P2.2 a densidade aparente se reduz (1,608g/cm3), passando a elevar-se na P2.1 e mantendo-se estável nas unidades P1.2 e P1.1. A porosidade total possui, entre o horizonte Ap e o paleossolo P1, variação de 13,94%. Entretanto, esta variação é de 4,4% entre as unidades coluviais. Apesar da pequena variação percentual destas unidades, são elas que possuem os maiores valores de porosidade total. Entre os paleossolo esta variação percentual é de 13,22%. A quantidade de matéria orgânica variou consideravelmente. A unidade (Ap) contém 5,7%M.O (3,32%C). Este teor de matéria orgânica se reduz para 3,8%M.O (2,21%C) na unidade coluvial IV e para valores entre 0,3%MO e 0,8%MO nas demais unidades coluviais (III, II, I e IA). Nos paleossolos a quantidade de matéria orgânica torna a se elevar, com teores entre 3,8%M.O e 4,85%M.O, muito próximos daquele encontrado no horizonte Ap. Os teores de matéria orgânica para as unidades coluviais são praticamente ausentes. A química total forneceu valores absolutos que permitem somente comparações relativas em relação a sua concentração. Para comparar horizontes dentro de um mesmo perfil ou seção do solo é recomendado o uso das relações moleculares (COSTA VERDADE, 1972; RETALLACK, 1990, 1997). Estas relações permitem estabelecer a migração diferencial de determinados componentes químicos. A relação molecular soda/potássio (Na2O/K2O) indica maior concentração de K2O entre as unidades coluviais IV a I, do que nos paleossolos (Figura 2b). No colúvio Ia, como nos paleossolos, o numerador óxido sugere um sutil acúmulo de Na2O. A exceção é o paleossolo P2.2, cujo numerador óxido sugere acúmulo de K2O. A relação alcalino terrosos/alumina (CaO+MgO/Al2O3) sugere maior concentração alcalino-terrosos entre o horizonte Ap e o Colúvio IA (Figura 2c). O paleossolo, quando comparado com as demais unidades do perfil, sugere maior acúmulo de Al2O3 nesta porção do perfil estudado. A exceção é a unidade P2.2 cujo numerador óxido está próximo aos valores das unidades coluviais que sobrepõem os paleossolos. A relação alumina/sílica (Al2O3/SiO2) molecular demonstrou uma sutil concentração de Al2O3, no horizonte Ap e unidades coluviais, enquanto os paleossolos tendem a concentrar mais sílica. A exceção é o paleossolo P2.2 (Figura 2d) cujo numerador óxido é próximo daqueles encontrados nas unidades coluviais. A alumina/bases (Al2O3/CaO+MgO+Na2O+K2O) sugere maior concentração de material solúvel entre o horizonte Ap e a unidade Colúvio IA (Figura 2a), enquanto os paleossolos tendem a reter mais Al2O3. O alumínio/titânio (Al2O3/TiO2) demonstrou acúmulo de alumínio nas unidades Ap, IV, III, II, I, IA e nos paleossolos P2.2, P2.1, P1.2 e P1.1 (Figura 2e).

Figura 1

Distribuição de unidades pedológicas na seção Monjolo. Desenho, José Gardin.

Figura 2

Relações moleculares do perfil da seção Monjolo. a) alumina/bases; b)Na2O/K2O; c) CaO+MgO/Al2O3; d) Al2O3/SiO2; e) Al2O3/TiO3

CONSIDERAÇÕES FINAIS
A granulometria sugere maior mobilidade de finos nos paleossolos do que nos colúvios enquanto a areia tem percentuais maiores nos paleossolos. A densidade real têm variações entre os paleossolos P3.2 e P1.1. Já, a densidade aparente tem valores mais constantes nos colúvios do que nos paleossolos. A porosidade total tem menores percentuais nas unidades com elevada densidade aparente. A distribuição da matéria orgânica tem teores elevados no horizonte Ap e C (5,7%MO e 3,8%MO) passando a teores abaixo de 0,5%MO nos colúvios e tornando a elevar-se nos paleossolos (3,8%MO e 4,85%MO). As relações moleculares sugerem que o horizonte Ap e colúvios têm maior teor de materiais solúveis, bases e concentrações de ferro, enquanto nos paleossolos predomina a concentração de material insolúvel (argila) e depleção de Fe2O3. É possível que os paleossolos tenham evoluído em pedoambiente saturado de água na maior parte do ano, enquanto outras unidades evoluíram em ambiente mais oxidante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA
CANUTO, J. R. Origem dos diamictitos e rochas associadas do Subgrupo Itararé, no sul do Estado do Paraná e Norte do Estado de Santa Catarina. 1985. 186 p. Dissertação (Mestrado em Geologia) - Instituto de Geociências - Universidade de São Paulo. São Paulo.
COSTA VERDADE, F. Análise Química Total. In: MONIZ, A. C. (Coord.) Elementos de Pedologia. São Paulo: EDUSP, 1972. p. 209-221.
EMBRAPA. Serviço Nacional de Levantamento e Conservação de Solo. Manual de Métodos de Análise de Solos. Rio de Janeiro, 1979.
FENWICK, I. Paleosols: Problems of recognition and interpretation. In: BOARDMAN, J. (Ed.) Soils and Quaternary landscape evolution. Nova Iorque: John Wiley & Sons, 1985. 391p.
RETALLACK, G. J. Early Triassic Palaeosols. Australian Journal of Earth Sciences, v. 44, n.2, p. 185-201, 1997.
RETALLACK, G. J. Soil of the Past: a introduction to paleopedology. Londres: Ed. Academic Division of Unwin Hyman, 1990. 520p.
THOMÉ JR., J. B. Manual para interpretação de análise de solo. Guaíba: Agropecuária, 1997. 247p.